Presos Por Um Olhar escrita por Carol McGarrett


Capítulo 54
Entre Cavalos, Cowboys e Apostas


Notas iniciais do capítulo

É quarta-feira e hora de continuar com a visita de Olivia à Fazenda dos Pierces.
Boa leitura.



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— Bom dia, tia! – Olivia me cumprimentou assim que abri a porta do quarto.

— Bom dia! E, por acaso você estava plantada na porta do meu quarto, me esperando?

— Na porta não, mas estava te esperando para poder ir pra cozinha. Não sei se todos se levantaram, mas...

— Tudo bem, vamos lá. – E minha sobrinha foi saltitando do meu lado, já pronta para ficar em cima de um cavalo por todo o dia.

— O tio não vem? Ou ele já se levantou?

— Está dormindo. E deixa ele lá.

No meio do caminho já pude sentir o cheiro do café da manhã.

— Dona Amelia se levanta cedo, né?

— Sim, muito. E pelo visto você é o assunto da cozinha! – Parei de falar e começamos a prestar atenção na conversa de meus sogros. Os dois animados para ver quão bem Liv montava.

E a garota começou a ficar vermelhinha e me parou, segurando o meu braço.

— E o que foi? – Perguntei diante de seu olhar amedrontado.

—  Isso não é bom! – Ela sussurrou. – E se eu cair, tia? Ou pior, machucar algum cavalo?

— Você nunca machucou nenhum cavalo Liv. E as vezes em que caiu, não foi nada sério.

— Eu sei... mas só escute! Eles estão falando como se eu fosse uma campeã mundial!

— Liv, mesmo se o cavalo refugar, se você não conseguir pular um obstáculo, eles não vão ligar. Isso não é uma competição.

— Tia... eles acham que eu monto muito bem!

— Não. Escute direito, estão felizes porque tem mais gente para montar, e você ficou toda animada ontem para testar a pista de saltos. É sobre isso que estão falando.

— Ainda acho que estão colocando esperanças demais no modo como conduzo um cavalo.

— Não fique preocupada. Escolha um animal e se divirta. Só isso. – Acalmei-a e logo estávamos entrando na cozinha.

— Bom dia! – Acabamos falando juntas.

Dona Amelia veio logo nos dar um abraço de bom dia e perguntar como passamos a noite.  Depois, fui até meu sogro e o cumprimentei, Olivia fez o mesmo.

— O cheiro tá muito bom! – Minha sobrinha começou.

— Quero saber uma coisa. – Dona Amelia disse e deslizou uma panqueca para o prato que estava na frente de Liv. – São ou não melhores do que as de Dottie?

Eu, que tinha ido assumir o fogão, onde o bacon e os ovos estavam sendo fritos, só escondi a minha risada e observei Liv ficar vermelha, destacando as sardas que ela tinha.

Liv pegou o garfo e a faca, derramou um pouco da calda de chocolate e colocou morangos em cima e deu uma generosa garfada.

— São muito melhores! – Disse depois que comeu o primeiro pedaço.

Meu sogro deu uma sonora gargalhada.

— Amelia, não faça mais isso com a menina! A pobrezinha não sabe o que faz para te agradar e você tenta pregar uma peça nela justamente com comida?

Liv ainda tinha os olhos arregalados diante da cena, e minha sogra só disse.

— Só brincando com você, minha querida. Fique à vontade para comer o que quiser e o quanto quiser.

Liv só pegou mais umas panquecas e retornou a comer, conversando com meu sogro sobre os cavalos.

Só nós quatro tomamos café, os outros três ainda estavam apagados para o mundo e continuaram assim até quando saímos para a área de salto. No estábulo onde os cavalos de competição ficavam, Sr. Pierce deu total liberdade para Liv escolher o cavalo que quisesse.

Ela rodou um tempão até que escolheu um belo Andaluz negro com meias brancas, chamado Ares.

E enquanto ela se entendia com Ares, minha sogra e eu paramos perto da cerca e ela começou a falar sobre como estava feliz em ter uma criança por perto, além de dizer que queria que fizéssemos as selas para deixarmos por aqui.

— Posso trazer uma da Inglaterra. Vai ser até melhor. Não teremos que ficar medindo. – Respondi.

— O que me leva a outra questão. – Ela continuou.

— Que é?

Quando você vai mostrar que sabe montar?

Dei uma risada.

— Em dezembro quando Prince Hal chegar. Só confio nele para poder pular. Assim como Liv confia muito em Chocolate. Portanto, não espere um show logo na primeira volta. – Indiquei a garota que estava colocando o capacete.

— Está faltando o chicote. – Meu sogro comentou, parando ao lado da esposa.

— Isso é erro meu, deveria tê-la ensinado a usar um, porém eu detesto chicote e Olivia meio que me imitou nisso. Mas não se preocupem, mesmo sem o chicote para ajudar a guiar o Ares, ela vai conseguir domá-lo.

— Você não usa chicote?

— Nunca usei e nem esporas. Sei que não machuca quando são usados com a finalidade certa, mas meus cavalos são animais que confiam tanto em mim que me é impossível pensar em usar algo que poderia vir a machucá-los.

— E como você domou um Puro Sangue Árabe sem chicote e esporas?

— Sr. Pierce, acredite ou não, foi com muita paciência e persistência, juro para o senhor, eu passei as primeiras trinta e seis horas ao lado dele, só para que ele pegasse confiança em mim e assim eu pudesse passar a rédea por sobre sus cabeça.

— Creio que os próximos cavalos que chegarem vou colocar você para domá-los. – Ele brincou e voltou a sua atenção para Liv que já tinha conseguido montar Ares e dava os primeiros comandos para começar um trote.

— Será um prazer. Adoro fazer isso. – Respondi e imitei o seu gesto, só que, como sempre, fiquei um tanto nervosa de ver a minha sobrinha no lombo de um cavalo desconhecido, e quando dei por mim, estava sentada na cerca, batendo a bota em ansiedade, no momento em que ela se preparava para o primeiro salto. E nem sei o porquê que eu ficava assim, afinal Liv era uma amazona talentosa e sabia controlar a montaria muito bem.

E ela foi passando pelos obstáculos com uma firmeza e elegância que minha sogra faltava pouco bater palmas, quando ela estava realmente confiante que Ares a obedeceria plenamente, acelerou a cavalgada e colocou o cavalo na linha do obstáculo mais alto entre todos.

Era um salto de noventa centímetros de altura e de quase um metro de distância, tendo em vista o lago que ficava logo embaixo e no qual o cavalo não poderia pisar.

Dona Amelia se endireitou do meu lado, meu sogro até tirou o chapéu de cowboy que usava, eu agarrei a madeira da cerca com mais força.

