Encontros de Líridas - KakaSaku escrita por LoreyuKZ


Capítulo 2
Ensopado de genjutsu!


Notas iniciais do capítulo

Alguém sabe o que é revisão? Eu não. Tem no meu dicionário não AHAHAHAHAHAHAHA *APANHA*

Capítulo do feriadão tá ai, espero que todas vocês estejam com a pipoquinha na mão, o lanchinho da tarde, a coquinha da madrugada, o suquinho do café da manhã pra ler esse capítulo cheio de diálogo AHAHAHA

E VAMOS QUE VAMOS ♥

Ps.: eu esqueci de avisar, mas essa fanfic vai ser recheada de diálogos (que às vezes não vão fazer o menor sentido, mas que a vida é isso né? Nem toda conversa tem sentido e significado AHAHA as vezes uma conversa é só uma conversa, e às vezes não....)

Espero que gostem!



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O cheiro agradável das ervas melhorava o seu humor, afinal era tudo o que faltava para terem uma boa refeição. A mulher pegou um punhado das ervas ainda verdosas colocando cuidadosamente naquele recipiente improvisado que fizera com uma casca grande que havia soltado de uma árvore.

Não precisariam de muito, mas ela se permitiu pegar um pouco mais para futuras necessidades, afinal nunca poderiam saber quando encontrariam coentro silvestre e outras especiarias durante sua longa viagem, que tinha acabado de começar. Três dias haviam se passado, e nesse meio tempo eles só viram árvores características da vegetação do país do Fogo.

Tudo bem que Sakura não esperava que grandes coisas fossem acontecer só por ter concordado em seguir por um caminho mais longo, mas três dias depois e ela se perguntava quando veriam algo diferente.

Voltou para o local onde tinham armado acampamento. Kakashi estava mexendo os legumes numa panela de ferro trazida dentro de um pergaminho juntamente a um kit de cozinha rápida. Sim, ele havia preparado um kit para cozinhar durante a missão deles, e Sakura nunca o viu cozinhar em toda sua vida, mas tinha que ser justa com o homem porque a desculpa dele parecia convincente o suficiente ao seu bom senso.

Segundo ele, como sensei, ele deveria garantir que seus alunos soubessem se virar com o que encontrassem na floresta, e isso incluía comer alimentos crus, identificar plantas comestíveis, acender fogueiras sem auxílio de jutsus...  etecetera. A explicação ainda soava como uma desculpa para que o preguiçoso não precisasse fazer nada, mas ao mesmo tempo parecia razoável da visão de um professor que está formando ninjas autônomos.

O homem pegou as ervas e cheirou por cima da máscara. Pareceu satisfeito enquanto as preparava para colocar dentro do ensopado de legumes que estava preparando com tanto cuidado. Naquela manhã, a dupla acabou passando por uma plantação discreta nas imediações de um casebre escondido entre a vegetação densa, e intencionados a receberem alguma recompensa, se prontificaram à simpática velhinha que morava solitária para arrumar as telas arruinadas de suas janelas.

A moradora não apenas ofertou seus legumes, como também os convidou para ingressar em seu café da manhã e assim descobriram que sua escolha em morar sozinha no meio da floresta era puramente uma escolha. Ela tinha sido uma ninja da Vila da Grama e assim que se aposentou, resolveu que queria viver daquele jeito, no meio da floresta com os animais e plantas.

Sakura a achou divertida, e a velha senhora reconheceu seu professor das histórias. Sharingan no Kakashi. No fundo, a moça queria ouvir um pouco daquelas histórias dela, mas não podiam ficar muito mais já que já estavam atrasados. Seguiram seu caminho e horas mais tarde Kakashi mexia o caldo daquele ensopado com cuidado depois de acrescentar aquelas ervas.  

Se agachando próximo ao fogo, o calor fez seu corpo aquecer de maneira morna. O dia estava bonito, e era começo de primavera. Na verdade, em poucos dias seria seu aniversário de 19 anos e ela se pegou pensando nisso enquanto observava os cubos de cenoura, batata e chuchu flutuarem no caldo ralo, seguindo o fluxo do líquido de acordo com a colher que conduzia um fraco redemoinho dentro da panela.

— Kakashi-sensei, você acha que as pessoas vão contar histórias sobre mim?

Ele levantou seu olhar com a habitual expressão de tranquilidade que carregava. Sakura tinha aqueles olhos quase contemplativos enquanto o mirava com aquela questão flutuando no ar. Soltou um ruído de quem estava pensando um pouco na pergunta aleatória dela enquanto voltava sua atenção ao ensopado que borbulhava gentilmente.

— Sobre a ninja médica que curou milhares de ninjas na Grande Guerra Ninja? A kunoichi que ajudou a selar Kaguya? – Ele devolveu a questão quase de maneira retórica — Eu acho que já circulam histórias sobre você por aí, Sakura.

Não precisou levantar o olhar para saber que havia aquele tom vermelho nas bochechas femininas. Sakura não sabia lidar com elogios ou qualquer coisa que se assemelhasse a um. Ele ficou em silêncio ouvindo os ruídos discretos da natureza, como o farfalhar das folhas nas copas das árvores, ou o rastejar de uma serpente curiosa que os observavam em um dos galhos daquele arbusto mais a direita.

— Deve ser divertido encontrar com alguém que você nunca viu na vida e ela saber seu nome – Sakura disse depois de um momento, sua voz parecia descontraída como quem superou o momento tímido por conta de um elogio que sequer soava como um.

— Você acaba se acostumando. – Respondeu quase automaticamente.

— Durante a guerra, quando Sasuke-kun chegou ao campo de batalha e usou uma daquelas variações do Chidori pela primeira vez, eu ouvi um ninja de Kumogakure falar “aquela é a única técnica autoral do Ninja Copiador, Hatake Kakashi”— Ela disse com uma risada divertida antes de continuar — “Esse garoto com certeza é um dos alunos dele”.

