Roderick e seus doze irmãos escrita por Wi Fi


Capítulo 14
Dores e tudo


Notas iniciais do capítulo

Oi gente!

Mais um capítulo com bastante diálogos! Eu adoro escrever diálogos entre personagens, acho que é quando eu mais me sinto confortável e à vontade para mostrar as relações entre eles, e também me permite humanizar um pouco cada um. Espero que tenha conseguido transmitir essa sensação pra vocês também.



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Roderick acordou com uma dor pungente nas costas. Francisca chegaria em poucos dias. Não podia estar em más condições para recebê-la. Decidiu que era hora de visitar Alister.

O apotecário da cidadela era um pequeno prédio escondido entre todos os outros, facilmente ignorado, identificado apenas pela guirlanda na porta. Roderick bateu três vezes na porta, e lá de dentro ouviu o som de vidros se quebrando.

— Está tudo bem aí? – Roderick perguntou.

Só um pouco!— Alister respondeu.

Mais alguns barulhos de móveis sendo arrastados, e a porta se abriu, com um Alister muito descabelado por trás dela.

— Ei, Rod! – ele cumprimentou – Entre, entre.

— Oi, Roderick! – a voz de Kenna acrescentou.

O interior da loja era escuro. Kenna estava sentada numa cadeira, com papéis ocupando parte da mesa de trabalho do irmão, e uma vela para que pudesse ler.  Todas as prateleiras e bancadas que se espalhavam pelo pequeno cômodo estavam cobertas por potes com plantas, líquidos estranhos e outras bugigangas.

— O que estás a fazer aqui, Ken? – perguntou Roderick.

— Comprando coisas para o teu casamento – ela explicou, mostrando a folha onde tinha uma lista – Ingredientes para o banquete, flores para boa sorte…

— E nós já não temos tudo isso?

— Nem tudo dá para plantar em casa – Kenna respondeu, distraída – E é mais barato comprar do nosso irmão. Se bem que, se ele fosse um irmão de verdade, nos dava de graça.

— É preciso saber gerenciar os negócios, irmãzinha – Alister respondeu, voltando para trás do balcão.

Irmãzinha— bufou ela – Eu sou mais velha. E mais alta.

Roderick se pôs atrás dela e inspecionou suas listas. Sabia que Fionna a tinha encarregado de cuidar dos preparativos e dos convidados – afinal, se a casa dos bastardos tinha se mantido em pé tinha sido porque Kenna era feroz nas contabilidades.

— Olha, ainda bem que apareceste por aqui. Queria te perguntar uma coisa, Rod – ela disse - A Marion… a Marion vai estar em Gayern na altura do casamento?

— Hm, acho que sim. Não ouvimos dizer nada sobre ela em Breator nesta altura - respondeu o lorde – Por quê?

— Oh, por nada. Eu só gostaria de vê-la por lá…

Kenna não desviara os olhos de suas listas intermináveis, mas Roderick notara que ela havia parado de ler e tomar notas durante a conversa. Ele e Alister trocaram um olhar, e o rapaz assentiu. Era tudo que Roderick tinha que saber. Kenna e Marion… ele nunca imaginaria.

— Então, Roderick, o que precisas de mim? – perguntou Alister.

— Algo que me alivie as dores.

— As tuas costas andam a atacar de novo?

— É, a mesma maldita dor.

Alister lhe ofereceu um sorrisinho de compaixão, e voltou a percorrer suas paredes de tralhas com os dedos. Logo encontrou um vidro que lhe chamou a atenção, contendo uma pasta amarelada.

— Aqui tens, pasta de arnica. Passe na região onde te dói, ao acordar e antes de dormir – Alister explicou – Se acabar, é só encontrar mais flores de arnica e esmagar com um unguento comum.

— Não vou ter larvas a subir nas minhas costas, pois não? – Roderick perguntou, de sobrancelha erguida.

— Não se fores limpo.

