Presos Por Um Olhar escrita por Carol McGarrett


Capítulo 58
O Jogo


Notas iniciais do capítulo

E se preparem porque hoje tem jogo do Campeonato Universitário! Não entende nada de Futebol Americano, eu também não, mas lá embaixo tem um link para uma página que poderá te ajudar com os termos que eu usei aqui!
Boa leitura!



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— Então, que horas é o jogo? – Comecei com a pergunta mais inocente, assim que entramos no carro.

— 19:30.

— E temos que estar lá às?

— Quanto mais cedo, melhor. E já vou avisando, o estádio não é muito perto, então as duas, tratem de se arrumarem rápido.

— Deixa comigo, setä! – Liv respondeu.

— E nada de salto alto, a menos que você queira perder o Grande Prêmio. – Alex me alertou.

— Tudo bem.

Alex ia costurando pelo trânsito, sempre passando perto demais dos carros e ganhando algumas merecidas buzinadas, assim, chegamos em casa mais rápido do que o normal.

Liv correu para o quarto para se arrumar, eu aproveitei que ainda tinha um tempinho e fui brincar com meus cachorros no quintal dos fundos. Alex logo se juntou ao mim.

— E então, como você está?

— Comparada com a parte da manhã, bem melhor. Mas ainda um tanto revoltada por Liv ter caído no meio do furacão.

— E tem mais coisa... – Não era uma pergunta.

— Sim, minha irmã, o fato de que minha ex equipe ter sido demitida em Londres. E agora estou preocupada com o que pode acontecer no final de semana.

— Esse último está fora do seu alcance, não se preocupe por antecipação.

— Um tanto difícil de não fazer isso, Surfista. Não depois do choque de realidade que Kim me deu.

— Vai dar tudo certo, Loira. Te prometo. Só te peço para parar de se preocupar com coisas que não estão sob o seu controle. E para aproveitar a noite de hoje.

— Aproveitar o jogo?! – Questionei cética.

— É divertido, da arquibancada. Você vai ver. – Ele me disse e saiu meio que me empurrando para o quarto.

Me arrumei para o tal jogo, e quando encontrei com Liv no corredor ela tinha uma cara engraçada.

— O que foi agora? – Perguntei.

— Estava conversando com papai, mesmo que lá em Londres já passe da meia-noite.

— Então ele já sabe?

Ela deu um sorrisinho.

— Ele mandou te falar que, uma vez que os fofoqueiros de plantão acham que você é minha mãe, a partir de agora é você quem vai arcar com a minha educação, alimentação, vestuário e diversão. Disse que não gasta mais nenhum centavo comigo.

Levantei uma sobrancelha.

— Quer que eu passe a te chamar de mamãe? – Olivia teve a cara de pau de perguntar.

Revirei meus olhos e sai ordenando:

— Pegue seus sapatos, nós já estamos atrasadas, e nada de me chamar de “mamãe”! Não sou sua mãe.

Liv saiu rindo de volta para o quarto.

Hullu[1]. – Murmurei descendo a escada. – A família inteira é louca.

— Espero que você não esteja falando da minha. – Alex falou do sofá.

— Ah, não! Da minha mesmo.

— E o que aconteceu agora?

— Ian disse que como os fofoqueiros de plantão acham que Liv é minha filha, eu devo arcar com todas as despesas dela a partir de agora.

— Se ele quiser a gente pode muito bem ficar com ela por aqui. Hoje, por exemplo, ela já vai conhecer onde vai estudar daqui uns seis anos.

— E você é tão maluco quanto eles. – Emendei.

— Eu não, até você já está pronta para torcer para o time da futura universidade da sua filha! – Ele fez piada.

— Enche ainda mais a minha paciência que eu volto no quarto e pego a minha camisa de Oxford. Aí eu quero ver o que você vai falar.

— Mas é metida... enfiando uma Universidade velha como essa na conversa.

Nesse meio tempo Liv desceu, carregando o celular na mão.

