Stella escrita por Vic


Capítulo 14
Não me esqueça


Notas iniciais do capítulo

Bom dia! A partir daqui iniciamos a fase mais tensa da história, preparem-se.
Boa leitura!

CAPÍTULO REVISADO



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— Oi. – Ambos disseram assim que ele abriu a porta, as olheiras no rosto do homem eram mais uma evidência de que ele não tinha dormindo na noite anterior.

— Obrigado. – Tratou de agradecer enquanto deixava a mulher entrar em sua casa. – Obrigado por ter vindo... – Fechou a porta. – Ainda mais assim tão em cima da hora, sei que tem a sua própria filha para cuidar e que também tem outras coisas para fazer.

— Não, tudo bem. A Luz está com a minha avó. – Usou o tom de voz mais gentil que tinha. – Não vai atrapalhar, juro.

— Estava pensando se você podia ficar com a Lily por um tempo. – Coçou a nuca sem jeito, não queria ter que ficar pedindo favores para ela. – Quero ver se consigo encontrar a Stella.

— Ela não deu nenhuma notícia? – Indagou em um sussurro, mas pela expressão no rosto dele a resposta era óbvia.

— Não, ainda não. – Suspirou, massageando as têmporas com as pontas dos dedos. – A polícia não vai registrar como pessoa desaparecida porque não se passaram mais de 24h.

— Odeio toda essa burocracia. – Também suspirou. – Ainda mais quando há motivos reais para se preocupar.

— Me disseram que nenhum acidente foi reportado, isso é uma coisa boa. – Ensaiou um sorriso.

— É ótimo. – Assentiu sem parar, não sabia o que deveria dizer.

— Sim, eu acho... – Colocou as mãos nos bolsos, indo até a janela. A mulher acompanhou seus movimentos com os olhos. – Liguei para todos os hospitais próximos daqui, para unidades de atendimento de emergência e...

Seu celular tocou, interrompendo o que estava dizendo.

— Stella? – A expectativa de ouvir a voz de sua esposa era alta, mas desapareceu gradativamente. A voz do outro lado da linha não era a da mulher. – Oi, Danny... – Suspirou. – Como assim ela deixou uma mensagem para você? – Estava incrédulo. – Mas ela está bem, não está? – Andava de um lado para o outro, Lindsay o acompanhou com os olhos. – Tudo bem, onde ela está? – O nervosismo dos dois crescia a cada segundo. – O que quer dizer com ela não disse? O que diabos está acontecendo? Por que ela não me ligou? Sou o marido dela. – A ligação foi encerrada sem que nenhuma de suas perguntas fossem respondidas. Danny sabia tanto quanto ele, ela só havia dito o que ela queria que ele soubesse, nada mais.

— Não acredito nisso. – Ele ainda olhava para o telefone sobre a mesinha. – Ela simplesmente desapareceu. Ela só... – Virou para olhar para a amiga. – Ela simplesmente se levantou e foi embora. – Colocou as mãos dentro dos bolsos, era o que fazia sempre que estava muito nervoso. – E quando ela decide contar para alguém que está bem. Esse alguém é o Danny.

— Talvez seja apenas força do hábito...

— Hábito? Lindsay, ela é uma mulher adulta. – Arqueou a sobrancelha. – Não estamos falando de uma adolescente que está atrasada para o toque de recolher. – Virou, indo até a janela novamente. – Fiquei acordado a noite toda com o telefone em uma mão e a mamadeira da Lily na outra, preocupado com a possibilidade de ela estar numa vala em algum lugar, e ela não teve nem a capacidade de me ligar para avisar que está bem?

— Will, sei que está chateado, mas não tire conclusões precipitadas antes de saber de todos os fatos. – Entendia muito bem o que o amigo estava sentindo, mas era preciso ter um pouco de cautela.

— O fato é que a Stella é a minha esposa e... – Deu alguns passos na intenção de aproximar-se da mulher. – E ela é a mãe da Lily. As prioridades dela deveriam ser as pessoas que estão sob esse teto, mas obviamente esse não é o caso. Ou ela acordou ontem e decidiu que não se importava mais nem comigo e nem com a Lily, ou ela tem um problema muito sério.

