Presos Por Um Olhar escrita por Carol McGarrett


Capítulo 120
Seja bem-vindo, Sebastian!


Notas iniciais do capítulo

Voltei!
Sei que as atualizações estão muito espaçadas, mas realmente está faltando tempo.
Prometo não abandonar a história, ainda tem muita coisa boa para acontecer!
No mais, aproveitem o capítulo!



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E depois do pequeno incidente em Venice Beach, decidimos que talvez, por um tempo, seria bom deixar a corrida na praia, para que nada parecido com aquilo tornasse a acontecer.

Nos restou voltar à fazenda e liberar os cachorros para correrem pela propriedade, enquanto nós dois dividíamos o tempo entre os cavalos e o script do episódio piloto da série.

— Você tem certeza de que quer que eu leia isso? – Perguntei pela milésima vez, ao fitar a brochura onde se lia em letras garrafais: CONFIDENCIAL.

— Você não vai sair por aí contando o que leu, vai?

— Para te ser bem sincera, acho o script uma bagunça para se ler... não lembro de nenhuma cena do filme que você fez e olha que nós repassamos várias!

— Bom, então não tem problema. Mãos à obra! – Alex falou e empurrou a brochura para perto de mim.

Com uma sobrancelha levantada peguei o bendito e comecei a ler, como uma boa leitora, eu leio todas as páginas, não me importando se é apenas o copyright ou a dedicatória.

— Vai ler página por página? – Alex reclamou.

— Vou. Se achar que estou demorando, pode ir atrás de Thor, Loki e Stark e ver o que estão aprontando. – Respondi sem tirar os olhos do papel.

Alex fez um som de desgosto e foi para algum lugar, me deixando em paz por algum tempo.

Levei duas horas, mas terminei de ler tudo, quando finalmente virei a última folha, meu noivo não me deu tempo nem de respirar e já foi logo perguntando:

— O que achou?

— Bem... acho que vai ser interessante. Mas não creio que sou a pessoa mais indicada para falar algo. Seus pais julgariam esse script melhor do que eu.

— Esquece a parte técnica. Como leitora, o que você achou?

— Intenso. Intrigante. Gosto de suspenses como o que está aqui.

— Se fosse um livro... – Ele continuou.

— Eu iria querer a segunda parte. – Respondi sem pestanejar.

— Era isso que eu queria ouvir!

— Sério? – Questionei descrente.

— Sim. A parte técnica não interessa para quem está vendo a série, mas sim a história. Uma vez que você é a pessoa que menos entende disso na família e que iria, teoricamente, focar na história, era essa a opinião que eu iria querer. Então você gostou?

— Sim. E você está me perguntando isso porque quer saber se outros talvez teriam a mesma reação que eu?

— Na verdade, foram encomendados apenas 10 episódios da série, meio que um teste, se o público gostar, teremos uma temporada ou até mesmo mais de uma, se o público não gostar, encerramos nos 10.

— Então é assim que funciona?

— Não fazia ideia, hein?

— Não mesmo, sempre achei que pediam a temporada...

— Pedem meia, na verdade, se vingar, eles investem, se não...

Balancei positivamente a cabeça, começando a achar essa coisa toda muito complicada para mim... no fim, tinha-se uma combinação de história boa, mais audiência, mais patrocinadores.

— Os bastidores da televisão são cruéis. – Comentei ao me levantar do sofá.

— Vai aonde?

— Atrás dos cachorros. Está quente demais e os peludos precisam se hidratar. Depois dar uma olhada nos cavalos.

O final de semana passou rápido com Alex mergulhado no script e em reuniões de produção, que ele tentou me explicar para o que serviam e eu deliberadamente não quis entender.

No domingo à noite voltamos para Los Angeles, acabei atrás do volante, enquanto ele ia repassando uma cena de forma repetida no meu ouvido.

— E por que ficar repetindo essa cena? – Perguntei por fim, cansada de ouvir as mesmas palavras. Até eu já tinha decorado o texto.

— Amanhã tem teste de elenco. E vai ser justamente essa cena que vamos usar.

A cena em questão era entre um homem e uma mulher.

— Ah, sim. – Foi a minha resposta. Internamente eu imaginava a fila de atrizes, famosas e aspirantes a um lugar ao sol, que repetiriam essa mesma cena durante toda a segunda-feira.

— Do jeito que você já ouviu essas falas, poderia ir tentar o papel... – Alex brincou.

— É... se eu soubesse como me comportar na frente de uma câmera eu até tentava. Mas não sei. E essa não é minha praia. – Deixei bem claro antes que ele inventasse alguma ideia mirabolante.

— Estou falando sério. – Ele continuou.