— Uhn... täti, a äiti te mandou uma mensagem. – Me entregou o aparelho.

E na mensagem que Tanya havia me mandado estava assim:

Estou terminando de encaixotar as coisas da sua filha, providencie o transporte o mais rápido possível, um bem grande, pois a sua discípula tem tanta roupa e sapato quanto à mãe. E ela é sua responsabilidade agora.

— Isso está perdendo a graça.

Alex que tentou ler a mensagem por sobre o meu ombro – e não conseguiu porque estava em finlandês. – olhou para Liv pedindo pela tradução.

— Definitivamente me entregaram para a täti, sou responsabilidade dela agora.

— Não disse! Vamos levar essa menina para conhecer a Universidade onde ela vai estudar! – Ele disse rindo.

Respirei fundo e tive que me controlar para não arremessar o celular na cabeça dele.

A ida até o Rose Bowl não foi tão demorada assim, demorado foi encontrar uma vaga no enorme estacionamento.

— Isso não pode estar tão cheio! É um jogo de futebol universitário! – Falei sem pensar.

Alex me olhou atravessado e só respondeu:

— Você vai aprender que muitas pessoas levam mais a sério esse campeonato do que a Liga Profissional. É daqui que vai sair o substituto do Tom Brady, Peyton Manning.

— Vou fingir que conheço esses nomes. – Falei. – E ali tem uma vaga. – Apontei para o local.

Alex manobrou o carro e mal tinha descido, já foi ligando para o pai e depois para Will. Avisando da nossa chegada e que tinha achado um lugar com muitas vagas.

Não sei o que Will respondeu, porém, Alex se escorou no capô do carro e nos pediu para esperar.

Com pouco tempo, vi o carro de meu sogro estacionar ao nosso lado.

— Aconteceu um verdadeiro milagre, Kat está vestida como uma californiana! – Meu sogro brincou ao ver a minha roupa que consistia em Converse, calça jeans e camisa do Bruins.

— Para o senhor ver. – Comentei.

Ele me cumprimentou e depois cumprimentou Olivia, já contando para ela a história por trás do estádio e, com um movimento que eu quase perdi, colocou um boné, das mesmas cores das nossas camisas, na cabeça dela.

— Esse é para dar sorte! – Falou.

Will chegou não muito tempo depois, também brincando que hoje era o meu primeiro batismo como uma moradora da Califórnia.

— Achei que fosse o trânsito confuso. – Comentei enquanto íamos andando até a entrada.

— Esse é um deles. Então esse é o segundo.

— E tem mais?

— Ah, claro. – Ele disse com um sorriso que me fez arrepiar.

— E qual seria? – Inocentemente perguntei.

— O mais importante de todos!

— Que é? – Será que ele poderia parar com o suspense?

— Você ainda não sentiu a terra tremer, sentiu?

Eu parei onde estava e fiquei por uns quinze segundos pensando na frase de Will.

Droga, eu tinha me esquecido que a Califórnia fica sob a falha. Que Deus permita que não ocorra nenhum terremoto pelos próximos... 80 anos.

Will começou a rir da minha cara.

— É Alex, acho que essa daí nunca nem sentiu um tremorzinho de terra. No dia em que ela sentir, vai entrar em choque e pegar o primeiro voo para longe daqui.

Mal sabia meu cunhado que essa ideia estava se tornando uma possibilidade bem atraente agora...

— Nada, ela vai tirar de letra! – Alex disse todo confiante.

Não, eu não ia tirar isso de letra. Na verdade, eu já estava entrando em pânico antes mesmo de qualquer coisa acontecer.

— Será que vocês dois querem parar de assustar a Kat e a Liv. – Minha sogra passou dando um tapa nos ombros dos filhos. Depois se virou para nós e disse: - Não tem nada que se preocuparem. Acreditem em mim.

