Presos Por Um Olhar escrita por Carol McGarrett


Capítulo 40
Encruzilhada


Notas iniciais do capítulo

Bem... capítulo surpresa em plena quinta-feira. E um capítulo enorme.
Domingo tem mais.
Tenham uma boa leitura!



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“A love like ours

Could never die

As long as I

Have you near me

Bright are the stars that shine

Dark is the sky

I know this love of mine

Will never die

And I love her”

(And I love her - The Beatles)

O restante da semana passou mais rápido do que um piscar de olhos. Entre tentar controlar a minha sobrinha e suas ideias malucas, conversar com o Bando de Loucas sobre os preparativos para o GP, buscar e reservar o hotel para a família inteira em Austin; reuniões intermináveis no escritório, uma ou outra farpa trocada com meu avô durante as videoconferências e finalmente resolver o problema do navio parado em Valparaíso, a sexta-feira chegou.

Eu nem acreditei quando o relógio do computador virou para as 18:00 horas, parecia que eu tinha trabalhado um mês em uma semana e, claro, eu não iria direto para casa.

Alex tinha vindo para a cidade para fazer exames, queriam ter a certeza de que tudo estava bem, já que o bonito era incapaz de ficar quieto. Então, eu teria que ir direto para o hospital.

Mal entrei no carro e meu celular tocou.

Era Will.

— Olá você, Will! Como vai Atlanta? – Perguntei.

— Oi! Aqui tá tudo bem. Estou te ligando para saber do meu irmão. Parece que ninguém mais me dá notícias. A não ser por um grupo muito estranho que me jogaram e eu nem sei que foi que criou aquilo.

— Sobre o grupo, bem Alex o criou.

— Desde quando meu irmão mexe com isso??!

— Desde que ele uniu forças com a minha sobrinha, Olivia.

— A que chega em 15 dias?

— A própria.

— Me diz que ela já está chamando meu irmão de tio?

— Pode apostar que sim.

E Will deu uma risada.

— Agora, trocando de assunto, como está o “tio” da família?

— Bem... se você considerar que ele não para quieto. Veio para LA hoje para ser examinado.

— Como sempre Alex é incapaz de seguir à risca uma ordem médica...

— Sua mãe falou a mesma coisa.

— Bem... pelas buzinas que estou escutando, você está non trânsito. Vou indo, Kat, qualquer coisa me avisa, porque se deixar por conta do Alex... não fico sabendo de nada. E quando a sua sobrinha chegar, me fala, vou ver se consigo aparecer só para conhecê-la e tentar descobrir os motivos dela ter me enfiado nesse grupo.

— Pode deixar que eu te aviso sim, Will. E boa noite para você e para a Pepper.

— Boa noite para vocês também!

Ele desligou e eu estava um tanto confusa com o trânsito. Tudo o que eu não precisava era me perder hoje.

Dei uma voltinha desnecessária, mas cheguei até o hospital. Já sabia para onde ir e logo desci no andar. Encontrei meus sogros que estavam na sala de espera.

— Você se perdeu, não foi? – Sr. Pierce falou.

— Entrada errada... – Sai pela tangente.

Escutei a risada dele, não era para me deixar desconfortável.

— Desculpe Jonathan. – Dona Amelia disse. – Ele só acha graça que você se confunda com as saídas da mesma forma que acontecia comigo.

Acontece. – Meu sogro corrigiu a esposa com uma tossida e ela o olhou com cara feia.

— Não ligo. – Disse por fim. – O trânsito daqui é ainda mais complicado e confuso do que o de Londres. Bem, alguma novidade? – Troquei de assunto.

— Ainda não. – Sr. Pierce me respondeu. – Porém, vindo de Alex, eu espero qualquer coisa.

Isso era algo que eu tinha que me acostumar também, nesta semana me vi mais preocupada com Alex do que já fiquei com os meus três sobrinhos. Tuomas, Olivia e Elena eram massinhas de modelar nas minhas mãos, comparado com Alexander e a sua péssima mania de não ouvir as ordens médicas e cismar de fazer o que bem quer. Sendo que a última peripécia do doente foi andar a cavalo, quando tem um pé e um braço imobilizado!

Não demorou tanto assim, e Alex, já sem a tipoia, mas com o pulso em uma tala e não mais com gesso, e sem a bota ortopédica, apareceu.

— E então? – Dona Amelia perguntou.

— Oficialmente já posso dirigir! – Olhou bem na minha direção.

— Você ainda está mancando. Nada de pegar volante. – Meu sogro avisou.

— Já estou quase bom. Agora é só fisioterapia.

— Mais quanto tempo sem nenhuma atividade arriscada? – Tive que questionar, ele estava confiante demais na sua quase recuperação.

— Dois meses. As costelas não cicatrizaram. – Disse injuriado me encarando. – Será que podemos ir?

— O que foi? Fugindo do médico? Ou você deixou a tipoia e a bota na sala de propósito? – Provoquei.

— Estou realmente liberado daquilo.

Ainda bem que eu não era a única que desconfiava que Alex tinha dado um jeitinho de se ver livre das duas, pois meu sogro olhava desconfiado para o filho.

— Quando começa a fisioterapia? – Minha sogra focou novamente no que interessava.

— Segunda-feira. Um mês completo.

— Ótimo. Vocês vão poder passar o final de semana na fazenda. E no domingo à noite voltam para Los Angeles. – Ela continuou com o plano.

Alex, que andava do meu lado e longe do olhar afiado dos pais, apenas fez uma careta.

