Os Cavaleiros do Zodíaco: A Lenda de Seiya escrita por Masei


Capítulo 102
Ametistas Amaldiçoadas


Notas iniciais do capítulo

Hyoga está furioso e finalmente descobrirá as verdadeiras intenções de Alberich, um antigo amigo de seu Mestre Camus.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/800469/chapter/102

A batalha em Asgard seguia. Os guardas palacianos anunciaram toque de recolher na cidade-baixa e na cidade-alta, pois os invasores estrangeiros já haviam vitimado três Guerreiros Deuses: Fenrir nas florestas, Hagen nas cavernas e Mime nas ruínas. A notícia de que o sensível violinista havia sido vítima da violência de Atena foi o último golpe na esperança pacífica do povo de Asgard, que começou a gritar palavras de ordem nas praças centrais, causando essa intervenção dos guardas palacianos para o próprio bem dos aldeões de Asgard.

Fenrir observava aquela movimentação à distância ao lado de seus lobos, confusa sobre a comoção que se operava na cidade dos homens. Hagen ainda delirava atormentado pelo Golpe Fantasma de Fênix, sendo cuidado de perto pela Princesa Freia, mas também por June. Mime, o violinista, de fato tocou seus últimos acordes de um réquiem maravilhoso e agora jazia morto nas ruínas de Fossegrim, seu corpo já sendo pouco a pouco coberto pela neve enquanto Shun e Geist seguiram adiante para o Palácio Valhalla.

Alberich, na Floresta Proibida, no entanto, já havia vitimado dois Cavaleiros de Atena: Shaina e seu amado rival Seiya que, mesmo sem sua armadura, se aventurou na batalha. Pois toda essa notícia foi relatada pelos guardas para Sid, o guardião do salão de entrada do Palácio Valhalla.

— Mime foi mesmo vencido. — surpreendeu-se Siegfried que, por dentro, esperava que os corvos espiões de Hilda talvez pudessem estar errados, mas então não haviam dúvidas de que o violinista agora jazia vencido e os Cavaleiros de Atena seguiam em direção daquele Palácio.

— Alberich parece ter tido êxito com os Cavaleiros de Atena.

— Eu não posso compreender. Um guerreiro incrível como Mime derrotado e um inútil como Alberich ter conseguido vencer dois deles. Nada disso faz sentido.

— Eu também não entendo, Siegfried. — concordou Sid. — Alberich sequer era chamado para o Conselho, ele vivia fora de Asgard e não foram raras as vezes que Hilda precisou melhor orientá-lo por conta de suas atividades duvidosas. Ele nunca pareceu realmente ligar para Asgard ou pela honra de ser um Guerreiro Deus.

— Ele é uma cobra, Sid. — argumentou Siegfried. — Mas como uma serpente, ele também é muito astuto. Alberich é muito inteligente, isso não podemos negar. Não é à toa que tornou-se um dos Conselheiros de Hilda nesse momento de crise, mas ao contrário de nós, ele conquistou seu posto não pela honra e o orgulho, mas porque suas palavras o colocaram ali.

— Talvez seja bom que tenhamos alguém como ele ao nosso lado.

— Eu não tenho total certeza de que lado ele está.

— Ao menos não está do lado de Atena.

— Será que não? — perguntou-se Siegfried. — Era amigo de um Cavaleiro do Santuário e abraçou um prisioneiro em sua própria casa, colocando seu nome antes de sua missão. 

— É terrível ter de concordar com Alberich, mas ele tinha razão. Precisávamos de mais guerreiros nesse momento de batalha.

— Inferno. — resmungou o amigo.

— Ora, Siegfried. — aventurou-se Sid em território perigoso. — Se ao menos você pudesse perdoar Sigmund.

— Hilda não perdoará Sigmund! — bradou ele para o amigo.

— Seu irmão tem Odin no coração. — tentou ainda Sid.

— Chega, Sid. Apenas estamos falando sobre isso porque Hilda não está entre nós. Mas assim como ela, eu nada quero saber de meu irmão. Ele traiu Odin. E ficará preso até que seus dias terminem.

A conversa terminou de maneira ríspida e Siegfried deu as costas ao Guerreiro Deus Sid, deixando-o com o salão de entrada de Valhalla, enquanto ele voltava aos enormes aposentos de Hilda.

 

—/-

 

A Floresta Proibida era viva, ainda que tudo o mais em Asgard morresse lentamente; suas árvores pareciam mesmo eternas e, por toda escuridão de seus troncos, a sensação era de que haviam olhos por todas as partes. Naquela clareira onde brilhavam o céu e o chão brancos de neve, Alberich de Megrez viu-se surpreso diante da voz intempestiva de Hyoga, o Guerreiro Deus de Phecda. Que seguiu falando apaixonadamente.

— Você sabia de tudo desde o começo, não é verdade, Alberich? Essa maldita pedra-preciosa tomou a minha mente e me tornou um Guerreiro Deus sem qualquer capacidade de distinguir entre o que é certo e o que é errado. Você sabia que isso aconteceria, não é mesmo?

Hyoga não tinha mais o elmo de sua Robe Divina e seu olhar parecia um tanto vidrado, como se ainda operasse dentro dele qualquer tipo de feitiço que nublasse sua mente.

— Asgard precisava de um guerreiro. Você precisava de uma Armadura. — respondeu ele apenas.

— Mentira! — vociferou Hyoga, adiantando-se. — Diga-me, Alberich, o que há nessas Safiras? Que feitiço foi esse que você colocou para controlar a minha mente?

— Não há feitiço algum, Hyoga. — respondeu o rapaz, calmamente. — Esse é o verdadeiro poder dos Guerreiros de Odin.

