Paternidade Surpresa (Severitus) escrita por Srta Snape


Capítulo 17
Capítulo 17 – Dursleys




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Capítulo 17 – Dursleys

Snape não fazia a menor ideia de que horas era naquele momento, tudo que ele sabia era que agora o menino estava dormindo tranquilamente em sua cama enquanto ele não conseguira pregar o olho pensando no pedido que ele fizera. Muitos pensamentos passaram por sua cabeça naquelas horas, diversas possibilidades. Como um exímio jogador de xadrez, sabia que deveria ver muito mais do que só a próxima jogada, precisava ver dezenas de jogadas a frente. Porém todas as vezes que montava uma jogada em sua cabeça tentando manter seu papel de espião tudo que via no final era Harry chorando sobre seu corpo. E todas as vezes que tentava prever um futuro em que abandonava seu posto ao lado de Voldemort, tudo que conseguia era um monte de nada, um vazio interminável, pois em nenhum momento de sua vida pensara nesse possível futuro. Era tudo um completo desconhecido para si.

Uma fraca luz solar entrou pela pequena janela que ficava acima do lago negro iluminando seu braço esquerdo e fazendo sua marca dançar em sua pele como se a luz a incomodasse. Devagar passou o dedo por cima dela sentindo o leve relevo em sua superfície, a cobra abriu mais a boca querendo lhe dar um bote, mas Snape apenas a ignorou. Aquela marca era como algemas que apertavam seus pulsos prendendo-o a um destino insólito. Teria coragem de quebrar essas algemas?

A resposta veio tão rápido que se surpreendeu de estar tão na superfície de seus pensamentos.

Se levantou devagar evitando fazer barulho e se aproximou do menino que dormiria por mais algumas horas devido a poção do Sono sem Sonhos. Levou sua mão aos cabelos revoltos acariciando com cuidado enquanto a resposta de sua dúvida saia baixinho por sua boca.

— Por você, eu faço.

Um ano, apenas um ano fora o suficiente para que Harry conseguisse entrar tão profundamente em sua alma a ponto de fazê-lo caminhar decidido a caminho do escritório do diretor afim de dar-lhe sua decisão.

— Entre. – Disse Dumbledore por trás da grande porta de madeira maciça.

— Desculpe o horário, diretor. – Disse Snape fechando a porta atrás de si e caminhando para perto da mesa onde Dumbledore se encontrava. – Mas precisamos conversar.

— Não se preocupe, estou acordado há algumas horas. – Dumbledore lhe sorriu e indicou a cadeira a sua frente com a mão. Snape acenou com a cabeça e se sentou colocando os cabelos negros atrás da orelha e cruzando as pernas. – Parece tenso, Severus. Ainda está com dor? Tenho certeza que Madame Pomfrey poderá lhe ajudar se é que você mesmo não tem uma poção que possa ajudá-lo.

— Não é necessário, diretor, estou bem.

— Então o que aconteceu, meu filho?

— Harry teve uma crise de ansiedade ontem em meus aposentos.

— Ele está bem?

— Sim, está dormindo. O ponto é que ele é forte, mas ao mesmo tempo é muito frágil e precisa de cuidados e atenção, mesmo que ele não queira aceitar essa verdade. E no meio desse episódio um pedido me foi feito. Um pedido de um filho para um pai.

— E que pedido foi esse? – Perguntou Dumbledore se recostando na cadeira e olhando atentamente para Snape por cima dos oclinhos de meia lua.

— Meu filho me pediu para não voltar ao Lord.

— Era de se imaginar após ele ver o estado que você ficou ao voltar do encontro com Voldemort.

— Eu aceitei.

A sobrancelha de Dumbledore se ergueu em seu rosto, o ancião levou a mão ao rosto o apoiando com o dedo e olhou intensamente para o homem a sua frente sem falar nada.

— Diga alguma coisa, Alvo. – Pediu Snape após vários minutos em que Dumbledore se manteve calado apenas o encarando.

— É compreensível que Harry queira preservar a sua pessoa, ele é um adolescente, tem traumas e perdas em sua vida que muitos adultos jamais experimentarão e que muitos não tem força para suportar. Possivelmente ele diria para ele mesmo ir para a luta enquanto você ficaria seguro dentro dos muros do castelo. O menino te ama muito pelo que vejo e você corresponde a esse sentimento, se possível até mais ainda. Entendo tudo isso. Mas Severus, você sabe a importância de seu papel para o caminho escuro que iremos percorrer daqui para frente, você entende as implicações de sua escolha em afastar-se de seu papel? Ficaríamos completamente no escuro sem seu auxílio.