Chegamos até nossos lugares, pelo que pude notar, estávamos mais ou menos bem no meio do campo, e a meia altura, o que nos dava a visão total de todo o cumprimento e, por conseguinte, de todas as jogadas.

— Melhores assentos? – Perguntei para Alex.

— Lugar favorito do Velho. E se prepare, ele vai explicar para você e, principalmente para Liv, cada uma das jogadas. – Meu noivo disse, ao observar o pai pedir para Liv se sentar ao lado dele. – Ele fez a mesma coisa comigo e com Will. A diferença é que éramos bem mais novos.

— Não espere a mesma cortesia de meu pai no domingo, ele vai estar trabalhando.

— Mas espero de você. Você terá que me explicar o que está acontecendo a cada segundo da corrida.

— Melhor eu preparar um livrinho para você e Will. Não tenho a menor condição de explicar algo enquanto estou xingando alguns pilotos.

— É, sei. Você já demonstrou isso. Terei de recorrer à Liv.

— Ela é pior do que eu.

— Não sobra ninguém na família?

— Até sobra. A Elena. Mas ela só vai te explicar as coisas que ela quer.

— Pelo menos vou ter alguém para me ajudar a entender aquela bagunça!

— Não é bagunça! É um esporte como qualquer outro. – Expliquei.

Estávamos sentados, esperando que as coisas começassem de verdade. Algumas líderes de torcida se aqueciam do outro lado, o nosso vizinho de arquibancada já estava no terceiro cachorro-quente sem molho e meu sogro ainda explicava como era o futebol americano na prática.

— Pelo que ele falou, seu pai jogou futebol, não é? – Perguntei para Alex assim que ele retornou, tinha ido comprar água e alguns petiscos para todos.

— Sim, ele foi. Jogou pelos Bruins.

— Isso explica a paixão da família. – Apontei para Will que parecia que ia morrer de ansiedade.

— No final das contas, sua família é igual à minha, Kat. Só muda a nacionalidade e o esporte. – Alex me disse e me estendeu um pacote de pipoca. – E não ligue para as caretas que meu pai vai fazer para você por conta da pipoca, ele mesmo não come nada. Só fica na água.

— E você parece que vai para a cerveja.

— É, eu vou. E você vai voltar dirigindo por conta disso.

— Não ligo. Se divirta. Se nós nos perdemos e acabarmos do outro lado da fronteira, a culpa vai ser sua. – Respondi sarcasticamente.

Alex deu uma risada e nos viramos para o campo, parecia que algo estava para acontecer, dava para sentir a atmosfera do campo mudando, era bem parecida com aquela que antecede a largada da Fórmula 1.

E não deu outra, um enorme urso, a mascote da Universidade entrou em campo vindo dos vestiários, carregando uma bandeira nas mãos, e enquanto ele dava a volta correndo no campo, a banda começou a tocar, as líderes de torcida fizeram um corredor na frente da escadaria por onde o urso havia saído, todos ficaram de pé e assim que o primeiro jogador colocou os pés no campo, a torcida foi à loucura.

Olhei para Alex, ele tinha se transformado. Os olhos brilhavam e ele, assim como os demais torcedores começaram a cantar o que eu achava que era o grito de guerra do time.

Olivia me deu uma cotovelada e ficando na ponta dos pés, falou em meu ouvido.

— O jogo pode até ser diferente, mas a reação da torcida é a mesma!

— Com certeza. – Apontei para o sogro e Will.

Começamos a rir, sem saber o grito de guerra, apenas batíamos palmas no ritmo que o Urso pedia e para a minha surpresa, outro urso entrou em campo, ou melhor uma ursa. E eu nunca tinha visto um casal de mascotes na minha vida!

Com os times em campo – eu acabei perdendo a entrada do time adversário, o California Golden Bears, da Universidade da Califórnia, que eu descobri bem tarde ser um dos maiores rivais do Bruins e da UCLA, - O casal de ursos parou bem no meio do campo e com um gesto silenciaram a banda, deixando a torcida entoar o restando do cântico de “Mighty Bruins” à capela.