Alberich escondia sempre seu olho direito debaixo de uma mecha ruiva, de modo que apenas o olhar frio e penetrante de seu olho esquerdo claro encarava Hyoga enquanto o garoto enchia-se de dúvidas.

— O verdadeiro poder?

— É claro que sim. — falou ele calmamente e então caminhou devagar ao redor de Hyoga enquanto contava uma história antiga, usando aquela própria Floresta Proibida como prova de um passado remoto. — Conta-se que, na antiguidade, os maiores guerreiros que serviam ao Deus-Corvo lutavam com uma força e uma ferocidade descomunal. Seus inimigos tremiam e diziam que era como se estivessem tomados de uma profunda e violenta loucura que os fazia atacar de maneira selvagem. Eram chamados de berserkir.

Alberich aproximou-se de Hyoga e tocou sua própria Safira, que ainda tinha na cintura da Robe Divina.

— Mas, poderosos e loucos como eram esses guerreiros, logo todos eles foram presas fáceis para que Loki os enganasse em sua trama e trancasse suas almas, suas forças e até mesmo a loucura desenfreada que tinham nos olhos em sete pedras preciosas. Sete Safiras.

Hyoga olhou para a pedra que tinha nas mãos e compreendeu a sensação antiquíssima que ela lhe transmitia, bem como o ressoar baixo, mas curioso que ela tinha com aquele lugar.

— Travesso como um demônio, Loki espalhou as Safiras em Asgard e as mais diferentes pessoas foram tomadas dessa loucura, causando imensa confusão e destruição entre o povo. Até que a destruição foi finalmente apartada pelo Ser Superior que tomou as Safiras desses pobres coitados e as colocou dentro das Robes Divinas que os antigos anões forjaram para a guerra contra os Jotun. E é onde elas têm estado desde então.

A voz de Alberich carregava toda sua sabedoria e a forma como contava a história soava a Hyoga como alguém que parecia tê-la vivido em seu tempo, tal era a voz, a entonação e os olhares que o rapaz salpicava durante sua fala. Era mesmo hipnotizante ouvir Alberich, mas Hyoga sentia-se traído.

— Eu não acredito em suas histórias, Alberich. Ainda que eu estivesse fora de mim eu lembro de cada segundo do que vivi e do que eu fiz. Eu era o único dos Guerreiros Deuses que estava sob esse feitiço. Não vai me enganar com seus contos antigos! — mas Alberich deixou escapar uma risada.

— Você não é o único Guerreiro Deus sob um feitiço, Hyoga. Você é o único Guerreiro Deus de longe. O único Guerreiro Deus estrangeiro. Apenas isso. O efeito que a Safira teve em você deve-se unicamente ao fato de que você não nasceu, tampouco cresceu debaixo desse céu amaldiçoado. O frio, a miséria, a tristeza e os poucos frutos e verduras que tiramos de nossa terra desgraçada pela Yggdrasil nos fez todos imunes à loucura da tramoia de Loki, e Odin deu-nos apenas a força dos antigos guerreiros berserkir. Já quanto a você, não corre em suas veias o mesmo sangue que corre nas nossas, de modo que a Safira realmente apoderou-se de sua mente e transformou-o em um antigo berserk.

Hyoga finalmente calou-se, confuso, enquanto encarava Alberich resoluto à sua frente.

— Então você realmente sabia que essa Safira tomaria a minha mente.

— Não é verdade, Hyoga, escute o que está dizendo! Ainda está sob os efeitos alucinógenos da Safira. — discordou Alberich. — Não se tem registro algum de um estrangeiro trajando uma Robe Divina na história de Asgard, eu jamais imaginei que isso poderia acontecer.

— Por que então permitiu que eu seguisse usando essa maldita Robe Divina?! — vociferou Hyoga.

Um silêncio cruzou a face de Alberich, tornando-o muito sério.

— É como eu disse. Asgard precisava de um Guerreiro. E você precisava de proteção.

— Eu não acredito! — bradou o garoto.

— E o que fará então, Hyoga? Olhe para você, olhe bem para você! Está usando um dos maiores presentes de Asgard, uma proteção abençoada por Odin-Nosso-Pai, uma Robe Divina!

— Sou um Cavaleiro de Atena!

— Aqui e agora você é um defensor de Asgard. Talvez tenha sido melhor que a Safira o tenha controlado, pois você jamais defenderia a terra sagrada contra os Cavaleiros de Atena.

— Mas é claro que não!

— Pois aí está. Se estiver usando uma Robe Divina, é o seu dever defender Asgard! — e o rapaz adiantou-se à frente de Hyoga. — É o que Camus teria feito.

Aquele nome calou fundo de Hyoga, que viu-se acuado; lembrou-se das tantas cartas de Camus para aquele homem, a dívida fatal que tinha para pagar e como, em certo sentido, Hyoga esperava quitá-la em nome de seu amado mestre. Olhou para as suas mãos e viu as duas Safiras que trazia na proteção carmesim de seu punho. Mas então lembrou-se de um corpo no chão que trouxe muita dor para ele.

— Eu quase matei uma amiga, Alberich!

E arremessou as duas Safiras que tinha aos pés dele.

O Guerreiro Deus olhou para aquelas pedras preciosas próximas aos seus pés, pois nada parecia turvar o brilho daquelas Safiras. Ele lentamente ajoelhou-se e recolheu cuidadosamente as pedras do chão daquela floresta antes que as duas fossem engolidas pela neve.

— E ainda assim você está aqui. — disse ele apenas, já com as Safiras nas mãos.

— Não havia guerra nenhuma. Asgard nunca esteve prestes a ser invadida.

— Pois três Guerreiros Deuses já foram mortos por seus antigos amigos, Hyoga. O que tem a dizer sobre eles? Se antes eu imaginava que a invasão que varreria Asgard viria dos Mares, os cadáveres que se empilham de Asgard são todas vítimas de Atena!