— E eu também. Não. É. A. Minha. Praia. – Repeti.

Para o meu azar a rodovia estava fechada por conta de um acidente, assim, acabamos parados no meio do nada e com um calor infernal que, nem com o cair da noite, diminuiu e Alex continuava a tagarelar no meu ouvido as mesmas palavras.

Cheguei a pensar se seria muita falta de educação se eu simplesmente colocasse meus fones de ouvido, só para ficar um pouco aérea quanto à falação, acabei que não fiz isso. O carro ao lado do nosso estava com o som tão alto que serviu para o propósito, mesmo que estivesse tocando um pop bem genérico.

— Adolescentes. – Alex murmurou como uma velha de setenta anos ao meu lado.

Dei uma olhada pela janela e vi o Mustang rosa conversível onde estavam três garotas de idade universitária.

— Mais clichê impossível. – Foi a minha resposta a ele. – Mas cuidado, uma delas poderá ser a Tracy, sua parceira de cena.

Alex me olhou mortalmente e depois de deliberadamente fechar a minha janela, voltou a se concentrar no texto, graças à Deus que agora ele estava lendo o script inteiro e não uma cena em específico.

Assim, aproveitei o ensejo e tirei o meu livro da bolsa, já que não iríamos a lugar nenhum mesmo...

Quatro horas depois o trânsito foi liberado, mas o congestionamento era tanto que demoramos mais duas horas e meia para chegarmos em casa. Estava tão cansada que nem me preocupei em desfazer a bolsa de viagem, do banho fui direto para a cama.

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Com o meio do ano chegando, era hora de começar a falar de balancete. O ano fiscal ainda estava na metade, porém, eu gostava de antever cada passo do conselho para que não sobrasse tudo para novembro e assim ter que parar o escritório por duas semanas só para resolver qualquer pendência que pudesse aparecer.

Milena e Amanda me ajudaram a montar a agenda de reuniões de meio de ano e eu aproveitei para observar se as metas que traçamos no mês de janeiro estavam sendo cumpridas ou não.

Era um trabalho chato, demorado e cansativo, porém alguém tinha que fazer. E olha que eu ainda não estava mexendo na parte financeira. Essa sim dava trabalho.

A semana acabou que passou depressa e parecia que eu era a mais nova solteira da cidade, pois ver o meu noivo que era bom, eu praticamente não via. Alex saia cedo de casa e estava voltando tarde.

— Pré-produção é uma merda. – Ele murmurou ao se deitar do meu lado, na quinta à noite. Já passavam das duas da manhã quando ele chegou e apenas tomou um banho e se jogou do meu lado.

— Até quando dura isso?

— Até termos o elenco escolhido, todo o roteiro dos dez episódios discutidos e metade das locações das externas definidas.

— Ou seja, quando começarem as gravações. – Resumi a história.

— Basicamente. E você, como anda a semana? – Ele perguntou só para ser educado, pois pelo tom de voz ele estava mais dormindo do que acordado.

— Melhor do que a sua. Só burocracia de escritório. Sem nenhuma novidade.

— Não ter novidade é bom. – Alex falou no meio de um bocejo.

— Vá dormir, Surfista. Você está exausto e daqui a pouco tem que se levantar. – Acariciei seus cabelos, sabendo perfeitamente que seria questão de minutos para que ele começasse a ressonar.

— Isso é bom... – Foram as últimas palavras que ele falou antes de cair no sono.

Eu ainda fiquei um tempo acordada, fazendo contas e planejando como seria a semana em que eu passaria na Inglaterra assim que Sebastian nascesse.

Fui acordada com o despertador e os grunhidos de Alex. Eram 05:00 da manhã e eu ainda precisava de um pouco mais de cama, porém, como esse é o único horário que temos para conversar, resolvi me levantar para ajudá-lo, não só com o café da manhã, mas também com o almoço.

— Sabe que não precisa fazer isso todo dia, né? – Alex falou assim que me viu entrando na cozinha e já abrindo a geladeira para tirar os ingredientes do almoço.

— E eu já falei que não é incômodo nenhum. – Respondi e fui para o fogão. Diferentemente da maioria dos americanos que apenas comem um sanduiche, ou Deus me livre, um pedaço de pizza no almoço, eu fui acostumada com uma refeição completa no almoço, e era algo do qual eu jamais abriria mão. Assim, me levantava todos os dias e preparava a minha marmita e a de Alex, quando ele iria para o estúdio, só para que nós dois pudéssemos comer algo mais saudável.

— Quando as gravações começarem, vai continuar fazendo isso? – Ele perguntou olhando por sobre meu ombro para o que eu fazia.