— E não adianta discordar, Alexander. Não é por você. É por Kat. Ela não merece passar o final de semana trabalhando igual uma maluca dentro de casa. Basta olhar para ela que você verá quão cansada ela está. – Dona Amelia disse.

Eu arregalei meus olhos. Nunca imaginei que seria o assunto da conversa. Alex me encarou e depois me puxou para perto de si, me abraçando pela cintura.

— Tudo bem. Agora eu vou poder mostrar a propriedade para ela. – Deu um peteleco no meu nariz. E eu só fiquei ainda mais sem graça.

— Vocês vão passar em casa ou vão direto para lá? – Meu sogro questionou assim que paramos perto dos carros.

— Temos que passar em casa, trocar o carro. Vai ser rápido. O que eu precisava pegar já peguei e coloquei no Jeep. – Informei.

E os pais de Alex se foram na direção do carro e ele abriu a porta do meu carro e se sentou, resignadamente, no banco do carona.

— Se você quiser, eu posso dirigir até a fazenda. Dá pra ver que está realmente exausta. Dia puxado?

— Sim. Não tive nem tempo de comer. – Respondi, contendo um bocejo.

— Vou te deixar dormir até tarde amanhã. – Ele prometeu. – E você tem que entrar aqui... – Me guiou rindo.

— Não ria... já me confundi para chegar ao hospital... – Murmurei.

E lá foi Alex dar uma gargalhada.

— E seu pai simplesmente descobriu... ainda quero saber como.

— Ah... sobre isso... – Meu namorado começou. – Eu posso ter deixado escapar que você meio que se confunde com as saídas.

Revirei meus olhos e acelerei pela rua mais calma.

— Foi de grande ajuda. – Comentei sarcasticamente.

— O velho achou divertido.

— Veremos o que você vai fazer em Londres... Dezembro está quase chegando.

Sobre isso Alex não tinha o que dizer. E ele ficou calado até que chegamos em casa.

— Você realmente já arrumou tudo dentro do carro, ou só falou aquilo para que meus pais não ficassem cobrando que fossemos direto?

— Já está tudo arrumado. Cheguei mais cedo hoje e quis adiantar para a volta. Não sou muito fã de dirigir à noite. – Falei ao descer do meu carro. – Por quê? Quer pegar alguma coisa?

Alex deu uma olhada para a casa.

— Eu queria ficar aqui. Só com você. – Disse. – Mas minha mãe tem razão. Você merece descansar. E se souberem que eu estou aqui, tenho certeza de que alguém vai acabar aparecendo para me perturbar por não poder surfar. E aquela turma pode, às vezes, se esquecer de como é ir embora...

— Claro. – Concordei.

— Eu só preciso pegar uma coisa lá em cima. Por que você não aproveita e não toma um banho, tira esse sapato alto e essa roupa chique?

— Boa ideia. – Falei e o segui para dentro de casa, removendo os saltos assim que passei pela porta.

— Ah! Só para te avisar. A faxineira vem amanhã. É a mesma que minha mãe tinha te indicado. Se tiver alguma coisa que você queira que ela faça, é só deixar anotado na porta da geladeira. – Alex me informou enquanto me guiava escada acima.

— Então não é melhor dormirmos aqui? Alguém tem que recebê-la!

— Ela tem a chave, Kat. Já está mais do que acostumada a entrar aqui e arrumar tudo quando eu não estou. Só vai estranhar a quantidade de sapato de salto no closet. – Ele brincou.

Entramos no quarto e eu nunca me senti tão atraída pela cama como agora. Porém, me fiz de forte, passei direto por ela e fui direto atrás de uma roupa mais confortável e um banho.

Não demorei muito e quando saí do banheiro, já pronta, Alex, que estava deitado na cama com algo na mão, abriu um sorriso.

— Finalmente te vejo usando uma camisa de rock!

— Não estou com cabeça para montar um look chique. Peguei as primeiras coisas que encontrei.

Ele se levantou da cama, guardou o que quer que estava segurando no bolso e me estendeu a mão.

— Vem, eu dirijo! – Falou.

— Eu não acho isso uma boa ideia.

— Kat, Kat, Kat... você está cansada, muito cansada. Ficar indo e voltando todos os dias, além de acordar ainda mais cedo do que o normal, te esgotou demais. E isso é minha culpa. Assim, para me fazer me sentir um pouco menos culpado por ser o causador dessas olheiras e dessa carinha de exausta que você está, me deixe dirigir. – Disse me abraçando e me dando um beijo.

— Você sabe que eu não me arrependo, não sabe? – Falei quando nos separamos um pouco.

Ele abriu um sorriso imenso.

— Sim. Eu sei. E nunca duvidei disso. Só fico preocupado em como eu vou pagar.

— Não tem nada para pagar. – Falei.

Ele só me abriu um sorriso misterioso e, antes que eu pudesse perguntar o que aquele sorriso significava, ele se virou para digitar o código do alarme e trancar a porta.

— Vamos logo, antes que você durma em pé, fã dos Beatles.

Segui ao lado dele até a garagem, onde ele fez questão de abrir a porta do carro e me ajudar a entrar. Deu a volta e quando se sentou do meu lado, assobiava.

— Seu humor está contrastando com o meu. – Falei.

Ele deu uma gargalhada.

— Poderia estar melhor se pudéssemos sair nessa noite. Ainda não tivemos um encontro de verdade, os nossos sempre foram depois do expediente com você ainda fantasiada de "Executiva Poderosa". – Informou antes que eu pudesse contestar a informação. – Porém, pelo menos não vamos dormir em um hospital e, oficialmente, vou passar dois dias inteiros do seu lado. Tenho lá meus motivos para estar de bom humor, Cansadinha. – Me deu um beijo antes de arrancar o carro.