— O quê!?

— Fenrir, Hagen e Mime tingem o solo de Asgard de vermelho-sangue e seus corações não batem mais.

— Não, isso não pode ser verdade. Nós, os Cavaleiros de Atena, viemos em paz para selar Poseidon, isso deve ser um engano!

— Não há engano. Há três cadáveres nessa guerra, Hyoga. — falou Alberich. — E aqui eu posso ver que você carregava não apenas a Safira que lhe foi presenteada por Odin, mas também outra da qual eu jamais tinha tido conhecimento.

Hyoga recuou ao encarar novamente as duas Safiras de Odin na mão de Alberich: uma era aquela que ele havia usado diante do Tenente Marina e que havia tomado sua mente até que fosse atingido pelo punho de sua amiga Shiryu, tirando-a de sua Robe Divina tamanha violência do Dragão; a segunda era aquela que Ikki trazia quando ele a surpreendeu na saída de uma caverna, ainda nublado de sua razão e agindo furiosamente como um Guerreiro Deus.

— Onde encontrou essa outra Safira, Hyoga?

Hyoga titubeou.

— Por acaso você mesmo tomou do corpo de um dos Guerreiros Deuses?

— Não, não. Eu… — ele gaguejou, tentando se lembrar. — Eu ataquei Fênix… Não, eu ataquei Ikki na entrada de uma caverna e vi que ela estava com uma Safira de Odin e então…

— Uma caverna?

— Eu tomei a Safira que ela trazia para evitar que o que quer que havia tomado a minha mente também se apoderasse dela.

— Pois o que você tem nas mãos, Hyoga, é a prova da morte de Hagen. Hagen de Merak, da Estrela Beta. Um Guerreiro Deus que desde a infância treinava nas cavernas do sul. Eis a prova da guerra. Estava em suas próprias mãos!

O Guerreiro Deus de Phecda cambaleou para trás e lembrou-se das penas da Fênix na neve.

— Ikki…

A Cavaleira de Fênix não era mesmo alguém que negociava com seus inimigos e simplesmente os obliterava a mente ou o corpo. Era uma Cavaleira feroz e não deixava para trás qualquer tipo de dúvidas em uma batalha entre a vida e a morte. Se ela estava com uma Safira de Odin, então sem dúvidas que havia deixado para trás um cadáver dentro daquela caverna.

O garoto levantou os olhos e encontrou a face austera de Alberich; sua mente tinha tantas dúvidas quanto angústias, mas a Safira havia mesmo tornado sua mente nublada, de tal modo que agora que tudo aos poucos se aclarava, ele sentia dores pelo corpo como se estivesse expulsando aos poucos o que antes o havia controlado. Inclusive sua enorme força de Guerreiro Deus, capaz de derrubar até mesmo Shiryu com seu Escudo do Dragão ou a feroz Cavaleira de Fênix.

— A verdade é que o Santuário de Atena carregou adiante a suspeita de Hilda. Invadiu Asgard para impedir que o Reino do Norte pudesse ver o sol.

— Não, eu não posso acreditar nisso. Deve haver algum engano!

— O que há são cadáveres na neve, Hyoga! — bradou Alberich de volta.

— Eu falarei com todos e essa guerra irá acabar. Têm de haver uma explicação!

— Não! — interrompeu Alberich a marcha de Hyoga, colocando-se diante dele.

— O que está fazendo, Alberich? Cada minuto que se passa, mais se alonga essa inútil batalha.

Alberich então pela primeira vez parecia desarmado diante de Hyoga; como sempre, o garoto achava desconcertante seu único olho verde-claro o encarando, mas então Alberich afastou a franja que lhe cobria não só o outro olho como seu ouvido direito e mostrou um brinco de flor muito bonito na orelha. Hyoga compreendeu que Alberich queria que ele notasse o brinco delicado; um brinco que nada tinha a ver com Alberich ou sua estatura de Conselheiro.

— A fatalidade causada por seu Mestre Camus em Asgard vitimou uma garotinha chamada Sinmara. — começou Alberich. — Ela usava esse brinco na noite que foi soterrada. Era seu brinco favorito.

— Alberich…

— Sinmara era minha irmã mais nova.

Eis a dívida.

Hyoga compreendeu finalmente o tamanho do pecado de seu Mestre Camus para com Asgard e, mais ainda, para com Alberich. O garoto olhou para seus punhos, para a Robe Divina que vestia, e por um segundo se perguntou se fazia alguma justiça àquela promessa. Alberich parecia desarmado, assim como Hyoga. Pois ele sabia muito bem quão dolorosa podia ser a perda de alguém amado.

Alberich deixou escapar um suspiro longo demais, de quem realmente estava cansado de tudo aquilo. Ele caminhou até uma árvore e deixou sua voz vacilante falar ao garoto.

— Nada disso importa, Hyoga. — começou ele, apoiando-se na árvore. — Se Atena está nos invadindo ou não, se Poseidon realmente vai se levantar dos Mares, nada disso importa mais.

Hyoga estava confuso quando viu que Alberich tornou a olhar para ele.

— Agora falta pouco. — o Guerreiro Deus era agora resoluto em sua voz. — Pela memória de Camus, lute ao meu lado, Hyoga. 

Hyoga não sabia mais o que pensar e sua confusão era terrível, fazendo-o se sentir extremamente vulnerável. Havia dias, ou talvez semanas e até meses, que estivera naquela Terra Branca em que a noite encurtava-se e as horas nada significavam para um céu eternamente congelado. 

