Roderick e seus doze irmãos escrita por Wi Fi


Capítulo 7
Que um raio me acerte


Notas iniciais do capítulo

Oi gente! Estou aparecendo sem ser terça (ou quinta) pq esta semana eu vou estar bastante ocupada, e não gosto de ficar agendando postagens pq me parece mto mecânico. Enfim, aqui está um capítulo que eu considero ser bem softzinho, e a primeira aparição oficial da Griselda, em mais um flashback. Espero que gostem!



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Griselda era um furacão andando de um lado pelo outro pelo jardim do palacete onde seu noivo estava hospedado. Roderick era o único da família que aceitava pôr os pés naquela casa. Estava sentado em um banco de pedra, bem agasalhado contra a fria noite de outono que estava por vir, cabeça apoiada nas mãos, cabelo loiro balançando com a brisa.

O casamento dela seria em dois meses, para o desgosto de todos os Donne.

Lorde Ewan havia mandado Griselda para viajar pelo país com algumas parentes distantes enquanto ele procurava, entre seus vassalos, um pretendente digno para sua filha mais nova.

O rei Alfred, de Breator, sabendo do assunto, foi pessoalmente até Gayern, e mais do que explicitamente indicou que gostaria que Griselda se casasse com seu afilhado, Jamie Sullivan, cuja mãe era sayena, de modo que o rapaz tinha um pouco de sangue dos dois lados. Lorde Ewan preferiria morrer que ver sua filha casada com alguém da corte breatoriana.

Entretanto, os Sullivan tinham poder tanto em Breator quanto em Saye, donos de terras importantes na fronteira entre os dois reinos, de modo que um ato de rebeldia por parte deles seria extremamente perigoso para o condado. Então, o noivado foi arranjado, e para piorar a ofensa, assim que Griselda conheceu Jamie, ficou completamente apaixonada por ele e sua elegante família.

Desde então, todos os Donne estavam profundamente infelizes, mas nada convenceria Griselda a mudar de ideia sobre seu amado. A teimosia dos vinte anos e a cegueira das paixões jovens dificilmente são contrariadas.

— Roderick, tens que me levar ao altar. O pai diz que não vai à cerimónia, e nem posso pensar nos bastardos…  - reclamou Griselda – És o único homem que sobra. Eu não vou percorrer aquele corredor sozinha, ou com um estranho.

— Por que vocês não podem se casar em Gayern? Por que tem de ser em Breator? – Roderick resmungou – Se casassem aqui, o pai iria.

— Eu vou mudar-me para lá, Roderick. Precisamos oficializar nossa união na terra onde iremos morar, e onde iremos criar nossos filhos.

— Mas isto é mesmo necessário? Não podes fazer cara de fofa e insistir?

— Rod! Por que é que tu e o pai decidiram tornar minha vida tão difícil? – perguntou Griselda, cruzando os braços.

Seu irmão suspirou. Ele não sabia se conseguiria se impedir de sair aos socos com seu futuro cunhado naquele jantar, muito menos se tivesse que levar Griselda até ele no altar de uma igreja breatoriana.

— Tente ver isto pelo nosso lado, Gris – insistiu Roderick.

— Qual lado? O lado em que vocês julgam qualquer um com sangue breatoriano? Ou aquele em que vocês não confiam em mim para tomar decisões sobre minha própria vida?

— A decisão não foi tua, e tu mal o conheces.

— Conheço-o melhor do que tu.

— Está bem, já vejo que não vale a pena discutir. Não vais mudar de ideia e já é tarde demais para isto de qualquer forma – Roderick respondeu – Mas se importa tanto para ti, sim, eu levo-te ao altar.

Griselda abriu um enorme sorriso e puxou Roderick de seu banco para um abraço.

— Obrigada, Rod! Amo-te tanto, és meu irmão preferido, sabias? – exclamou ela.

— Não é como se tivesses muitas opções…

— Sabes o que quis dizer. Agora vamos, o jantar deve estar a ser servido. Prometa-me que vais te portar bem com o Jamie.

— Eu prometo – Roderick fez um sinal em cima do peito, solenemente – E se eu estiver a mentir, que um raio me acerte.

De braços dados, Roderick e Griselda marcharam para o interior do palacete. O sol já se punha, e as sombras lançadas pelas estátuas decorativas do jardim davam a Roderick uma sensação de que estava a ser seguido.