E o salto foi perfeito, tão perfeito, que Liv, logo depois que Ares tocou o chão com as quatro patas, reduziu a cavalgada e começou a acariciar o pescoço dele. Depois olhou na nossa direção e veio sorrindo.

— Não fui tão mal, né? – Disse parando na nossa frente.

— Não, minha querida. Para quem não conhece o cavalo, vocês foram perfeitos.

Meu sogro concordou com a esposa e Liv ficou ainda mais feliz, não só ela como Ares, que pareceu gostar muito da amazona que o guiava.

— Tia?

— Fui muito bem. Só corrija a sua postura quando aterrissar ou você pode ficar com dor nas costas.

— Sempre a postura, né? – Ela disse com um sorriso. – Mais alguma coisa?

— Cuidado com a curva mais fechada, Ares deu uma escorregada que não é normal. – Continuei minhas observações.

— E?

— Creio que você pode ser mais veloz do que isso, porém está se acostumando com Ares. Vá lá tentar de novo. E postura!

Minha sobrinha jogou os ombros para trás, endireitando as costas e recomeçou a cavalgada, escolhendo por qual dos obstáculos ela passaria primeiro.

 - Sempre perfeccionista assim, ou é só com ela? – Dona Amelia me perguntou.

— Com tudo e com todos. Um defeito meu. Mas ela já está mais do acostumada, e Elena também.

— Elena já monta?

— Um pônei. Está aprendendo a ficar sentada em cima do bichinho sem sufocá-lo com tantos abraços.

Minha sogra riu.

— Estou tentando imaginar Elena mais abraçando do que montando um pônei.

— Não é difícil de se imaginar, Lena tem a mania de abraçar qualquer coisa. Não era nem para nos deixar abismados, mas, enfim, é Elena. Tenho o vídeo dela dando as primeiras voltas, se a senhora.... – Nem terminei e minha sogra já tinha estendido a mão.

Peguei o celular no bolso da calça, procurei pelo vídeo e mostrei a ela.

Elena fazia a verdadeira bagunça em cima do pônei, a quem ela nomeou de Algodão Doce, e, ao invés de ficar sentada, se deitava com o intuito de passar os braços pelo pescoço do animal. E a cada vez que alguém mandava ela ficar sentada direito, ela só soltava uma gargalhada e ia e abraçava Algodão Doce de novo.

Meus sogros viram o vídeo umas três vezes direto e riam cada vez mais ao ver minha sobrinha mais nova se divertindo com o pônei.

E enquanto eles se distraiam com Elena, Olivia estava cada segundo mais confiante em cima do cavalo Andaluz.

— Reduza essa velocidade! Ou ele não vai fazer a próxima curva! – Alertei

— Mas, täti!

— Ele está escorregando, Olivia! Você está entrando muito rápido e puxando a rédea de uma só vez. Isso está confundindo Ares. Ou um comando, ou outro.

Liv parou a sequência e veio para perto de mim.

— Mas ele quer correr.

Encarei minha sobrinha.

— Ele ou você? Porque estando selado assim, duvido muito que um cavalo que é saltador, queira sair correndo como se estivesse em uma prova de turfe.

Chocolate entra rápido nas curvas e consegue se controlar.

Chocolate te conhece. Você o monta desde que ele era um potrinho. Ele está acostumado com você. Ares não. Respeite o cavalo ou pare de montar.

Olivia não ficou muito feliz com o que eu falei, contudo, desmontou e foi olhar uma coisinha.

— E o que foi agora? – Perguntei.

— Pode parecer besteira, porém, eu acho que tem alguma coisa errada com o Ares. E deve ser nas patas, por isso está escorregando. - Ela rodou o cavalo e começou a levantar os cascos dele.

— Achei!

Pulei para dentro do cercado, meu sogro fez a mesma coisa.

— Tem que lixar o casco dele. Ele está escorregando é por isso. A ferradura deve estar incomodando. Sr. Pierce, onde tem uma lixa? É só o senhor me falar que eu deixo o casco dele brilhando.

Meu sogro saiu reclamando que tinha mandado lixar os cascos de todos os cavalos na sexta-feira, e pelo visto, esqueceram de Ares. Já minha sogra, tinha se juntado a nós e estava acariciando o pescoço do cavalo.

Meu sogro voltou alguns minutos depois e já ia começar a lixar os cascos, quando Olivia o impediu.

— Pode deixar que eu faço.

Ela se sentou na areia e logo começou a lixar.

Minha sogra só arregalou os olhos.

— Não liga. Quando Liv disse que precisávamos arrancá-la da área de salto, ela não estava brincando. Se deixar faz tudo sozinha. – Expliquei e voltei a me sentar na cerca.

Com pouco minha sobrinha terminou, deu uma conferida no trabalho e depois deu espaço para o Sr. Pierce conferir.

— Ficou muito bom, Olivia. Muito bom mesmo. – Ele elogiou.

— Obrigada, Senhor Pierce! – Ela respondeu toda sem graça.

— Agora vá e volte a montar, afinal foi para isso que você se levantou tão cedo.

Ela deu uma limpada na roupa e logo estava em cima de Ares novamente, testando como ele estava se sentindo primeiro.

— Eu acho que agora ele está bem. Até a forma como ele está correndo mudou. – Ela gritou do outro lado da pista.

— Dê seu melhor. – Minha sogra respondeu.

Outra volta e Olivia recomeçou o percurso.

E como ela havia dito, tanto a corrida, quanto a aterrissagem de Ares haviam mudado.

— Não acredito que uma garota de 12 anos consegue lixar os cascos de um cavalo melhor do que os tratadores cheios de curso que contratamos. – Meu sogro murmurava.

— Eu só acho, Jonathan, que no caso de Liv não é estudo ou a falta dele. É carinho. Ela gosta dos animais. Por isso fez o que fez.

— O que a minha sobrinha aprontou agora? – Escutamos a voz de Will atrás de nós.

— Só nos ensinou como tratar dos cavalos. – Sr. Pierce murmurou.

Quando Will parou do meu lado, eu tive que olhar duas vezes para acreditar no que meus olhos viam.

— Onde é o rodeio? – Me vi perguntando.

E Will deu um passo para trás, me mostrando seu look cowboy completo.

— Estou pronto para ficar aqui embaixo o dia todo. – Disse tocando na aba do enorme chapéu.  – E é isso o que nós usamos por aqui.

— Claro, claro. – Respondi e depois tive que morder a língua para não rir ainda mais pois, desmontando de Duke, também com um visual de cowboy completo, vinha Alex.