— Tenho certeza de que seremos capazes de contra atacar o Lord das Trevas sem o meu auxílio, diretor. Eu ainda farei parte da Ordem da Fênix ajudando no que eu puder. Sabe que posso ir atrás de informações muito importantes da forma que nenhum outro membro da Ordem pode, nem mesmo Moody ou Mundungo.

— Ah, eu sei bem que você tem a capacidade de descer ao pior local do submundo. Mas preferiria que permanecesse recebendo informações diretamente de Voldemort.

— Eu não posso voltar, Dumbledore. – Sentenciou Snape com a cabeça erguida e o olhar firme. – Meu filho me pediu.

Por um segundo Snape jurou ver ódio nas íris azuis do diretor e não duvidava que fosse verdade o que vira. Dumbledore acabara de ser avisado que uma de suas mais valiosas armas contra o Lord das Trevas não mais faria seu serviço sujo, agora estavam completamente no escuro. Mas Dumbledore não seria O Dumbledore se não soubesse esconder muito bem suas frustrações e mais ainda jogar com as cartas que estavam a mesa. O diretor respirou fundo fechando os olhos por um momento e então abrindo-os e trazendo um sorriso compreensivo nos lábios.

— Eu entendo sua escolha, Severus, e a aceito. Vamos achar uma outra forma de resistir. Mas, já pensou em como as coisas serão após Voldemort descobrir que você desertou de sua posição?

— Passei a noite pensando nisso. Provavelmente o Lord ficará colérico e mandará comensais da morte para me matar ou para me sequestrarem e ele mesmo poder fazer o serviço.

— Está preocupado com isso?

— Não, aqueles idiotas morreriam antes de saber o que os atingiu.

— E se o próprio Voldemort vier atrás de você?

— Ele não virá. – Disse Snape descruzando as pernas e arrumando a postura na cadeira. – Não até que seja extremamente necessário, mas eu não soube de nada de seus planos antes, possivelmente ele deixará para cuidar de mim após seus planos estarem concluídos e espero que consigamos derrotá-lo antes disso.

Os olhos negros se prenderam com força aos azuis demonstrando claramente que ele contava com Dumbledore para que a Ordem conseguisse pôr um fim em tudo antes que tivesse que encarar Voldemort de frente.

— Claro. – Disse Dumbledore por fim.

Ao término da reunião com o diretor Snape voltou aos seus aposentos vendo que Harry continuava a dormir. Chamou um elfo e pediu que trouxesse o café da manhã deixando na mesa que conjurara na sala então voltou ao quarto e sentou-se na beirada da cama.

— Harry? – Chamou balançando o menino devagar. – Acorde.

Harry reclamou baixinho e abriu os olhos aos poucos levando as mãos ao rosto tentando afastar a preguiça. Se espreguiçou e só então viu Snape sentado ao seu lado.

— Oi. – Disse se sentando.

— Oi. – Respondeu Snape vendo-o ficar com as bochechas vermelhas, possivelmente ao se lembrar da crise que tivera na noite anterior. – Está tudo bem. Já passou. Faça sua higiene, o café está servido na sala, vou te esperar lá.

Demorou alguns minutos para que Harry saísse do quarto vestido com uma calça jeans e uma camiseta por baixo de uma blusa vermelha. Snape estava sentado em uma mesa com um café da manhã farto, lia o Profeta Diário, mas deixou o jornal ao lado quando o menino se aproximou sentando-se na cadeira a sua frente.

— Alguma novidade interessante? – Perguntou Harry apontando para o jornal.

— Não. Nenhuma palavra de nada. Não achava que Fudge fosse comunicar algo ao mundo bruxo, ele é um frouxo medroso que negará até a última instância sobre o retorno do Lord. Pois assumir que ele retornou será assumir o fracasso de seu governo em evitar esse retorno, além do fato de que Fudge é medroso demais para combater o Lord. O Ministério será um ponto com que não poderemos contar. Teremos que contar apenas com nossa própria força.

— Você fala como se...

— Eu saí das forças do Lord. – Disse Snape interrompendo-o. – Como você pediu.

Harry recostou-se na cadeira e fechou os olhos por alguns segundos sorrindo de leve antes de abri-los e encarar Snape que para sua surpresa também trazia um leve erguer de lábios.

— Obrigado. – Agradeceu sentindo dentro de si uma felicidade imensa o tomar.

— Não precisa agradecer. Vamos comer.

O café da manhã pareceu até mesmo mais saboroso com aquela notícia. Harry não suportaria perder mais alguém que amava. A morte de Cedrico fora muito cruel com seu coração, perder Snape, o pai que descobrira tão recentemente e o homem que fizera o sentimento paternal instalar-se com força em seu coração seria o fim para si.

