Eu vou só conhecer os pais dela escrita por Renan


Capítulo 1
Capítulo 1




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Meninos e meninas, enfim vivenciei um dos maiores medos possíveis para um jovem e resolvi dividir a minha experiência. Mas não vou me adiantar muito, é melhor me apresentar. Meu nome é Andrew, mas todos me chamam de Andy. Sim, nome estrangeiro, não me perguntem o porquê. Tenho 15 anos e acredito que sou normal. Vocês já vão ver muita perspectiva minha ao longo da história, então é melhor falar o que os outros dizem de mim. Pontos positivos é ser legal, divertido, bom suporte no lolzinho, etc. De neutro pra negativo os mais íntimos costumam insinuar que falo pouco, fico internamente nervoso com facilidade, sobrepenso muito coisas simples e pareço ter mania de perseguição. Acho exagero desse povo, mas chega de enrolar.

O lance é que eu estava de olho numa garota da minha classe há um bom tempo. Luíza o nome dela, cabelo escuro, olhos verdes hipnotizantes, nem magra nem gorda, altura é tipo 1,63 e vou tentar não falar muito mais pra ninguém pedir foto dela. Gente fina, sociável, meio cabeça-de-vento, mas faz parte do charme. E desculpem feministas por eu ter falado primeiro da aparência dela e depois da personalidade, me deem um desconto porque eu talvez ainda esteja na puberdade.

Enfim, depois de toda uma burocracia eu finalmente a pedi em namoro e ela disse que por ela aceitava, mas que só ia ser definitivo depois de eu conhecer os pais dela. Maldição! Não sabia que ela era tão superprotegida. Nunca antes eu tinha tido um encontro ou ido conhecer os pais de uma garota que me interessasse. Ia ser talvez o maior desafio da minha vida, mas eu estaria pronto, ah ia!

Passei mais de uma semana me preparando para o fatídico dia. Nos dias anteriores regulei meu sono, evitei problemas na escola pra ela não falar pros pais sem pensar em como influenciaria no dia, fiz diversas pesquisas estratégicas e assisti uns vídeos do Metaforando.

Quando chegou o dia, minhas refeições foram devidamente calculadas pra eu ter fome quando chegasse lá, mas não muita. Qual seria a cor da minha camisa? Verde não parecia chique, vermelho representa paixão mas o pai dela podia lembrar do PT (maldito bolsonarista), branco suja fácil, minha azul favorita tava marcada e não ia dar tempo de resolver, então foi o “pretinho básico” como diriam as amigas da Luíza. Felizmente minha calça favorita combinava. Tênis com palmilha de 6cm pros meus 1,65 virar 1,71 e não parecer ter a mesma altura dela, já tinha pedido pra ela não usar nenhum salto. Pra dar mais personalidade também decidi que ia usar um colar de cruz, pra saberem que também sou servo do Senhor (embora seja bem menos devoto do que eles).

Mas e a DESGRAÇA do cabelo?! O foda quando a gente vai conhecer os pais da cremosa é que a gente tem que parecer másculo (pro velho pensar “esse é capaz de protege-la”) mas também um garoto inofensivo e comportadinho (pra mãe não pensar “ele pode ser meio perigoso”). Como caralhinhos d’água eu pareceria as duas coisas ao mesmo tempo?! Depois de muito pensar, resolvi que deixar o cabelo penteado pra trás seria uma opção razoável.

Depois do banho caprichado e várias tentativas de me acalmar, me olhei no espelho e disse:

— Agora vai! Agora vai! Agora vai! – e saí da frente do espelho antes que reparasse muito em imperfeições imutáveis porque precisava me forçar a acreditar que a nota da minha aparência tinha subido de 5/10 pra 7/10, senão nem ia conseguir sair de casa.

Meus pais me levaram de carro. Tive um desentendimento com a minha mãe no dia anterior porque ela queria ir lá na porta e conhecer os pais da Luíza também, provavelmente ficar de conversinha com a mãe dela e tudo mais. Que bom que meu pai me ajudou a faze-la ver que não era uma boa. Pedi pra me deixarem a uns 30 metros da casa dela pros pais dela me verem chegando sozinho e pensarem “Uh, rapaz independente!” apesar que eu mal sei o caminho pro mercado mais próximo da minha casa. Mas só saí do carro quando deu 20:03 no meu relógio. Se eu chegasse às oito em ponto pareceria apressado e se chegasse muito mais de cinco minutos depois me achariam atrasado. Detalhe: tinha mentido pros meus pais que o horário combinado foi 19:45, porque se eu dissesse 20:00 chegaríamos lá no mínimo às 20:15 e... enfim, é a maldição da minha família chegarmos atrasados em tudo uns quinze minutos pra mais.