— Essa é a questão. Na cabeça da Stella, você é o problema. – O homem a encarou, não tinha pensado por esse lado. – Sente-se. – Pediu e sentou-se também. – Vamos supor que a Stella realmente esteja com depressão pós-parto. – Ele passou as mãos no rosto. – Ela está se recuperando de um parto muito difícil após meses de estresse por estar grávida e ser HIV+, é muita coisa para lidar. São muitas coisas que estão totalmente fora do controle dela. Não acho que ela esteja fugindo de você, mas você representa um período na vida dela que ela simplesmente não consegue encarar agora.

Will arqueou a sobrancelha e deu um longo suspiro, doía em sua alma não conseguir ajudar a mulher que amava.

— Quero ajudá-la, Lindsay. – Confessou em um sussurro cansado. – Eu realmente quero... mas não consigo parar de pensar que isso teve que começar em algum lugar, em algum momento. Quando foi que a Stella ficou tão infeliz? Foi depois que a Lily nasceu ou depois que nos casamos?

— Acho que não podemos dizer exatamente quando. – Ele se levantou e voltou a andar de um lado para o outro. – Há muitos fatores psicológicos em jogo. – Virou para olhar para ele. – A Stella não consegue ser tão racional quanto você espera que ela seja, levando em consideração que esteja com depressão pós-parto. Quanto mais isso dura, mais grave fica e tenho certeza de que esse é o caso dela.

— Isso é ótimo. – Passou as mãos no rosto. – Mas a Stella me abandonou e abandonou a Lily e... é muito difícil não levar para o lado pessoal.

Nem esperou por uma resposta, só se levantou, pegou o sobretudo que estava no sofá e saiu. O bar não estava tão cheio quando ele chegou, haviam apenas uma meia dúzia de caras bebendo cerveja, e ele estava ansioso para se juntar a eles.

— Cara, não acredito que estou recebendo um autógrafo do grande Jordan Donahue. Isso é incrível! É uma ótima foto, é um lindo carro, um lindo carro. – O barman conversava animadamente com o outro homem, dando-lhe alguns tapinhas nas costas. Will se sentou bem ao lado dele. – Ei, cara. Ei, cara. – O homem lhe cutucou. – Deixe-me te apresentar...

— Por favor, posso só ficar na minha? Me dê uma cerveja e uma tequila. – Interrompeu, não estava a fim de conhecer ninguém. O homem entendeu rapidamente o recado e voltou para trás do balcão. – Por causa de mulher também? – Perguntou ao notar que o homem com quem o barman conversava estava bebendo uma cerveja. – Sabe, talvez eu não precise disso. Talvez eu só deva pegar o meu carro e partir para o sul.

— Por que para o sul? – Jake perguntou.

— É Atlanta, tem um autódromo e tenho alguns amigos por lá. – Resumiu. – Só queria andar em uma pista aberta e dar uma relaxada.

— Atlanta tem umas curvas muito complicadas. – Jordan disse.

— Sim, mas consigo fazer isso de olhos fechados. – Bebeu um gole da cerveja direto do gargalo. Jordan riu e negou com a cabeça. – O que foi? – O encarou. – Você não tem ligação com nenhum caso antigo, não é?

— Não, claro que não.

— Então não ficará ofendido se eu beber isso. – Pegou o shot de tequila e bebeu de uma vez. – Tem muitas curvas, mas é uma pista boa. Só precisa manter a velocidade nas curvas.

— Nada disso importa se não manter o controle do acelerador. – Abriu um sorriso amigável, mas cheio de confiança.

— Não sei quem você pensa que é, cara, mas é óbvio que não entende nada sobre corridas. – Abriu um sorriso cheio de si. Os outros dois homens também riram, ele não fazia ideia de com quem estava falando. – Olha, eu já dirigi no circuito de Atlanta, muitas vezes na verdade.

— Eu acredito. – Jordan virou o corpo na direção dele.