— Precisamos falar de uma coisa importante. – Disse Snape limpando a mesa ao término do café da manhã. – Seu retorno à casa de seus tios.

— O que?

Harry franziu a testa e seus dedos apertaram o braço da cadeira. O sorriso que ainda estava em seus lábios sumiu completamente e a visão de Snape a sua frente foi substituída por um Tio Valter furioso com o punho fechado. Apesar do coração disparado Harry fechou os olhos com força tentando afastar a imagem de seu tio da mente. Quando finalmente focalizou Snape a frente não pode controlar a voz ao questioná-lo do motivo de ter que voltar.

— Você é meu pai, não é? Seu sangue corre em mim, sua magia também. Por que tenho que voltar para eles?

— É necessário.

— Eu não entendo essa necessidade. – Disse Harry se levantando. – Eu pensei que poderia ficar aqui em Hogwarts com você, ou na sua casa, até na Toca, em qualquer lugar que não seja lá. Eu não quero voltar.

— Harry, eu sei que não quer e eu não quero que vá. Mas a proteção de sangue de Lillian tem que ser fortalecida de tempos em tempos e isso só acontece com a sua proximidade física com o parente mais próximo que tenha o mesmo sangue, sua tia que aceitou essa magia quando aceitou você ainda bebê.

Harry se recostou no encosto do sofá e cruzou os braços diante do peito onde seu coração batia com força. Não queria fechar os olhos, sabia muito bem o que apareceria no escuro de suas pálpebras, a figura forte de Duda em cima de si com a risada grotesca do tio ao fundo e a imagem de sua tia fechando os olhos para tudo aquilo.

— Vai ficar tudo bem, Harry. – Disse Snape à sua frente postando uma mão em seu ombro. – Eles não farão nada com você.

— Como pode garantir isso? Você não estará lá. Eu ficarei sozinho mais uma vez com eles. Eu amo Hogwarts, mas não quero mais passar por aquilo, usarei minha varinha se for necessário, nem que precise ser expulso para isso. – Disse Harry entredentes com raiva despontando em cada letra. Em seu olho uma lágrima que ele fazia o possível para não deixar cair.

— Confie em mim. – Pediu o mestre de poções apertando de leve o ombro do menino. – Eles não chegarão perto de você.

Não foi fácil para Harry arrumar o malão no dormitório da Grifinória. Suas mãos agiam de modo letárgico, sua mente tentava acreditar nas palavras de Snape de que nada aconteceria, mas a verdade era que seu coração acelerava cada vez que pensava em voltar para aquela casa que só representava dor para si. Infelizmente querer não era poder e logo Harry deixou seu malão na entrada do castelo antes de ir até a carruagem que levaria até Hogsmead. Após se sentar avistou Snape ao longe ao lado de McGonagall.

O professor acenou com a cabeça e o observou ir embora sendo levado para longe de si. Seu coração apertou ao mesmo tempo em que a mão de Minerva apertou seu braço levemente.

— Quanto tempo terá que esperar para ir buscá-lo?

— Um mês. É preciso que ele fique um ciclo lunar inteiro junto ao sangue de Lillian para fortalecer a magia que o protege.

— Um mês. – Sussurrou a professora ainda olhando para o lugar onde antes estiveram as carruagens com os alunos e agora restavam apenas os dois. – Vamos, Severus, vamos entrar, tenho uma caixa de biscoito muito gostosos em meus aposentos.

— Eu tenho cara de quem fica comendo biscoitos, Minerva?

— Não, você tem cara de quem nem se alimenta bem. – Disse a professora caminhando para o interior do castelo sabendo que o homem a seguiria de qualquer forma. – E os biscoitos foi apenas por educação, seu velho ranzinza.

— Quem foi professor de quem mesmo? – Disse Snape provocando a mulher que andava firme a sua frente.

— Verdade. – Concordou a professora abrindo a porta de seus aposentos e esperando que o homem entrasse. Os aposentos de McGonagall eram quase tão grandes como os de Snape, mas muito mais caloroso e convidativo. - E eu o vi sentar naquele banquinho com cara de assustado esperando ser mandado para uma casa, um molecote minúsculo, sendo assim respeite minhas rugas e aceite a droga dos biscoitos.

A mais velha terminou de falar e enfiou uma caixa de biscoitos nas mãos de Snape que deu um sorriso torto pegando um deles dando uma mordida antes de retirar sua capa negra e sentar-se em uma poltrona diante do sofá onde a bruxa se sentou após entregar um cálice de bebida a ele.

— A sua saúde. – Brindou Minerva levando o cálice a boca.

— O que quer conversar?

— Dumbledore me contou que você deserdou de seu posto de espião em pró de seu tempo com Harry.

— E?