Kakashi levantou o olhar e descobriu que ela estava olhando para alguma coisa no horizonte, como se estivesse falando aquelas coisas como um devaneio de sua mente. Ele sorriu brevemente sem sequer perceber enquanto abaixava seu olhar para o ensopado que lentamente encorpava.

— Quando eu era mais nova, eu sentia um orgulho besta toda vez que alguém te reconhecia durante nossas missões. Era quase como se estivessem falando de mim. – E riu nervosa percebendo que estava falando algo tão bobo.

— Pelo menos você não saia gritando nos vilarejos que o Grande-Kakashi-Sensei-Ninja-Dos-Mil-Jutsus vai salvar a todos.

Sakura riu lembrando-se daquela missão idiota nos arredores do país do Chá. Os olhares se encontraram e eles riram cúmplices daquela memória antiga.

— Sabe, quando voltamos à vila depois da guerra, durante o período que Naruto ficou internado por conta dos ferimentos vários ninjas iam ao quarto dele para ter uma oportunidade de conversar com ele. – Sakura começou com sua voz animada — Teve um dia que havia um ninja de Iwa lá e ele perguntou que super jutsu de vento era aquele. – A mulher gesticulava à medida que as palavras lhe escapavam — Aí o Naruto falou, todo empolgado, “É o Rasenshuriken! Uma variação do jutsu do meu pai, o rasengan, que eu criei junto com o Kakashi-sensei.”

Kakashi riu do jeito com que ela imitava a fala de Naruto, fazendo aquele tom de voz mais alto e mexendo os ombros como se fosse o amigo. A risada mais baixa dele se misturava com a dela um pouco mais alta. Um pássaro voou de seu ninho pelo ruído atípico, mas eles não se importavam com aquilo.

— O pior de tudo é que eu não fiz nada. – Kakashi disse dando os ombros ainda divertido — Eu só disse para ele usar os clones.

— Ah, fala sério... Você ficou com ele durante todo o processo e teve todas aquelas dicas valiosas. – Ela o encarou com seu olhar de sabe-tudo e antes que ele pudesse retrucar, Sakura continuou — Eu fui lá todos os dias, então sei do que estou falando. Ele está te dando o crédito devido.

— Bobagem – Kakashi disse a tranquilidade de todo o mundo — Só fiz o que tinha que fazer como professor dele.

Sakura soltou um ruído de reprovação diante das palavras dele porque aquela modéstia em excesso era tão a cara dele, mas não disse nada para ir de encontro ao seu pensamento. Ela suspirou olhando para os raios de sol que vazavam em um brilho amarelo entre as folhas verdes. Aquela floresta não era tão densa, mas o sol não conseguia atingir o solo de maneira direta devido aquela camada de folhas sob suas cabeças.

O silêncio se fez entre eles e Sakura o olhou discretamente por um momento. Kakashi era, sem dúvida alguma, um ninja extraordinário, e todos que conheciam seus feitos o temiam e admiravam, mas aqueles que conviviam com o homem em seu dia-a-dia sabiam que ele era pacato, preguiçoso, pervertido discreto, estranhamente cuidadoso, detalhista, metódico, pão-duro.... E enquanto cozinhava, Sakura também o sentia emitir uma aura doméstica que ela nunca havia reparado antes.

Esse era Hatake Kakashi.

Mas as pessoas conheciam o ninja copiador que venceu todos os seus inimigos com seu sharingan e acervo de jutsus quase ilimitado, e era engraçado pensar que Sasuke já era uma figura conhecida no mundo ninja àquela altura que, apesar de tudo, era lembrado primeiramente como aluno de Kakashi. Também era engraçado ver Naruto, o ninja que salvou a todos, contanto uma história orgulhosa sobre como criou um jutsu em parceria com Kakashi.

Só fiz o que tinha que fazer como professor dele.

Aquela frase soou novamente em sua cabeça e ela apenas riu sozinha com seus pensamentos antes de perceber que ele estava apagando a brasa que aquecia sua refeição, sinalizando que estava tudo pronto. Ele a serviu numa caneca de metal e fazia tanto tempo que a mulher não saia numa missão como aquela em que tinham que acampar e se virar com o que a natureza os oferece.

— É melhor esperar esfriar um pouco – Ele disse daquele jeito cuidadoso de sempre antes de servir a si mesmo.

Sakura olhou para o ensopado fumegante que exalava seu aroma delicioso e percebeu que tinha fome. Levantou o olhar para Kakashi novamente, e o viu confortável enquanto se escorava no tronco da árvore de maneira tão tranquila enquanto se deixava relaxar sob a brisa que serpenteava em meio a floresta. Os pensamentos da moça ainda dançavam naquele tema, e inevitavelmente ela se viu quebrando o silêncio acolhedor entre eles.

— Eu queria ter uma história legal sobre um jutsu que você me ensinou – Ela disse depois de um momento fazendo o olhar dele se tornar curioso sobre aquilo — Quer dizer, eu sei que não foi por tanto tempo assim, mas eu também fui sua aluna e seria legal que as pessoas me vissem em batalha e pensasse “hey, essa é a aluna do grande Hatake Kakashi”, ou algo assim.

— Mas as pessoas dizem isso para você, mas no lugar do meu nome eles falam da Hokage. – Kakashi disse levemente confuso com a declaração da moça.

—  Bem, sim, e eu adoro que me vejam como alguém que honre os ensinamentos dela, mas também fui sua aluna e ninguém parece sequer lembrar disso – Sakura riu brevemente — Lembra do que falei sobre Naruto mais cedo? O mesmo ninja de Iwa ficou de queixo caído quando Naruto deixou escapar que tivemos o mesmo professor. Ele pensou que apenas Tsunade-sama tivesse cuidado do meu treinamento.

— Isso te incomoda? – Ele perguntou sem entender onde ela queria chegar com aquela conversa, e a viu dando os ombros com uma expressão genuína de quem não dá a mínima.