Caminhei num ritmo normal até a frente da casa dela, pois o misto da vontade de passar logo a ansiedade prévia com a noção de que eu podia estar sendo como um porco indo pro matadouro me fez alcançar o equilíbrio. Não tinha mais volta. Diante da porta, dei aquela respirada funda e toquei a campainha.

Ouvi latidos, isso não me pareceu bom. Ainda bem que eu estava de calça pra ter a falsa segurança de que uma mordida não me machucaria. A porta abriu e logo vi que era a mãe dela. Que loira, meus amigos! Pena que eu estava pensando demais em sair vivo dessa, e em como seria bom sair com a Luíza dentro de alguns dias caso fosse aprovado.

— Ooooi! – disse ela sorrindo, porque o oi de toda quarentona quando abre uma porta tem que ter vários O’s ou vários I’s.

— Oi, tudo bom? – perguntei, antes de beijar a bochecha dela.

— Tudo, e você? – perguntou ela.

— Tudo, graças a Deus. – respondi, enquanto recebia o primeiro beijo de uma loira na bochecha em alguns anos. Não, eu não estava pensando nisso, eu estava focado!

E lá vinha ela... Luíza. Ela estava tão bonita. Parecíamos até combinar porque ela também estava com uma roupa preta. Mas o mais surpreendente é que ela tinha até passado um lápis de olho. Eu tenho um baita fascínio por isso e tinha comentado com uma colega há algumas semanas. Será que ela tinha interrogado várias pessoas próximas para saber mais sobre os meus gostos? Prefiro acreditar que sim. E nossa, ela estava com as mãos juntas na altura da cintura e com os dedos entrelaçados, exatamente como eu fantasiava.

— Oi, Andy! – disse ela, dando um saltinho com cada pé pra chegar em mim, e com aquele sorriso lindo que não se desfez completamente nem na hora de beijar minha bochecha.

Cometi meu primeiro erro, que foi não ter falado nada nem ter respondido o oi. Eu fiquei temporariamente hipnotizado por ela e não soube o que dizer. Assim que percebi isso, o cachorro da família veio me cheirar.

— Oi, totó! – falei, olhando pra baixo.

— Oi, rapaz. – disse o pai dela, que também sorria mas não apertava os olhos tanto quanto as outras. Estava ele observando se o cachorro parecia fazer algum julgamento de mim baseado no meu cheiro?

— Oi, tio. – respondi, procurando ser simpático.

Eu tinha passado pelas duas capangas e o mascote, agora era a vez do boss final. Ele deu a mão para eu apertar e eu sabia que seria o primeiro grande desafio. Existe um tabu sobre comentar o quão chato é um homem cumprimentar outro com um aperto de mão porque ao invés de ser algo natural, tem sempre que empregar pelo menos o triplo da força necessária, pra parecer que é macho ou sei lá qual a merda do motivo. Me recuso a acreditar que só eu acho isso uma palhaçada. De qualquer forma, eu tinha que me adequar a essa norma social e tinha até treinado com um amigo o meu aperto algumas vezes pra me preparar pra esse momento. Eu só não podia fazer cara de quem estava fazendo força, então precisava me conter.

Apertei a mão dele. Numa escala de 1 a 10 eu diria que usei 8 de força, o suficiente pra não precisar mudar a posição do braço e mudar de expressão. Já ele numa escala de 1 a 10 provavelmente usou 32. Velho filho da puta parecia que queria quebrar minha mão. Não sei como manteve a expressão razoavelmente simpática no rosto.

— Andy, não é? - perguntou, como se a filha não tivesse acabado de dizer. A única explicação pra mim era a raiva interna tê-lo deixado desatento.

— Isso. De Andrew.

— Are you american? – perguntou ele, em tom de brincadeira.

— No, no. – respondi, rindo. Parecia mesmo um nome/apelido que um escritor fresco daria para um personagem brasileiro por achar que todo nome nacional parece genérico.

Eu já estava no território. Tinha passado um bom tempo me preparando e não ia sair de lá sem aprovação. Tinha que lutar pelo meu relacionamento com a Luíza. A batalha psicológica com os pais dela estava apenas começando.


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