Com o fim do grito de guerra, a torcida, os jogadores e as líderes de torcida entoaram o grito de “Lutar, Lutar e Lutar” para então começarem a aplaudir.

Realmente eles levavam muito à sério, não só o jogo, mas a rivalidade com os Bears.

O campo foi desocupado para as verdadeiras estrelas brilharem, assim os capitães dos times se posicionaram ao lado do juiz para tirarem no cara ou coroa que começaria a partida com a bola e até nisso as duas torcidas fizeram pressão.

Para a alegria da maioria, os Bruins começariam jogando, e assim que o time de ataque se posicionou entre as jardas, a torcida, puxada pelos Mascotes, tornou a gritar “Lutar, Lutar, Lutar!”.

E a partir daí eu não entendi muito mais coisa, não sabia quem era quem – reconheci os times, claro, era impossível confundir o azul e dourado dos Bruins com o uniforme completamente azul dos Bears! – digo que eu não sabia o que cada jogador fazia campo e o qual era a sua posição.

Eu não sabia, mas Alex, Will e meu sogro sabiam muito bem o que se passava no campo. Sabiam tanto que não raro um dos três – ou os três – xingava ou começava a gesticular insistentemente.

Com a torcida já sentada, pude me voltar para a minha pipoca, feliz em ver que pelo menos saberia quando era hora de comemorar os pontos, quando o jogador que corria como uma flecha, cruzasse todas as 100 jardas e batesse a bola na endzone. Ou quando fizessem um gol, usando os pés, através de uma trave que ficava nas alturas.

Ao meu lado, Alex quase se matava de nervoso, murmurando coisas que eu não entendia, e eu estava era rindo das expressões dele ao invés de prestar atenção no jogo, quando algo muito importante aconteceu no campo, que resultou em uma reação em cadeia na nossa fila. Alex pulou de uma vez, soltando um sonoro palavrão, nesse ímpeto, ele esqueceu de calcular a distância entre nós dois e deu um tapa no meu pacotinho de pipoca que voou alto, caindo na cabeça da pessoa que estava sentada na minha frente. Meu sogro, que era até bem contido, deu um pulo e xingou o juiz. Will fez a mesma coisa, Pepper seguiu Will, mais no susto do que no entendimento, e começou a xingar na mesma altura que os demais torcedores, minha sogra escondia um sorriso, achando graça nas atitudes dos filhos, da nora e do marido, Olivia estava na ponta dos pés, tentando entender o que acontecia em campo e eu...

Bem, eu estava tentando me desculpar com a mulher que estava sentada na minha frente e que tinha tomado um estranho banho de pipoca.

— Me desculpe. – Falei. – É que meu noivo meio que se empolgou para xingar e calculou mal a distância. Não foi por mal. – Tentei por panos quentes, enquanto Alex, Will e meu sogro gritavam contra o juiz.

— Mais cuidado da próxima vez. – A mulher sibilou e eu só pude concordar.

Sentei-me novamente, mesmo que o restante do estádio estivesse de pé, chiando, reclamando e gritando.

Alguns minutos depois, todos se acalmaram e eu pude, enfim, perguntar para Alex o que tinha acontecido de tão importante.

— Foi um safety[2]. Mas o juiz não pensou assim. Era claramente um safety!

Fingi que entendi e voltei a prestar atenção no campo. Quase cochilando por não entender nada. E de tempos em tempos me via ficando de pé, ora para xingar o time adversário, ora para comemorar um ponto conquistado ou até mesmo pelos Bruins terem evitado um touchdown que teria sido decisivo.

Desisti de observar Alex para observar o campo, sem tentar entender nada em especial, apenas para ver o jogo, e foi aí que eu dei o primeiro vexame da noite.