— Pra ser sincera eu só vim pensar nisso agora – E riu — Talvez eu só esteja querendo me gabar em cima dos seus feitos como Naruto anda fazendo.  

Se gabar? Kakashi pensou confuso. Ele quem tinha perdido uma óbvia oportunidade de ser relacionado com alguém do nível de Sakura, que modéstia a parte, era a melhor e maior kunoichi de sua geração.

Não podia negar que sentia uma certa satisfação pessoal ao ver seus três genins se tornarem ninjas excepcionais, porém Sakura tinha esse plus em tudo o que conquistou, afinal ela não tinha um pai Hokage, nem um clã famoso por trás de si, na verdade era até surpreendente que ela tivesse se tornado alguém tão relevante e pudesse ser equiparada com seus companheiros de equipe, que eram reencarnações de divindades.

Diante disso tudo, quem deveria estar se gabando era ele, e não ela.

Kakashi quem deveria estar falando para todos que tinha sido professor dela em algum momento.

Ele a viu tomar seu ensopado de maneira tranquila e realmente não parecia nenhum pouco incomodada com o significado daquela conversa, mas o fato é que aquilo tudo deixou um sentimento amargo na boca do ninja mascarado, e não que ele fosse o tipo de homem que tivesse um grande ego ou se preocupasse com sua fama no mundo, não era isso, mas ele tinha orgulho da ninja que ela havia se tornado e só agora percebia que não teve muita contribuição nisso tudo.

— Droga, você é um ótimo cozinheiro! – A viu resmungar divertida depois de bebericar um pouco mais daquele ensopado improvisado — Obrigada pela refeição, Kakashi-sensei.

Hm, sensei.

— Ok, que tal eu te ensinar um jutsu depois do almoço para você ter uma história legal para contar pros seus amigos?

— O que? – Ela disse levemente confusa antes de demonstrar algum tipo de urgência em sua fala, como quem foi mal compreendida — Kakashi-sensei, você não precisa fazer isso! Eu só falei por falar, não estou te cobrando nada.

— Eu sei, não me sinto cobrado. Sei que estou atrasado alguns bons anos, mas acho que posso te ensinar alguma coisa realmente útil e de quebra vamos ter uma história para contar.

Talvez ele estivesse sendo um babaca completo tentando ensinar qualquer coisa à uma ninja do nível de Sakura. Ela era brilhante e completa, Tsunade não tinha hesitado no seu treinamento árduo e ela havia absorvido tudo com uma ampla maestria, mas... Ela era uma ninja médica proficiente em taijutsu, e ele era um ninja versátil especialista em ninjutsu, então talvez tivesse alguma coisa para ensinar ainda que não tivesse nada a ver com ninjutsu.

A viu olhar para si com certo nível de desconfiança e descrença. Tomou mais de sua sopa enquanto considerava as palavras dele naquela calma tarde de começo de primavera. Talvez ele estivesse ficando louco, Sakura pensou, mas seria divertido ver o que ele tinha em mente diante da aleatoriedade daquela sugestão. Não era como se estivesse resistente, ela só estava...

Animada? Confusa?

Talvez um pouco dos dois.

— O que você tem pra mim hoje, sensei? – Perguntou com um olhar cúmplice e ele sorriu daquela maneira satisfeita.

— Vamos terminar o almoço e logo te digo o que vai ser.

Ele a viu sorrir de canto antes que ele pudesse apenas dar as costas para ter sua privacidade. Era algo que a moça já estava acostumada a presenciar, já que o rosto de seu antigo professor era um dos maiores segredos da Vila da Folha, e só por isso o gesto foi recebido de maneira tão natural, ao passo que aquele sorriso de canto que a moça havia dado mais cedo foi recebido de uma forma um tanto diferente.

Não era sempre que Sakura tinha aquela expressão no rosto e sempre que tinha coisas grandes aconteciam, como um desafio que ela já tinha considerado como ganho, mas ele não conseguia determinar o quê em tudo aquilo era um desafio. Talvez achasse que ele fosse ensinar algo muito complexo? Talvez o Chidori? Bem, ela não tinha os requisitos mínimos para isso – nem ele àquela altura – então o Chidori estava fora de cogitação.

O ensopado tinha ficado bom e ele se permitiu ter aquela refeição no seu tempo enquanto sentia a presença agradável de Sakura bem à suas costas. Tinham se acostumado com essa dinâmica e a presença de Sakura era sempre muito suave nesses momentos, quase compreensiva não fosse sua vontade de simplesmente dar a voltar a tentar espiar, porque ele sabia que a vontade estava toda ali.

Depois da refeição, o homem percebeu que talvez tivesse sido impulsivo demais. Ela era uma ninja completa, não precisava que ninguém ensinasse mais nada para ela e talvez estivesse sendo apenas gentil em não rejeitá-lo sumariamente, mas quando virou-se tal incerteza sumiu. Ela já estava de pé dando dois socos no ar como um aquecimento e ele apenas sorriu sem perceber.

Não podia negar gostar do jeito como ela energética sem ser espalhafatosa. Era óbvio que estava animada.

E quem não estaria? Aprender alguma coisa do grande Hatake Kakashi? Sakura certamente queria saber o que ele tinha em mente para ela, e mais ainda, queria saber o quão rápido levaria para aprender aquilo, afinal ela já tinha toda a técnica para dominar um jutsu em menos de uma hora e deixá-lo com o queixo caído. Tudo bem, talvez ela quisesse impressioná-lo um pouco, mas quem não gostava de impressionar o professor? Iruka sempre rasgava elogios à sua disciplina com os estudos teóricos, e Tsunade a reconhecia como uma igual em tudo o que lhe ensinou, mas Kakashi...

Não que ele não a reconhecesse, mas seria outro tipo de reconhecimento.

— O que vai ser, sensei? – Ela virou-se colocando uma mão na cintura — Alguma técnica como abertura dos portões? Eu sei que você consegue abrir até o quarto!