As linhas bonitas da caligrafia de seu mestre e a sensação de que seguia, pela primeira vez, a fundo uma missão destinada a ele por Camus o levaram até aquele ponto, mas já era doloroso demais colocar-se longe de seu juramento de Cavaleiro trajando uma Robe Divina de Odin. Mas pensava que carregar adiante aquele juramento de seu Mestre era a melhor forma de honrá-lo. Mas mesmo que tivesse de enfrentar seus próprios amigos?

Isso nunca.

— Não posso lutar contra eles, Alberich.

Alberich lhe mostrou a Safira que havia atirado até ele.

— Você pode, Hyoga.

— Não farei.

— Então lute ao meu lado. — ofereceu Alberich.

Hyoga o encarou confuso e sentiu que Alberich, pela primeira vez, parecia hesitante em lhe contar algo; antes, todas as suas palavras e pontuações pareciam premeditadas, e agora o Guerreiro Deus de Megrez não parecia mais tão seguro de si.

— Me escute muito bem, Hyoga. — começou Alberich aproximando-se e notando, com clareza, que Hyoga estava invadido de dúvidas e angústias. — A verdade é que Valhalla não aceitou a sua petição. Eu tentei, mas a verdade é que Hilda apenas entende a linguagem da Guerra. Uma guerra aos invasores. E aqui os Cavaleiros de Atena são esses invasores que, de fato, estão derrubando os Guerreiros Deuses dando razão à sua fúria. Não haveria nunca paz entre Asgard e o Santuário. — e então adicionou, de certo modo sinistro. — Não enquanto Hilda for a governante desta Terra.

— O que quer dizer com isso, Alberich? — perguntou Hyoga, um pouco torcido de dúvida.

— Ajude-me, Hyoga. — falou o rapaz com sinceridade, aproximando-se de Hyoga e mostrando as quatro Safiras de Odin que Alberich agora possuía, três na palma de sua mão e uma ainda alojada em sua Robe Divina. — Se juntarmos as Sete Safiras de Odin, eu poderei despertar Balmung, um dos tesouros desta terra, e com ela poderei acabar com a vida de Hilda e o poder do Anel de Ouro.

— Matar Hilda? — assombrou-se Hyoga, dando um passo para trás.

— E então eu governarei esta terra. — concluiu Alberich com os olhos queimando de ambição, aproximando-se de Hyoga. — E juntos selaremos a Relíquia dos Mares de Poseidon, calando o Deus dos Oceanos em suas profundezas.

Hyoga afastou-se outro passo para trás, surpreso de que o rapaz sempre solícito, delicado e sincero havia se tornado tão esfomeado de um momento ao outro; o confidente silencioso, mas aparentemente amável e prestativo ao seu amado Mestre Camus, tinha um fogo nos olhos que até então Hyoga não havia notado.

— Mime foi derrotado nas Ruínas de Grim, o que significa que seus amigos têm uma quinta Safira. Faltariam apenas os principais conselheiros de Hilda, Sid e Siegfried. Se não dobrarem à razão, nossa força poderá tomá-los de suas pedras preciosas e a Espada Balmung poderá ser despertada.

— Uma Espada?

— Capaz de apaziguar qualquer mal. Inclusive o de Hilda.

— Quer trair o seu próprio povo, Alberich? — assombrou-se Hyoga. — Há poucos instantes queria me convencer de atacar meus amigos e agora está tentando me convencer a matar os seus?

— Meu povo esconde-se nas casas dessa guerra arquitetada por Hilda e seus Conselheiros de Valhalla. Um círculo vicioso do qual eu não sou bem-vindo. Liderado por uma mulher que sequer pode escutar os anseios de sua própria irmã. A única coisa que ela entende é a linguagem da Guerra, de forma que levaremos a Guerra até ela, Hyoga.

O plano era ambicioso e traiçoeiro e Hyoga sentiu como se houvessem soprado sua espinha do inferno.

— O povo de Asgard definitivamente não está em uma dupla de conselheiros bajuladores de uma mulher cruel que nunca desceu de seu palácio para ver o que se passa nas tabernas da cidade-baixa, onde se escondem homens e mulheres do destino terrível que ela nos faz trilhar. Lute por Asgard, Hyoga. Como Camus teria feito. Lutar por Asgard significa derrubar Hilda.

Os olhos de Alberich queimavam e, conforme sua fúria manifestava-se em palavras, aos poucos ele se aproximava de Hyoga, que mantinha-se calado.

— Foi por isso que me deu a Safira, não é mesmo, Alberich? Dar a Safira para mim era garantir que havia pelo menos duas sob seu controle. Era isso que eu era? Um peão?

— Nunca, Hyoga. Você é o discípulo de Camus. Você é Camus. Dei a Safira para você, pois você precisava de proteção para lutar ao meu lado. Para lutar por Asgard.

— Contra o quê, Alberich?! — retrucou Hyoga em ira. — Não havia guerra nenhuma. Onde estão as hostes de Poseidon? Onde estão os Marinas que atacariam no momento final?

— Hilda encontraria um inimigo para guerrear! — retrucou Alberich. — A Guerra era inevitável na neve de Asgard. Entenda de uma vez por todas, Hyoga! Hilda é o inimigo. É ela quem devemos derrubar. E então… Então nada mais importará. Selaremos juntos a Relíquia dos Mares e eu escoltarei seus amigos para longe daqui pessoalmente. Mas enquanto Hilda estiver em Valhalla, a Guerra vai continuar em Asgard.

Hyoga recuou em silêncio e Alberich avançou esfomeado na Floresta Proibida, que soprou um vento gélido pelos dois.

— Lute ao meu lado, Hyoga! — pediu ele.

Mas por sobre os ombros de Alberich, Hyoga notou algo terrível.

— Você mente, Alberich. — falou ele com calma.