— Não, acho que você não entendeu. Não estou falando de um desses lugares onde um bando de caras ricos vão e gastam sabe-se lá Deus quanto para dar algumas voltinhas na pista no fim de semana. – Explicou enquanto bebia mais um pouco da bebida. – Quando digo que dirigi, quero dizer que competi como semiprofissional.

— Isso é incrível. Então quer dizer que você é um piloto de verdade? – Jordan tentava não rir da cara dele.

— Bom, não é minha profissão, mas fui muito bem no meu circuito.

— Talvez possamos correr no circuito de inverno. – Sorriu. – Qual é o seu nome?

— Will. – Disse. – Will Taylor.

— Eu sou o Jordan. – Sorriu. – Ei, quanto eu devo?

— Nada, cara. – O barman sorriu e apertou a mão dele – É uma honra recebê-lo aqui, JD.

— Tenha uma boa noite. – Jordan pegou o sobretudo e foi em direção à saída.

— Você também, cara. – Acenou. – Pé no acelerador e borracha na estrada!

— Não é qualquer um que ganha bebida de graça. – Concluiu. – Quem é esse cara?

— Já competiu como semiprofissional e não sabe quem era?

— É óbvio que eu não sei quem era. – Debruçou-se um pouco sobre o balcão.

Jake pegou a foto autografada e entregou para ele.

— Jordan Donahue? – Segurou a foto, estava boquiaberto com a descoberta. – Eu estava dizendo para Jordan Donahue como correr em Atlanta? – Abaixou a cabeça e levou a mão ao rosto. – Jake, eu sou um idiota.

— Está tudo bem, cara? – Jake sabia que ele tinha dias muito difíceis, mas nunca tinha o visto tão para baixo.

— Não.

Will voltou para casa quase de tarde, tirou o sobretudo e o colocou em cima do sofá. Ainda estava muito cansado, mas estava um pouco mais relaxado.

— Oi. – Lindsay tinha acabado de checar Lily no andar de cima.

— Oi. – Suspirou e olhou para ela. – Escuta, sinto muito por ter saído daquele jeito. – Não conseguia nem a olhar nos olhos, tinha sido um completo idiota saindo daquela forma. – Antes...

— Não precisa pedir desculpas.

Ele abriu um sorriso tímido para ela.

— Como a Lily está? – Olhou para a escada e depois olhou de volta para ela.

— Ela é um anjinho. – Sorriu.

— Sim. – Sorriu, sua menina era realmente muito encantadora. – Ela não te deu trabalho?

— Não, de jeito nenhum.

— Ela não choraminga quando você a pega? – Esse era um dos muitos problemas que Stella tinha com a filha. A menina quase sempre chorava quando a mãe a pegava.

— Não.

Ele abaixou a cabeça.

— Mais um sinal de que a Stella tem mesmo um problema.

Os dois ficaram em silêncio por um tempo, aquele ainda era um assunto muito delicado para eles.

— Acho que você não a encontrou. – Suspirou.

— Na verdade, eu nem tentei. – Abaixou a cabeça, era difícil admitir que tinha usado esse tempo para beber uma ou duas cervejas. – Acabei indo ao bar do Jake e fazendo besteira.

— Isso é bem a sua cara. – Abriu um sorrisinho irônico, ele também sorriu e foi sentar no sofá. – Espero que não se incomode... – Foi até a mesa de centro e pegou os papéis que estavam em cima dela. – Fiz algumas anotações para te ajudar. – Estendeu os papéis para ele, que os pegou. – É sobre depressão pós-parto. – Sentou-se ao lado dele. – Óbvio que não substitui as consultas com um terapeuta, mas é um começo. Também tem um número de um grupo de apoio.

— Obrigado. – Olhou rapidamente para ela e depois tornou a olhar para os papéis em suas mãos. – Se eu tivesse um dólar para cada vez que pesquisei sobre isso só para me convencer de que não havia nada de errado... – Um nó formou-se em sua garganta. – Lindsay, eu amo a Stella e realmente quero ajudá-la, mas... – Disse quase em um sussurro. – Como vou fazer isso se ela nem fala comigo?