— Oh, não... Isso não – O homem maneou a mão na frente do rosto, ainda sentado em sua posição — Venha cá e sente aqui.

— Hm? – Deixou escapar com um momento de hesitação.

Kakashi deu dois tapinhas no vazio a sua frente e a moça apenas franziu o cenho antes de dar alguns passos na direção dele, sentando completamente confusa.

— Que tal irmos de genjutsu hoje? – Perguntou com aquela serenidade absurda que invocava quando bem quisesse.

— Oh – Ela disse parecendo pega numa surpresa nem ruim nem boa — É verdade, você tinha dito que eu era do tipo genjutsu.

— Sim, mas você nunca teve oportunidade de aprender, não é? Eu não sou nenhum especialista como a Kurenai, mas vou te ensinar os fundamentos e você pode criar alguns cenários.

— Mas eu já sei os fundamentos. Nós estudamos isso na academia.

— Você sabe a teoria básica. Eu vou te ensinar tudo na prática. – Ele esperou por um momento avaliando a reação dela.

Tinha que confessar que não esperava exatamente aquilo, porque Kakashi era muito melhor em ninjutsu, mas estava disposta a dar um voto de confiança ao homem desde que ele era quem era. Nunca viu Kakashi ensinar algo que não fosse útil.

— Tudo bem, estou pronta. – A menina disse convicta — O que eu faço?

— Me dê sua mão – Ele estendeu a própria para que ela colocasse os dedos delicados em cima dos calejados dele. Era engraçado porque as mãos dela sempre tiveram a aparência macia, mas ali em contato direto e sentindo o toque dela de maneira mais direcionada, Kakashi percebia que a pele de seus dedos era um tanto ressacada.

Enquanto Kakashi tomava ciência das nuances do corpo de Sakura, a mulher percebia um óbvio incomodo surgir em seu fluxo interno de chakra. Para alguns deveria ser bem sutil, mas para ela era como ter um cano entupido que podia ser facilmente resolvido.

Genjutsu.

— Não conserte seu chakra ainda – Ele pediu em sua voz tranquila — Sei que deve estar sendo uma tortura, mas tente se concentrar no ambiente ao seu redor.

— Eu percebi que você colocou mais árvores e pedras – Sakura comentou apontando com a cabeça para o local onde uma árvore aparecera do nada, assim como alguns pedregulhos e rochas fincadas ao chão. Kakashi concordou com a cabeça.

— Você está no meu genjutsu obviamente, e como uma ninja experiente, você não precisava sequer sentir o incômodo no chakra. – Ele sorriu satisfeito vendo-a lançar aquele olhar de sabichona — Esse é o tipo mais simples de genjutsu que há. Você pega o cenário e o modifica um pouco usando a experiência que tem e a do alvo também. Você sente que eu estou apenas distorcendo o canal de chakra que afeta sua visão, correto?

— Sim. Meus movimentos, olfato, paladar e outros sentidos estão no plano real, mas a minha visão tá submissa ao seu chakra.

— Eu to acessando um campo onde eu consigo pegar suas experiências passadas e, com um pouco de estímulo você acaba enxergando essas árvores e rochas que não estão aqui de verdade. Eu não estou te dando a minha visão de árvores, mas sim fazendo a sua visão completar o cenário.

— Entendi. É como se você dissesse para a minha mente “ali tem uma cadeira” e deixasse que minha cabeça completasse essa imagem com a cadeira que eu achar mais adequada. – Ela riu — Engenhoso.

— É o jeito mais simples de lançar um genjutsu de maneira eficaz, já que você não precisa dar detalhes específicos, e isso serve para quando você tem imagens conjuntas de algo. Por exemplo...

— Sakura-chan! Kakashi-sensei! – Naruto de repente surgia em sua visão, caminhando em sua jaqueta laranja com um dos braços completamente enfaixado.

Sakura riu.

— Oh céus, trouxe o Naruto para cá.

— É fácil porque você o conhece em detalhes, então eu só preciso dizer que “Naruto está aqui”, e sua mente vai só completar. Isso não vai funcionar se for alguém que você não conhece ou não lembra.

— Seu chakra também expandiu a influência pro campo da audição.

— Como esperado, você notou.

— Você não está sendo muito sutil.

— Estou tentando de verdade. A maioria dos ninjas não conseguiriam sentir isso.

— Eu não sou a maioria dos ninjas.

— Ah, eu sei.

Se entreolharam por um momento com aquela aura de bom humor entre eles. O diálogo era estranhamente fácil com Sakura, principalmente quando nenhum deles estava tentando realmente ter uma conversa. Ele achava engraçado sobre como ela ia de um extremo ao outro ora se perguntando se seria uma ninja relevante a ponto de ter histórias sobre si mesma circulando no mundo, ora apenas declarando não ser a maioria dos ninjas.

— Qualquer genjutsu é mais fácil quando seu alvo pode completar o cenário, e com isso é mais fácil dominar os sentidos. Por exemplo, um incêndio.

E no mesmo instante uma árvore começava a pegar fogo numa combustão repentina. Havia o cheiro intenso da fumaça subindo aos céus, a sensação de calor que se alastrava pela sua pele, o som crepitante das chamas descontroladas que queimavam num misto de tons em vermelho bem diante dos seus olhos. Sakura sentia o chakra dele bagunçar todo seu fluxo suave de chakra, mas sabia que se resolvesse se levantar, seu corpo o faria de verdade.

— E se for algo que o alvo desconheça?

Kakashi sorriu suavemente.

— Então você vai ter que ter essa imagem de maneira muito nítida na sua mente.

E então o incêndio cessou, e no lugar havia Pakkun.

— Oh! – Sakura soltou animada — Tão fofo!