— Se está dizendo... – Deixei a frase no ar.

Alex logo estava passando por um caminho que eu não conhecia e que era bem mais rápido para pegar a rodovia. Assim que o trânsito ficou mais calmo e ele tinha pista livre para acelerar, pegou a minha mão esquerda e ficou brincando com meu dedo anelar. A brincadeira era tão relaxante que eu quase cochilei com a cabeça escorada na janela.

— Não vale dormir agora. Logo, logo nossos filhos peludos vão pular em cima de você, querendo o carinho da mamãe! – Ele falou ao fazer um carinho na minha bochecha.

— Não estava dormindo. – Menti descaradamente. – Estava vendo o céu.

— Sei... vou fingir que acredito!

— Pode acreditar. É a verdade. – Tentei disfarçar o sono.

Alex deu uma risada e acelerou ainda mais o carro, passando dos 150km/h.

— Isso tudo é saudade de dirigir? – Perguntei sarcástica.

— Está com medinho, é? – Ele acelerou mais um pouco, chegando aos 180 km/h.

Tive que rir.

— Nossa. Muito. Estou até tremendo de medo! – Estendi a mão e fingi que tremia.

Ele reduziu a velocidade.

— Eu ainda vou ter que achar algo que te deixe de cabelo em pé. Gosto de te ver com aquele ar de aterrorizada, igual na quinta-feira quando te levei para conhecer a turma.

— Vai ter que se esforçar muito. – Garanti.

— E eu vou! Pode apostar nisso.

— Quer perder pela terceira vez? – Relembrei.

Alex fez um bico e tratou de prestar atenção na estrada. Depois de ter ido para lá tantas vezes em seguida, eu já sabia o caminho com os olhos fechados.

— Só um lembrete para que você não acelere tanto assim na estrada de terra... não vai fazer bem para as suas costelas ainda quebradas.

Logo estávamos na estrada de terra que levava até à fazenda e, como eu estava concentrada demais dirigindo nos dias anteriores, não tinha reparado em como o céu é estrelado por aqui, por conta da falta de luzes artificiais, então me debrucei no painel para ficar olhando para cima.

— Não tinha reparado? – Alex me perguntou, diminuindo ainda mais a velocidade e desligando os faróis.

— Não mesmo.

— Mais bonito que na Finlândia, né? Pode admitir.

Dei um tapa nele.

— Nenhum lugar do mundo terá um céu noturno mais bonito que na Finlândia. Nenhum. – Respondi.

— Bem... pelo menos esse aqui já te deixou encantada. Já é alguma coisa. Amanhã te prometo que saímos para ver. Tem um ponto aqui que você vai gostar. – Garantiu e arrancou o carro.

— Quando eu era mais nova, costumava abrir a janela do meu quarto e me esgueirar para o telhado só para ficar vendo o céu à noite. – Falei do nada.

Mulher Gato? – Ele brincou.

— Não. Só não gostava de pensar que eu estava deitada, em um quarto todo fechado e perdendo o show no céu.

— Quantos anos você tinha? – Alex perguntou enquanto manobrava o carro com os faróis apagados só para que eu pudesse ver o céu.

— Começou quando eu tinha seis anos e, bem... se me deixarem, é bem capaz que eu ainda faça isso.

— Quando foi a última vez? - Indagou curioso.

— Na noite antes da minha viagem para cá. – Falei. – Passei praticamente metade da noite sentada no telhado.

— Na sua casa em Londres?

— Não... na Fazenda do meu avô George. Fui lá para me despedir dele, da minha avó e dos meus cavalos. Acabei passando a noite.

— Acordada olhando para as estrelas... – Ele murmurou.

— Pensando na vida.

— Isso é muito vago. – Alex falou ao parar o carro na garagem.

Mordi o lábio.

— O motivo de “por que justo eu?”. Por que me mandaram para cá? Por que a minha vida não foi o que eu achei que seria? Me perguntando se não valia a pena desistir de tudo e tentar uma outra carreira. No fim, eu estava destinada a vir de qualquer forma. Até porque eu tinha que te conhecer. – Falei olhando para ele.

— Você realmente não queria vir, não é?

— Não. O que Matti me disse na nossa reunião na segunda da semana passada é verdade. Eu não gosto de praia, não gosto de calor ou do verão. E sim, eu teria feito qualquer coisa, dado qualquer coisa para ter ficado em Londres, naquela noite. Pensei em fazer essa oferta. Porém, sou orgulhosa demais para admitir fraqueza, então eu vim. E ainda bem que vim! A mudança valeu a pena. Em todos os sentidos.

Alex que estava sentado de lado, me puxou para um abraço e eu enterrei meu rosto em seu peito.

— Você não faz ideia da gratidão que eu tenho por você ser orgulhosa desse jeito e ter vindo, Kat. Eu realmente não faço ideia do que seria a minha vida sem você nela.

— Não é para tanto. – Murmurei sem olhá-lo.

Alex ficou calado só me abraçou mais forte.

— Temos que entrar. – Falei depois de algum tempo, eu não queria soltá-lo. Não hoje e nem nunca.

Ele suspirou audivelmente e beijou a minha cabeça.