Desviei meu olhar para a pista, onde Olívia ainda teimava em ir rápido demais em uma curva fechada com um cavalo desconhecido.

— E então, como a futura campeã olímpica está se saindo? – Alex perguntou parando do meu lado e eu precisei de toda a minha força de vontade para respondê-lo sem começar a rir.

— Teimosa como sempre. Ainda mais com um cavalo que não é o dela.

Alex começou a observar o conjunto e a escolha que obstáculos que eles faziam. E eu dei uma olhada pelo canto do olho no que ele vestia e usava.

Meu Deus, que roupa ridícula! Precisava de todas essas franjas por cima da calça jeans? E do cinto com fivela? E das botas? AS BOTAS!!!

Eu juro que estava tentando me comportar e não falar nenhuma besteira sobre o que os irmãos estavam vestindo, afinal não queria briga com ninguém.

Mas eles estavam testando todos os meus limites. Pois até Pepper estava com botas e chapéu de cowgirl.

Vai ser difícil não falar nada. E ainda mais complicado não magoar ninguém hoje.

E enquanto eu me decidia internamente como não rir dos trajes de rodeio ao lado, Olivia cismou que estava mais do que pronta para um salto extremamente complicado.

— Será que vai dar? – Pepper murmurou ao lado de Will.

— Agora ela vai conseguir. – Dona Amelia respondeu.

Vi Alex ficar nervoso do meu lado e eu comecei a bater a bota na parte de baixo da cerca.

Minha sobrinha pegou velocidade e quando se apoiou só nos estribos se preparando para o salto...

Ares refugou, fazendo com que ela voasse por cima de sua cabeça e fosse de encontro com o chão.

— OLIVIA! – Gritamos. E como eu era a única que estava dentro da área destinada aos saltos, saí correndo até ela.

— Eu tô bem! – Escutei ela murmurar.

— Tem certeza? – Indaguei, ao mesmo tempo em que me ajoelhava ao seu lado, Ares, estranhamente, tinha trotado para o lado de Olivia e agora meio que a cheirava, como se verificasse se ela estava bem.

— Tenho, täti. Já voei mais longe do que isso. – Ela me disse, esfregando a cabeça.

— Bateu a cabeça?

— Bati o nariz! – Ela me corrigiu e eu olhei para seu rosto. A ponta de seu nariz estava vermelha e ralada, além da ponta do queixo.

— Você precisa ir se lavar. Seu nariz está sangrando.

— Meu Deus, Olivia! Você está bem? – Dona Amelia chegou desesperada.

— Sim, Dona Amelia. Foi o que eu falei com a tia, já caí mais longe do que isso. – Respondeu ao tentar se levantar.

— Tem certeza de que está bem? – Meu sogro estendeu a mão para ajudá-la.

— Sim, Sr. Pierce, eu tenho. Só estou tentando entender o motivo de Ares ter refugado. – Ela olhou intrigada para o cavalo que era segurado por Will.

Com pouco apareceu Alex com um kit de primeiros socorros.

— Tio, eu tô bem. Não preciso disso.

— Para o seu nariz e queixo, Olivia. Você tem que limpar isso aí.

— E o joelho. – Apontei para o joelho direito dela.

— É sério... – Ela começou a recusar a atenção, contudo não teve jeito, com todos olhando para ela, minha sobrinha pegou o kit e saiu murmurando em finlandês que erámos exagerados.

— Eu vou com ela. – Falei. – Ou é bem capaz de ela não limpar os machucados direito e falar que está tudo bem, só para voltar a montar. – Sai correndo atrás dela. O que foi um alívio, pois com isso eu garantiria que Olivia estava realmente bem e ficaria o mais longe possível dos pseudo cowboys.

Assim que alcancei Olivia, que ainda ia reclamando que ninguém precisava fazer todo esse drama, que ela estava bem, minha sobrinha deu um pulo.

— Credo, tia!

— Anda, acelera aí, vamos desinfetar esses machucados. – Meio que sai empurrando a menina.

Olivia quando quer, é teimosa e foi contando passo até a casa, porém, quando eu estava limpando seu queixo, ela me perguntou.

— Uhm... tia.

— Que foi?

Ela teve que respirar fundo, porque deve ter ardido quando passei o antisséptico.

— Eu bati a cabeça ou o tio tá com uma roupa completa de cowboy?

— Sim, ele está. – Falei sem olhá-la e tentando me concentrar em não começar a rir.

— Me desculpe, eu o adoro, sei que a senhora ama seu noivo, mas... e esse é um MAS, bem grande, ele tá ridículo naquilo.

Parei o que estava fazendo e tive que me escorar na parede para não cair sentada, porque eu estava até chorando de rir.

— Eu sei. E esse foi um dos motivos para que eu viesse te ajudar. Está complicado ficar do lado de Alex com ele está vestido daquele jeito. E ainda tem o Will e a Pepper.

— Eu vi!! Mas, por quê?? Pra que?? Completamente desnecessárias aquelas franjas e fivelas e chapéus. OS CHAPÉUS SÃO ENORMES!! – Olivia me acompanhou na gargalhada. – E o que são aquelas botas??

— Eu concordo com tudo o que você disse aí, porém, vamos tentar manter as aparências e não comentar nada, afinal, não queremos ser visitas inconvenientes.

— Eu sei, tia, vai ser complicado.

— Para você nem tanto, já que muito provavelmente vai voltar para cima do cavalo, já eu... vou ficar do lado deles.

— Fácil, por que não monta?

—  Furia de la Noche não é um saltador. E eu não vou tentar nenhum outro cavalo que não seja Hal, assim, terei que ter muita força hoje.

 - Boa sorte! – Liv me respondeu. – Já acabou?

— No rosto, sim. E o joelho?

— Só sujei a roupa, não tá machucado. Mas está doendo. Devo ter batido quando aterrissei.

— Se começar a incomodar muito, por favor, pare. Forçar pode ser muito pior.

— Pode deixar. Agora podemos voltar? – Me pediu.

— Preparada para fazer cara de paisagem? – Perguntei a ela, cutucando sua cintura.

— Estou preparadíssima para meu papel mais importante! Vou até ganhar um Oscar por ele! – Disse entrando na brincadeira.

— Ótimo. Eu só vou pegar uma coisinha.

— O que?

Corri no quarto e voltei com meus óculos escuros.

— Isso não combina com montaria. – Liv disse cética.

— Mas vai me livrar de uma dor de cabeça. – Expliquei.

Descemos devagar, conversando sobre como Olivia estava montando e no que ela tinha que melhorar. E assim que nos viram, tanto Alex quanto Dona Amelia vieram ao nosso encontro.

— Jesus... com o vento fica pior! – Murmurei ao ver as franjas da calça de Alex.