— Nada, só queria dizer que admiro esse gesto. Fico feliz que seu amor por aquele menino tenha se sobreposto a qualquer manipulação de Alvo em sua vida. – Snape franziu a testa e cerrou os olhos ficando atento as palavras de Minerva. – Ah, eu sei que Alvo é um grande bruxo e um homem muito importante em sua vida como uma figura paterna. Mas nunca gostei como ele o manipulava antes da queda de Você Sabe Quem, e muito menos como queria usá-lo agora.

— Por que essa preocupação toda agora, Minerva? Nós nunca conversamos sobre esses assuntos antes, você nunca manifestou nenhum interesse em eu estar sendo usado ou não, mas agora quer me dar seu apoio em minha escolha de renúncia. Por quê?

— Você tem razão, Severus, esse não era um assunto que me fizesse gastar energia para sequer pensar nele. – Disse McGonagall olhando seriamente para o homem enquanto falava. – Mas contar-lhe aquela verdade que escondi por tanto tempo e vê-lo preocupando-se com Harry como vi na primeira tarefa do torneio me fez querer me redimir por tudo que nunca fiz por você.

— Você não me deve nada, Minerva.

— Eu sei, mas o que sinto é diferente.

— Então por isso quer ser minha amiga? Para se sentir melhor consigo mesma?

— Não, Severus. Pelo amor de Mérlin, abaixe esses escudos, homem. Você não é uma pessoa de ter amigos, olhe ao seu redor, está sempre sozinho e isso não é bom. Eu gosto de você Severus, mesmo que as vezes queira te esganar por ser cruel com seus alunos. Quero apenas que entenda que poderá encontrar uma amiga em mim e contar comigo quando precisar.

Baixar os escudos era algo difícil, Snape estava acostumado a não ter ninguém que se importasse verdadeiramente consigo e sempre desconfiou de que qualquer ato de afeto vinham com segundas intenções, mas a vinda de Harry para sua vida mostrou que é possível que uma pessoa queira se aproximar de si apenas por querer. Minerva mostrou-se ser uma dessas pessoas durante o ano, guardando para si a sua verdade. Ainda recordava-se da mulher segurando sua mão com firmeza quando Harry sumira de vista na primeira tarefa e de novo ao seu lado na segunda e terceira tarefa acalmando-o. Talvez, somente dessa vez, pudesse de fato abaixar os escudos e apenas deixar a mulher se aproximar.

— Tudo bem, Minerva, acredito em sua palavra.

— Que bom, pois os tempos mudarão e precisaremos confiar um nos outros e eu confio em você.

Houve um silêncio por alguns minutos enquanto Snape digeria cada palavra dita pela professora.

— Você vai trazer Harry para cá ou para sua casa?

— Ainda não sei, Dumbledore provavelmente tem planos quanto a Ordem, vou aguardar novas instruções dele sobre isso para saber onde ele estará mais seguro.

— Acho que qualquer lugar é melhor do que com aquela família dele. Nunca gostei daqueles trouxas.

— Obrigada pelos biscoitos Minerva, mas você me lembrou que tenho algo a fazer.

Com um aceno de cabeça Snape pegou sua capa e saiu dos aposentos da professora de transfiguração indo diretamente para os portões do castelo. A conversa com Minerva o deixara mais acalentado com um calor interno gostoso de sentir, há muito tempo que não sentia como era ter uma amiga e sabia que a professora estava sendo sincera, pois Minerva não tinha necessidade alguma de mentir para si e isso já era mais do que precioso. Porém aquele calor que sentia foi deixado de lado quando desaparatou diretamente para a Rua dos Alfeneiros.

Aquela rua era exemplarmente limpa e silenciosa. As casas iguais uma das outras e até mesmo os carros tinham o mesmo modelo alterando apenas as cores. Snape revirou os olhos para esse padrão tedioso. Mas não era para criticar o quão sem graça aqueles trouxas eram que ele estava ali. Havia um motivo, uma razão muito forte para que o homem caminhasse pé ante pé até diante da casa de número 4. Estar diante daquela casa era como voltar para a sua própria, podia sentir o peso ruim que ela emanava, podia ouvir o choro da criança negligenciada que Harry fora durante tantos anos ali dentro.

Engolindo a raiva que se apresentava em seus olhos, deu um passo à frente, depois outro e mais outro até chegar à porta. Pensou a princípio em abri-la com força quebrando-a ao meio para demonstrar o perigo de sua pessoa, mas sabia que o maior perigo se apresentava nos atos e falas mais calmas. Por isso apenas respirou fundo trazendo para a superfície o negror de seu comensal. Sentindo-se até mesmo mais pesado, levou o dedo a campainha e tocou uma única vez. Ouviu barulho do outro lado da porta e passos firmes se aproximarem. O trinco se abriu e o homem de bigode grande e olhos miúdos apareceu, a princípio com curiosidade em saber quem estava em sua soleira se não esperavam visitas e em seguida com surpresa e receio ao reparar nas vestimentas do homem parado a porta.