 - Sim, vamos lá. – Me soltou e descemos do carro. Meu namorado não perdeu tempo e assim que eu estava ao alcance dele, me abraçou pela cintura, me colocando na frente dele, apoiando seu queixo no topo da minha cabeça e cantarolando uma música.

Entramos na casa e Loki veio nos receber, pulando em mim e me farejando toda. E, por milagre, fez o mesmo com Alex.

— Acho que ele está começando a gostar de mim. – Meu namorado disse ao acariciar as orelhas do Ruivo.

— É o que parece. – Falei.

— Agora, onde estão os nossos outros dois filhos? – Questionou e foi logo assobiando.

Stark apareceu correndo, pelo estado de seu focinho, ele estava comendo. Thor nem se dignou a aparecer.

— Creio que o do meio é aquele que se importa mais com a barriga do que com os pais. – Alex disse ao brincar com os dois cachorros.

— Sempre tem um, não é mesmo? – Eu ri.

— Claro! Ainda mais que ele é sobrinho do Will. – Ele continuou.

Me levantei do chão e fui lavar a mão, indo para a cozinha, para poder ajudar minha sogra com o jantar. Logo que entrei, meu sogro estranhou minha roupa.

— Creio que podemos declarar o final de semana aberto. – Ele brincou.

— Por favor. É tudo o que mais quero. Espero que nenhum problema surja nos próximos dias. – Falei e parei atrás de Dona Amelia.

— Sente-se. – Ela ordenou.

— Nem pensar.

— Todo dia vai ser assim?

— Se a senhora não me deixar ajudar, sim.

Dona Amelia cruzou os braços e se pôs a pensar.

— Tudo bem. Mexa o risoto. E, por favor, é risoto, não arroz.

— Sim, senhora. – Respondi e por muito pouco não bati continência diante do seu tom mandão.

Eu estava tão cansada que mal me lembro do jantar ou de ter ficado na sala, conversando com meus sogros, a única coisa de que me lembro é, de Alex toda hora brincando com minha mão esquerda e murmurando uma música no meu ouvido.

Eu podia jurar que conhecia a canção. Só não me recordava de onde.

Quando fomos nos deitar, até cedo para nossos padrões, a nossa rotina de desmumificar e mumificar o doente foi mantida.

— Não faça essa cara! – Falei para um emburrado Alexander que tinha se sentado na cama e só aberto os braços para que eu o enfaixasse. – Já está bem melhor. Oito dias e os hematomas já quase não são visíveis, nem aquele pé horroroso.

— Achei que você tinha gostado dele, estava pensando e tatuá-lo. – Disse jocoso.

— Ia ser a sua tatuagem mais linda. O pé de um total estranho em seu abdômen!

— E te garanto que levantaria as mais doidas das teorias da conspiração.

— Pode apostar que sim. – Eu ri da ideia louca dele.

— Como está aí atrás? – Ele indagou.

— Os arranhões sumiram. Os hematomas estão mais para amarelados do que para roxo escuro. Creio que mais dois dias esses aqui somem de vez. Mas o que me preocupa é o do seu rosto.

— E posso saber por quê?

— Claro... você não tem um evento de lançamento do comercial de um carro para ir em 11 dias? – Olhei para o rosto dele.

— E a sua opinião profissional é? – Ele perguntou.

Fiz uma careta.

— Não faço ideia. Está sumindo, mas não sei se vai estar completamente curado. Porém sempre tem um jeito.

— Que é? – Alex perguntou desconfiado.

— Maquiagem.

Ele fechou a cara.

— Admita, vai ser a sua salvação. Você não pode aparecer lá de bochecha roxa!

— Melhor esperarmos, não acha?

— Por mim tudo bem. – Ia completar a frase, contudo desisti.

— E o que mais você ia falar? – Alex me leu direitinho, mesmo que eu estivesse com a cabeça baixa para prender a faixa.

— Sua roupa. Você falou que tinha que olhar...

— Vou deixar nas suas mãos, pode ser?

— Pode... creio que na quarta-feira eu tenho folga na parte da tarde. Vou adiantar o máximo de trabalho que puder e saio para olhar. Mas me responde uma coisa?

— Até duas, se eu souber...

— Por que não quer ir? – Questionei assim que terminei de ajeitar as faixas e passar uma pomada cicatrizante no rosto dele.

Paparazzi.

— Mas eles vão estar na porta do evento, não vão?

— Sim. Mas lá terá seguranças. Não quero que te vejam comigo e corram atrás de você. Que acampem na porta do seu prédio. Quero você longe deles o máximo possível.

— Agradeço a preocupação, Alex. Mas, isso vem com quem você é. Cabe a mim aceitar.

— Você não faz ideia do que eles podem fazer, Kat.

— Creio que já tenha provado do que eles são capazes. E fora isso?

Meu namorado só me encarou e disse:

— Você está realmente pronta para o que está por vir?

— Não sei. Gosto de pensar que sim. Só o tempo dirá.

— E se você não gostar do que a sua vida vai virar? – Ele me questionou sério, me fazendo sentar ao seu lado.

— Minha vida já virou de cabeça para baixo, Alex. Tem sido assim nos últimos vinte dias. Duvido que possa piorar. Eu sei que vão me perturbar, que vão me dissecar nas revistas, sites de fofocas, programas de TV. Que vai ter gente que vai inventar mil teorias sobre mim. Mas eu não ligo. Quando se passa pelo que passei, quando a sua vida privada vira motivo de chacota dentro da empresa onde se trabalha. Quando acontece o que aconteceu comigo, na frente de mais de quinhentos convidados, mais imprensa, você deixa de se importar com o que falam de você. Eu ouvi muita coisa no mês que sucedeu à cena da igreja, Alex. E posso te jurar. Lucca nunca foi o culpado. Era sempre eu. Parei de me importar com o que as pessoas pensam sobre mim. Elas falam, no escritório daqui já tem gente falando sobre isso, que falem. Eu sei a verdade e não me importo com a opinião de mais ninguém, porque se eu for fazer isso, vou ficar maluca!