Griselda, assim como Fionna, tinha herdado os cabelos ruivos de Lorde Ewan. Entretanto, fora o único dos filhos de Elinor a ser digno de herdar seus olhos verdes. Naquela noite, vestia um vestido azul-claro, incomum na moda sayena, que lhe conferia um ar de inocência. Era apenas dois anos mais nova que Roderick.

O interior do palacete era bem decorado com vasos e pinturas coloridas de pintores de todas as partes do mundo, e mais alguns da família Sullivan. O longo corredor que levava ao salão de jantar era frio e mal iluminado, mas lá foram recebidos prontamente por Jamie, bem-vestido com gibão vermelho e dourado.

— Chegaram bem a tempo! – disse ele, abrindo os braços – Vamos, estou esfomeado. E tenho uma surpresa para ti, minha querida.

Griselda soltou-se do braço de Roderick e tomou o de seu noivo. Adentrando o salão, descobriram uma mulher com uma espécie de alaúde, em um canto do cômodo, sentada em cima de um tapete. A mulher tinha pele escura, cabelos pretos ondulados e grandes olhos claros. Com certeza não era de Saye.

— Oh, que belíssimo! – disse Griselda, batendo palmas – Jantar e música!

Com um gesto de cabeça de Jamie, a estranha começou a tocar seu instrumento. O som era lindo, como Roderick nunca tinha ouvido antes, agudo e delicado. Logo a mulher também começou a cantar em um idioma completamente desconhecido.

— Em Breator temos muitas destas atrações exóticas – Jamie ressaltou com um sorriso – Vais gostar muito.

— Mal posso esperar! – suspirou a noiva, não desgrudando os olhos da musicista, enquanto empregados serviam a sopa do jantar.

Roderick permaneceu quieto. Prometera ser bonzinho, e aquela música era muito bonita, mesmo que não entendesse nada do que a mulher estrangeira cantasse. E talvez Jamie estivesse mesmo fazendo um gesto carinhoso por Griselda.

A comida estava boa, e o jantar passou sem maiores incidentes. Jamie fazia seus comentários pró-Breator, e cada vez que isso acontecia Roderick tomava um longo gole de seu copo de vinho, mas era perdoável.

Depois do jantar, Roderick e Griselda seguiram para o castelo de Gayern. Griselda era toda sorrisos, e tagarelou no caminho de volta também.

— Meu vestido está tão lindo! Vou ser a noiva mais bonita que já viste, Rod, pode apostar! – ela disse, enquanto subiam as escadas para seus respetivos quartos – Ainda não posso mostrar a ninguém, se não dá azar, mas ele é azul como este, mas muitíssimo longo, com as mangas enormes…

Ela prosseguiu contando os mínimos detalhes como seria seu vestido, detalhes que Roderick provavelmente nunca teria notado se estivesse a vê-lo pessoalmente, mas ele não saberia dizer o que isso implicava para a sorte ou azar.

— Acho que devias usar o diadema da mãe – sugeriu Roderick – Aquele dourado.

Griselda, pega de surpresa, parou onde estava e encarou o irmão.

— Achei que o pai o tivesse dado para Blair – balbuciou.

— E deu, mas Blair deu-o a mim antes de partir. Não iria usá-lo no convento. Tenho-o guardado com as minhas coisas.

Os olhos de Griselda pareceram ficar ainda maiores que o normal e ela deu em Roderick mais um abraço apertado.

— Obrigada, Roderick. Muito obrigada – ela murmurou – Eu queria tanto que ela estivesse… que nós tivéssemos…

— Eu sei… eu sei.

Ela tinha apenas quatro anos quando Elinor morreu. Havia um buraco onde as lembranças sobre a mãe deveriam estar, que não poderia ser tapado com diademas, jóias, roupas ou retratos.

Quando Griselda o soltou, deu um sorriso para o irmão, e seguiram para o quarto dele. Roderick tirou de seu baú a pequena caixa de madeira polida onde o diadema estava guardado. Griselda suspirou ao ver o acessório, e quando Roderick o encaixou em sua cabeça, por cima de seus cachos ruivos, ela derramou mais algumas lágrimas.

Blair tinha deixado subentendido que Roderick deveria dar o diadema a sua futura esposa, mas a cada ano que se passava, mais distante essa ideia lhe parecia. E aquele presente significaria muito mais para Griselda.

— Estás muito linda – sorriu o Roderick, guiando a irmã para um espelho – Jamie é um homem de muita sorte.