— Quem é você? – Perguntou Valter Dursley rispidamente.

— Você!

A fala veio do fundo do corredor na voz assustada e gritada de Petúnia que olhava para o homem de negro como visse um fantasma.

— Olá Tunia. – Cumprimentou Snape com um sorriso torto em seus lábios. – Não vai me convidar para entrar?

— Você conhece esse homem, Petúnia? – Perguntou Valter olhando exasperado para a esposa atrás de uma resposta para o fato dela conhecer uma figura tão claramente bruxa como aquele ser. Petúnia nada disse. – Você está na casa errada! – Vociferou voltando-se para Snape. – Vai embora ou eu chamo a polícia.

Valter tentou fechar a porta, mas Snape a segurou firmemente com uma mão colocando o pé na soleira para impedir seu fechamento. O professor nada disse, apenas empurrou a porta fazendo-a quase bater no nariz de Valter que deu dois passos para trás fechando a mão em punho ao ver Snape entrar em sua casa e fechar a porta como se fosse o dono do local.

— Está tudo bem pai? – Snape olhou para o topo da escada encontrando ali um menino de grande porte olhando dele para seu pai e sua mãe ainda acuados no final do corredor.

— Vai para seu quarto, Duda! – Gritou Valter sem tirar os olhos de Snape. – E tranque a porta.

— Eu não faria isso se fosse você. – Disse Snape com a voz baixa, mas perigosa retirando a varinha da manga de seu sobretudo e apontando para o menino que se encolheu tremendo as pernas. – Então você é o Duda.

— Não se atreva a apontar essa varinha para meu filho!

— Calada! – Snape apontou a varinha para a mulher e de repente Petúnia abria a boca, mas nada saia de sua garganta.

— O que fez com ela? - Perguntou Valter desesperado segurando a mulher pelos braços enquanto ela abria e fechava a boca sem emitir um único som.

— Nada demais, calei a boca dela, tinha esquecido como era irritante. – Comentou voltando-se para o menino. – Desça. – Ordenou. - Desça, agora. - Exigiu olhando para o menino novamente.

Duda tremia da cabeça aos pés enquanto descia os degraus devagar. Ao chegar perto de Snape o menino murchou a barriga e tentou passar o mais rente a parede possível, ainda assim estava mais perto do que queria do homem cuja varinha estava apontada para sua cara.

— Todos para a sala, vamos ter uma conversinha.

Snape deu um passo adiante e a família então entrou na sala de estar, Valter a frente tentando tapar Duda com seu corpo, mas o filho era quase de sua largura e mais alto, a única que não podia ser vista era Petúnia atrás do filho.

— Então é nessa casa que Harry foi criado. Não há nada dele aqui. - Constatou olhando para o ambiente com uma careta. - Não tem uma única foto dele, nem mesmo o ar traz sua energia. Nada.

Então encaminhou-se devagar para o corredor e abriu com uma mão a portinha embaixo da escada enquanto a outra mão seguia apontando a varinha para aquelas pessoas. Embaixo da escada ainda tinha um pequeno colchão quase sem espuma, um lençol velho e alguns mínimos brinquedos quebrados. O local era muito pequeno e claramente não cabia um menino de onze anos ali dentro, isso explicava um pouco porque Harry era menor do que sua idade exigia, visto que ele era alto, assim como Lilian e o menino deveria ter puxado essa genética, mas era apenas um garoto mirrado que batia no ombro do seu melhor amigo.

— Onze anos. - Sussurrou fechando a porta e voltando para a sala encarando os tios de Harry. - Durante onze anos Harry foi mantido naquele cubículo, por mais do que isso ele apanhou e foi completamente negligenciado por aqueles que deveriam ter cuidado de si.

— Nós nunca o maltratamos. - Disse Valter. - O que ele disse é mentira. Saia da minha casa ou chamo a polícia.

— Pode chamar, já terei terminado quando eles chegarem. Inclusive vou começar com você, seu porco.

Os olhos de Snape brilharam de ódio ao aproximar-se de Valter. Tudo que vinha em sua mente era a visão do menino chorando em seus braços após um dos pesadelos que o assombrava. O amor que um dia sentira por Lillian dissolvia-se a cada segundo que pensava nas atrocidades que seu filho passara na mão daqueles trouxas, se a mulher ao menos tivesse lhe contado sobre Harry, com certeza o menino teria um futuro diferente.