— Você, Katerina, é mais corajosa do que eu achei que era! – Ele falou e me puxou para que me deitasse ao seu lado. – Contudo, eu prometo que vou fazer o máximo para que eles não tenham a oportunidade de chegar perto de você.

— Obrigada pela promessa. – Dei um beijo em seu ombro.

— Você sabe que é impossível, não sabe? – Ele riu.

— Sei que é. Mas já fico melhor em saber que você vai me defender. Só não vale usar as suas habilidades de luta de qualquer coisa.

— Eu luto...

— Não quero saber... quanto menos eu souber sobre essa sua mania de querer ficar todo roxo, melhor.

— Ah, Kat!!! – Me abraçou apertado, me puxando para ainda mais perto, e eu acabei enlaçado a minha perna na dele e deitando a minha cabeça em seu peito.

Alex logo recomeçou a murmurar a mesma canção de mais cedo, praticamente me ninando para que eu dormisse e eu estava quase lá quando reconheci a melodia.

A música que ele tanto murmurava durante essa noite era “And I Love Her” dos Beatles.

— Eu também te amo, meu Surfista Tatuado. – Falei e dei um beijo em seu pescoço.

— Finalmente reconheceu a música, hein?

— Antes tarde do que nunca, mas pode continuar, estou precisando de um pouco de Beatles na minha vida.

Alex continuou com os murmúrios, que logo me levaram a dormir. E não tinha melhor lugar e trilha sonora para isso. O que só confirmava que toda a minha provação valia a pena, se fosse para terminar o dia assim, nos braços dele.

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Abri os olhos para dar de cara com Loki me observando.

— Bom dia, Lokinho! – Acariciei a cabeça dele. Meu cachorro se fez de confortável e se jogou do meu lado, virando de barriga para cima. – Folgado. – Comentei, porém, fiz o que ele queria.

Fiquei um bom tempo acariciando o meu cachorro e depois acabei fazendo hora para me levantar. Loki sempre do meu lado.

— Será que você sabe por onde anda o Thor? Aquele lá para cair em um lago, piscina ou até mesmo em um buraco é lesado que só!

Loki só deu uma ganida e pulou da cama para que eu pudesse arrumá-la.

— Você é mais esperto que seu pai. – Brinquei e dei um puxão de leve na ponta da cauda dele.

Arrumei tudo, troquei de roupa e só então eu fui ver a hora. Mais de dez da manhã. Dei aquela conferida rápida se havia algo de urgente no meu telefone relacionado à trabalho. Nada. Nem mesmo as meninas tinham mandado mensagens. Estava começando a desconfiar que elas tinham feito um grupo paralelo para falarem de mim... isso era tão a cara da Pietra, começar a planejar o que elas iriam aprontar em Austin. Decidi por deixar o celular no quarto e rumei para a cozinha.

— Agora quero ver com que cara que eu vou chegar perto dos meus sogros... – Murmurei para mim mesma ao sair procurando por alguém.

Estranhamente não vi ninguém, até que passei perto da sala de jantar, que Dona Amelia me disse que só usava quando algum parente realmente exigente aparecia, e ouvi um pedaço de conversa.

— É realmente muito bonito, Alex. De muito bom gosto. Mas não acha que está um pouco cedo? – Era a voz de minha sogra.

Escutei a risada de meu namorado.

— Sei que é. Mas só quis deixar guardado. Foi um tanto no impulso que comprei. Achei que combinava com ela e não quis perder a chance. – Alex respondeu à mãe e logo em seguida ouvi o barulho característico de uma cadeira sendo arrastada.

Saí de perto da porta, pensando no trecho da conversa que ouvi.

O que Alex tinha comprado? Quem ele tinha em mente?

Balancei a cabeça, tentando esquecer o que ouvi, mas a conversa me acompanhou até a cozinha, quando Dona Amélia fez a seguinte pergunta:

— Mas quando foi que você o comprou?

— Há treze dias. Saí para almoçar e quando vi na vitrine, pensei logo nela.

Ouvi o que me pareceu o som de alguém beijando a testa de outro, para logo em seguida escutar.

— Não sei quando você vai entregar isso a ela. Mas se certifique de que ela não descubra antes da hora. Kat é esperta e se você deixar escapar uma mísera pista, o seu plano vai para água abaixo.

— Eu vou guardar no carro. Já volto. – Alex disse e escutei os seus passos rápidos indo em direção à porta principal.

Já eu. Eu estava estática no meio da cozinha, com Loki me encarando. Contudo, tive que sair do meu estado de letargia e fingir que fazia algo, pois Dona Amelia estava se encaminhando para cá.

Corri até a geladeira e a abri, procurando por algo que nem eu sabia o que era.

— Ah! Bom dia, Kat! – Ela me saudou.

Eu displicentemente tirei uma jarra de suco de morango e me virei para ela.

— Bom dia, Dona Amelia! Como vai a senhora? – Consegui manter a minha voz o mais calma possível.

— Estou bem. Procurando algo para comer?

Dei aquele sorrisinho de quem foi pega no flagra.

— Pois é... perdi a hora hoje.  Mas acho que vou ficar só no suco mesmo.