— E qual é o veredito? Liv está realmente bem? – Ele começou falando.

Me concentrei mais em minha sogra, que parecia fazer um inventário completo dos machucados no rosto de Liv, do que em meu noivo, para respondê-lo.

— Ela está bem. E só parecia feio porque estava sujo. – Falei.

— Posso ver, minha criança? – Minha sogra pediu e levantou o queixo de Liv com a ponta dos dedos. – Não vai nem ficar marca. Mas seria muito bom se você não pegasse sol. Quer que pegue um chapéu para você?

— Não precisa Dona Amelia. Como a täti disse, é só um arranhão. Amanhã não tem mais nada.

— Mesmo assim eu vou pegar. – E saiu minha sogra de volta para casa. Olivia olhava para ela com uma expressão que ficava entre o desespero e a desolação total.

— Vai voltar a montar, Liv? – Alex perguntou.

— Vou. Isso se Ares ainda me deixar montá-lo.

— Tenho certeza de que vai. Não foi sua culpa. Ele se assustou. – Alex ia caminhando do nosso lado e eu estava fazendo um ótimo trabalho ignorando a sua roupa, afinal, eu virava a cabeça na direção dele, mas não o olhava. Escondida como estava pelos óculos, poderia olhar para qualquer direção que ele nem perceberia.

— Se assustou com o que? – Perguntei.

— Uma cobra. Estava enrolada no pé do obstáculo.

— UMA COBRA?! - Liv deu um grito esganiçado. – Jura?

— Não se preocupe, era venenosa, mas não vai atrapalhar sua montaria. E nós já passamos o pente fino na área, não tem mais nenhuma.

Eu e Liv olhamos para a pista e me deu uma sensação de querer voltar para a segurança da casa...

Chegamos perto da cerca e Ares estava ali, amarradinho, esperando sua amazona.

Passamos pela cerca e Liv se preparava para subir, quando minha sogra chegou com um enorme chapéu branco, a garota só não se encolheu em desespero porque seria uma falta de educação.

— Prontinho! – Disse Dona Amelia assim que colocou o chapéu de cowboy na cabeça de Liv.

Ela me olhou como que pedindo ajuda, assim, cheguei perto dela, fingindo que iria ajudá-la a se firmar na sela e disse em seu ouvido.

— Começa pelo chapéu.

Olivia se ajeitou na sela. Endireitou os ombros e antes que ela pudesse sair do lugar, eu já estava sentada na cerca e tirava uma foto dela, que mandei para Ian, Tanya e meus pais.

Conhecem essa cowgirl?— Foi a legenda que coloquei.

Meu irmão me respondeu na hora.

Enfim tenho notícias da minha filha. Mas qual é o motivo do chapéu?

Por que vestiram minha filha de cowgirl? Isso é alguma espécie de iniciação?— Tanya mandou.

Nem 48 horas nos EUA e já está assim. Deixa seu avô ver isso.— Minha mãe respondeu.

O que fizeram com a minha neta?— Esse era meu pai.

Ninguém fez nada. Dona Amelia só deu de presente para Liv, para que ela não ficasse tomando sol no rosto. — Expliquei.

Alex parou do meu lado e tentando ver a tela do celular, me perguntou.

— Tá tudo bem com você?

Então minha atuação não tinha sido tão convincente assim, já que ele percebeu.

— Sim, por que não estaria? – Sai pela tangente.

— Você não me deu nem bom dia. – Falou do meu lado.

Dei uma conferida nos arredores. Meus sogros estavam distantes, observando a volta de Liv. Will e Pepper tinham desaparecido.

— Só isso? Só por conta do bom dia que não te dei? – Retruquei. – Se for assim, então, bom dia!

Porém, ele não ficou satisfeito, e me fez olhar para ele. Ele segurou meu rosto virado para si e eu tive que fechar os olhos, me concentrando em manter uma expressão relaxada.

— Kat... você não me engana. O que está acontecendo?

Fiz um biquinho.

— Nada, Alex. Para com a paranoia.

Ele não caiu na minha lábia.

— Katerina Elizabeth Nieminen... nem parece que há algumas horas estávamos falando sobre nosso noivado. O que...

Tampei a boca dele.

— Nada de falar em noivado agora. Já temos a data para anunciar e eu sei que você está extremamente feliz com isso. Então, silêncio. – Pedi.

Voltei a prestar atenção em Olivia que parecia ter perdido a confiança em Ares, e agora só dava saltos mais baixos e de menor complexidade.

— Foi o tombo ou por eu ter falado da cobra? – Perguntou preocupado com a maneira com a qual ela guiava o cavalo.

— A cobra. Um tombo não a assusta. Ela foi sincera quando falou que já tomou tombos piores. Mas ela tem verdadeiro pavor de cobras.

 - E você? Não vai montar?

— Só vou para os saltos com Prince Hal. Não tem jeito, não confio em outro cavalo.

— Você parece se dar muito bem com Furia. – Ele comentou.

Furia não salta. – Pontuei. – E nem Duke. – Falei quando ele se virou para o mustang que estava parado atrás de nós.

— Mas os dois são excelentes corredores. – Alex disse com um sorriso de lado.

— E onde você quer chegar com isso? Porque, da última vez, se me lembro bem, você me deixou para trás e eu te fiz comer poeira.

Alex fez uma breve mesura com o chapéu e completou.

Três tambores. Nós dois. O que você acha?

— É uma prova de mulheres! Por que justo essa?!

— Só para você ver o que eu sou bonzinho com você!

Fiquei desconfiada de tanta boa vontade e tive que perguntar:

— Valendo o que?

— Achei que você já estava farta de apostas com os Pierces.

— Eu posso ter perdido uma aposta para Will. Mas ganhei duas de você. – Cutuquei seu peito, já que ele estava virado para mim.

— Então pode pedir qualquer coisa. – Ele disse como se não se importasse.

Qualquer coisa mesmo? E você não vai implicar ou ficar com raiva?

— E por que eu ficaria com raiva de algo que você me vai me pedir? – Disse todo charmoso, chegando perto de mim.

— Só guarde essas palavras. – Falei antes que ele pudesse chegar ainda mais perto, desviei meu rosto.

Escutei seu murmúrio de desagrado ao mesmo tempo em que observei que Liv iria tentar novamente o salto que Ares tinha negado em dar.

Minha sobrinha se concentrou, alinhou o Andaluz e deu o comando para que ele acelerasse o suficiente para dar um salto perfeito.

E foi o salto perfeito.