E caminhou na direção do Guerreiro Deus, que novamente se surpreendeu, mas antes que pudesse escolher as palavras Hyoga passou por ele até o tronco maior daquela floresta onde Alberich notou, com assombro, que o vento havia derrubado a parede de folhas e raízes que escondiam os caixões de Ametista.

E ali o Guerreiro Deus de Phecda encarou com medo no coração o corpo de Shaina, trajando metade de sua Armadura de Prata, com os olhos que antes eram assombrados e vívidos, agora semicerrados enquanto a vitalidade lhe escapava do corpo; e de outro lado o de Seiya, um amigo querido usando um sobretudo rasgado no ombro, sem uma de suas mangas, nenhum sinal de sua maravilhosa Armadura de Pégaso e a expressão também de quem lentamente adormece eternamente.

Hyoga foi invadido de dúvidas. Afinal de contas, se Shaina estava ali, isso significava que o Santuário havia enviado sua própria Mestre-de-Armas, uma situação muito distante da tranquilidade que aquela carta fazia crer. Mais do que isso, a presença de Seiya naquele caixão com seu sobretudo tão roto era sinal de que há muito tempo o Galeão de Atena havia aportado em Asgard, fato que Alberich havia certamente  escondido dele. E ele sabia disso por um detalhe que não lhe escapou dos olhos e o fez inclusive olhar para o próprio punho.

— Você mente. — repetiu Hyoga, resignado.

Seiya tinha marcas evidentes em seu punho que eram idênticas às de Hyoga e ele compreendeu imediatamente que, assim como ele, o garoto também estivera preso por muito tempo com aquelas malditas algemas de ametista.

— Era tudo uma grande mentira, então? — falou Hyoga, finalmente virando-se para Alberich. — A voz da legião estrangeira. Um profundo conhecedor das fronteiras. Um espião. Sabe mais sobre nós do que nós sobre Asgard. Deve ter criado esse pingente, fabricado aquelas cartas e me enganado esse tempo todo.

O Guerreiro Deus não lhe respondia.

— As marcas no punho de Seiya mostram claramente que ele esteve preso por muito tempo. O que tem a dizer, Alberich?! — bradou Hyoga.

Alberich novamente parecia escolher bem as palavras.

— Se o que diz é verdade e esse garoto vinha pelo Mar, então só posso concluir que nós dois fomos enganados por Valhalla. Sabe muito bem que não sou bem-vindo no Palácio e não me surpreende que tenham feito prisioneiros a visita do Galeão de Atena.

— Mentira! — bradou Hyoga. — As algemas de Ametista, somente você pode controlá-las.

— São criações de gerações muito antigas de minha família, é verdade. Mas aqueles idiotas não precisam de mim para prender ou libertar alguém. — tornou Alberich.

— Responda-me uma coisa, Alberich. — começou Hyoga. — O que teria acontecido se Shiryu não houvesse me acertado e arrancado a Safira de meu ventre na entrada de Asgard?

Hyoga o rodeava enquanto Alberich parecia escolher sempre as palavras. E ele finalmente falou.

— Você teria sido poupado do sofrimento de ver seus amigos caírem em batalha. — falou Alberich decisivamente.

— O que quer dizer com isso?

— O maior dos Guerreiros Deuses chama-se Siegfried. E Siegfried é um imortal. Diante do qual todos os seus amigos seriam mortos.

— Se isso fosse mesmo verdade, o seu plano jamais daria certo também. Pare de mentir!

— Eu posso lidar com Siegfried. Eu sei o seu ponto fraco. E eu o venceria assim após as batalhas terríveis que eu tenho certeza que os Cavaleiros de Atena levariam contra ele. Ainda que Siegfried seja um imortal, ele ainda é um homem. Mesmo vivo, estaria exaurido das batalhas contra os valorosos Cavaleiros de Atena. Não seria páreo para mim.

— E quanto a mim, Alberich!?

— Eu tomaria a sua Safira quando fosse o momento certo.

— E deixar-me viver o resto da vida com o peso da morte de meus amigos nas costas? Que tipo de desgraçado é você que ousa brincar dessa maneira com a vida das pessoas?

— Eu sou Alberich! — bradou o Guerreiro Deus pela primeira vez, finalmente aumentando o tom de voz e avançando na direção de Hyoga com os olhos frêmitos de ira, como quem calou por muitos anos a força de um nome que ele acreditava ser deixado às margens do que realmente lhe cabia. — Eu governarei a Terra de Asgard. Como é de direito e do destino de minha família. E quanto a você, Hyoga. Você teria pago a dívida que seu Mestre Camus deixou para trás.

— Eu não acredito em você, Alberich. Não acredito naquelas cartas, ou nessa dívida, eu sequer acredito que você tenha tido uma irmã em toda sua história!

Hyoga tinha os olhos feridos de traição enquanto do outro lado Alberich tinha olhos ardentes de alguém que parece próximo a algo que por anos almejava.

— Pois sua trama termina aqui, Alberich. — falou Hyoga, finalmente. — Não vou perdoá-lo por ter usado o meu Mestre para me convencer a lutar contra meus próprios amigos por sua própria ambição!

Alberich não teria qualquer chance contra Hyoga; e foi efetivamente atingido pelos punhos congelantes do garoto, que o arremessou contra troncos e galhos. O Guerreiro Deus de Megrez ainda tentou lutar, mas Hyoga foi mais ágil e esquivou de seus golpes e o atingiu no estômago.

— Eu tenho pena de você, Alberich. Tudo que existe ao seu redor são mentiras.

E olhando para o corpo dolorido de Alberich que sofria imensamente na neve, Hyoga tirou parte por parte daquela Robe Divina alaranjada do corpo, voltando a ter apenas as roupas simples que o próprio Alberich havia lhe emprestado em sua mansão, agora já muito suja e rasgada em alguns pontos.