Lindsay não sabia o que dizer para aplacar um pouco da angústia que o amigo estava sentindo, então fez a escolha mais sábia, ficou ao seu lado e apenas escutou o que ele tinha para dizer.

— Chamei a Judy, ela é ótima com bebês. – Ainda estava com o telefone na mão quando ele voltou do andar de cima com uma mamadeira nas mãos. – É só uma ajuda, só até a Stella voltar para casa.

— Isso é ótimo. – Will assentiu. – Obrigado por tudo.

— Amigo é para essas coisas. – Sorriu.

— Sim, acho que nunca precisei tanto de ajuda como agora. – Seus olhos pesavam, a noite em claro estava começando a cobrar seu preço. – Estou tentando permanecer calmo e dar à Stella o benefício da dúvida acreditando que ela realmente está doente, mas fica difícil sem ela aqui. – Virou-se e deu alguns passos, ficando parado no espaço entre os sofás. – Às vezes acho que a Stella inventou um mundo só para ela... – Colocou a mamadeira em cima da mesinha de centro. – Marido, bebê, casa nova... e agora ela se cansou e fugiu de tudo isso.

Stella entrou pela porta do bar com um sorriso no rosto, o tempo em Redfield estava lhe fazendo muito bem. Sentia-se mais feliz e um peso havia sido retirado de suas costas.

— Oi. – Cumprimentou Lulu assim que entrou no bar.

— Oi, Georgie. Como vai o mundo das vendas farmacêuticas? – A moça sorriu.

Ela tirou o sobretudo e pendurou na cadeira onde ia sentar.

— Bem, pensei em pegar um refrigerante entre uma reunião e outra. – Sentou.

— Tem certeza de que é só isso mesmo que vai querer? – Lulu saiu de trás do balcão para levar algumas cervejas para a mesa de alguns clientes que a esperavam.

— Está quase pronto. – Um homem surgiu debaixo do balcão e sorriu para Stella. – Você é muito bonita. – Seu sorriso se abriu ainda mais.

— Oi. – Sussurrou e sorriu de volta. – O que houve? – Reparou que o homem segurava a mão esquerda.

— Machuquei a mão aqui embaixo. – Colocou a mão machucada sobre o balcão.

— Não parece ser muito grave. – Segurou a mão dele e analisou o ferimento.

— É. Sou um carpinteiro, então acontecem muitos acidentes comigo. É só enfaixar e voltar ao trabalho. – Ela estava muito focada no machucado para notar que o homem a encarava com um certo brilho nos olhos, o mesmo brilho que o seu marido tinha nos olhos quando a olhava.

— Não quer ir ao médico para ver isso aí? – Lulu perguntou indo ao encontro dos dois. – Pode ter quebrado.

— Eu acho que não. – Ela já tinha visto muitos machucados em sua vida e aquele não apresentava sinais de algum osso quebrado. – Não está inchado e nem nada do tipo, mas é bom fazer um raio x, só para ter certeza.

— Como é que uma mulher tão bonita como você sabe tanto sobre machucados? – Sorriu, era óbvio que estava a paquerando.

— Oh... meu irmão jogava futebol no colégio e ele teve um machucado assim. – Sorriu sem soltar a mão dele.

— Também joguei futebol no colégio. – Sorriu. – A propósito, me chamo Scott Maddox. – Estava ansioso para descobrir o nome daquela bela mulher.

— Georgie Samms. – Sorriu e estendeu a mão livre para ele.

— Georgie. – Apertou a mão dela.

— Coloque um pouco de gelo em cima para desinchar, mas se começar a doer, tome um pouco de paracetamol. Mesmo que inche, a única coisa que o médico vai fazer por você é receitar um anti-inflamatório, mas vai ficar tudo bem. – Soltou as mãos dele, estava receosa com toda aquela aproximação.

— Parece que alguém aqui é ótima na área da saúde. – Lulu entrou na conversa, fazendo o homem rir e Stella abaixar a cabeça.

— Tudo bem? – Perguntou para a amiga quando Scott saiu.

A moça estava com uma expressão muito séria.