Não teve jeito, tivemos que comemorar. Eu comecei a bater palmas, como faria se estivesse em uma competição oficial de hipismo. Já Alex começou a assobiar do meu lado, como se estivesse realmente em um rodeio. E Liv, bem ela, só cavalgou ainda mais rápido até onde estávamos e, ao frear Ares, este empinou, o que não a assustou nem um pouco.

— Agora eu estou satisfeita. Consegui dar o salto que queria desde que vi essa pista. Aliás, Sr. Pierce, Dona Amelia, essa pista é uma das mais difíceis que já vi e treinei. – Se virou para os meus sogros. – Agora estou curiosa em como Chocolate se comportaria aqui. – Divagou. – E Prince Hal.

Minha sogra passou para dentro da cerca e deu um abraço em Liv assim que ela desmontou.

— Você vai ser uma excelente amazona. Se quiser, pode até mesmo chegar às Olimpíadas.

— Não é para tanto, Dona Amelia. Não sou assim tão boa. O Ares fez todo o trabalho difícil. – Liv respondeu toda sem graça.

— O cavalo é tão bom quanto quem o monta, Olivia. – Sr. Pierce disse. – E você provou que mesmo com um animal com o qual não está acostumada, é excelente.

Minha sobrinha ia ficando cada hora mais vermelha e as sardas que ela tem, ainda mais evidentes.

— Obrigada. – Ela falou quase se escondendo atrás de Ares e debaixo do chapéu.

— Além da equitação. É boa em mais o que? – Alex perguntou.

— Nas seis balizas.

— Nada de três tambores?

— Isso é com a täti. Ela adora essa, porque Perigo é rápido igual a um raio... aí fica difícil de ganhar do conjunto, né?

— Como Perigo não está aqui... – Alex começou.

Liv deu uma risada.

— Boa sorte, setä. Eu não encaro uma prova dos três tambores contra a täti de jeito nenhum.

Mas Alex não estava convencido e nem ouviria minha sobrinha, assim, ele só se virou para mim e disse:

— Vai lá e pegue Furia. Vamos ver se o que Liv está dizendo é verdade.

— É você quem vai perder, cowboy. – Falei um tanto debochada demais, mas não da confiança dele, da roupa, pena que ele não entendeu a referência. Para quem era dublê do Capitão América, ele era bem lento em entendê-las.

Novamente subi em direção à casa, dessa vez para os estábulos onde os cavalos da família ficavam.

Entrei na baia, selei Furia, que ficou muito feliz em sair para uma cavalgada e quando estava saindo, sem montar, encontrei com o trio peludo, que pela sujeira, tinham se embrenhado no meio da poeira atrás de algum animal, e os três me seguiram. Logo estava perto de todos.

— Ouvi dizer que vamos ter revanche do jogo de vôlei! – Will gritou chegando com Pepper, e cada vez que eu olhava para eles eu tinha que mentalizar qualquer outra cena para não morrer de rir.

— Não é revanche. – Garanti.

— Não, sou só eu provando para a Kat que ela não sabe montar outro cavalo que não sejam os dela. – Alex se gabou.

— Uuuhh! Isso fica pior a cada segundo. – Liv murmurou sentada na cerca, ao lado de minha sogra. – Quem quer abrir a casa de apostas?

— Olivia! – Chiei.

— O que? É o que vai acabar acontecendo mesmo!

Alex e sua roupa pavorosa de cowboy, montaram em Duke e tomaram a frente até a área destinada ao treino com os três tambores, que, estranhamente, já estavam nos lugares.

Fui andando calmamente, puxando Furia pela rédea, conversando com meu sogro sobre a quantas andava os móveis do meu escritório – não que eu tenha perguntado, foi ele quem tocou no assunto. Seguida por Loki, Liv já tinha conseguido a atenção dos outros dois cachorros para si e vinha conversando animada com minha sogra, sobre o que ela ainda achava que tinha que melhorar.

— Está fazendo essa hora toda porque está com medo de perder, Kat? – Alex me provocou, já com Duke dentro do cercado.

— Se está com tanta pressa, comece. – Retruquei.

— Não, preciso da plateia que vai te ver perder.

Olivia mais uma vez assobiou atrás de mim, Will e Pepper se sentaram na cerca e já estavam pensando em qual dos dois sairia dessa competição em um caixão.

— Quem vai marcar o tempo? – Will gritou.

— Uma pessoa bem imparcial. – Alex olhou para Liv.

— Eu não, setä. Vou tirar as fotos.

Dona Amelia se prontificou e pediu que o marido fosse o segundo a marcar, para não haver nenhuma discussão.

— Damas primeiro? – Alex perguntou.

— Fique à vontade para ser o primeiro. É você quem está com pressa. – Falei.

— Melhor de cinco, alternadas?

— Pode ser.

— Se prepare para perder, Rainha do Gelo. – Alex fez a provocação final e eu só soube revirar os olhos.

Meu sogro teve que fiscalizar o filho, pois o bonito estava fora da posição de partida e depois do assobio de Will, Alex disparou com Duke.

Um tambor. Dois. Três e ele estava de volta. Seu tempo, dezesseis segundos e trinta e cinco centésimos.

— Kat, sua vez. – Meu sobro chamou.

Entrei com Furia na área, Alex ainda estava por lá com Duke, em um canto e me olhava com um sorriso superior.

— Não ligue pra ele, Furia. Ele só está tentando te intimidar. Sabe que você é mais ágil que Duke. – Sussurrei no ouvido do cavalo.

Internamente eu queria que estivesse montando Perigo. Apesar de que Cavalos Árabes não são próprios para esse tipo de prova, Perigo era veloz e já estava acostumado com ela. O meu caso era mais ou menos o mesmo de Liv mais cedo. Sabíamos o que tínhamos que fazer, porém a parceria com o cavalo ainda era recente demais.

Montei Furia e esperei pelo assobio de Will.

Ele mal tinha acabado de dar o sinal e eu já estava em disparada pelos 140 metros que me distanciavam do primeiro tambor. Uma volta, duas voltas, três voltas e parei no mesmo lugar de onde saí.

— Isso foi rápido.... – Pepper comentou.

— E como. – Emendou meu sogro.

— Catorze segundos, cravados. – Disse minha sogra.

Alex sibilou do outro lado da área.

— Sorte de principiante. – Ele disse ao montar novamente.

E partimos para a segunda rodada.

Eu ganhei de novo, apesar de que Alex havia melhorado o tempo. Mas não chegou nem perto dos meus catorze segundos.

— Eu estou achando que pode acabar na terceira rodada. – Will disse, provocando Alex, que claramente não estava nada feliz em perder para mim – de novo.

Como resposta, meu noivo fez o melhor tempo dele até aqui. Catorze e quarenta seis. Ele tinha literalmente voado, pois até o chapéu perdeu.