— Claro. Não é só o seu almoço que está aqui.

Acabei de preparar as nossas marmitas e nos sentamos para o café. Alex sairia logo depois, eu ainda teria algumas horas de ‘folga’ até que fosse uma hora adequada de ir para o trabalho.

Na hora em que ele se levantou para voltar ao quarto e terminar de se arrumar, busquei o bloquinho de post its que tenho no meu escritório e continuei com a nossa tradição de bilhetinhos, colando o papel na tampa da marmita.

Ele não me pedia para fazer isso, mas creio que sempre esperava. E, quando chegava em casa, independentemente do horário, sempre colava o bilhete do dia, no bloquinho que eu tinha dado a ele logo no nosso primeiro fim de semana juntos.

Com essa troca de horários pela qual passamos, troquei também meu pilates, agora minhas classes eram todas as manhãs, às 06:30, ia e voltava correndo do studio, afinal, se não tinha a corrida na praia, eu ainda tinha a chance de queimar algumas calorias.

Minha manhã no escritório estava se desenhando para ser uma reprise dos dias anteriores. Relatórios intermináveis e balancetes de cada setor. Até que meu celular apitou do meu lado.

Cansada de ficar vendo números de produtividade, agradeci a interrupção, pesando em quem poderia ser. Levantei a tela e uma notificação de mensagem apareceu na tela.

Uma mensagem... uma não, várias mensagens de um único remetente, Olivia.

Advinha quem foi a primeira aluna da classe e de todo 8º ano?

Boa tarde para você! — Respondi.

Achei que a senhora iria me xingar por ter sumido...

Não sei o motivo. Estava em época de provas.

Pois é... e elas acabaram....

Notei, se está me mandando mensagem a essa hora da tarde...

Então...— Continuou Olivia.

Quando você começa assim, eu tenho até arrepios.

Não é motivo para ter arrepios. Só queria saber se não seria muito incomodo se eu passasse um mês ou dois com a senhora e o setä aí em Los Angeles...

Um mês ou dois?! Só isso?!

As coisas por aqui ficarão só por conta do Sebastian, então, pensei que ter menos um para tomar conta poderia facilitar as coisas, sabe como é?

Não planejou nada com suas amigas?— Sondei.

A grande maioria vai viajar com a família. Destinos diversos. Mas nenhuma tem Los Angeles em mente.

Entendi  onde ela queria chegar.

Por mim, você pode passar o verão todo aqui, sem problemas.

Isso é bom. E a senhora, vem para o GP da Inglaterra ou vem só para o nascimento do Sebs?

Sebs?

Pois é... já apelidamos o bebê. Lena não gostou nada disso. Para falar bem a verdade, Elena está estranha... Nunca vi a minha irmã fazer pirraça igual vem fazendo.

Normal. Ela está vendo que agora tem alguém mais novo do que ela na família. Leninha vai se acostumar com a mudança temporária de atenção. Você foi a mesma coisa, Loira Aguada.

Isso é bom, acho. Mas a senhora não me respondeu...

Falei que iria te levar no show da Adele no Hyde Park, não falei.

EU VOU TER COMPANHIA??? NÃO CREIO!!

Não precisa gritar, Olivia.

Desculpe.

Tudo bem.

O setä vem também?

Creio que sim. A menos que os planos tenham mudado no dia de hoje. Mas tanto o show quanto o GP são só em julho...

Assim, eu pensei, Sebs está quase chegando, tia Vick está imensa de grávida, mamãe falou que ele não fica nem uma semana na barriga da tia, então, acho que poderíamos fazer o seguinte, a senhora, vem, visita o Sebs e a tia e o tio Kim que virou um papai babão e quando for voltar, porque a senhora nunca fica muito tempo, eu vou com a senhora. E a gente volta na semana do show, que coincide com o fim de semana do GP! O que acha?

Um plano muito bom, mas creio que você não contou todas as variáveis...— Comentei.

Que variáveis?

Seu pai e sua mãe... eles vão te deixar passar um mês aqui?

‍️‍️‍️‍️‍️‍️‍️

 

Já entendi, Olivia. Você não perguntou para eles!

Não mesmo.

Então pergunte e veja o que eles falam. Por mim está tudo bem a sua estadia por aqui.

Obrigada. Vou perguntar ainda hoje, aproveitar que ainda lembro.... porque minha memória está igual a da Dori nesse final de ano letivo. Dou uma volta e já nem lembro o meu nome...

Tive que rir da comparação.   

Então nos falamos mais tarde, porque por aqui o dia ainda está começando. Meus parabéns pelas notas e não perca o foco.