— Minha garotinha está espirrando. – Olhava para o celular. – Queria ir lá para saber como ela está... sei que você já fez isso duas vezes essa semana, mas pode olhar o bar para mim por 1h?

— Sem problemas, dê um beijo nela por mim. – Scott sorriu para ela e voltou ao que estava fazendo.

Lulu respirou aliviada.

— Sei que é bobagem, mas toda vez que a minha filha espirra, eu quero ir até lá para dar uma olhadinha. – Pegou a bolsa e o sobretudo que estavam na entrada.

— Ela tem sorte de ter uma mãe tão dedicada. – Disse antes da mulher sair.

— Oh, droga! – Scott gritou e saiu debaixo do balcão.

— Ei, o que... – Segurou uma risada.

— Peguei o martelo, mas como meu polegar está doendo, não consegui segurar direito e já sabe o que aconteceu...

— Oh não, sinto muito. – Gargalhou. – Você é mesmo carpinteiro?

— Sou.

— Então como é que se machuca tanto assim? – Riu.

— Deve ser porque é um trabalho para dois caras. – Arqueou a sobrancelha.

— Estou livre. – Também arqueou a sobrancelha.

— Você? – Apontou para ela.

— Sim, posso te dar as ferramentas, a não ser que você seja um daqueles homens das cavernas que acham que mulheres não conseguem diferenciar uma ferramenta da outra e que deveriam ficar em casa descalças e grávidas o tempo todo. Você é esse tipo de cara? – O encarou franzindo a testa e segurando a pistola de pregos que estava no balcão.

— Jamais. – Ergueu os braços e sorriu. – Abaixe a pistola de pregos, certo?

— Me desculpa. – Riu e colocou a pistola de volta no balcão.

Os dois resolveram que trabalhariam juntos, ela entregava as ferramentas para ele e ele faria os reparos.

— Não quero ser o porco machista que você disse, mas você conhece as ferramentas melhor do que a maioria das mulheres. – Sorriu. – Onde foi que aprendeu tanto?

— Tenho muita experiência com... algum tempo atrás namorei um cara que consertava motocicletas. É incrível o quanto você aprende sem nem perceber. – Comprimiu os lábios. – As coisas mudam tanto, eu era tão boa com bebês naquela época... – O final da frase saiu como um resmungo, estava falando consigo mesma.

— Mas, por outro lado, você pode se esforçar muito para aprender uma coisa e nunca conseguir. É como tentar ser bom em uma coisa, mas isso não estar no seu DNA. – A expressão facial dela mudou, estava pensando em sua filha. – Tentei aprender italiano uma vez... – O barulho da chave caindo o fez se levantar imediatamente. – Opa!

— Pelo menos dessa vez você não se machucou. – Riu do jeito desastrado dele.

— Estou bem. – Riu também.

— O que você realmente faz?

— Já disse, sou um carpinteiro. – Ambos ainda estavam rindo.

— Sei que disse, mas parece que você é apenas mais um daqueles caras que faz reparos para a pobre esposa que não entende de nada disso.

Scott abaixou a cabeça e comprimiu os lábios.

— Minha pobre esposa me abandonou dois anos atrás...

A expressão dela se fechou, parecia até que a vida estava lhe pregando uma peça.

— Ei... desculpa, acabamos de nos conhecer e já estou me metendo na sua vida...

— Não tinha como você saber disso. – Voltou a prestar atenção no trabalho. – E além do mais... essas feridas já estão cicatrizadas.

— E conseguiu perdoar a sua esposa por ter te abandonado?

— Não cheguei tão longe, meu ego não é tão evoluído assim. – Riu. – Mas foi melhor assim, não devemos ficar com alguém que não quer estar conosco. – Ela abaixou a cabeça. – Isso é mais fácil quando não se tem filhos, porque seria uma tragédia. – A imagem de Lily passou por sua cabeça mais uma vez. – Está tudo bem?

— Sim, tudo. – Tentou sorrir. – Só me sinto meio mal por ter mencionado algo que é tão doloroso para você.

— Se sentiria melhor se eu empatasse o placar fazendo algumas perguntas pessoais?