Estava complicado de ganhar. Até porque Furia já estava cansado. Essa prova requer muita resistência e agilidade.

— É a sua vez, Kat. Quando estiver pronta. – Dona Amelia me disse.

Respirei fundo e olhei para Will.

Veio o assobio e eu disparei. Não tive nem tempo de respirar e estava de volta.

Furia de la Noche ofegava, cansado, e eu esperava pelo veredito, afinal, eu tinha quase certeza de que o meu cavalo não ganharia outra rodada.

— Parem com o suspense!! Se eu já não gosto de filmes assim, detesto na vida real! – Pepper reclamou.

Liv tentava ver o resultado por sobre o ombro de minha sogra, que a pegou no flagra.

Alex, confiante como sempre, já tinha montado e estava no ponto de partida.

— Pode desistir, Alexander. 3x0 para a Kat. Ela levou essa rodada. – Meu sogro disse.

— Ela foi mais rápida do que os 14”46’? – Will questionou pulando para dentro da área e vindo para perto de nós.

Täti, se a senhora baixou de catorze segundos, vai ser o seu melhor tempo de todos! – Disse Liv.

— A Kat fez em 13”52.

Eu fora quase um segundo mais rápida que Alex. E ele tinha perdido uma aposta para mim, de novo.

— Sabe, se morássemos no Brasil, depois de perder três apostas consecutivas para mim, eu diria que você pode pedir música no Fantástico. – Brinquei com a cara dele. – Como não moramos...

— O que você vai querer em troca da vitória, Kat? – Alex perguntou mal-humorado.

— Tenho que pensar. – Falei.

— Tem até amanhã pela manhã. Ou perde o direito. – Retrucou.

— Até lá te dou uma resposta. – Garanti.

— Só quero ver o que vai ser. – Murmurou taciturno e puxando Duke pela rédea, foi levando o cavalo até os estábulos.

— Pode voltar aqui, Alex. A regra da família é bem clara. Quem perde uma aposta, além de pagar o que o vencedor quer, tem que tratar do cavalo. – Will falou.

Alex não deu ouvidos e continuou a subir, eu podia jurar que ele ia praguejando contra mim.

Dona Amelia declarou que as brincadeiras da parte da manhã estavam encerradas e mandou que Liv fosse cuidar de Ares e que todos fizessem o mesmo com os cavalos.

Minha sobrinha foi mais do que feliz para cuidar do cavalo e eu tive que montar em Furia só para testar uma coisinha, assim, cavalguei até onde Alex já estava – não muito longe – e quando passei perto dele me vi obrigada a perguntar:

— Uma corrida até o estábulo?

Ele só me encarou e eu saí rindo da cara dele.

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O restante do domingo foi relativamente tranquilo, com Liv reclamando um pouco de dor no joelho, Dona Amelia proibiu que ela fizesse qualquer atividade física, e acabamos passando a tarde, sentados no deck dos fundos, perto da piscina, sem fazer absolutamente nada, as mulheres sentadas descansando e os homens trabalhando na cozinha.

— Eu ainda não acredito que Alex vai arrastar vocês duas para um jogo demorado de futebol. – Minha sogra disse, ainda abismada com a ideia que Alex tinha tido.

— Creio que é o pagamento antecipado por levá-lo ao GP. O que me lembra... – Olhei para Pepper. – Já que vocês ainda vão ficar por aqui por mais uma semana, se tiver ingresso, quer ir a Austin? – Perguntei para ela.

— Querer ir, eu quero. Mas será que o Will vai?

— Vou ver se tem ingressos antes de falar com ele... – Comentei e peguei o celular para pesquisar. – Tem sim, e aí?

Pepper muito delicadamente, gritou o namorado.

— Will, preciso de você aqui!

E em menos de um minuto, lá estava ele.

— O que foi? Achei que era importante.

— E é! Vamos pra Austin? A Kat disse que ainda tem ingressos!

— Por que não? Vamos dar mais um pouquinho de dor de cabeça para a novata da família.

Liv, que estava sentada no chão, ao lado de Thor e Stark, só abriu um sorriso. E depois vi que ela pegou o celular e começou a mandar uma mensagem.

— Espero que não esteja avisando para... – Não cheguei a terminar a minha frase, pois meu celular, na minha mão, só me mostrou a notificação.

Você tá ferrada! As duas famílias completas. Mais Mel e Euzinha, esse ser de Luz! Só quero ver como você vai fazer! Te vejo em cinco dias, e vou levar até uma roupa preta, pois estou achando que vou direto para um enterro. Para o seu enterro!

Olhei para Liv.

— Mais o que você está passando para a Louca? – Perguntei em finlandês.

— Nada. Só esse. Ela me pediu para avisar, caso tivesse a remota chance de alguém desistir.

Alguém?!

— Vamos dizer que o meu pai tá achando que o tio não vai. E o vovô tá torcendo pra isso. Mel acredita que ele está indo obrigado e vai ficar mudo igual a uma porta, já a Louca, bem, ela só quer ver o circo pegar fogo, como sempre.

Vocês estão apostando?

Ela só balançou a cabeça e depois olhou em volta. Dando um sorrisinho na minha direção, afinal tinha três pessoas ali que estavam nos encarando com expressões de dúvida. E eu me lembrei tardiamente que nem todos ali falavam finlandês.

— Não sei o que está acontecendo, mas será que as duas podem voltar a falar inglês e nos incluir na conversa? – Pepper pediu.

— Fofoqueira! – Foi tudo o que eu falei para Liv.

— Então... os ingressos.... – Will começou, se sentando ao lado da namorada e fingindo se esquecer da cozinha.

— Um minuto e... – Encerrei a transação. – Comprados. No mesmo setor onde vamos ficar.

— Isso é bom ou ruim? – Pepper perguntou.

— Aí depende. – Liv deu o pitaco dela. – Se vocês forem torcer para a mesma equipe e piloto que todo mundo... tá tranquilo.

— E se isso não acontecer? – Will fez a pergunta de um milhão de dólares.

— Leve um abafador de ruídos. E ainda bem que vocês não falam finlandês! – Foi tudo o que minha sobrinha falou.

— E o que mais você está olhando agora, Kat?

— Hotel, Dona Amelia. A menos que os dois ali queiram acampar no circuito ou ir de trailer...

— Não. Hotel, por favor. – Pediu minha cunhada.

Levou um tempinho e uma ligação para o hotel onde todos ficaríamos e eu consegui a reserva.

— Acho muito bom não desistirem agora. Já está tudo reservado e certinho.

— Isso vai ser uma bagunça! – Dona Amelia falou.