Valter sentiu a ponta da varinha de Snape pressionar seu peito, sua cara tremia de medo enquanto tentava ainda assim proteger sua esposa e filho, mas Snape não ligava para nada daquilo, na verdade sentia prazer por vê-lo quase urinando de medo. Uma das coisas que mais amava em sua vida de espião era poder torturar pessoas culpadas, assassinos, estupradores e qualquer ralé nojenta que se colocava a sua frente. Ficara muito tempo longe desse seu lado enquanto trabalhava com Dumbledore na escola, após a queda do Lord, por isso era delicioso sentir o prazer de usar esse seu lado escuro com seres desprezíveis como Valter Dursley.

— Tão valente para espancar uma criança, tirar seu sangue, quebrar seus ossos e agora não consegue nem mesmo olhar para mim direito. - Sussurrou ficando tão próximo do homem que podia sentir seu hálito podre. - Harry só chegará em umas cinco horas, será tempo suficiente para que aprendam uma lição por tudo que ele já passara.

Apontando a varinha para o ar fez o feitiço Abafiato para que ninguém de fora pudesse escultar o que acontecia ali dentro do número quatro dos Alfeneiros. Então voltou a apontar a varinha para Valter e com um sorriso demoníaco em seus lábios recitou o feitiço que fez o homem cair no chão se contraindo.

— Crucio!

— Valter! - Petúnia gritou quando viu o marido se contorcer no chão. Duda ficou parado sem saber o que fazer. - Pare com isso, Snape, pare com isso.

— Acha que seus pedidos farão algum efeito em mim, Petúnia? Nunca fizeram nem mesmo quando era criança e implorava para fazer parte do meu mundo junto com sua irmã.

— Por que está fazendo isso? É vingança por Lilian? Não fomos nós que a matamos.

— Eu sei, sei muito bem quem a matou e sei inclusive que eu mesmo sem saber o ajudei a escolhê-la como alvo, mas minha vingança não é por ela e sim por ele, por Harry.

— Nós não fizemos nada com ele. Solte meu marido! Você vai matá-lo.

— Não, não vou, infelizmente sei que meus atos não seriam bem-vistos se eu matasse vocês. - Disse Snape afastando a varinha e deixando o homem ofegante e quase desmaiado no chão. - Não vou matá-lo, apesar de querer. Mas vou ensiná-los a nunca mais maltratarem Harry. Vocês vão pagar por tudo que fizeram a ele.

Snape se aproximou de Petúnia e pegou o queixo da mulher com a mão levando o rosto até perto do seu que trazia um sorriso perigoso nos lábios.

— Seu esposo aprendeu o que é dor física, agora você Petúnia, saberá o que é a dor emocional de ver a própria tia, sangue de seu sangue ignorar o líquido rubro que seu marido e filhos faziam sair do corpo dele.

Sem dar tempo para a mulher pensar lançou um feitiço não verbal em direção a sua testa. Com concentração adentrou aquela mente com selvageria mexendo em cada lembrança, rasgando as memórias e pensamentos. Snape sempre fora um exímio Legilimente e Oclumente, estudara muito para saber a arte de ler e ocultar a mente e por isso sabia que havia um limite que uma pessoa comum conseguia suportar com alguém invadindo seu inconsciente, havia uma linha limite que poderia atingir sem que a pessoa chegasse à loucura. Ele foi até essa linha e contemplou a visão de Petúnia batendo a cabeça no chão não suportando a dor de sua intromissão. Era bela a arte de conseguir deixar memorias e praticamente programar o cérebro da mulher para que o simples fato de se lembrar dos atos violentos do marido para com o menino a fizesse sentir como se estivesse morrendo.

— Você tem sorte Petúnia. - Disse Snape saindo de sua mente e deixando a mulher encolhida na parede com as mãos na cabeça. - Em outra ocasião eu estaria passando por cima de seu cadáver nesse momento, indo embora sem nem mesmo lhe dar a chance de um enterro, mas você está viva. No entanto, você. - Disse apontando agora para Duda que se encolheu chorando e olhando para os lados tentando pensar em uma saída. - Você vai desejar estar morto quando eu terminar.

Sem nenhum pudor Snape agarrou o pulso do menino e o puxou para o andar de cima, parecia que as tentativas de se soltar de Duda eram nada mais do que uma cosquinha feita em sua mão. O menino gritava em desespero enquanto sentia o aperto violento do homem em seu pulso. Ao chegar ao quarto de Duda, Snape o jogou em cima da cama virando-se para fechar a porta com cuidado.

— Não pode fazer nada comigo, sou apenas uma criança. Eu vou chamar a polícia. - Disse Duda se encolhendo na parede oposta.

— Uma criança. - Disse Snape baixinho divagando. - Uma criança, assim como Harry era todos esses anos que você o fez de saco de pancada.