Sim, pois a versão filhote de Pakkun surgia com seu focinho achatado e olhos enormes. Ele era um fofo que andava como se estivesse numa espécie de marcha atrapalhada com seu corpinho redondo e pequeno. Estava com seu uniforme azul ajustado para o corpo pequeno, mas a bandana ninja não estava estampada em sua cabeça.

Sakura resistia ao impulso de se levantar e buscar o filhote nos braços, mas sabia que se o fizesse, a sensação seria extremamente real.

— Nessa época ele ainda não sabia como falar – Kakashi disse se deixando levar brevemente pela memória — O Pakkun de hoje odeia suas fotos de filhote.

— Por que??? Ele é lindo!

— Você gosta das suas fotos de bebê?

— Bem... Algumas. – Ela respondeu incerta enquanto entendia o ponto do homem, que apenas riu satisfeito com a reação dela.

— Você entendeu? Eu tenho essa imagem bem nítida na minha memória, mas você não. Se eu tentar colocar algo que não lembro em sua totalidade, o resultado será bem óbvio.

Foi quando Pakkun sumiu dando lugar a uma silhueta confusa. Pela altura talvez fosse uma mulher, mas não havia como dizer com certeza e havia esse avental azul escuro que praticamente flutuava no ar.

— Quem é?

— Hm... – Ele soltou sem saber exatamente como responder aquilo, porque de repente ele percebeu que estava dando a ela uma visão de alguém intimo demais. — É a minha mãe. – Kakashi imediatamente a sentiu hesitar através da pressão tão suave que os dedos dela fizeram em sua mão.

— Ah! – Sakura soltou virando para o homem. Ele sorriu daquele jeito que dizia que estava tudo bem, e talvez Sakura estivesse com uma expressão mais séria.

— É, você não a conhece, e eu não lembro direito dela – Disse tranquilo — Por isso não funciona bem usá-la para um genjutsu.

A mulher de cabelos cor-de-rosa concordou com a cabeça sentindo que não sabia como avançar a partir daquele ponto. Era de seu conhecimento que Hatake Kakashi era filho de Hatake Sakumo, e apesar de nunca ter ido muito a fundo na história de vida de seu antigo professor, Sakura sabia do fim trágico de Sakumo de maneira superficial, mas nunca tinha sequer ouvido falar da mãe de Kakashi, que basicamente estava diante de si naquele momento como uma forma distorcida de uma silhueta confusa com avental.

— Você não conheceu sua mãe?

Foi a pergunta dela depois de um longo momento de silêncio.

— Ela se foi quando eu era muito novo – Ele respondeu com sua voz habitual — Eu não tenho lembranças dela, só esse avental e mais ou menos o som da voz dela.

Sakura ainda tinha perguntas e Kakashi não parecia ter problemas para responder qualquer questão que ela pudesse ter, mesmo assim a moça achou melhor apenas preservar o clima tranquilo que sempre estava com seu velho professor.

E então ela riu distraída.

— O que foi? – Kakashi perguntou genuinamente interessado naquela reação.

— Nada! Eu só... – Sakura se apressou a responder antes de soltar outra daquela breve e discreta risada — Não sei... Fiquei me perguntando se você se parecia com ela.

Kakashi sorriu antes de olhar para a silhueta disforme por um momento e voltar seu rosto tranquilo para a moça de olhos verdes bem humorados.

— Eu sou idêntico ao meu pai – Ele revelou com aquele ar de sempre e Sakura gostou sobre como aquele assunto não tinha se tornado algo pesado entre eles. — Mas vamos avançar um pouco com esse genjutsu.

— Sim, eu estou me segurando para não expulsar você do meu sistema.

— Aguente um pouco mais, ok? Estou quase acabando.

E com isso todo o cenário onde estavam se tornava uma pintura craquelada que lentamente se desmontava. Sakura sentia o chakra dele se movendo para definir o fluxo de chakra dela, tomando total controle não apenas sobre seus sentidos, mas também sobre seu corpo.

— Esse tipo é mais difícil já que você transporta a mente do alvo para uma realidade completamente diferente. Tudo o que acontece agora está no plano da mente e nenhum dos seus movimentos acontecerá de verdade no mundo real.

Sakura o olhou por um momento antes de olhar ao seu redor. Era tudo absolutamente branco numa vastidão de nada. Não havia eco ou vento, não sabia sensações muito nítidas além do vazio que não parecia exatamente um vazio. As vozes deles ainda se propagavam pelas partículas de ar, e Sakura ainda sentia a pele da mão masculina segurar a sua com leveza. Ela fez um pouco mais de pressão naquele aperto sem deixar sua mente vagar para o pensamento de que estavam segurando a mão um do outro por tempo demais, sentiu a mão dele de forma mais presente com o gesto e com a outra mão, ela tocou a si mesma, os cabelos, as roupas... Tocou o chão que não tinha contornos ou limitações, mas encontrou aquela camada estranha e invisível que os sustentavam sentados.

— Você consegue saber o que eu estou pensando com genjutsu?

— Não. Eu não sou capaz de invadir sua mente dessa maneira, mas posso invocar memórias que eu sei que existem dando um comando para sua mente.

— Então meus pensamentos soltos e sem forma estão protegidos?

— Sim. Só suas lembranças e pensamentos imagéticos podem ser revelados, e mesmo assim só se forem realmente nítidos, o que geralmente não são, por isso genjutsu é bem ineficiente para desbravar a mente alheia.

— Como deve ser o jutsu dos Yamanaka? – Ela perguntou de repente — Entrar na mente de alguém e descobrir seus segredos?

Kakashi considerou aquela pergunta por um momento sem saber direito como responder algo tão abstrato, tão amplo.

— Eu não faço ideia. Você nunca perguntou isso a Ino?

A moça desviou o olhar por um instante e parecia contemplativa de alguma forma.

— Eu só pensei nisso agora, então não... Eu nunca perguntei a Ino, mas agora fico me perguntando se ela não se sente um pouco perdida na mente das pessoas, com tantos pensamentos abstratos, memórias incompletas...