— Pior que vai. – Concordei com ela, no exato momento em que meu sogro aparecia para levar Will de volta para cozinha, porém, ao invés de levar o filho, acabou por se sentar por ali.

— O Alex que se vire com a cozinha hoje. – Disse em resposta à pergunta muda que a esposa lhe fez.

— Daqui a pouco vem reclamando. – Will comentou. – Quem quer apostar o tempo?

Ninguém falou nada.

— Nossa, como vocês gostam e protegem o meu irmão aqui.

— A questão não é proteger o Alex. É que você nunca paga as suas apostas quando perde. – Dona Amelia foi quem explicou.

— É muito bom para cobrar, mas para pagar... – Até Pepper teve que perturbar o namorado.

— Não está mais aqui quem falou. Vamos trocar de assunto. Terça-feira. O que as finlandesas precisam saber?

— Tudo. Elas não entendem nada. Kat nem sabia quem eram os Seahawks quando assistiu ao jogo. – Meu sogro comentou e lá fomos nós ter uma aula de “Introdução do Futebol Americano”.

 Sr. Pierce se encarregou da aula, com Will fazendo alguns comentários ocasionais. A única certeza que eu tive, no final da explicação, foi que eu teria que ir uniformizada, com camisa e boné, só não sabia como iria arrumar isso até lá.

A noite de terça-feira vai ser muito interessante.

A conversa, depois de um tempo, acabou por cessar, principalmente quando Alex apareceu na área, com uma carranca, acusando o pai e, principalmente o irmão mais novo, de deixarem o pobre sozinho na cozinha.

Assim, com tudo tranquilo, acabei por cochilar, escorada no meu noivo, só para ser acordada por Will, clamando que queria o meu cartão de crédito.

— E posso saber para que? – Perguntei ainda meio desorientada por ter sido acordada tão de repente.

— Você perdeu a aposta. Eu e Pepper vamos voltar para LA agora, nosso jantar tem reservas para às 20:00. – Me explicou e estendeu a mão.

Olhei para ele.

— Você paga e depois me fala em quanto ficou que eu te pago.

— Não confia em mim, cunhada? – Ele brincou, já sabendo qual seria a minha resposta desde o início.

— Confiar, confio. Só não confio o meu cartão de crédito a ninguém, às vezes não confio nem a mim.

Will deu uma risada.

— Bem, eu tentei descolar uma noite totalmente bancada pela cunhada, mas não colou. Mas não pense você que vou economizar no jantar.

— Nem eu faria isso, se fosse comer de graça. – Falei. – Bom apetite para vocês.

— Nos vemos na terça, no Rose Bowl. – Ele se despediu.

Pepper veio se despedir propriamente, mas teve que brincar com a minha cara sobre o jantar.

Alex ainda enrolou para ir embora, só saindo da Fazenda quando os pais se foram, e isso já era mais de 19:00. Quando enfim nos sentamos no sofá, depois de chegarmos em casa, arrumarmos o que tinha ficado de bagunça do sábado de manhã e prepararmos tudo para a segunda cedo, já era mais de nove da noite.

— Um jantar tipicamente americano com hamburguer e fritas? – Alex perguntou já com um cardápio na mão.

— Por mim tudo bem! – Liv concordou.

— Kat?

— Pode ser.

— Quantos eu peço?

— Vai da fome de cada um. Eu fico satisfeita com um, já você e Liv, são dois sacos sem fundo - Falei.

E aqui começaram os protestos. Alex disse que não comia tanto assim e Liv quase que me mata por eu chamá-la de comilona.

No final das contas, ela comeu quase um hamburguer gigantesco, as fritas dela e metade das minhas e meu noivo dois! E eu me perguntei onde cabia tanta comida assim!

Com todos alimentados, acabamos o domingo na frente da TV, Alex colocou em um jogo, dizendo que ia nos explicar como era o verdadeiro futebol.

Liv, depois de comer tanto, acabou se ajeitando do meu lado e se escorando no meu ombro, dormiu ali, com vinte minutos de jogo, Alex, por sua vez, se deitou no sofá com a cabeça em meu colo e, para finalizar, virei almofada de Loki, que se deitou em cima do meu pé.

— Devo ser uma ótima almofada. – Comentei tentando manter meus olhos abertos.

— Com certeza você é. – Alex garantiu. E estranhou o silêncio de Liv. – Dormiu?

— Há muito tempo. Não esperou nem o primeiro quarto acabar.

— Será que ela vai conseguir ficar acordada na terça-feira?

— No estádio é completamente diferente do que em casa. Lá não tem sofá confortável.

— É tem isso. – Ele concordou comigo. – Você já está querendo ir dormir também? – Me perguntou.

— Ainda falta muito?

— Um quarto.

— Ou seja, quase uma hora de jogo. – Constatei.

— Mais ou menos.

— Acho que eu já durmo, mas tenho que colocar a criança na cama. – Brinquei.

— Vai acordá-la?

— Alex, eu não consigo carregar a Olivia no colo. Ela tem 12 anos. Além do mais, ela tem que colocar o pijama. – Falei e muito devagar, tentei acordar minha sobrinha.

Vielä viisi minuuttia, kiitos.[1]— Ela murmurou.

— Liv, é só para você ir para a cama. – Tentei de novo.

E com muito custo ela abriu um olho.

— Ainda tá passando o jogo?

— Sim. E você tem que ir para a cama.

— Tá bom. – Me respondeu e tentou se levantar, quase caindo de cara no chão.

— Espera que eu vou te levar, Bela Adormecida. – Brinquei com ela e sai mais carregando do que ajudando, afinal ela tinha jogado todo o peso em cima de mim.

No quarto não foi diferente, Olivia só acordou para trocar de roupa e escovar os dentes. Depois caiu direto na cama. Nem me viu apagar a luz ou viu Stark e Thor pulando na cama ao lado dela.

Fiquei entre ir dormir e acompanhar Alex na sala, mesmo que eu não estivesse entendendo ou prestando atenção no jogo, decidi por acompanhá-lo, e, para a minha sorte, ele já estava subindo a escada, depois de ter apagado todo o primeiro andar.

— Não vai ver mais? – Indaguei quando nos encontramos no alto da escada.

— Não. Os Seahawks jogaram ontem. Vamos dormir. – Ele saiu me guiando pelo corredor, sem me deixar me virar para ver para onde eu ia, afinal, cada passo era um beijo.

Depois do banho, estávamos nós dois quase dormindo, quando Alex trouxe um assunto à tona.

— E então, pensou no que vai querer que eu faça, Rainha dos Três Tambores?

Para falar a verdade eu sempre soube, só não quis falar na frente da família dele. Assim, me fingi de boba e tentei deixar pra lá.