Era um ataque dos Bears, como a grande maioria do estádio, eu queria que os Bruins interceptassem a jogada, o Wide Receiver dos Bears era rápido, mas não o suficiente, logo dois da defesa dos Bruins conseguiram alcançá-lo e, ao invés de simplesmente tentar desarmar o WR, eles voaram, literalmente, em cima dele, fazendo o WR dar uma pirueta no ar e cair deitado.

Foi um tombo feio, horroroso. E eu tive que soltar a seguinte pérola:

— Ai meu ciático! – Afinal, o WR tinha caído todo torto no chão, e eu senti a dor dele.

Meu noivo só olhou para mim e começou a rir. E não só ele, o pessoal da fila de trás também.

Parabéns, Katerina! Acabou de dar o atestado de que nunca vira um jogo de futebol americano na vida!

Na hora do intervalo, Alex e Will correram na lanchonete para comprarem mais um copo de cerveja para eles e água para o restante e eu, que ainda tentava evitar a mulher da fila da frente, fiquei quietinha no meu lugar, mexendo no celular, o que não impediu de a pessoa que se sentava atrás de mim, tomasse a liberdade de me cutucar. Quando me virei, me deparei com uma senhorinha com uma carinha de simpática.

— Seu primeiro jogo, não é? – Ela me perguntou.

— Sim. Nunca tinha visto nenhum no estádio. – Confirmei.

— Gostei do seu grito de “Ai meu ciático!” é exatamente o que eu sempre penso.

Senti meu rosto começar a esquentar.

— E não precisa ficar com vergonha. Nem todo mundo que está aqui, entende o que se passa lá embaixo. – Me garantiu. – E, depois de um tempo, você se acostuma com os tombos.

— Assim espero, alguns são assustadores.

— Falava isso para meu filho. Ele jogou pelos Bruins. Se estivesse vivo, estaria rindo de você e o modo como você parece não encaixar aqui.

— É, não posso dizer que é meu esporte favorito. E eu sinto muito pelo seu filho.

A senhora, ao invés de ficar chateada pelo filho, só soltou:

— Hoje ele está feliz, o time dele está ganhando do maior rival. – Disse saudosa.

— Aposto que sim. – Confirmei.

Ela se virou e viu que Alex se aproximava.

— Bom segundo tempo para você. E, por favor, não se acanhe em torcer do jeito que você sabe. É divertido.

— Obrigada. E toda sorte do mundo para os Bruins.

A senhorinha se voltou para seu marido que chegava com um pacote de amendoins para ela e eu olhei para Alex. Ele só olhou do casal de idosos para mim, me questionando o que tinha acontecido.

— Ela só estava me dando às boas-vindas ao Futebol Universitário. – Expliquei ao pegar a minha água. – E meio que rindo da minha forma torta de torcer. - Dei de ombros.

— Sinceramente, ela não está errada. Essa do ciático foi para matar qualquer um de rir.

Revirei os olhos, não iria discutir sobre isso, afinal, saiu sem querer!

Logo, meu sogro, chamou a atenção dos filhos e os três começaram uma resenha de meio de partida, discutindo no que o time tinha que melhorar, como se eles fossem os técnicos da equipe. E eu fiquei vendo a Banda da UCLA fazer o show do intervalo, até que reconheci o tema.

Clássicos do Rock.

O time ainda não, mas a banda já tinha uma fã!

Com o fim do show, jogadores retornaram do vestiário, dessa vez o kick off ficou à cargo dos Bears e com o apito inicial todos os olhos se voltaram para o campo. Eu voltei à minha torcida sem jeito e Olivia, que estava do meu lado, apenas gritava acompanhando a torcida.

A parte fofa era a paciência que Sr. Pierce tinha de explicar para Liv cada um dos lances, ele apontava para o campo, observava se estavam passando um replay no enorme telão e chegava até a demonstrar com as mãos para que a loirinha entendesse.