Ele assentiu, e botou duas moedas de ouro no balcão. Alister não fez pretensão de recusar o pagamento, e prontamente o guardou em sua bolsa.

— Queres algo também para acalmar os nervos? – perguntou o bastardo, apontando para outro pote atrás de si – As noivas compram bastante aqueles.

— Minha noiva ainda não está aqui.

— Eu sei, estava a oferecer para ti.

— Se o mar colaborar, ela estará aqui em seis dias – Kenna comentou, distraidamente – Já mandei os criados limparem um dos quartos desocupados para ela.

— Estás mesmo a gostar de ter poder sobre o castelo, não estás? – Roderick brincou.

— Devias estar a agradecer-me pela minha mania de arrumação. Vais ter um casamento de rei.

— Espero que não seja tão extravagante assim, sabes que não devemos ser imodestos…

— Eu sei, eu sei, é modo de dizer – Kenna respondeu – Seu chato. O Sul tirou-te todo o senso de humor?

—  Talvez esteja mesmo ansioso para o casamento – Roderick admitiu.

— Posso fazer dois calmantes pelo preço de um só, um para ti e outro para a dairense! – Alister disse, já com os dois frascos na mão.

— Não é preciso, Alister. Mas já agora, me dê mais ervas de fumo. E obrigado, Kenna.

Alister sumiu por mais alguns segundos, buscando as plantas no jardim. Um novo cliente entrou, e cumprimentou o trio com muitas cortesias. Kenna cuidadosamente guardou e escondeu seus planos. Depois do homem ter sido atendido, ela reiniciou sua conversa. Alister continuou procurando algo nas prateleiras que ficavam por baixo de seu balcão.

— Olha, devo dizer que fiquei surpresa quando a Fionna disse que ias te casar com uma princesa – Kenna disse - Quer dizer, sabia que foste muito galante na tua época, mas achei que tinham se passado os tempos em que encantavas moças estrangeiras.

Minha época. Como se tivesse sido há muito tempo.

— E foi.

— Bom, de certeza vocês já ficaram a saber do motivo do meu casamento com Francisca – Roderick respondeu, se referindo à mentira que tinham feito circular para esconder a rebelião – Eu ouso dizer que ainda tenho meus charmes.

Alister ergueu a cabeça para cima do balcão, reaparecendo.

— Por falar nisto, tenho aqui uns afrodisíacos. Queres?

— Alister, estás a tentar me extorquir de alguma forma?

— De jeito nenhum. Só estou preocupado com o futuro de Saye, obviamente – ele brincou – Agora que sou um Donne, quero que tenhamos muitos descendentes!

— Claro, claro, e vocês dois estão a contribuir bem para isto. Tu és basicamente um ermitão, e a Kenna não gosta de homens.

— Não é verdade, eu gosto de homens. Vocês dois são grande companhia – interferiu Kenna.

— Kenna gosta de homens, mas ela gosta mais das suas irmãs. E primas. E esposas – acrescentou Alister – Conall estaria orgulhoso.

— Esposas? Porra, Kenna. Nem eu fui tão longe…

— Ah, por favor! – ela protestou – Não enganas ninguém, Roderick. Nunca estiveste com uma dama casada?

— Estou a dizer a mais pura verdade.

— Bem, vou ter que confirmar esta informação com Logan Clery então.

— É claro, porque Logan Clery é uma pessoa muito honesta – riu Roderick.

— Ei, não mudem de assunto – Alister interrompeu, brincando com seus frascos – O ponto é que Kenna anda a causar confusão.

— Em minha defesa, foi só uma vez, e eu não sabia que ela era casada.

— Sei – Roderick disse, e aproveitou o assunto para bisbilhotar mais sobre a vida da irmã – Dentre nossas convidadas para o casamento encontrarei algumas mulheres do teu…clube de moças?

— Os teus eufemismos são cada vez mais criativos – Kenna respondeu – E sim, algumas delas estão.

— Lady Olive vai estar?

Alister riu.

— Esta daí não quer ver a Kenna nem pintada de ouro.