— Não tem nada disso de perder hora, você precisava descansar, teve uma semana agitada. E trate de comer algo, pois o almoço ainda vai demorar para ficar pronto.

Achei algumas torradas e me sentei na ilha para ficar mordiscando, enquanto minha sogra ia de um lado para outro na cozinha.

— Procurando algo? – Perguntei só para manter uma conversa inocente.

— Meu livro de receitas. Nunca lembro as medidas de nada.

— É o mesmo que a senhora usou ontem para o risoto?

— Sim.

— Está guardado ali. – Apontei para a gaveta. – Alex jogou ali.

— É por isso que eu não gosto dos meninos aqui dentro. Nada fica onde tem que ficar.

— Falou igual a minha mãe. Quer deixá-la doida é deixar o Kim e o Ian tomarem conta do fogão. Falta pouco ela tirá-los de lá na base da vassourada.

— E você não?

— Sigo à risca todas as ordens... Dona Diana brava põe medo até no Chuck Norris!

Dona Amelia riu. E veio se sentar do outro lado da ilha, lendo o livro de receitas. De ponta cabeça vi qual receita ela lia.

Nhoque.

— Vai querer ajuda? – Perguntei.

— Você também consegue ler de ponta cabeça igual ao Alex?

— Consigo.

Minha sogra me olhou seriamente e depois deu um enigmático sorriso de lado.

— Então, quais os planos de vocês dois para hoje? – Ela me questionou.

— Sinceramente, não sei. Por mim eu não faria nada de especial. A senhora vai querer ajuda com o almoço?

— Já estava contando com isso. Massa ou molho?

— Massa.

— Ótimo. Ainda é bem cedo e eu não quero o Jonathan me atazanando por aqui. Podemos começar meio-dia e meio?

— Claro. – Respondi.

— Então acabe esse seu café da manhã.

— Sim, senhora. Só uma perguntinha. – Continuei e percebi que ela deu uma pequena parada.

— Pode dizer.

— Onde está Thor? Eu mal me lembro dele de ontem à noite, não que eu estava muito presente, mas...

Dona Amelia deu uma gargalhada, que, além de ser pelo que eu havia dito, pude perceber que era de alívio também.

— Thor saiu seguindo Jonathan por aí. Está com saudades do seu cachorro lesado? – Ela perguntou acariciando Loki que estava fielmente ao meu lado.

— Então... Thor não sabe a diferença entre a vasilha de comida e um buraco no chão... para ele sair correndo desesperado por aí e depois cair em qualquer lugar ou se perder... bem, posso dizer que teria que começar as buscas agora.

— Fica tranquila. Thor vai aparecer. Talvez precisando de um banho, se ele se embrenhou na Caverna do Jonathan, mas vai aparecer.

— Pode voltar tão sujo assim?

— Pode. Até Stark volta com uma cor diferente quando fica muito tempo lá.

— Melhor eu providenciar um petshop para dar banho nestes três nessa semana... – Murmurei.

— Ah, eles vão precisar mesmo. – Minha sogra me garantiu.

— Quem vai precisar de que? – Ouvi a voz de Alex bem atrás de mim e dei um pulo da cadeira.

— CREDO! – Praticamente gritei e Loki rosnou para Alex, como que o alertando que não era para fazer isso. – Eu já te falei para parar de me assustar assim! – Dei um tapa no braço dele.

— Não bata em mim, ainda estou doente. E não vá pensando que eu vou parar de te assustar, Kat, porque não vou. É engraçado te ver pular desse jeito.

Encarei meu namorado que tinha acabado de roubar o restante do meu café.

— Tomando café quase na hora do almoço... como minha mãe me costuma dizer: “depois não almoça!”

— Eu falei para ela comer algo, Alexander, o almoço ainda vai demorar.

— Isso é tratamento especial. – Ele disse com um beicinho. – Porém, como temos tempo, vem, vou te mostrar a fazenda. – Me estendeu a mão. – Vá colocar uma bota ou um tênis, pois vamos a cavalo.

— Você ainda não está totalmente liberado para isso. – Encarei Alex.

Ele deu de ombros e saiu me rebocando. Fazendo a questão de me colocar na sua frente, contudo, não perdi o olhar que ele trocou com a minha sogra.

Voltei ao quarto para calçar uma bota e achar uma blusa de manga comprida para jogar por cima da camiseta.

— Isso não pode demorar, vou ajudar a sua mãe com o almoço.

— Não vai. Só vou te levar onde ela não te levou. E te fazer uma oferta.

— Uma oferta!? Que oferta?

— Uma coisa de cada vez, Kat. – Me respondeu e novamente me colocou na sua frente, me empurrando para que andasse mais rápido enquanto ia dando beijos no meu pescoço. – Só te aviso que hoje eu vou com Furia.

— Tudo bem, e eu? Nem pensar que vou com você. É sofrimento demais para o cavalo carregar dois.

— Você vai no meu cavalo número 02. – Ele me apresentou um Mustang, como Furia, porém, ao invés de todo preto, esse era castanho, com meias brancas e uma marca branca na testa. – Conheça Duke.

Duke? Homenagem à John Wayne? – Perguntei.

Alex me olhou.

— Você disse que não assistia à filmes.

— Não gosto de Faroeste. Mas meu pai e meus avós adoram... vi minha quota nesses anos. – Expliquei.

Meu namorado não se convenceu totalmente, mas seguiu com o assunto.

— Sabe selar o cavalo?