Obrigada, täti! Não vou perder. Oxford me espera! Te ligo à noite. Beijos e bom trabalho.

Beijos, Olivia!

Minha sobrinha desconectou e eu voltei para o trabalho, parando para a reunião com Camilla e depois para almoçar.

Quando, enfim, pude dizer que a semana de trabalho tinha terminado, o prédio estava vazio e era muito provável que todos estivessem curtindo o happy hour em algum dos muitos bares em terraços que tem espalhado por Los Angeles, a grande maioria voltado para o pôr do sol.

Passei no supermercado e voltei para casa pensando no que iria fazer, já que estaria sozinha até sabe-se lá que horas. Não tinha animação nenhuma para pensar em lavar a roupa ou arrumar algo, estava cansada e com vontade só de me jogar no sofá e ficar.

Depois de guardar as compras, decidi por me jogar em uma das redes do quintal, arremessando as bolas para os cachorros correrem atrás, só que até eles se cansaram de ir e vir e eu comecei a ficar entediada em ficar à toa.

Levantei-me da rede, olhei a piscina, depois a academia. Também não era isso que queria fazer. Voltei para dentro de casa e rodei por todos os cômodos, ajeitando algumas coisas, até que parei no meio da enorme sala de visita e percebi o que queria fazer.

Tocar piano.

Corri no meu escritório, peguei as partituras e logo estava sentada com os dedos no teclado, tirando alguns acordes aleatórios do instrumento.

Um acorde levou a outro e quando vi, estava escrevendo-os no caderno, criando uma melodia que me pareceu feliz demais.

Desconfiada, recomecei a tocar o que tinha saído sem querer, e me surpreendi por ser bom, era uma peça que tinha futuro.

Deixei a criatividade me guiar e quando a música chegou naturalmente a seu final eu estava tão feliz que nem acreditei.

Tinha anos que eu não me sentava ao piano para compor. A última vez foi quando Elena nasceu e olha o que tinha saído hoje!

— Será que minha inspiração são os bebês da família? – Perguntei alto, rindo da minha própria bobeira.

Dei de ombros e recomecei a tocar a canção, fazendo pequenas modificações aqui e ali nos acordes, para que tudo ficasse na mesma afinação, ritmo e sutileza.

E a minha mais nova inspiração deveria estar muito boa e ser muito inusitada, pois até os cachorros saíram de suas camas e vieram se deitar debaixo do piano, suspirando felizes enquanto escutavam a composição.

— E se eu fizer essa nota desse jeito? – Comecei a inventar.

E a cada nova ideia, eu recomeçava tudo de novo, brincando de compor e de tocar piano, enquanto estava sozinha em casa.

Ou assim eu pensava...

— Eu não sou a pessoa mais certa para dizer isso, pois não escuto tanta música clássica quanto você, mas essa eu nunca ouvi! – Alex falou perto de mim e eu, que estava concentrada em um arranjo meio excêntrico demais para o que eu havia composto até agora, quase que caio do banco.

— São Jorge! Custa avisar que chegou? Você é silencioso como um gato!!

— Não posso ser silencioso carregando tudo isso! – Apontou para o chaveiro que fazia um barulho considerável. – Isso sem contar que tropecei na bola de um dos seus filhos peludos e quase que passo aqui deslizando. Você que estava no mundo da... música. E então, que música é essa? É de quem lá da Finlândia? – Ele perguntou e foi se sentando do meu lado na banqueta, olhando para as teclas de marfim.

— De ninguém. Eu estava apenas brincando aqui... – Falei sem graça.

Demorou alguns segundos para que ele compreendesse as minhas palavras.

— Você... você compôs isso? – Questionou com os olhos arregalados e um enorme sorriso nos lábios.

— Não é grande coisa, mas sim. – Dei de ombros.

— Não desfaça do que fez! Eu gostei. Já está pronta? Tem mais?

— Pronta está, só estou inventando novos acordes... nada demais.

— Então, faça o favor, ó Senhorita compositora, toque novamente.

Olhei para ele um tanto descrente de que ele pudesse ter gostado tanto, mas só li sinceridade em suas feições e atitudes, assim me pus a tocar novamente.

— Bonita. Muito bonita. – Alex falou quando terminei.

— Obrigada. – Murmurei sem graça.

— Ainda está disposta a tocar mais? – Perguntou de repente.

— Estou, mas qual é o motivo da pergunta?

— Espere aqui que eu já volto. – Deu-me um beijo e subiu a escada de dois em dois degraus.

— Tudo bem... – Respondi para ninguém em particular.

Com todo o barulho feito por Alex, o trio se agitou e agora ia e vinha do quintal dos fundos até a porta, brigando, ora pela bolinha, ora pelo bichinho de pelúcia que eles tinham...