Hyoga não era mais um Guerreiro Deus.

Era um garoto arrasado por ter sido feito de peão em um esquema ambicioso. Seus sentimentos, as palavras de seu mestre, as histórias, os pecados de um juramento. Mas acima de tudo que ele sentia, haviam os corpos de Seiya e Shaina lentamente sendo sugados pelas terríveis Ametistas de Alberich.

— Faça algo de digno alguma vez em sua vida, Alberich. Liberte Seiya e Shaina e sua Ametista!

Uma risada entrecortada pelo sofrimento do Guerreiro Deus no chão.

— Não vou aceitar que diga que não é possível tirá-los dali, pois tudo que sai de sua boca são mentiras. Eu sei que existe um jeito. Vamos, diga!

— Sabe que jamais lhe contarei, Hyoga.

— Droga, Alberich. O que acha que vai conseguir com isso? — perguntou Hyoga. — Não governará Asgard e morrerá sozinho nesta Floresta.

— Se eu morrer, Shaina e Seiya morrem junto.

Alberich sofria na neve enquanto vangloriava-se ainda de ter uma vantagem sobre o garoto arrasado por dentro. Somente então que ele teve uma ideia; uma ideia que Alberich mesmo havia lhe emprestado. Ele correu na neve e recolheu as três Safiras de Odin que haviam voado quando Alberich foi atingido por seu cosmo.

— Pois se a tal Espada Balmung é capaz de apaziguar qualquer mal, eu tenho certeza de que ela será capaz de libertar Seiya e Shaina de sua prisão de Ametista.

E colocou-se diante do corpo de Alberich, que tentava se levantar.

— Me dê a sua Safira de uma vez, Alberich!

O Guerreiro Deus puxou dentro de sua Robe Divina e jogou aos pés de Hyoga o pingente de ponta-de-flecha.

— Pise no pingente, Hyoga. É o que está fazendo com a memória de seu antigo Mestre. Já o matou uma vez tirando sua vida e agora está pisando em sua própria promessa, manchando sua presença entre os valorosos de Valhalla.

— Isso é uma mentira! — reagiu Hyoga. — Entregue logo a sua Safira!

O Cavaleiro de Cisne estava furioso. O fato de Alberich ter usado o carinho que ele tinha por seu amado Mestre Camus, por quem ele se mortificava todos os dias por ter sido responsável pela morte, para manipulá-lo dentro daquela trama ambiciosa pelo poder de Asgard havia arrebentado com o garoto por dentro. A raiva que sentia talvez rivalizasse mesmo com os antigos berserkirs, mesmo que estivesse distante da influência da Safira. Sua voz irascível e apaixonada calou a voz do Guerreiro Deus, que viu diante de si um garoto irredutível.

A nobreza de Alberich inexistia agora que estava arrasado no chão; sua Robe Divina ainda estava brilhante e maravilhosa, mas Hyoga reconhecia no olhar de Alberich o caminho perdido de quem não vê saída dentro de uma batalha. Fosse ele um guerreiro, ele saberia de onde buscar forças para seguir adiante e até mesmo morrer por sua missão, mas Alberich não era mesmo um guerreiro. E ali desistiu finalmente.

Seus ombros caíram e seus olhos se fecharam, comiserados. Ele levou a mão até a cintura e efetivamente tirou a Safira de Odin que lhe protegia a Robe Divina, e estendeu para que Hyoga a levasse. O garoto estendeu o braço para tomar a quarta Safira de Odin que havia naquela Floresta Proibida, mas quando Hyoga o fez, Alberich conjurou sua maldita espada de Ametista, que havia intrigado Seiya em sua derrota; de muito perto, Hyoga percebeu tarde demais a tramoia da serpente encurralada.

Ele saltou no ar e esquivou-se do golpe fatal que certamente perfuraria seu estômago, mas a espada de Ametista que brotou furiosamente da mão de Alberich trespassou sua coxa direita, o levando ao chão tingindo a neve de sangue.

— Maldito seja, Alberich. — reclamou Hyoga com uma estaca de ametista atravessada em sua coxa.

Alberich levantou-se finalmente e caminhou até o pingente de ponta-de-flecha que havia arremessado para Hyoga; o garoto viu que o Guerreiro Deus tomou o pingente, limpou-o da neve e recolocou-o no pescoço. Finalmente olhou para Hyoga e disse essas palavras.

— Eu sinto muito que tenha acabado assim, Hyoga. — seu seidr ascendeu frio enquanto sua energia sugava as partículas púrpuras daquela Floresta Proibida. — Mas nada ficará em meu caminho.

— Droga, Alberich…

— Peça perdão ao seu Mestre quando encontrá-lo.

A Robe Divina de Megrez estava toda iluminada de uma luz púrpura; o Guerreiro Deus abriu os braços e seus cabelos agitaram-se com força, revelando o brinco de flor que ele usava na orelha. Sua voz nunca havia sido tão forte.

— Couraça Ametista!

O garoto Hyoga viu como a iluminação da Floresta Proibida pareceu escurecer, como se o frio de Alberich a houvesse sugado para usar sua técnica púrpura e mortal, mas antes que a nevasca de ametista o trancasse em um ataúde como aqueles que lentamente sugavam a vida de seus amigos, um vulto apareceu à sua frente e o protegeu com o fulgor de um brilho dourado.

Quando a luz voltou ao normal, Hyoga viu à sua frente que Shiryu estava com seu Escudo do Dragão protegendo os dois; uma fina camada de ametista cobria todo o Escudo esmeralda que a garota carregava no braço esquerdo. O corpo inteiro da garota iluminou-se e a ametista caiu feito lascas no chão, livrando seu poderoso Escudo, firme como um diamante.