Ela assentiu, e deu uma risadinha.

— Acho que ele é mesmo.

Era hora de Roderick verificar se o seu plano havia funcionado. Talvez ele estivesse cruzando uma linha, talvez estivesse a exagerar, mas ele não poderia deixar Griselda, com seu coração enorme, simplesmente desaparecer com um homem estranho e pouco confiável. Ele precisava garantir que Jamie não a machucaria.

Havia pagado um dos empregados do palacete, que em tempos tinha sido empregado dos Donne, para espionar seu futuro cunhado pelos próximos dias que estivesse ali. Roderick encontrou-se com seu informante logo fora das muralhas do castelo.

— Eu o vi indo com a musicista estrangeira até uma estalagem no centro do vilarejo – informou o homem, aceitando o saco de moedas que Roderick lhe entregou – Não sei o que estavam a fazer, mas achei que era estranho.

— Merda – resmungou Roderick – Obrigada.

Ele montou em seu cavalo e seguiu para o local apontado pelo empregado. No vilarejo não havia muitos lugares onde um homem daquela posição social conseguiria se esconder. A estalagem era mal iluminada e de aparência descuidada, com alguns clientes saindo e entrando da taberna no primeiro andar.

Roderick conhecia bem o lugar, devido às suas próprias noites boêmias – talvez mais do que ele gostaria de admitir. Entrou, deu boa noite ao estalajadeiro, que já o conhecia e encontrou seu amigo Logan Clery em uma das mesas.

— Ei, Donne! O que fazes aqui? – perguntou ele, erguendo a sua enorme caneca de cerveja como um aceno de boas-vindas.

— Shh, fale mais baixo – Roderick respondeu, se aproximando e se sentando – Há uma pessoa nesta estalagem que não precisa saber da minha presença.

— Do que estás a falar, homem? Partiste o coração de alguma miúda? Cala-te e bebe!

— Não é nada disto. É o noivo de minha irmã.

Ele rapidamente explicou a situação. Logan, já influenciado pela bebida, bateu as mãos na mesa, enfurecido.

— Mas que vergonha! A Griselda não merece um merdolas deste. Vamos lá acima e castramos o bastardo!

— Não, seu maluco, não podemos fazer isto, o casamento já está marcado e a reputação da família está em jogo! – Roderick avisou, segurando Logan no banco antes que pudesse fazer algo estúpido – Mas podemos dar-lhe um susto, e se o pegarmos com a mão na massa, chantageá-lo. Venha, vamos ao trabalho, antes que ele escape.

Os dois subiram as escadas discretamente. Não pensaram em perguntar ao taberneiro onde Jamie estava, Roderick por causa do nervosismo que antecedia o confronto, e Logan pelo álcool. Entretanto, não precisaram investigar muito.

Andando sorrateiramente pelo corredor, ouviram de súbito um grito masculino de dor. Roderick logo sacou a adaga que tinha em seu cinto, e Logan ergueu os punhos, desarmado e cambaleante, pronto para uma luta.

Da mesma porta, ouviram agora uma voz masculina abafada, a falar em breatoriano.

Sua vadia! Vais pagar, tu não tens ninguém além de mim aqui. Vou mandar-te de volta ao teu país numa jangada!

Era suficiente. Roderick e Logan se jogaram contra a porta, que se abriu de supetão.

Dentro do quarto, Jamie estava de pé em frente à cama, com a mão cobrindo a boca e sangue escorrendo pelo queixo. Ele estava com a camisa aberta, as braguilhas parcialmente desamarradas. Quando Roderick e Logan entraram, ele deu um pulo, e voltou seu olhar furioso para os dois.

Na cama, estava a musicista estrangeira, com um pouco de sangue na boca também, mas completamente vestida.

— Roderick – gritou Jamie – Mas que merda é esta?

O rapaz não hesitou. Movido por sua própria raiva, ele voou para cima de Jamie, que não tinha nem de longe um preparo físico suficiente para aguentar uma briga de verdade.

Agarrou o cunhado pelo colarinho e o empurrou contra a parede, antebraço pressionado contra o pescoço dele. Jamie esperneou, e tentou chutar Roderick, mas ele usou seu braço livre para pegar sua adaga e apertá-la contra a barriga dele. Logan se ocupou de cuidar da moça estrangeira.