— Pobre franguito... – Comentei quando o três cismaram de puxar um pedaço do bichinho. – Mais um que não vai durar muito tempo.

Escutei Alex fazendo uma barulheira no andar de cima e me peguei curiosa com o que ele estava aprontado, até que o vi descendo a escada com a guitarra em uma mão e o violão na outra.

— Vamos de acústico ou de rock? – Perguntou sorrindo. – Se for a segunda eu vou pegar o amplificador....

Só para saber, olhei as horas no celular, já passava das onze da noite.

— Acústico, Alex. Não queremos os vizinhos batendo na porta nos xingando pelo barulho e nos ameaçando com um processo por termos quebrado as vidraças deles.

Alex desfez do meu comentário, mas depois de colocar a guitarra em cima do sofá, tirou o violão da capa, testou a afinação e, puxou uma cadeira, onde se sentou e só falou:

— Eu começo ou você começa?

— Depende. O que você sabe tocar?

— Se prepare, você nunca viu um músico como eu na sua vida. Cuidado para não se apaixonar! – Alertou e depois de fazer um drama excessivo alongando dedos e pescoço, começou com os acordes de “I was made for lovin’ you”, do Kiss. – Consegue me acompanhar?

— Creio que sim. Não no piano, já voltou com outro instrumento. – Deixei-o tocando e, fui pegar o meu cello em meu escritório.

Sentei-me ao lado de Alex e comecei a acompanhá-lo nas músicas. Claro que não saíam perfeitas, contudo, quem ligava? Tocamos vários clássicos do rock, cantando as letras, rindo quando errávamos, seja a letra da canção, seja o acorde ou o ritmo. Tenho certeza de que se alguns dos compositores das músicas escutassem o que fizemos com elas, teriam nos processado.

— Freddie Mercury deve ter se revirado no túmulo quando você errou “Another one bites the dust”! – Falei rindo.

— Eu não errei tanto assim.

— Não... só perdeu a introdução que é praticamente a base da música! – Retruquei e puxei mais uma música.

— Essa até uma criança sabe qual é! – Alex comentou.

— Então vê se não erra, pois é um pecado estragar “Enter Sandman

Acabamos por tocar até quase o amanhecer, o que nos rendeu a manhã na cama.

— Devíamos fazer isso mais vezes! – Alex comentou quando guardou o violão na tarde de sábado.

— O que? Estragar os grandes clássicos do rock até que eles fiquem irreconhecíveis para o restante das pessoas? – Brinquei.

— Exatamente isso! – Alex concordou. – Quais vamos estragar hoje? Alguma da sua banda favorita...

— Com coisa que você sabe tocar alguma música da Nightwish! Nunca tinha ouvido falar da banda até que me conheceu!

— Realmente não tinha, mas depois de te escutar cantando sem parar todos os álbuns da banda...

— Eu não canto sem parar... e nunca coloquei um álbum para tocar! Só fico com os fones de...

— Você pode não perceber, mas canta junto com a música toda vez que está ouvindo. E, assim, eu acabei por ouvir cada uma das músicas.

Fiz uma careta. Nunca tinha percebido que eu cantava alto, para mim, estava apenas sussurrando as letras.

— Deveria ter gravado para ter provas, principalmente porque você não cansa de cantar “The phantom of the opera”, porém, só a sua cara já te entrega a culpa.

— Sorte a sua que eu canto bem, hein? – Dei um tapa no braço dele e fui para a guardar o cello. Estava no meio do caminho quando meu celular começou a tocar. – Por favor, me diga que não é trabalho! – Pedi voltando correndo até o sofá, que era onde o aparelho estava. Parei e me debrucei no encosto, vendo quem era o chamador.

— Trabalho? – Alex perguntou do outro lado da sala.

Fiz que não com a cabeça e atendi.

— Oi, äiti! Tudo bom com a senhora? – Perguntei feliz, já tinha quase uma semana que não falava com ela.

— Oi, filha. Como está a sua agenda na próxima semana?

— Controlada, por quê? – Perguntei. Mantinha a conversa em inglês porque sabia que o curioso do meu noivo sempre ficava ouvindo e quando não entendia, sempre me perguntava depois.

— Bem... se eu fosse você, fazia uma mala e vinha para Londres.

— Vic já está em trabalho de parto!? – Perguntei alarmada, já correndo escada acima, em direção ao quarto.

— É questão de pouco tempo agora. O processo já começou e se você quiser estar aqui quando o seu sobrinho nascer...

— Mas é claro que sim! Nós estaremos aí! Fala para a Vick aguentar só mais um pouquinho, até que eu chegue!