— O que você acha? Sendo dona de dois, achou que eu ficava de beleza enquanto alguém fazia isso para mim?

Alex só apontou para a sela.

Selei Duke antes que Alex se entendesse com Furia, pelo visto o cavalo não estava em um humor para ser montado hoje.

— Precisa de ajuda aí? – Perguntei já montada.

— Tá tudo sobre controle. – Me garantiu.

— Se você está dizendo... – Fiquei ali parada, observando Alex duelar com Furia para poder selá-lo. Porém, não resisti e tive que comentar. – Tente do outro lado...

— Vai me ensinar como selar o meu cavalo, Kat?

— Só dando uma opinião de uma espectadora... Furia parece menos arisco quando você o pega pelo lado direito.

E nem assim Furia se deixou ser selado.

Acabei por desmontar, tirar a sela das mãos e Alex e selar o cavalo por mim mesma.

— Muito obrigada, garoto! – Falei assim que coloquei a rédea. – E aqui está o seu cavalo, Alexander.

— Vai com ele. – Meu namorado murmurou, já em cima de Duke.

— Tem certeza?

— Sim... ele parece ter gostado de você. – Comentou com um muxoxo.

Montei em Furia e segui Alex pela fazenda, vendo Loki deitado na varanda da casa, nos acompanhando com os olhos. E, assim que passamos pela Oficina/Carpintaria, pude ouvir a risada do meu sogro.

— Perdeu até o cavalo, Alex?

— Para o senhor ver!

— Não tem problema não. Kat perdeu o cachorro. Thor agora não sai do meu lado. – Sr. Pierce saiu dos confins do lugar com Thor, ou quem eu acho que era Thor, ao seu lado, pois o meu cachorro era branco neve, não marrom serragem.

Alex riu ao ver o estado do husky.

— O que aconteceu com ele? – Praticamente gemi em desespero.

— Bem, Kat, não podemos dizer que Thor é o cachorro mais inteligente do mundo... porém, ninguém esperava que ele fosse se deitar no monte de serragem que tem aqui e fazer de cama.

— Coisas que só Thor pode fazer... – Falei desolada

— É... só esse aqui mesmo. – Meu sogro deu um tapinha na cabeça de Thor e voltou para seja lá o que estava fazendo. Thor, por sua vez, deu uma latida e o seguiu porta adentro.

Eu ainda encarava o lugar onde meu cachorro estava poucos minutos atrás.

— Aquele é realmente o Thor? – Perguntei para Alex.

— Um tanto encardido, mas sim, é o seu cachorro.

— Meu Deus! – Falei assustada.

— Agora que você já sabe onde está o seu filho do meio, anda, não podemos demorar ou Dona Amelia vai cortar a minha cabeça. – Alex deu o comando com os pés e saiu galopando com Duke. Não fiquei para trás e incitei Furia que logo ultrapassou a outra dupla.

— Não sei o porquê de correr tanto, se você não sabe para onde vai. – Alex me alertou assim que eu o ultrapassei.

— Não era minha intenção, mas parece que Furia não vê um bom cavaleiro ou amazona há muito tempo... assim ele resolveu dar um sprint só para me testar. – Falei assim que consegui evitar que Furia empinasse.

Alex me encarava mal-humorado quando passou por mim.

— Mudando de assunto. – Tentei uma conversa mais amena, assim que emparelhei com ele. – Qual era a oferta?

— Surpreso que ainda não tenha descoberto.

— Não sei ler mentes, Alex. E pare de ficar de mau humor só porque o Furia resolveu gostar mais de mim do que de você.

Alex deu um tapinha no pescoço de Furia e apenas soltou.

— Você viu os estábulos, certo?

— Sim. Saímos de lá agora. – Confirmei.

— E ouviu que minha mãe quer aumentá-los.

— Sim. Ela vai comprar mais cavalos? – Questionei.

— Sim, dois. Mas o espaço vai caber até seis cavalos. E eu estava pensando...

— Pensando em? – Eu juro que não estava querendo colocar o meu cérebro para funcionar hoje, e todo esse suspense estava me matando.

— Por que você não traz os seus dois cavalos para cá?

Puxei as rédeas de Furia com força e parei no meio do caminho.

— Não é como se a ideia não tivesse passado por sua cabeça! – Alex se justificou.

— Eu já te falei, Liv monta também.

— Mas ela tem os cavalos dela, não tem?

— Sim. Tem, mas tenho certeza de que está cuidando dos meus! Assim como meu avô. – Me defendi.

— Eu sei que Liv deve estar, mas pense nos seus cavalos e em você. Eles são seus. Estavam acostumados a você... e já tem quase um mês que você não aparece. Não é uma má ideia trazê-los para cá. Ainda mais você que tem os meios necessários para que eles viajem sem muito stress.

— Alex eu... sério, deixe isso para lá.

— Minha mãe iria adorar tem um Puro-Sangue Inglês e um Árabe por aqui.

E eu me lembrei da semana passada, quando saí com Dona Amelia e a conversa logo que voltamos... Sr. Pierce comentou sobre isso, e ela pareceu genuinamente feliz em ter mais cavalos por aqui. Mesmo assim, decidi por tentar outra abordagem.

Filho do Perigo não é lá o mais dócil dos cavalos. – Informei e voltei a trotar com Furia.

Furia também não é.

— Você não entendeu o meu ponto, Alex...

— Kat... – Ele parou Duke atravessado no caminho, impedindo que eu continuasse a cavalgada. – Você se mudou para cá, praticamente tudo o que é seu veio para a Califórnia. Por que não trazer as duas peças que faltam, que são Filho do Perigo e Prince Hal?