— O jutsu dela funciona de maneira diferente. Ela consegue acessar camadas da mente que um genjutsu não chegar nem perto, então... Sim, talvez seja confuso.

— Não é à toa que é um jutsu secreto, não é?

Kakashi a lançou um sorriso gentil e Sakura se permitiu apenas deixar aquele pensamento esvanecer. Sorriu de volta para o homem antes de voltar sua concentração no que estava acontecendo, e quando se deu por conta, a voz dele se fez presente.

— O que você estava pensando? – Ele perguntou e Sakura se viu piscar numa leve confusão — Depois que eu expliquei o que estava acontecendo com o genjutsu.

— Ah... Bem... – Deu os ombros desviando o olhar brevemente apenas para olhá-lo novamente — Nada em particular.

Era uma resposta insatisfatória e a única resposta que ela tinha para dar, mas ela não contava que Kakashi iria sentir aquele aperto tão sutil que ela fez em sua mão antes de simplesmente dizer aquelas três últimas palavras.

Só que aquilo não significava muita coisa.

— Ok. – Ele disse em tom de retomada, deixando aquele assunto para trás como se jamais tivesse acontecido — As regas aqui são as mesmas: Quanto mais nítido for o cenário na mente do usuário, mais real será na mente do alvo.

— Dá pra usar a mente do alvo pra completar o cenário?

— Sim, o princípio é o mesmo, mas se você for mais forte que o alvo e dependendo do seu intuito, você pode apenas ignorar isso e criar um mundo completamente irreal.

— Como assim?

— Bem, isso é mais fácil para quem tem um doujutsu como o sharingan, mas não é impossível de realizar para alguém que tem o controle do chakra perfeito, como você.

— E você? – Ela perguntou de repente. — Você consegue lançar algo assim?

— Aqui, com você ignorando meu chakra no seu sistema, sim, mas numa batalha real seria muito arriscado. É necessário uma precisão muito grande e um controle mais rígido.

De repente, Sakura sentiu o chakra dela conduzir o dela de uma forma quase cômica. Não estava direcionando-o para nenhum lugar especifico, mas Sakura entendia o que estava acontecendo, porque aquilo causava uma desordem que para a maior parte das pessoas poderia ser cansativo demais resolver, principalmente para as pessoas que não sentem o chakra correr, que não sabem a velocidade ou o volume do próprio chakra.

Paralelamente, aquele mundo branco se transformava. Kakashi havia colocado grama azul para nascer onde deveria ser o chão, e havia um lago na cor vermelha que cheirava a refrigerante de soda. Carpas voadoras, nuvens com os rostos de cada niken existente, um sol que brilhava em verde, e tudo era absurdamente irreal. Sakura riu daquela bagunça enquanto os elementos iam aparecendo um a um.

— Kakashi-sensei, eu realmente não sabia que você ia me colocar num genjutsu tão infantil. – Disse naquela provocação branda.

— Estou me esforçando para criar algo maluco aqui – Respondeu fazendo Lady Katsuyu surgir com óculos redondos gigantes em seu rosto — Mas confesso que minha criatividade é limitada.

— Percebi – Ela respondeu daquele jeito sarcástico, porém bem humorado, e Kakashi apenas aceitou que era um fracasso completo.

— O ponto aqui é mostrar que você pode criar um ambiente para fazer o oponente sofrer um pouco, ou muito, a depender do seu objetivo. – Ele disse enquanto todo aquele mundo recém criado ia se desfazendo — É preciso foco para manter os elementos funcionando, mas numa situação de combate você vai se concentrar mais em um único elemento.

— Isso me faz lembrar do teste dos guizos, lembra?

Oh, sim... Ele meio que lembrava.

Soltou uma risada sem graça enquanto recebia o olhar afiado de uma Sakura que recordava um desmaio causado pela visão de Sasuke a beira da morte. Kakashi não achou que seria tão efetivo, mas o ponto é que ela era apaixonada demais para perceber que estava presa numa ilusão sem sentido.

— Faz muito, muito tempo...

— Eu desmaiei.

— Foi?

— E fiquei lá por horas.

— Acho que foram minutos...

— Sozinha.

— Era um campo de treinamento controlado.

— E quando acordei acabei me deparando, logo de cara, com a cabeça de Sasuke-kun plantada como uma muda de algum arbusto.

— Oh...

— E desmaiei novamente.

— Mas você já não estava sozinha.

Eles se encararam por um momento e o cinismo de Kakashi em lhe responder com aquelas desculpas esfarrapadas era tamanho que Sakura apenas cruzou os braços sobre o peito, esperando alguma coisa. A mão dela deixou a dele para trás e Kakashi se permitiu fechar e abrir a mão repetidamente de maneira discreta.

— Yare, yare... – Soltou levando uma mão para trás da cabeça, coçando a nuca com aquela naturalidade.

— .... Você pegou pesado comigo! – Sakura declarou mais energética.

— Era um treino controlado! – Ele rebateu antes que ela pudesse acusá-lo de coisas mais graves.

Foi quando ela sentiu o chakra dele se mexendo dentro dela de uma maneira menos sutil do que antes. Suas mãos ainda deveriam estar conectadas no mundo real, mas ali no plano da mente parecia que ele havia dominado todo o fluxo de seu corpo de maneira quase displicente.

— O que está acontecendo? – Sakura perguntou confusa com a repentina mudança dentro dela.

— Estou te levando pra outro lugar.

Tinha funcionado.

A moça a sua frente havia perdido o foco da conversa enquanto ele deixava seu chakra muito mais evidente dentro do corpo dela, bagunçando todo o fluxo perfeito que ela tinha. Kakashi realmente não queria ter aquela conversa sobre o teste dos guizos pelo simples motivo de que não se arrependia de nada, mas Sakura parecia estar determinada a arrancar um pedido de desculpas, mesmo que fosse desonesto.