— Shiryu! — surpreendeu-se Hyoga às suas costas, salvo pela amiga.

— Hyoga. — retornou ela, sem sequer olhar para o amigo sofrendo no chão.

— Shiryu. — começou ele, gaguejando. — Shiryu, por favor, me perdoe…

— Não há necessidade alguma de pedir desculpas, amigo. — falou ela, ainda em guarda diante de Alberich, que tinha no rosto um certo assombro.

Hyoga olhou da garota para Alberich à frente olhando bem para aquela Cavaleira com uma venda rosa nos olhos, como se aos poucos juntasse as informações que certamente tinha sobre ela também.

— Nesse caso, Shiryu, você precisa me ouvir. Este que se coloca diante de você é Alberich de Megrez, um Guerreiro Deus que foi capaz de aprisionar Shaina e Seiya em caixões de Ametista. Tenho certeza que pode ainda sentir seus cosmos lentamente se esvaindo. Pois somente ele pode livrá-los dessa prisão. Mas você não deve confiar em suas palavras.

Shiryu ouviu com atenção o seu amigo, enquanto Alberich estava surpreso de ver que sua técnica não tinha qualquer efeito contra aquele Escudo de Bronze no braço da Cavaleira de Atena. E ele conhecia bem aquele mosaico que inscrevia-se desenhado na Armadura de Bronze e não deixou de achar poético que, séculos depois, ele novamente apareceria na história da linhagem de Alberich.

— Esse Escudo é o Escudo do Dragão, não é verdade? — falou ele, atraindo a atenção de Shiryu.

— Vejo que já o conhece. — comentou ela, e Alberich deixou escapar um sorriso.

— As coisas parecem mesmo ter sido escritas pelos Deuses. — falou Alberich, respirando fundo. — Primeiro, um discípulo de um velho amigo aparece em minha prisão. E então, o Escudo do Dragão está diante de Alberich novamente.

— O que quer dizer com isso?

— Está nos registros de minha família que o maior guerreiro de nossa história enfrentou esse Escudo no oriente. Ainda me lembro o nome desse grande guerreiro. Seu nome era Dohko.

O nome fez com que Shiryu mudasse sua expressão, surpresa ao ouvir o nome de seu maior rival na infância.

— Vejo que o conhece. — comentou Alberich ao notar sua surpresa.

— Não. — negou ela. — É verdade que eu conheço alguém por esse nome, mas ele jamais poderia ter enfrentado seu antepassado, pois este de quem falo treinou ao meu lado.

— Ora, Cavaleira de Atena. — sorriu Alberich. — Se eu carrego o nome de um antepassado de séculos atrás, deve imaginar que esse seu amigo também foi homenageado por esse outro grande guerreiro do oriente.

— E qual foi o resultado dessa batalha, Guerreiro Deus?

— A mais profunda igualdade. — falou Alberich e Shiryu duvidou muito, mas não deixou que seus pensamentos se vocalizassem.

— Receio que o mesmo não se passará nos dias de hoje.

— Está segura que vai me vencer? — perguntou Alberich.

— Absolutamente.

Hyoga olhou para a garota diante dele e sentiu certo calafrio ao vê-la tão decidida; sua ferida ainda vertia sangue e ele não poderia ser de qualquer ajuda para ela, mas atravessou Hyoga um pensamento inacreditável: Shiryu não precisava dele. Céus, Shiryu não precisava de ninguém. Hyoga tinha a mais absoluta certeza de que Alberich seria mesmo vencido. Com apenas um golpe. O Cosmo de Shiryu estava diferente.

À frente de Shiryu, Hyoga viu que Alberich conjurou outra espada de Ametista para empunhar nas mãos; o garoto gritou para que sua amiga evitasse contato com aqueles cristais, mas Alberich saltou em grande alvoroço para atingir Shiryu de cima abaixo com aquele cristal cortante. Novamente, Alberich não era um grande guerreiro, de forma que Hyoga sabia que um golpe aberto e óbvio daquele seria facilmente desviado ou até mesmo apartado pelo incrível Escudo do Dragão. Mas Shiryu fez algo ilógico.

— Shiryu! — berrou Hyoga, sem conseguir levantar-se.

Pois Shiryu não se moveu para esquivar, tampouco levantou o Escudo para apartar aquele corte terrível; não, Shiryu ergueu rapidamente o braço direito e segurou a lâmina da Ametista com apenas uma mão, parando o gume daquele cristal nos dedos. Um erro terrível, sabia bem Hyoga. Ele tentou se levantar para avisá-la, mas a estaca de ametista em sua coxa o levaram ao chão novamente; ao levantar os olhos, viu clarear a Floresta um brilho dourado quase imperceptível.

Alberich saltou para trás com um sorriso no rosto de quem sabe que havia novamente enganado sua vítima. Mas algo inacreditável se passou quando Hyoga percebeu, observando com mais clareza, que o Punho do Dragão que protegia o braço de Shiryu reluzia em ouro.

O Guerreiro Deus levantou sua espada e sorriu pronto para mais um ataque, mas foi interrompido por Hyoga.

— Acabou, Alberich. — disse ele, ainda olhando para as costas de Shiryu.

— Para todos vocês, Hyoga!

— Pare, Alberich. Olhe para si mesmo. — pediu Hyoga.

Alberich sentiu seu coração pular uma batida, seu peito faltar o ar por um segundo, um calafrio terrível lhe atravessar a espinha e uma linha quente percorrer sua testa. Um filete de sangue que ele limpou, assombrado, com a mão.

— O que aconteceu?

— Você já está vencido. — anunciou Hyoga para ele.