Alex não estava errado. Nem um pouco.

— Porque trazê-los é a confirmação de que eu não volto mais para a Europa, Alex! Ter os dois lá, junto com a minha família significa que eu ainda posso voltar. Agora, se eu me mudar com tudo, absolutamente tudo. – Parei para respirar. – Isso vai significar que eu não volto mais. Que eu definitivamente deixei a minha vida na Europa para trás. E... eu não estou pronta para admitir para mim mesma que eu não pertenço mais àquele lugar. Que a minha família e as minhas amigas sim, mas não eu.

Alex ponderou as minhas palavras e, depois de um comando, colocou Duke em marcha, ainda em silêncio.

Permanecemos assim por mais de vinte minutos, até que ele perguntou, me tirando da contemplação em que estava.

— E quando você vai estar?

— Não sei. Uma parte de mim sabe que eu não vou voltar e essa parte nem quer voltar. Mas a outra, essa ainda se agarra ferozmente à mera possibilidade de voltar para lá.

— Esse voltar seria quando?

— Não sei. Isso aqui ainda é muito novo para mim, Alex. Tente entender. Eu serei eternamente agradecida por você me ajudar e me apoiar a ficar. Me faltam palavras para expressar minha gratidão a tudo o que seus pais fazem por mim. Em como Will e Pepper me receberam. Mas não é fácil ficar tanto tempo longe da minha família. Longe de todos. Eu sempre fui uma criatura apegada à família e à casa dos pais. Posso não falar de sentimentos com facilidade, mas adoro companhia. E sempre tive. Sou a mais nova de quatro. Tenho um irmão gêmeo, três sobrinhos. Dois primos. Três amigas completamente loucas por quem eu daria a minha a vida. E todos estão longe de mim agora. Não os vejo pessoalmente a quase vinte dias. Não abraço meus sobrinhos, não fico de papo furado com as minhas amigas por todo esse tempo. Só por celular. E eu sinto falta disso. Da bagunça que era quando estávamos todos juntos, de ser acordada por Elena pulando na minha cama e me chamando para ver a corrida aos domingos. É por isso que eu quero voltar. Por eles. Mas, ao mesmo tempo, eu não quero, porque não quero perder você. Demorei muito tempo para achar essa felicidade, não quero jogar isso fora, assim como não quero perder o contato com a minha família. É conflitante, doloroso até, escolher um lado.

— Em três semanas você vai vê-los. – Alex tentou me animar.

— E em quatro eu estarei chorando a falta que eles me fazem.

A expressão de Alex endureceu.

— Viu? Não tem como remediar um lado sem machucar o outro. – Comentei diante do seu olhar.

Alex desmontou, foi para a beirada do morro, ficando de costas para mim, mas vi que ele cruzou os braços.

Acabei por desmontar também, mas me sentei à sombra de Furia, deixando Alex pensando.

— Você não gosta de verão, de praia, nem de sol. – Ele começou depois de uns cinco minutos calado. – Sente falta da sua família e da vida que levava na Inglaterra. Se te pedissem para voltar. Em definitivo. Hoje. Se te dissessem que tem um jato pronto para te levar de volta para casa. Você voltaria por eles? – Perguntou sem me olhar, mas pude ver que ele tinha tensionado os músculos. Estava nervoso.

Mordi o lábio. Pude sentir meus olhos se enchendo de água. Nosso relacionamento à jato tinha chegado na encruzilhada. Dependendo da minha resposta, eu teria Alex do meu lado ou não. Ninguém pode aguentar tamanha comparação. Respirei fundo e me pus a pensar.

Eu voltaria para a minha família sem nem pensar duas vezes? Sim, eu voltaria. Mas também tem outro lado, outro que eu não falei para Alex. O meu trabalho. Eu amo o que faço e sinto que ficar aqui é onde eu quero estar. Apesar de uma meia dúzia de funcionários que não são lá meus fãs, o pessoal do escritório é gente boa. Tenho um pessoal que é excelente, e sinto que vamos fazer um trabalho incrível quando tudo entrar nos eixos.

E tem ele. Como eu poderia abrir mão dele? Quando ele me salvou de uma vida de mentiras? Quando eu sei que nós já nos encontramos várias vezes no passado? E que estávamos destinados a nos encontrar novamente? Eu não poderia. E nem posso. Ele faz parte da minha vida, e talvez tudo o que passei TEVE que acontecer para que eu o encontrasse nessa vida.

Alex não aguentou ficar parado e começou a andar de um lado para outro, nervoso.

— A balança pesa para que eu fique. – Respondi por fim.

A balança? – Perguntou descrente. Se agachando na minha frente.

— Sim. Você me fez uma pergunta. Me deu uma situação hipotética. Eu ponderei o que tenho aqui e o que vou ter lá. A balança pende para que eu fique.

E o que os seus sentimentos querem, Katerina?— Vi que ele fez uma força tremenda para não explodir. – Por uma vez, uma vez, deixe de pensar com a razão. Deixe de ser aquela que mede todas as ações e responda sem parar a pensar. Você fica ou volta? – Ele pediu, segurando minhas mãos em um aperto de ferro, como se temesse que eu fosse deixá-lo no próximo segundo.

E eu falei a primeira coisa que me veio à cabeça.


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Notas finais do capítulo

Bem, é isso. E sim, ficou um gancho.
Só no domingo a resposta da Kat.
Até lá!
E muito obrigada por lerem.
xoxo



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