O melhor naquele caso, para ambos, era apenas mudar de assunto.

Foi quando a moça percebeu que estavam em Konoha, naquele descampado perto do canal. A água fluía levemente pela estrutura que havia sido construída para que a água pudesse ser conduzida pelo meio da área urbana. As árvores balançavam para lá e para cá num verde intenso, o sol brilhava não tão forte por entre as nuvens brancas, e o clima era ameno.

Mas havia algo estranho naquela cena. Não era a mesma Konoha que estava acostumada a frequentar.

Haviam menos prédios, e tudo parecia um tanto maior, ou menor. Ela não sabia dizer, mas a sensação era que estava no lugar errado, e por isso apenas girou no próprio eixo para ver a paisagem de forma completa, e encontrar, naquele penhasco além da torre Hokage, apenas três cabeças de pedra.

— O quê...?  

A moça franziu o cenho antes de olhar para as próprias mãos, pequenas demais para o que estava acostumada, macias demais para quem lidava com esterilização de modo cotidiano. Além disso, sua roupa estava errada, sua camisa jounin azul tinha sido substituída por aquela vermelha que usava quando... genin. Sim, seu cabelo estava grande novamente, seu short verde estava ali por baixo das pontas longas de suas vestes vermelhas.

— Kakashi-sensei! Você me transformou numa criança de novo? – Resmungou com humor — Sabe, Yondaime Hokage já tinha sua cabeça na pedra quando eu tinha treze.

— Mas quando eu tinha treze a vila só tinha tido três Hokages.

Sakura se virou na direção da voz para encontrar seu velho professor de forma muito nova. Seu cabelo prateado estava lá junto com a bandana azul orgulhosamente posicionada em sua testa. A máscara ainda parecia a mesma, apesar de cobrir um rosto um tanto menor, e ele ainda era mais alto que ela, mas apenas uns quatro ou cinco dedos. Havia aquela camisa de mangas largas com listras grossas nos ombros, e uma espada em miniatura nas costas.

— Hey! Era assim que você se vestia quando era genin? – Ela perguntou animada com a visão.

— Nessa época eu estava prestes a receber minha promoção para jounin.

— Ah, é verdade... – Ela disse de repente, colocando as mãos para trás daquele jeito característico de quando era mais nova. — É engraçado como os ninjas recebiam promoções tão rapidamente. Você com 13 já era jounin e eu só vim receber essa patente agora, com quase dezenove.

— Os tempos eram outros. A vila estava envolvida em constantes conflitos, muitos ninjas estavam morrendo cedo demais, por isso era necessário estabelecer um sistema que pudesse colocar ninjas na linha de frente o quanto antes.

Sakura considerou aquelas palavras olhando para a versão mais jovem de seu professor, que tinha uma voz muito menos presente. Era quase fina, quase grossa, e mesmo com palavras tão bem articuladas, ele parecia apenas um moleque falando. Bem, com treze anos, qualquer um era apenas um moleque levado aspirando ser um bom ninja ou qualquer outra coisa.

Mas não Kakashi.

Kakashi era um ninja completo segundo as regras para ganhar a patente jounin. Alguém funcional e analítico o suficiente para comandar uma equipe de ninjas e trazer sucesso para suas missões. Ele era uma arma, assim como muitos na idade dele naquela época – e até mesmo na época de Sakura.

O ninja a sua frente não teve tempo para conhecer sua mãe, perdeu o pai tragicamente, se criou sozinho no meio de uma guerra e conviveu com o estigma de ser filho de quem era. Kakashi perdeu seus companheiros de time na guerra, perdeu seu sensei, e viveu sozinho nas sombras por muito tempo.

Quando Sakura juntava todos esses pontos diante daquele garoto que tinha tropeçado tanto para se tornar alguém tão sereno, sua mente inevitavelmente se agitava com uma raiva quase descabida. Ela desviou o olhar sem perceber que estava séria demais. Olhou para os três Hokages ao fundo da paisagem e novamente para Kakashi, que teria seu rosto esculpido na pedra anos depois, ou meses se contassem no tempo real.

Kakashi a viu abrir a boca levemente antes de fechá-la novamente, como se estivesse decidindo as palavras que queria usar. Ele resistiu ao impulso de quebrar o silêncio entre eles, mas não sabia o que estava rondando a mente da mulher, se deveria de fato interromper, e apenas por isso ficou em silêncio, esperando pacientemente pelo que estava por vir.

— Sabia que Konoha abriu um orfanato?

...?

— Sim. – Ele respondeu um momento depois, e sem querer, Kakashi fez o vento soprar mais forte naquela realidade, fazendo os cabelos dela balançarem levemente.

— Ele tem vinte vagas – Sakura continuou cruzando os braços sob o peito, ainda olhando para o horizonte — No hospital nós fizemos uma estimativa de quantos órfãos restaram depois da guerra, e o número até onde eu sei, beirava uma centena.

O homem permaneceu em silêncio.

— Esse número abrange órfãos de pai e mãe, aqueles que perderam a estrutura familiar base. Alguns tem parentes que vão acolhê-los, mas estimamos que metade das crianças não tem pra onde ir, ou seja, cinquenta crianças para vinte vagas.

Ela riu sem nenhum humor.

— Eu fico pensando em Naruto, sobre como ele cresceu completamente sozinho numa casa. Ele não teve ninguém para ler uma história antes de dormir, ou olhar debaixo da cama para se certificar que não havia nenhum monstro, Naruto não teve o direito de ter medos infantis porque se os tivesse, então... Ele não teve ninguém para preparar seu almoço, e quem foi a pessoa que o ensinou a falar? Naruto se criou sozinho com o auxílio mínimo da vila, que era um dinheirinho qualquer. Ele era filho do Hokage, droga... Se o filho do homem que deu a vida para salvar a todos foi tratado daquele jeito, imagine todos os órfãos dos ninjas regulares que eu não pude salvar na guerra?