A espada de ametista que ele tinha nas mãos quebrou-se em mil pedaços, deixando-o boquiaberto e com as mãos nuas. A estaca púrpura que ainda feria a coxa de Hyoga atravessada também se esvaneceu, deixando jorrar seu sangue pela neve. Algo ainda mais assombroso aconteceu com a proteção de Alberich, pois sua Robe Divina, parte por parte, simplesmente fatiou-se em muitos pontos e caiu completamente destruída no chão. Ele caiu de joelhos sem acreditar.

— Seus cristais de Ametista são todos extensões não só de sua aura, como também da Armadura que você usa. — falou Shiryu para ele.

— Como… isso é possível? — surpreendeu-se o sempre decidido Alberich. — Você é diferente de todos eles.

— A resposta está no Sétimo Sentido. — respondeu Shiryu e tanto Alberich como Hyoga olharam para ela.

— O Sétimo Sentido? — perguntou Alberich, surpreso pela primeira vez, pois era sua função saber de tudo de seus oponentes, mas aquele conhecimento milenar dos Cavaleiros de Atena era desses segredos que um espião não poderia nunca conhecer. Shiryu explicou a ele:

— O Sétimo Sentido é a compreensão mais profunda do Cosmo. É sentir-se parte de tudo. Deve ter notado que eu não posso enxergar, e isso torna a minha compreensão de meus sentidos ainda mais profunda do que um Cavaleiro que pode ver as cores do mundo. Eu pude sentir que seus cristais de Ametista são também parte de você, parte de sua proteção que chama de Robe Divina. Sinto profundamente como você tira forças desta Floresta, como se a sua aura estivesse enraizada nestas árvores e neste solo que deve esconder uma incontável fonte dessa pedra preciosa, não é verdade? Neste caso, se a sua Robe Divina ressoava tão próxima aos cristais ao nosso redor, eu suspeitei que a resposta estava em destruí-la.

— Shiryu! — exclamou Hyoga, interrompendo a amiga. — Os corpos de Shaina e Seiya estão livres! Você tinha razão!

Alberich olhou por sobre os ombros e viu que seus ataúdes de ametista haviam sido obliterados, como ele sabia perfeitamente que aconteceria caso sua Robe Divina fosse danificada. Olhou adiante e viu Hyoga ajoelhado com a coxa sangrando e aquela Cavaleira de Dragão de pé, altiva e intocada. O garoto tentou levantar-se da melhor maneira que podia, mas Shiryu chamou pelo amigo.

— Hyoga, eu preciso que você pegue a Safira de Odin de Alberich. — pediu Shiryu.

— O quê? — confundiu-se Hyoga. — A Safira?

— Sim. E também aquela que estava com Seiya e a sua própria Safira, Hyoga.

— O que quer dizer com isso, Shiryu?

Finalmente Hyoga foi colocado à par da missão de seus amigos.

— A nossa missão, Hyoga. — falou ela. — É selar a Relíquia dos Mares guardada por Hilda, mas ela está possuída por um anel chamado de Anel de Nibelungos. E com esse Anel jamais poderemos chegar à Relíquia. De forma que precisamos usar a Espada Balmung para cortar o feitiço que hoje opera em Hilda. Libertá-la do mal e abrir caminho para selarmos a Relíquia.

Hyoga olhou imediatamente para Alberich, pois era absolutamente desconcertante que, na verdade, ele parecia ter dito a verdade. O mesmo plano que aquele homem ambicioso tinha para si já parecia estar em curso pelas mãos dos próprios Cavaleiros de Atena. Hyoga percebeu um ligeiro sorriso no rosto de Alberich, ainda que estivesse arrastando-se na neve, e compreendeu que talvez fosse mesmo seu plano desde o princípio. Se ele falhasse, os Cavaleiros de Atena não falhariam. De qualquer jeito a Espada Balmung surgiria naquela batalha.

— Eu cuidarei de Shaina e Seiya, Hyoga. — falou Shiryu, correndo na direção dos dois que aos poucos acordavam.

Restou ao garoto atender à tarefa de recolher as Safiras que se espalhavam ao redor de Alberich. Ele tomou todas, mas percebeu que a última estava na palma da mão daquele anfitrião ambicioso e agora completamente destituído de toda glória que antes o fazia brilhar, mesmo em um povo tão sofrido e miserável. Alberich finalmente era um deles.

Hyoga tomou a Safira de sua mão e, mancando, foi na direção de Shiryu e de seus amigos, mas Alberich lhe falou uma última vez com a voz vacilante.

— Eu não menti, Hyoga… — balbuciou ele. — As cartas eram reais.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

SOBRE O CAPÍTULO: Pura novela. Eu queria diálogos acusatórios quase intermináveis entre Hyoga e Alberich, ao mesmo tempo para expor a revolta de Hyoga de ter sido usado e também mostrar como Alberich sempre tinha tudo na ponta da língua, tamanho preparo e inteligência do personagem. Às vezes eu sinto que meus diálogos são muito curtos entre os personagens, portanto nesse capítulo eu quis que fosse uma cena com bastante acusação entre eles. E foi um diálogo difícil, pois ao mesmo tempo que eu queria que o Hyoga percebesse algumas coisas das tramoias de Alberich, certos pontos ainda ficassem dúbios: é verdade ou não é? Afinal de contas, onde Alberich e onde Alberich contou a verdade? Aqui fica bem mais evidente a inspiração de Surtr (Soul of Gold), pois eu trouxe a mesma temática e relação com Camus.

PRÓXIMO CAPÍTULO: O TIGRE NEGRO DE VALHALLA

Shun e Geist chegam ao Palácio Valhalla e lá encontram um exímio Guerreiro Deus do gelo.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Os Cavaleiros do Zodíaco: A Lenda de Seiya" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.