Minha mãe deu uma risada.

— Isso é impossível, minha filha. Não tem problema você não estar aqui para o parto....

— Nós vamos estar! – Garanti.

— Então, te vejo em algumas horas. E, Katerina, por favor, nada de ficar desesperada. – Falou e desligou.

Nada de ficar desesperada? Como assim?? Meu sobrinho estava para nascer e eu tinha que estar em Londres.

— Sebastian já está nascendo? – Alex apareceu no quarto e ficou um tanto assustado quando me viu já com uma mala aberta no chão e colocando roupas lá.

— Ainda não. Mas não vai demorar. Você vai para Londres?

— Mas é claro!

— E a série? – Lembrei-me um tanto tarde que os testes ainda não tinham acabado e que poderiam lembrar dele nessa semana.

— Nada que precisem de mim. Além do mais, já sabem que preciso de uma semana fora, por isso trabalhei desse jeito nessa semana. – Explicou-me.

— Ah... sim!

— Mas e você? E o escritório?

— Vou avisar Milena e ela sabe como controlar tudo. Não tenho reuniões nas próximas semanas, já sabendo que Seb estava chegando.

Arrumamos as malas rapidamente e, enquanto eu terminava de me arrumar, Alex ligava para o aeroporto, confirmando nossa ida. Como não havia data certa para o nascimento, ao invés de deixar a empresa sem o jato particular, eu reservei um aqui em Los Angeles para que nos levasse, no momento em que precisássemos. Saiu um pouco caro, mas era por uma boa causa.

Quatro horas depois da ligação de minha mãe, já estávamos sobrevoando A Cidade dos Anjos, em direção à Londres.

— Só uma pergunta. Já é quase verão... me diga que veremos sol em Londres... – Alex perguntou rindo.

— Alexander, meu amor, o que você acha?

— Ainda tinha esperanças, sabe como é...

— Não tenha. Ainda não. Se estivéssemos em julho ou agosto, até poderíamos encontrar céu azul, mas no final de maio? Capaz que ainda esteja frio... 

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Desembarcamos em Londres no domingo pela manhã. Alguém tinha deixado o meu carro no estacionamento e, como ainda não tinha novidades quanto ao estado de Vick, minha mãe me disse para ir para casa e descansar.

— Algo me diz que vamos terminar o domingo no hospital... – Comentei assim que entrei em casa e fui abrindo as cortinas.

— Acho que não, Seb vai nascer só no final de semana que vem, atrapalhando os esquemas de todos.

— Quer apostar quanto? – Parei no meio da sala e olhei para ele.

— Agora, só quem chega primeiro no quarto para poder cochilar! – E ele saiu correndo na minha frente.

Ponderei, mas como eu ainda estava no fuso da Califórnia, até que achei uma boa ideia, qualquer coisa, alguém me ligaria, certo?

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Conseguimos cochilar, nos arrumar e ainda almoçar na casa de minha mãe. Vick estava por lá, murmurando sozinha enquanto andava pela casa.

— Alguém quer me explicar, sem muitos detalhes, mas com clareza, em que estágio do trabalho de parto ela está? – Perguntei discretamente para minha mãe e para Tanya.

— Na fase inicial. Na verdade, ela já perdeu o tampão mucoso e está com contrações de curta duração, que aparecem de vinte em vinte minutos. Na medicina é sinal de início do trabalho de parto para a preparação da fase dois.

— Fase dois? – Perguntei... - Fica pior? – Indiquei com a cabeça na direção de Vick que agora estava sentada em uma bola de pilates fazendo movimentos circulares com a cintura.

— Isso é um nada, perto do que está por vir. – Minha mãe garantiu. – Ela vai sentir muito mais dor.

— Quanto tempo demora? – Questionei mais assustada do que tudo... apesar de ter visto as gravidezes de Tanya, eu não estava por perto quando ela deu a luz... então não vi em primeira mão o que era estar em trabalho de parto.

— Depende de mulher para mulher. Ela não estourou a bolsa ainda, capaz que nem o faça por agora... pode durar até 18 horas, mas claro que quando as contrações ficarem menos espaçadas, nós a levaremos ao hospital. Agora ela só tem que se movimentar para ajudar a dilatar mais rápido.

Arregalei meus olhos. Essa história estava ficando pior a cada hora.

— Dezoito horas... – Murmurei.

— Você e Kim nasceram apenas quatro horas depois que as contrações começaram... dezoito é o limite, desde que tudo esteja bem com o bebê. – Minha mãe me falou e foi ver como Vick estava, já que agora os grunhidos estavam mais altos.