— Sakura, você não é responsável por isso.

— Eu sei! Eu dei o meu melhor para salvar o máximo que eu pude, mas e aqueles que eu não pude alcançar? Eu penso em você e como seus pais se foram quando você era tão novo, e de repente, com apenas treze anos você estava sendo enviado numa guerra! Onde as pessoas, os adultos, estavam com a cabeça? Sasuke-kun era o último Uchiha, viu o massacre do seu clã de camarote, e olha o que fizeram com ele? Pensão e te vira.

Kakashi continuou silencioso, apenas observando a maneira com que ela desferia aquelas palavras que não combinavam em nada com o rosto infantil que ela tinha naquela visão. A Sakura de trezes anos não tinha esse tipo de maturidade ou empatia. Ela havia mudado muito, é verdade.

— Eu sei que o mundo não é perfeito e guerras continuarão acontecendo. Temos sorte de estar em paz, mas paz é algo delicado, e nós temos que nos preparar não apenas para o conflito, mas para as consequências dele. As crianças precisam se atenção, principalmente as desafortunadas que tiveram o nome de seus pais gravados na Pedra Memorial.

Foi quando a moça sentiu uma mão sob seu ombro e finalmente percebeu que já não tinha mais a aparência de criança. Kakashi tinha devolvido seu corpo, seu cabelo, sua mão com toque ressecado, e suas roupas que não se pareciam em nada com o que usava quando tinha treze. Ela virou para ele, que também já estava em sua idade real, e Kakashi sorria de maneira gentil.

— Você está certa.

Ele disse de maneira tão simples, tão calma. Sakura manteve seu olhar nele e havia um nível de compreensão mútua que nunca antes havia se estabelecido daquela forma.  

— Eu tenho pensado em... Eu não sei... Talvez uma clínica de cuidados mentais para crianças? Eu venho com essa ideia na minha cabeça, mas ao mesmo tempo eu sinto que é tão pouco.

— Sim, é pouco, mas é um ótimo começo – Ele disse de maneira suave, ainda com a mão pousada no ombro dela — Faça um projeto por escrito quando voltarmos. Parece que eu vou ser mesmo o próximo Hokage, e já que estamos em paz, vamos aproveitar para cuidar do que realmente importa.

Aqueles olhos verdes enormes o miraram. Tinham pessoas que relacionavam verde com esperança, mas nela soava como determinação. Ela sorriu um pouco mais leve e concordou com a cabeça. Era um grande compromisso que estavam firmando ali, e tudo bem que eram só palavras, mas se havia alguém em quem ela podia confiar, essa pessoa era Hatake Kakashi.

— Conto com você.

— Não... Eu que conto com você, Sakura.

A mão dele deslizou pelo ombro até o braço dela antes do contato ser desfeito. Ela sorriu um pouco melhor e havia aquela cumplicidade estabelecida entre duas pessoas que se entendiam. Kakashi enfiou a mão nos bolsos daquele jeito absurdamente natural e Sakura riu virando para o horizonte. Ficaram um momento em silêncio.

— Esse era o seu lugar preferido em Konoha?

Ela perguntou.

— Eu vinha muito aqui, mas não chamaria de preferido. – Deu os ombros — É só um lugar.

De repente o local começava a mudar e Kakashi franziu o cenho. Havia concreto a baixo de seus pés e o monumento Hokage ganhava algumas outras cabeças. As árvores ao redor se transformavam em casas, o canal sumia rapidamente dando lugar à uma rua asfaltada.

É claro...

Ela tinha assumido o controle do genjutsu, e ele só sabia disso porque as coisas estavam mudando e Sakura estava tão tranquila ao seu lado. Kakashi não conseguia determinar onde estava o chakra dela em seu sistema, não havia nenhuma desordem evidente no seu fluxo, mesmo assim ele procurou com afinco e se concentrou de verdade, achando aquele fino fio, tão discreto, do chakra feminino que serpenteava de maneira tão absurda de suave. Era uma quantidade mínima e dançava com seu chakra de forma gentil, não parecia forçar nada, ao contrário, seu próprio chakra parecia fazer questão de seguir o dela.

Assustador.

Sakura realmente tinha o melhor controle de chakra do mundo, ele tinha certeza disso.

— Aqui é o meu lugar preferido – Ela disse vestida naquele jaleco branco e Kakashi percebeu que estavam no terraço do hospital de Konoha, com sua vista privilegiada. — Não é todo mundo que tem acesso ao terraço, e sempre está ventando. Dá pra ver Konoha toda daqui.

— Doutora Sakura, com sua licença, mas posso perguntar como diabos você me expulsou do seu sistema sem que eu percebesse e ainda se apossou do meu?

Ela encolheu os ombros colocando a língua para fora daquele jeito travesso. Tentava segurar o sorriso orgulho, falhando miseravelmente. Kakashi se permitiu rir num gesto quase incrédulo antes de se aproximar da beirada do telhado.

— Yare, yare... Você é mesmo discipula de Tsunade-Hokage.

— Ah... Eu acho que nesse caso você tem que dizer que eu sou mesmo aluna do grande Kakashi-sensei.

Oh, é mesmo...

Foi ele quem ensinou aquilo a ela, não é? Genjutsu.

Kakashi sorriu olhando para a moça de cabelo cor-de-rosa antes que tudo começasse a desaparecer como um sonho distante, até que novamente estavam sentados no meio da floresta e horas já haviam se passado. Suas mãos estavam conectadas num aperto gentil e a sombra das folhas das arvores criavam um padrão no rosto da moça, mas seus olhos verdes ainda brilhavam.

Lição encerrada.

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Notas finais do capítulo

PRÓXIMO CAPÍTULO: Kakashi e Sakura finalmente chegam em algum lugar....

CONTINUEM COMIGO! A VIAGEM TÁ SÓ COMEÇANDO E EU VOU FAZER UM SOPÃO PRA VOCÊS ♥



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