— Bem, é… nós não nos separamos nos melhores termos – concordou a irmã – Mas a Lady Elise Furbanks irá, conheces ela, não? Foi amiga de Blair.

— A Elise é das tuas? – Roderick repetiu, cruzando os braços – Então é por isso que ela nunca me deu atenção…

— Ou talvez porque tu eras um pirralho naquela época.

— Talvez. A Marion é das tuas também, Kenna?

A bastarda desviou o olhar e corou.

— É assim tão óbvio? – ela suspirou.

— Bom, agora é. Mas a Marion é boa pessoa, Fionna e eu gostamos muito da família dela – Roderick garantiu.

— Sim, mas ela passa tanto tempo em Breator, fazendo sabe-se lá o quê, tenho pouco tempo para conversar e conhecê-la como gostaria… - Kenna respondeu, os olhos mais tristes.

Roderick sentiu uma pontada de culpa naquele momento. Kenna e Alister não deviam fazer a menor ideia de qual seria o propósito real das visitas de Marion a Breator. Abigail era a única entre eles que estava mais ciente do que se passava de verdade no castelo. A rebelião de Fionna levara os bastardos a guardarem segredos uns dos outros.

— Espero que tu e a Marion tenham uma chance de se conhecer melhor – Roderick desejou, pondo uma mão no ombro da irmã – Acho que é melhor eu voltar para o castelo, tenho ainda muito a fazer. Obrigado pelos serviços, Alister.

— Antes de ires, Roderick, estive a pensar – o rapaz respondeu – Não reparaste que as tuas costas doem sempre quando estás nervoso com alguma coisa?

Roderick mudou de posição, e fez cara feia.

— Isto é estúpido, Alister. Minha cabeça é minha cabeça, e minhas costas são as minhas costas. O que uma coisa tem a ver com a outra?

O bastardo deu de ombros.

— Foi só uma teoria. Podes sempre contar comigo para os calmantes.

— Obrigado de novo. Adeus, Kenna, adeus, Alister.

Com um aceno, se despediram. Roderick mal deu dois passos para fora do boticário quando as suas costas voltaram a protestar. Ele resmungou consigo mesmo e se recostou contra a parede até que a dor melhorasse.

Mas que bela merda, pensou consigo mesmo, que grande marido eu serei, com dores que me atacam quando estou nervoso.

Ele se lembrou de quando conversara com o rei José pela primeira vez sobre a possibilidade de juntar as forças de seus dois reinos.

“Casar a minha irmã consigo me parece óbvio” dissera o rei “É uma pena que teus irmãos mais novos sejam bastardos”

Roderick não sabia dizer se ele tinha dito aquilo com más intenções. Ele achava que o rei José até gostava bastante de si, mas ele pensava sempre no que era melhor para Francisca, é claro. Roderick estava mais próximo do suposto trono de Saye, mas era mais velho… Alister tinha a idade da princesa, mas era um bastardo.

 Será que Francisca seria mais feliz com um de seus irmãos? Conall era basicamente a versão mais jovem de Roderick, e agora já era um Donne legítimo. Alister era um rapaz estudado, inteligente, certamente teria muito a conversar com a princesa… e Roderick era um velho marinheiro cheio de dores e amarguras.

Não, não posso pensar assim, ele se lembrou.

Não sabia dizer se Francisca o amava, mas ela o mantivera em sua companhia por quase dois anos por escolha. Mesmo antes da aliança política, ela o quisera.

Ela o quisera. Dores e tudo.

Quanto mais se aproximavam do casamento, maior seu medo ficava. Quase tinha vontade de mandar Francisca voltar para Daire e esquecer de tudo. Tê-la ao seu lado, como esposa, era tudo que Roderick queria, mas se ela fosse infeliz, ele nunca conseguiria se perdoar.

Só queria que ela chegasse logo…


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Notas finais do capítulo

O que estão achando de dois capítulos por semana? Beijinhos e até terça!



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