— Por favor. – Implorou Duda se encolhendo na cama. – Por favor não faça nada comigo.

— Por que acha que devo acatar seu pedido? – Perguntou Snape baixinho se aproximando do menino que a cada passo se encolhia no colchão. – Harry sofreu com socos, chutes, tortura e até mais do que isso. Eu só não sei o que vocês fizeram de tão grave a ele, pois Harry não quer que eu veja e pediu para que eu respeitasse isso, que aguardasse o momento em que ele me contaria. Eu, como pai dele, aceitei aguardar.

— Pai dele?

— É, olha só que engraçado, garoto. Harry não é orfão no fim das contas, ele tem um pai vivo, eu. - A cada palavra Snape se aproximava mais do menino que não tinha mais para onde ir, pois ao tentar fugir encontrou-se  encurralado no canto de duas paredes. - Eu também não esperava por essa surpresa, mas ela veio e acredito que veio no momento certo, imagina o que poderia acontecer com ele se passasse mais um verão ao lado de vocês, ao seu lado, sem que eu tivesse essa conversinha.

— Eu não fiz nada com ele. Eu juro, por favor não me mata. - Chorou Duda escorregando pela parede e se encolhendo no chão. – Não me mata, por favor, eu não quero morrer!

— Pare de chorar seu moleque idiota. - Disse Snape revirando os olhos para o menino. - Eu disse pare de chorar!

Pegando Duda pelos braços Snape bateu suas costas na parede e puxou seus cabelos para que o olhasse. Duda tinha a visão embaçada pelas lágrimas, mas era possível ver o homem insano a sua frente, os cabelos escorridos emoldurando um rosto demoníaco com dentes cerrados e olhos tão negros quanto o inferno.

— Sabe uma ironia da vida, garoto? Eu não vou fazer nada com você por causa dele, porque sei que ele não aceitaria isso. Justamente aquele que tem pesadelos com você me condenaria se eu te matasse ou torturadasse como estou com vontade de fazer nesse momento. - Vociferou segurando o queixo do menino com força sentindo o osso da mandíbula estralar. Os olhos de Duda estavam arregalados, Snape quase encostava seu nariz ao dele. - Não vou castigá-lo, ainda. Mas você fica com um aviso meu, eu não vou invadir a mente do Harry para descobrir o que você fez a ele, vou esperar que ele me conte e quando ele contar se for o que eu estou pensando que é, acredite em mim, desejará que eu te mate rapidamente.

Duda tremeu nas mãos de Snape olhando em seus olhos negros desprovidos de qualquer sentimento. O homem sustentou seu olhar deixando a áurea pesada cair sobre os ombros do menino e então sorriu ao olhar para baixo e ver o molhado se formando na calça do menino.

— Isso, tenha medo, eu quero que toda vez que olhar para o Harry você se lembre que ele tem um pai que fará tudo por ele. Entendeu? – Perguntou apertando mais o rosto do menino. – Perguntei se entendeu e quando eu pergunto algo, quero uma resposta. Entendeu?

— Entendi. – Balbuciou Duda com lágrimas saindo de seus olhos.

— Ótimo, agora desça, tenho uma última coisa a falar com seus pais. – Duda caminhou devagar passando por Snape e abrindo a porta. – E não tente fugir da casa, ela está trancada com magia, só será pior para você.

O menino, ainda tremendo e chorando com a roupa mijada, abriu a porta e saiu descendo devagar e indo direto para os braços de sua mãe que o aguardava no início da escada. Petúnia aparentava desgaste, seus cabelos estavam bagunçados e seu rosto arranhado possivelmente pelas próprias unhas após a invasão que fez na mente da mulher. Snape não desceu a princípio, caminhou até o segundo quarto, o menor dentre os três e abriu a porta encontrando um quartinho pequeno que claramente não foi aberto durante todo o ano. Havia uma cama de solteiro com um colchão gasto, lençóis puídos e uma coberta fina. Um guarda roupas de duas portas pequeno e com a madeira gasta, uma mesinha bamba e uma cadeira velha. Não havia nada ali que mostrasse que aquele quarto era de Harry a não ser um papel desenhado grudado ao lado da cabeceira da cama com a figura de um cachorro preto grande. Por um momento Snape sentiu uma pontada em seu peito ao ver aquele desenho, mas respirou fundo e engoliu o ciúme que subiu pela garganta, afinal Black era o padrinho do garoto.