— Você sabe o que quer, eu sei que sabe! Não adianta bancar a desentendida igual hoje de manhã, porque você não me enganou lá. – Ele falou e acendeu um dos abajures, para me olhar.

Me sentei na cama.

— Você tem razão, eu sei. E sim, eu estava agindo estranho pela manhã, mas a culpa é toda sua.

Minha?! – Alex se espantou.

— Sim.

— E o que foi que eu fiz?

— Se vestiu de cowboy! – Soltei a bomba.

— E? – Ele não entendeu o meu ponto.

— Sério?

— Kat, não estou te acompanhando.

Tive que respirar fundo.

— Você me prometeu que não iria brigar com a minha escolha, certo?

— Certo, mas por que mudar de assunto? – Ele tinha a maior carinha de confuso.

— Não estou mudando, só garantindo que não vamos terminar a noite brigando.

— Tudo bem, não vou brigar com você. O que você quer?

— Me promete que não vai mais usar aquela roupa de cowboy quando estivermos juntos? Me promete? – Pedi.

— Por quê? O que tem de errado com ela?

— Alex, por favor. Eu até aturo a calça jeans, a camisa xadrez, você fica bem de xadrez, o chapéu até dá pra passar, mas aquelas franjas, o cinto com aquela fivela enorme e as botas. Não. Não dá.

Ele, que estava deitado, se sentou, fazendo, finalmente a conexão entre o meu comportamento e o que eu havia pedido.

— Você não gostou da roupa? – Ele estava quase rindo.

— Não. Para ser bem sincera, aquilo é bem ridículo em qualquer um, e nem em você eu consegui gostar. Te aturo vestido até com aquelas roupas largas que você tanto gosta de ficar e praticar uns saltos doidos de parkour... mas de cowboy não dá.

— E por que não falou nada?

— Will também estava assim, e Pepper, não queria causar um clima estranho.

E agora ele ria ainda mais.

— Você deixou de ficar do meu lado por conta da roupa que estava vestindo?

— Não, eu fiquei te evitando para não rir da sua cara. Porque cada vez que eu olhava para aquele estranho cosplay de índio apache com rei do rodeio que você estava usando, eu só queria rir. Saiba que me deu muito trabalho e precisei de muita força de vontade não rir da sua cara, ou do modo como aquela roupa ficava balançando quando você andava. Sério, Alex. Estava feio.

Ele parou para pensar.

— Então, seu pedido é...

— Nada de franjas e botas de couro de sei lá que e fivelão no cinto, por favor.

— Bem... vão me perguntar onde está a minha roupa, mas aposta é aposta. E eu vou cumprir a sua vontade.

— Obrigada. – Disse aliviada e dei um beijo nele, depois apaguei o abajur e nós dois nos deitamos, claro que eu o usava de travesseiro.

— Mas me diga uma coisa, por que você não gostou? – Ele quis saber depois de um tempo.

— Posso ser sincera?

— Mas é claro! Foi por isso que eu perguntei.

— Porque você passou do surfista gato e gostoso, para o homem mais ridículo e brega que já existiu e, sinceramente, se eu não te amasse tanto, e soubesse que por baixo de toda aquela falta de senso de moda está o homem mais lindo que eu já vi, eu te juro, te largaria ali e vinha embora na hora.

Ele ficou em silêncio, creio que absorvendo o meu rompante de sinceridade. E eu já estava quase dormindo, quando ele soltou.

— Quer dizer que eu sou gato e gostoso?

— Pelo amor de Deus! – Murmurei e me virei de costas para ele.

Alex deu uma risada.

— E quando eu for velho, e deixar de ser gato e gostoso? O que você vai fazer?

— Eu vou estar velha também, Alex. Entenda. Minha visão sobre você vai mudar. E você não é só gato e gostoso.

— Não? Sou mais o que? – Eu pude escutar o tom de brincadeira na voz dele, Alex estava completamente sem sono e queria que eu ficasse acordada junto com ele.

— Meu noivo. Agora me deixa dormir.

— Definição muito ampla. Favor exemplificar.

— Não vou inflar seu ego a essa hora da madrugada.

— Kat, você sempre diz isso. E sempre acaba fazendo o contrário...

— Não hoje.

— E amanhã?

— Larga de ser criança, Alex!

Senti ele chegando para perto de mim, enlaçando a minha cintura e apoiando o queixo no meu ombro.

— E se eu inflar o seu? – Me perguntou beijando meu pescoço.

— Eu preciso dormir, Surfista. Por favor. – Pedi.

— Só uma qualidade depois de gato e gostoso, e eu te deixo dormir. – Ele tentou novamente.

E eu perdi a paciência. Tornei a acender o abajur e mirei os olhos azuis na minha frente, que tinham um brilho traiçoeiro.

— Você não presta, Alexander!

— Uma qualidade.

— Seu enorme coração. E seu bom-humor.

— E?

— Já foram duas. Agora cumpra a sua promessa. – Me joguei no travesseiro.

— Eu acho que posso me contentar com essas duas.

— A primeira é bem ampla, fique pensando nela até dormir. – Murmurei.

— Não vai me dizer que sou um excelente travesseiro e cobertor, não?

— Quando você vai desligar? Deveria ter te acordado na hora em que levantei, assim você já estaria descarregado. – Tampei a cabeça.

Alex, não contente só em atrasar o meu sono, teve que me puxar para o seu colo novamente.

— Só fazendo o meu trabalho de travesseiro e cobertor... vai que você acha que eu estou fazendo corpo mole e resolve ir dormir no sofá... – Disse na minha orelha.

— Bobo.

— Seu bobo preferido, aposto.

— Essa você levou. – Concordei e me ajeitei.

— Então eu ganho um beijo?

Dei aquele beijo nele, e ele ficou até com falta de ar.

— Agora, Garoto da Califórnia, a finlandesa aqui tem que dormir, se quiser ganhar outro beijo como esse, me deixe quietinha que amanhã te recompenso.

Ele me abraçou apertado e, como meu ouvido estava em seu peito, era possível ouvir que Alex ainda não tinha recuperado o fôlego.

Rakastan sinua, Kat. Hyvää yötä e sonhe comigo.

— Boa noite, Alex. Te amo.

E ele ficou subindo e descendo a mão nas minhas costas até que eu caí no sono.

 

[1] Mais cinco minutos, por favor.


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Notas finais do capítulo

Eu não vou pedir desculpa pelo tamanho do capítulo! Sei que tem alguns que estão exagerados, mas se cortá-los perde o ritmo da história.
Muito obrigada a você que leu, espero que tenha gostado!
Domingo tem mais um!
Até lá!
xoxo



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