Não sei o quanto que Liv entendeu de toda essa aula particular, porém vi ela se levantando e antecipando o que foi o touchdown que decidiu a partida em favor dos Bruins. Ela começou a pular quando o quarterback passou a bola para um dos Running Backs— um handoff pelo que entendi até agora da narração. - que logo se desviou da defesa adversária de uma maneira que eu, sem querer, soltei um grito de “olé!! – Era o futebol errado para gritar assim, mas o desvio foi nesse contexto! – e disparou campo abaixo, logo encontrando um Wide Receiver para quem entregou a bola oval. Por sua vez, o WR disparou ainda mais rápido pelo campo, deixando os defensores literalmente no chão, quando finalmente cruzou a linha da endzone e, com uma firula e cheio de marra, jogou a bola no chão e saiu para comemorar.

A torcida foi à loucura. Faltavam menos de dez minutos e só uma ajuda muito especial para fazer com que os Bears virassem o jogo. E o pessoal do meu lado ficou tenso, mesmo com a partida quase encerrada.

Quinze minutos depois, o juiz, que foi xingado de todas as formas existentes e inimagináveis, encerrou a partida, para alegria dos Pierce que começaram a gritar, o já repetido à exaustão, “Lutar, Lutar, Lutar

— É isso, Liv. Esse foi um jogo de futebol. O seu primeiro. – Meu sogro olhou para ela.

E Liv estava extasiada, afinal, tinha entrado no clima e torcido, gritado e pulado a cada jogada nesse final de partida.

— Sim... nem parece que se passaram quase duas horas. Foi muito, mas muito emocionante. É confuso de se entender, mas é mais animado do que o futebol europeu.

— Então isso significa que você gostou?

— Sr. Pierce, eu adorei!

— Temos que providenciar ingressos para o Super Bowl, Alex. Ela tem que ver o que é show de verdade.

E a Loirinha começou a rir, querendo saber quando era isso.

— Em fevereiro.

— No meio do semestre? Como eu vou poder vir? – Agora ela olhou para mim, que tinha ficado um pouco para trás e ia andando devagar ao lado de Dona Amelia.

— Isso é entre você e seus pais. Eu não me responsabilizo por nada.

— Ih, Senhor Pierce. Eu vou ter que ver o calendário da escola.

— Eu vou conversar com o seu pai.

Mentalmente desejei sorte para meu sogro, Ian jamais permitiria que a filha faltasse de aula por conta de um jogo de futebol. Ele não deixa os filhos faltarem por conta da Fórmula 1!

— E você, Kat, o que achou do jogo? – Dona Amelia perguntou, e eu vi em seus olhos que ela já sabia a resposta.

— Eu não entendi muita coisa, uma meia dúzia de jogadas e até agora não sei o motivo de terem xingado tanto o juiz. – Apelei para a sinceridade.

— Conseguiu descobrir quem era quem dessa vez? – Ela ria.

— Distinguir os times. Sim. As posições dos jogadores e porque todos se tumultuam na beirada do campo, não passei nem perto!

— Que Jonathan não nos escute, acho o mesmo. Ele e os meninos adoram, vinham sempre. Bem, Alex deixou de vir por um tempo... Porém você deve ter percebido que o assunto entre eles é isso.

Dei uma risada nervosa.

— Dona Amelia, eu sei muito bem o que é isso. Somos assim lá em casa. Só muda o esporte.

— Falando nisso... você não enlouquece assim, enlouquece?

— Então... é... bem... assim, assim, como eles não.

— Ainda bem. Já basta o Alex de torcedor exagerado entre vocês.

Eu deveria ter mordido a língua ao invés de soltar.

— Eu sou bem pior. E já estou pedindo desculpas antecipadas por isso.

E ela começou a rir.

— Obrigada pela sinceridade. Pelo menos sei que você não ficou assustada com o palavreado e atitudes dos três.

— Acontece. A emoção fala mais alto nessas horas.

E Dona Amelia só balançou negativamente a cabeça, rindo de alguma piada interna ou só das terríveis coincidências que giravam em torno das duas famílias.