Alguns minutos depois Snape desceu as escadas devagar vendo no relógio que ainda faltavam algumas horas para que Harry chegasse à estação de Kings Cross. Ao adentrar a sala encontrou a família reunida e abraçada a um canto. Valter estava pálido e tremia involuntariamente devido o cruciatus, Petúnia parecia mais centrada enquanto cuidava do esposo e do filho que recomeçou a chorar ao ver Snape parado a sua frente todo de preto e com um olhar tão negro quanto sua alma.

— Harry deve chegar em algumas horas. Bebam essa poção, vai ajudar a restaurar a energia. – Disse colocando três fraquinhos em cima da mesa de centro.

— Não vamos beber nada que venha de você, seu monstro.

— Não quer beber não beba, é problema de vocês, mas os tremores e as dores não passarão tão cedo e venhamos, Túnia, se eu quisesse matá-los, ou melhor, se eu pudesse matá-los já teria feito antes de abrirem a porta.

Petúnia olhou seriamente para Snape e percebeu que ele falava a verdade, o homem trazia uma energia que era pura maldade, em seus dedos a varinha brincava balançando-se folgadamente, nem seria preciso o esforço de fazer uma poção, com um único feitiço, o mesmo que ceifou a vida de Lilian, ele acabaria com as deles. Em apenas um segundo. Por isso a matriarca se levantou e devagar foi até a mesinha pegando os vidrinhos bebendo o seu e forçando Valter a beber o dele assim como Duda. Em poucos minutos a cor voltava a Valter assim como seus tremores diminuíam.

— Muito bem. Como ia dizendo, Harry chegará em poucas horas, vocês irão buscá-lo, pois infelizmente ele precisa estar durante um ciclo lunar completo ao lado daquele que é o sangue mais próximo de sua mãe. – Disse olhando para Petúnia. – Um empecilho que já estou trabalhando para resolver. Daqui um mês eu virei buscá-lo pessoalmente. Durante esse tempo, se qualquer coisa acontecer com ele eu saberei e vocês se arrependerão amargamente. Entenderam?

— Sim. – Respondeu um traumatizado Duda olhando para baixo.

— É fabuloso quando aprendem rápido. – Comentou Snape sorrindo torto. – Recomponham-se.

O mestre de poções nada mais disse, girou sobre os calcanhares e saiu porta a fora esvoaçando a capa negra até o ponto onde desaparou.

***

Harry estava estranhando muito aquela viagem da estação até a casa dos tios. Ainda que nunca falassem com ele como faziam naquele momento, ao menos agiam normalmente uns com os outros e Tio Valter fazia várias reclamações sobre o trabalho de ter que ir buscá-lo para si mesmo, mas hoje estavam todos em silêncio. Tio Valter apertava o volante com força, tia Petúnia parecia aérea e Duda se encolhia no outro extremo do banco, parecia prestes a abrir a porta do veículo e se jogar para fora para não ficar perto dele. Foi isso que ele quase fez ao pararem na frente da casa, o menino correu para dentro e subiu diretamente para seu quarto trancando a porta.

— O que há com ele? – Perguntou Harry retirando o malão do porta malas.

— Nada. – Respondeu Tio Valter ríspido. – Vá para seu quarto, chamamos na hora do almoço.

O grifinório deu de ombros e carregou o malão e a gaiola de Edwiges até seu quartinho. Ao entrar sentiu a solidão que aquele local lhe dava. A sensação horrenda de prisão que o acompanhava por dias durante o verão. Estava tudo igual deixara ao sair no ano anterior para ir a Toca antes da Copa Mundial de Quadribol. Tudo menos o desenho de Sirius que ao invés de estar na parede, estava em cima de sua cama. Devagar se aproximou e pegou o papel com os dedos vendo ali a caligrafia fina e inclinada tão característica de Snape. O homem esteve ali em seu quarto, possivelmente falou com seus tios e primos, talvez por isso estavam agindo tão estranho, afinal Snape era um comensal da morte, apenas a sua presença era o suficiente para trazer o medo aos olhos do mais forte homem e mulher. Passando o dedo com carinho nas letras miúdas, seguiu lendo o bilhete.

“Me aguarde no prazo de um mês. Eu venho te buscar”

 

Um mês. 30 dias de inferno antes de poder fugir.

— Apenas um mês Edwiges, um mês, nada demais pode acontecer, não é?

A pergunta de Harry não teve resposta, mas assim que virou as costas a coruja olhou para seu dono trazendo a sabedoria de que em um mês muitas coisas poderiam acontecer, principalmente naquele local. Edwiges piou baixinho vendo-o se deitar com a folha de papel segura em sua mão mostrando o cansaço da longa viagem de trem. O menino rapidamente estava ressonando completamente despreocupado enquanto a coruja deixava seus grandes olhos abertos voltados a porta do quarto vendo as sombras mexendo-se por baixo dela.

Em um mês muitas coisas poderiam acontecer.

 


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