Minha mãe saiu, mas Elena entrou, com as sobrancelhas unidas e um vinco no meio da testa, parou no meio da cozinha e só perguntou:

— Mamãe, a tia Vic está com dor nas costas ou com dor de barriga? Por que ela não toma um remédio e se deita até passar?

— Ela está com as duas coisas, Elena. E a sua tia não pode tomar remédio nenhum porque está grávida e o remédio pode não fazer bem para o Sebastian.

Elena fez uma careta e depois saiu correndo, indo perturbar meu pai que estava mais quieto do que o normal.

O almoço transcorreu tranquilo, Vick foi a ausência na mesa, dizendo que ninguém tinha que ficar vendo ela fazer careta o tempo todo. E, enquanto estávamos na casa de meus pais, os intervalos das contrações diminuíram consideravelmente.

— Oito em oito minutos. – Minha mãe marcou. – Com alta intensidade.

— Dilatação alta. Esse menino nasce dentro de poucas horas. – Tanya confirmou.

— Joakim, se arrume, seu filho já vai nascer. Sem desespero. Tudo está sob controle. – Minha mãe deu a ordem e Kim ficou alguns segundos parado, como se absorvendo o fato de que o filho dele estava a poucas horas de chegar.

Ajeitamos tudo na casa e ajudamos Vick a entrar no carro. Tanya e minha mãe foram junto, afinal, eram médicas e tinham prometido ficar ao lado dela o tempo inteiro. Prometeram nos ligar assim que as coisas estivessem mesmo reais.

 - Mas já não está para nascer? – Liv perguntou. Ela, estava mais assustada com todo o processo do que todos.

— Não olhe para mim. Não sou médica e não entendo nada disso. – Falei e tentei colocar Elena para ver um desenho, pois até ela estava agitada.

Ninguém se concentrou plenamente no desenho, mas foi uma boa distração por alguns minutos, pelo menos para minha sobrinha que simplesmente me fez de colchão e apagou no meu colo.

Tinha acabado de fazer o jantar e dar banho em Elena quando o celular do meu pai tocou. Todos paramos perto dele, igual a crianças esperando pela mais importante das respostas.

— Sim, Diana, estamos indo.

E tinha chegado a hora.

— Victoria já está na sala de parto, podemos ir para o hospital. – Ele nos informou assim que desligou o telefone.

E, depois de cinco anos, nossa família estava prestes a aumentar novamente.

Fomos para o hospital em dois carros. Meus avós ficaram tomando conta de Elena e iriam logo cedo visitar o mais novo bisneto.

Lá, fomos encaminhados para a sala de espera e que agonia! Os minutos não passavam, os ponteiros do relógio pareciam fazer hora com a nossa cara e nossa ansiedade. A cada minuto era um que se levantava e ia andando até as portas, tentando saber se algo estava acontecendo ou se Sebastian já tinha nascido...

Lembrei, quase no meio da noite, de avisar Mel e Pietra. Sabia que Mel apareceria de manhã antes de ir para Woking, já Pietra, dependeria dela e de sua agenda em Maranello.

Café foi tomado aos litros pelos homens, Liv, que tinha insistido em vir, já cochilava apoiada no ombro do pai, eu batia os pés no chão, irritando a pobre enfermeira da recepção, que já tinha me olhado torto e me avisado que se eu continuasse com isso seria expulsa do hospital.

Alex segurava a minha mão, apertando de tempos em tempos, para me assegurar que estava do meu lado e até mesmo ele estava tenso com tudo.

Vi os ponteiros do enorme relógio chegarem perto do doze e o dia virar quando se encontraram. A madrugada se estendia fria e sem notícias diante de nós.

— É normal demorar assim? – Liv perguntou baixinho.

— Você demorou para nascer. – Ian respondeu a filha. – Sua mãe deu entrada às 08:00 da manhã e você só nasceu doze horas depois.

A perspectiva de virar a noite e meio dia sentada naquela cadeira dura e naquela sala fria não agradou muito minha sobrinha...

E as horas passaram pingando, até que às três e doze, do dia 29 de maio de 2022, minha mãe apareceu na sala, um sorriso imenso no rosto e os olhos brilhando.

— Sebastian nasceu! Já está no berçário! É saudável e bem grande. Vick está em observação, mas é praxe. Está tudo bem com ela e o parto, apesar de um pouquinho demorado, correu sem problema algum. E aqui está ele. – Estendeu o celular para meu pai, mostrando a primeiríssima foto tirada do neto.

Apesar da alta madrugada, não deixamos de comemorar.

— Agora, por favor. Vamos para casa. Vick precisa de descanso e Kim vai ficar com ela. Voltamos pela manhã, e todos poderão ver o pequeno.