— Claro, desde que eu tenha o direito de não responder. – Acomodou-se no banco.

— Justo. – Riu. – De onde você é?

— Grécia.

— E o que te trouxe para cá?

— Trabalho. – Estava tão acostumada a mentir que havia se tornado fácil dizer aquilo. – Vendo produtos farmacêuticos.

— Você disse alguma coisa sobre cuidar de bebês. Você tem filhos?

— Não, não tenho. – Mentir sobre isso causava uma sensação estranha em seu interior. – Sem crianças.

— Tem um anel de diamante enorme na sua mão direita. – Apontou para o anel. – É casada ou vai casar?

— É uma herança de família. – Tocou no anel em seu dedo e lembrou-se do dia do seu casamento.

A conversa acabou em pouco tempo, ele fez mais algumas perguntas e Stella respondeu apenas aquelas que sentiu-se mais à vontade. Voltaram aos reparos logo em seguida.

— Isso ficou realmente incrível. – Saiu de trás do balcão, estava analisando o trabalho de Scott.

— Treinei um pouco no bar da minha irmã em Buffalo. – Disse. – Desculpe, já falei demais sobre isso...

— Não, tudo bem. – Sorriu, estava feliz por não ter mais que falar sobre si mesma. – Gostei de ouvir.

— Eu também, mas agora é a sua vez. — Ela bebeu um pouco da bebida que ele fez para ela. – Gosta do seu trabalho?

Stella não gostava de lembrar do laboratório e muito menos falar sobre ele.

— É um bom salário.

— Então não é apaixonada pelo que faz?

— É difícil se apaixonar por venda de produtos farmacêuticos.

— Quer ter uma família? – Ela abaixou a cabeça, sua mente ainda estava em seu marido e em sua filha. – Me desculpa. Acho que fiz a pergunta errada. – Disse ao perceber que a mulher tinha mesmo ficado sem jeito. – Não sou bom nessas coisas, assim que abro a boca é como se estivesse pisando em um campo minado.

— Bom, não precisa se esforçar tanto. Você é melhor com as ferramentas. – Soltou uma risada irônica. – Até quando elas caem na sua cabeça.

— Sim. – Riu também. – Então, Georgie Samms da Grécia, gostaria de fazer uma viagem comigo? – Ela se surpreendeu com a coragem do homem. – Minha irmã me ofereceu esses ingressos para a ópera e são os melhores assentos, mas se não quiser é só dizer: não sou muito fã de ópera, então não irei dirigir uma hora e meia para ver, mas se tiver interessada...

— É uma ótima oferta, mas... – Tentou encontrar as palavras certas.

— Tudo bem, é uma ideia maluca fazer uma viagem no primeiro encontro, mas talvez possamos fazer algo aqui na cidade mesmo, talvez um jantar, ou podemos ir dançar.

— Me desculpa. – Fez uma pausa. – Me diverti muito conversando com você e parece que você é um cara legal.

— Mas parece que você quer estar em qualquer outro lugar menos aqui. – Ela abaixou a cabeça e tirou o sorriso do rosto. – O que está acontecendo?

— Acho que é hora de ir embora. – Levantou e pegou o sobretudo da cadeira, estava pronta para ir embora quando Scott a interrompeu.

— Sei que ficou surpresa por um simples carpinteiro te convidar para dançar. – Deu alguns passos na direção dela. – Passei dos limites, sinto muito.

— Não, não foi nada que você disse. A culpa é minha, não fui totalmente honesta com você sobre a minha situação. – Comprimiu os lábios. – Tenho estado emocionalmente abalada. Tem alguém em casa que me ama muito... tivemos algumas mudanças em nossas vidas e não estou lidando muito bem com tudo isso. – Abaixou o olhar, evitando olhá-lo. – Senti que estava fazendo tudo errado e então de repente vi uma chance de cair fora.

— Seu trabalho te trouxe até aqui...

— Sim, pensei em dar um tempo e respirar. – Os dois riram. – Isso faz algum sentido para você?