Já no estacionamento, com a grande horda de torcedores eufóricos diminuindo a cada segundo, alguém lembrou de trazer à tona três momentos bem específicos do jogo.

Os meus vexames.

Começando pela “A pipoca voadora”.

— Isso não foi culpa minha! O Alex quem esbarrou na minha mão na hora que ele enlouqueceu por conta do que acontecia no campo.

— E o acontecia no campo? – Will quis saber.

— Não sei, estava comendo pipoca.

E meu cunhado caiu na gargalhada.

— O melhor não foi esse. – Meu sogro interveio. – Foi ela gritando “ai meu ciático!”

Senti meu rosto ficar vermelho. Então ele tinha escutado isso. Ótimo! Jamais me deixariam esquecer!

— Ah, mas não! O momento do ciático foi até engraçado, mas nada supera o que eu ouvi. – Alex fez uma pausa dramática e olhou para o restante da família e depois para e mim e com um sorriso debochado, tomou fôlego, só para ter o seu grande momento interrompido por Liv:

— Acho que o certo, setä, é dizer “nós ouvimos”. – Liv completou.

Ole hiljaa![3]— Sibilei.

Liv deu uma pirueta e meio se escondendo atrás de Alex disse que não.

— Mas o que foi? Eu não escutei nem a história do ciático! – Pepper pediu.

— Ela gritou olé! – Olivia e Alexander disseram em uníssono.

E para que meu noivo foi passar essa informação para frente? Para que e por quê?

Primeiramente quatro pares de olhos me encararam, e meu rosto que já estava vermelho, esquentou ainda mais. Depois do choque inicial, vieram os risos.

Nem preciso falar que Will e Pepper riram de chorar, isso não é novidade. Inédito era meu sogro, que teve que se apoiar no carro para não cair de tanto que ria. Dona Amelia riu também, mas não na intensidade dos outros três.

Olé!? Você gritou olé? – Meu sogro perguntou.

— Em minha defesa, o movimento que o jogador fez...

— O Running Back. — Alex se intrometeu falando a posição do jogador.

— Sim. Ele. Então, o movimento que ele fez me lembrou um toureiro desviando do touro. Foi tão rápido e elegante quanto. Por isso o grito.

— Olé é grito do outro futebol... – Will disse assim que conseguiu recuperar o fôlego.

— E da tourada também. – Tentei sair dessa enrascada.

— Mesmo assim, Kat. Olé?! Com tanta coisa para gritar! Justo olé? – Claro que meu cunhado não desistiria.

Dei de ombros. Eu nem sabia o que deveria gritar!

— É, esse jogo entrou para história, não só pela humilhação que fizemos a Califórnia passar, mas por esses rompantes da Kat. – Senhor Pierce disse e só de se lembrar das cenas, ele recomeçou a rir.

Nos despedimos de todos e eu consegui tomar a chave da mão de Alex, afinal ele tinha bebido e tudo o que nós não precisávamos era de um susto nessa noite.

Antes de arrancar o carro, ainda vi meu sogro e meu cunhado rindo.

— Disponham! – Murmurei.

— Você deixou os dois muito felizes! – Alex falou do banco do carona.

— Com coisa que você não está se divertindo com isso.

— Eu estou. E muito. Mas sei que domingo será a sua vingança. E já estou até me preparando para isso.

Olhei de lado para ele e fiquei calada, mentalmente comentei:

Você não faz ideia do que eu vou aprontar com você, Surfista.

 

[1] Doida

[2] Ocorre quando o jogador de ataque é derrubado dentro da própria endzone.

[3] Fique quieta!


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Notas finais do capítulo

Para quem é tão leigo quanto a Katerina no quesito Futebol Americano e quer entender nem que seja o básico do básico: https://www.esportelandia.com.br/futebol-americano/regras-do-futebol-americano/
E é isso! Espero que tenham gostado!
Agradeço a você que está lendo e acompanhando!
Até o próximo capítulo!
xoxo



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