— Escuta aqui, bostinha sulista. Tu podes ter prendido minha família neste casamento maldito, mas Griselda é minha irmã – Roderick rosnou – Eu não vou te deixar machucá-la. Se eu souber que tu a traíste, ou que tu a machucaste, estás morto, ouviste-me?

— Ai, é? Tu vais fazer tudo isto a centenas de milhas de distância? És um bruxo por acaso?

Jamie cuspiu-lhe na cara. Roderick, sem pestanejar, abandonou momentaneamente a adaga e deu um soco no rosto do outro homem, fazendo Jamie arquejar de dor.

— Eu tenho meus olhos em ti. E tenho certeza de que se Griselda, meu pai ou o rei descobrissem que estavas na cama a tentar desnudar uma pobre rapariga, estrangeira e plebeia este noivado estaria acabado, junto do dote da minha irmã – respondeu Roderick – E tenho certeza de que teu rei e a tua família não gostariam nada de ter o vosso nobre nome manchado por uma coisa destas. Os Sullivan seriam mais uma família de jovens instáveis que podem por em causa a honra da coroa. Agora cala-te, e vai-te embora, idiota, antes que eu decida deixar de ser bonzinho contigo.

Tirou o braço do pescoço de Jamie, mas ainda o segurando pela camisa, empurrou-o para fora do quarto, em seguida trancando a porta.

Logan estava sentado na beirada da cama, e dera seu casaco à moça estrangeira. Ela parecia assustada, com as mãos entrelaçadas, e olhando de um homem para o outro.

— Tentei falar com ela – Logan explicou – Ela não fala sayeno.

— O teu sayeno também não é dos melhores – resmungou Roderick.

Ele se ajoelhou ao lado da cama, com as mãos abertas em um gesto de paz, e passou a falar o idioma de Breator.

Percebe o que estou a falar?— perguntou.

Sim… pouco, senhor— respondeu ela, com voz trêmula.

Como se chama?

— Farrah.

— Farrah, aquele homem machucou você?

A musicista balançou a cabeça.

Eu mordi— respondeu Farrah – Não me tocou.

Tem família, Farrah?

Não, senhor. Fugi de minha terra.

Logan e Roderick se entreolharam. O que haveriam de fazer? Provavelmente havia sido trazida para Breator como serva, que era apenas outra palavra para escrava naqueles tempos.

Os Sullivan são seus mestres?

Sim, senhor.

Eles lhe tratam mal?

Farrah desviou o olhar, com um misto de vergonha e tristeza.

Sim, senhor. 

Não precisa mais lidar com eles, Farrah. Se quiser, posso fazer de si a dama de companhia de minha irmã Griselda. Assim trabalharás para os Donne, pagaremos bem e viverá uma vida mais confortável. O que acha?

A estrangeira balançou a cabeça, pensativa.

Não confio no senhor.

Eu odeio os Sullivan, Farrah. A única coisa que peço é que cuide da minha irmã, e se Jamie tentar machucar ela, ou você, venha até mim ou outra pessoa da minha família, e acabaremos com o assunto. Temos um trato?

Roderick ofereceu-lhe a mão aberta. Farrah pareceu um pouco hesitante, mas depois de alguns segundos, aceitou o gesto.

Vem, vamos te levar ao castelo.

Ao sair da taberna com a moça, um raio cruzou os céus nublados, e um retumbante trovão fez-se ouvir.

“E se eu estiver a mentir, que um raio me acerte.”

Roderick não era supersticioso, mas acelerou o passo, ansioso por voltar para casa.


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Notas finais do capítulo

O que acham de postar capítulos duas vezes por semana? Eu estou achando que um por semana é pouco considerando que são 17 no total, e tenho medo de vocês desanimarem por ser mto longo, quero a opinião de vocês.
Essa foi a primeira vez que tivemos personagens falando sayeno e breatoriano em momentos diferentes da história, eu tentei deixar claro quando estavam falando breatoriano, tanto no texto quanto usando itálico, espero que tenha sido eficiente.
Além disso, o que acharam do Logan Clery? Eu particularmente adoro ele, e espero que vocês também gostem pq ele vai aparecer mais vezes nos próximos capítulos. Eu até pensei em fazer um capítulo extra curtinho só para contar como ele e o Roderick se conheceram, mas só vou postar esse no final de todos os 17 capítulos "oficiais".
Como disse, estou com uma semana meio atrapalhada, mas vou tentar responder os comentários que faltam o mais rápido possível!
Beijinhos e até o próximo



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