— Claro, sinto muito se alguém que você ama te machucou. – Ele sabia bem como era sentir-se daquele jeito. – Sei como é isso, mas espero que falar sobre isso não tenha te deixado triste.

— Não, tudo bem. – Sorriu. – Adorei conversar com você.

— Eu também. – Coçou a nuca. – Só te convidei para sair porque achei que seria divertido, não ia fazer nada demais, nem ia me ajoelhar, colocar um anel no seu dedo e pedir para que tivesse filhos comigo.

— Tudo bem, às vezes penso demais.

— Sabe que é isso que te torna humana. – Bateu um punho no próprio peito. – Não saia da minha vida.

A porta abriu e Lulu entrou com a filha nos braços, os dois estavam olhando para elas.

— Estou de volta. – A moça tinha um sorriso enorme no rosto. – Com um pacotinho, obrigada por cuidar do bar.

— Sem problemas, o tempo passou voando. – Sorriu para ela e olhou para Stella.

— Se importa de segurá-la enquanto eu pego o carrinho? – Perguntou para Stella. – Não se preocupe, ela está alimentada e já foi trocada. – Explicou ao ver a expressão no rosto dela. – É quase 100% de certeza de que ela não vai te sujar.

— Não, sou péssima nisso.

— Você já segurou um bebê antes?

— Claro. – Abaixou a cabeça, não tinha como fugir disso.

— Então você sabe que eles são muito resistentes. – Aquela era exatamente a mesma frase que ela havia dito para Jas no dia que Lily nasceu. – A menos que não queira, posso...

— Não, não, não. – Colocou o sobretudo de volta na cadeira e estendeu os braços. – Deixe-me segurá-la. – A menina choramingou ao ser passada para os braços de uma estranha. – Oi, oi. – A criança resmungava enquanto Stella lhe dava alguns tapinhas nas costas. – Não tenho muita experiência com bebês. – Balançava a menina. – Acho que eles não gostam muito de mim.

— Está indo muito bem. – Sorriu para ela.

— Ela não está chorando, acho que é uma vitória. – Segurou a mãozinha da menina.

— É só balançar um pouquinho. – Scott aconselhou.

A menina chorou um pouco, mas se calou ao sentir o balanço.

— Sim, sim. – Olhava para o rosto da menina, estava começando a ficar ansiosa, aquilo estava durando tempo demais. — Ela é muito fofa. – Sorriu. – Qual é o nome dela?

— Lindsay. – Todas aquelas coincidências faziam parecer que de alguma forma sua família estava lhe dizendo um sonoro "não me esqueça". — Obrigada por segurá-la. – Lulu se aproximou e pegou a menina de volta.

— De nada. – Respirou aliviada.

— Um dia você será uma ótima mãe. – Beijou o rosto da filha.

Aquela tinha sido a deixa para Stella pegar suas coisas e ir embora. Scott e Lulu ficaram sem entender porque ela tinha saído com tanta pressa e sem se despedir.

— Oi, é do quarto 125, pode somar o que devo e encerrar a minha estadia? – Stella arrumava as roupas dentro de uma mala, talvez fosse hora de voltar para casa. – Pensando bem, mudei de ideia. – Voltou atrás, seria bom passar mais alguns dias longe de tudo e de todos. – Obrigada. – Encerrou a ligação.

— Parece que você ainda tem todos os dedos. – Disse ao entrar no bar e dar de cara com Scott.

— Parece que tenho nove e meio. – Mostrou as mãos e ela riu. – Ficamos preocupados com você. – Indicou Lulu com um movimento de cabeça.

— Eu sei, desculpa. – Sorriu. – Saí muito rápido.

— O que foi que aconteceu?

— Eu tinha uma reunião online.

Ele sorriu.

— E chegou a tempo?

— Sim, cheguei. – Assentiu. – Queria saber se aquele convite para sair ainda está de pé, porque eu aceito. – Aquele podia ser o maior erro da sua vida, mas naquele momento parecia certo. Georgie Samms merecia viver uma noite como aquela, Stella podia ficar em segundo plano por mais algum tempo.


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Notas finais do capítulo

É, péssima escolha...
Até o próximo!



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