Foi contra a nossa vontade que voltamos para casa sem ao menos termos conhecido Sebastian.

Logo pela manhã, posso dizer que um batalhão aportou no Saint Mary Hospital, com um único objetivo: conhecer Sebastian.

Logo que chegamos, atualizaram a minha mãe sobre as últimas horas da mais nova mamãe. Vick estava bem, tinha descansado um pouco e já tinha até amamentado o filho.

Sebastian já havia feito alguns exames, todos de rotina e são todos essenciais assim que a criança nasce.

— Até agora os resultados estão perfeitos. – Garantiu a enfermeira. – Seu netinho está no berçário. – Indicou a direção.

Minha mãe, com um menear de cabeça, pediu que alguns a seguissem, meus avós, meu pai e Ian foram primeiro. Claro. E aos que ficaram, restou a mesma sala da madrugada.

— Aqui de novo!! Não acredito! Parece mais fácil ver a Rainha do que meu primo! – Liv reclamou.

Alguns minutos se passaram e chegaram, também para conhecer Seb, Mel, Pietra e Benny.

— Eu não me levantei com as galinhas para chegar até aqui e ter minha chance negada! – Pietra já chegou reclamando.

— Entra na fila e fica quieta, Louca. Não foi você que praticamente virou a noite sentada nessas cadeiras.

— Mas como está Vick e o pequeno? – Mel perguntou, sempre mais sensata que a italiana.

— Bem, pelas últimas informações da enfermeira que não gosta da tia! – Liv respondeu por mim.

— E a pergunta mais importante, com quem o garoto se parece? – Quis saber Benny.

— Vão lá e vejam por vocês. – Minha mãe falou abrindo a porta e nos indicando o corredor.

Andamos devagar para não fazer barulho, afinal, aquela era a ala da maternidade e atrás de muitas das portas, tinha uma mamãe e um recém-nascido descansando depois de todo o trabalho que é para nascer e dar à luz.

Paramos em frente à janela do berçário, todos procurando um único bebê no mar de pequenas vidas que ali estavam.

— E ele é?  - Mel perguntou.

Eu tinha visto a fotinha dele, mas não consegui reconhecer meu próprio sobrinho no meio de outros bebês.

Foi quando a enfermeira que toma conta do berçário cruzou a sala em passos rápidos e silenciosos, para não acordar nenhuma das crianças e pegou um pacotinho azul, trouxe-o para perto da janela e sorrindo nos apresentou Sebastian.

Ele dormia com a mãozinha para fora do cobertor do hospital, tinha a boquinha redondinha e a cabeça estava aquecida com uma enorme toquinha, pelo menos para ele era enorme.

Peguei-me sorrindo de volta para o pequeno bebê adormecido.

Tervetuloa tähän maailmaan[1]! – Murmurei ao vê-lo.

Liv observava o primo com interesse, Alex também, Tuomas fez uma careta e disse que ia ter tempo de ver o guri mais tarde, Mel, Pietra e Benny ainda estavam ali.

— Eu acho que ele se parece mais com Vick.  – Disse Mel.

— Não. Ele se parece com o tio! – Liv disse certeira.

Eu não via semelhança nenhuma com ninguém. Ele era muito novinho para que isso já se manifestasse. Assim, olhei para Alex, ele também não estava muito certo sobre com quem Seb se parecia e se limitou a dar de ombros para mim.

Benny não deu opinião, pois não conhecia ninguém muito bem ainda.

Foi Pietra que, no alto de sua sinceridade ímpar, soltou a pérola do dia:

— Ele parece com um joelho. Todo bebê quando nasce tem cara de joelho. Sejamos sinceros. Vocês pensaram nisso!

— PIETRA!! Que horror! – Mel bateu nela.

Benny segurava a risada, Liv olhava um tanto incrédula para a Louca.

Alex balançou negativamente a cabeça, essa era a sua reação natural a tudo o que Pietra falava.

Já eu... bem, internamente, bem lá no fundo, no fundo mesmo, até que concordava com ela.

Ainda precisava de um bom tempo para que soubéssemos com quem Seb se parecia.

Mas o que importava agora era que ele estava aqui, era saudável e já era muito amado, mesmo que temporariamente ele tivesse mais semelhança com um joelho do que com alguém das duas famílias....

 

[1] Bem-vindo a esse mundo!


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Notas finais do capítulo

E aqui está!
Espero que tenham gostado!
Muito obrigada a você que está acompanhando a história e não desistiu dela mesmo com esses intervalos imensos entre os capítulos!
Até o próximo capítulo!
xoxo



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