Hölle escrita por Dev Lish


Capítulo 15
Exulansis


Notas iniciais do capítulo

Exulansis
Substantivo. O desejo de ser atingido por uma tragédia.
Sugestão de música: Flower Face - Hangman Hands



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Água escorre do cabelo molhado de Dana. Imagino as gotas pendendo de seus cílios dourados. Até a ruga exasperada entre suas sobrancelhas é encantadora.

— O que foi? - Dana brinca com a barra de sua camiseta. 

É a primeira vez que o vejo com um pijama, ele sempre dorme com qualquer roupa que esteja vestindo quando entra no quarto. Guardo a calça com sapinhos estampados e blusa verde em minha cabeça para apreciação futura. 

— Nada. Você não quer dormir antes do interrogatório? 

— Eu vou deitar. 

— Eu sei. 

Estendo os braços ao meu lado em um convite mais do que claro. Parece tão trivial ter vergonha de qualquer coisa depois de ontem a noite, principalmente algo que era tão natural. Existe uma diferença entre dormir no pé da cama e me oferecer como um travesseiro não-humano? Talvez, mas Dana não nega imediatamente. Borboletas dão voltas em meu estômago enquanto espero sua resposta.

E ela vem. Dana abaixa a cabeça, caminha lentamente até a borda da cama, se senta e, assim que ele está ao alcance dos meus braços, o trago pra mim. Dana se deixa ser puxado como um pedaço de madeira e se deita como um, todo tenso sobre meu peito. 

— Dana, se você não quiser-

— Eu quero. Eu quero - ele anuncia bravamente e, como se precisasse provar, segura meu rosto entre suas mãos e me beija.

Nossos dentes se chocam com o movimento súbito, mas não recuo. Na verdade, estranho a empolgação de Dana quando ele prende meu lábio inferior entre seus dentes, corre a língua pelo céu da minha boca, segura em minha nuca e relaxa contra meu corpo. Minha mãe, a irmã dele, como eu deveria me importar com quem está ouvindo quando ele faz esse tipo de coisa? 

 

O sol nasce sobre o céu nublado. Mal faz diferença dentro do quarto de Dana, com as cortinas cerradas. Dana dorme sem nenhuma preocupação no mundo. Faço um breve inventário de todas as coisas que Eleonora vai questionar. Mal posso esperar para ouvir.  

— A Eleonora está estranha mesmo, Dana, será que ela está estressada porque eu matei o namorado casado dela? Espero que sim.

 

Sentamos, eu invisível, Dana e Eleonora em cadeiras opostas na mesa. Eleonora empurra uma caneca de café para ele e toma um gole de sua própria. Limpa sua garganta, endireita sua postura e cruza os dedos sobre a mesa.

— Por onde você quer começar?

Dana segura a caneca contra seu peito e dá de ombros, para o aborrecimento de sua irmã

— Onde você estava?

Na casa do meu amigo - A pálpebra de Elanor treme com a resposta que ela já ouviu. Quase espero que ela comece a puxar o cabelo em sua nuca.

— Que amigo? Você nunca me falou de nenhum amigo.

— É melhor você não conhecer ele. 

Eleonora gira a aliança em sua mão esquerda.

— Eu posso pelo menos falar com os pais dele? 

Dana encolhe os ombros diante da pergunta. Ah, a mãe dele está morta, mas você pode ir falar com ela. Eu tenho certeza que ela apreciaria a companhia. A reação de Eleonora seria impagável.

— Eu acho que… ele estão indisponíveis no momento. 

— Como você foi parar lá?

— Eu não estava me sentindo bem, então ele me levou pra casa dele.

Quero beliscar Dana embaixo da mesa. Usar a desculpa de que não estava bem quando sua irmã é uma enfermeira… ele realmente precisa aprender a mentir.

— E?

— E depois eu vim pra casa.

— Sim, aposto que antes disso você teve uma revigorante noite de sono. - Eleonora e Dana arregalam os olhos diante do comentário malicioso. - Desculpa.

Ela diz imediatamente, colocando a xícara sobre a mesa.

— Dana, eu já fui adolescente um dia. Eu sei que adultos perguntando coisas o tempo todo pode ficar chato, okay? Eu só quero saber se você usou proteção com ela. A gente pode ir no posto e tomar um coquetel, por via das dúvidas.

O rosto de Dana passa de branco a vermelho a rosa a branco de novo.

— Não é uma garota.

— Proteção?

— Não.

Dana toma um gole de sua caneca na esperança de que isso esconda o derrame que ele está prestes a ter caso Eleonora continue falando.

— Sabe, Dana, mesmo que não seja uma garota você ainda precisa de proteção. Eu posso pegar algumas cami-

— NÃO precisa. Sério.

Minha mente volta para o Submundo, onde todos aqueles demônios trocavam fluídos corporais, entre outras coisas, e me pergunto se há algum efeito colateral…

— Precisa sim. - Eleonora suspira antes de prosseguir - Eu não quero que pareça que eu estou brigando com você por causa disso. Você não precisa ser um celibatário ou nada no tipo, mas eu só queria… que você não sumisse no mundo sem, pelo menos, me avisar. 

Dana abaixa a cabeça, devidamente envergonhado, e responde encarando a mesa.

— Me desculpa.

— Você está desculpado e de castigo.

Um ponto de interrogação poderia muito bem estar na testa de Dana. Do que possivelmente ela poderia privá-lo é um mistério pra mim.

— Você está proibido de voltar pra casa sozinho. 

— Certo. 

Eleonora não especifica a duração do castigo e Dana não pergunta.

— Se você precisar de alguma coisa eu vou estar no meu quarto.

Ela se levanta e leva a caneca consigo quando entra em seu quarto. Dana olha ao redor me procurando, me encontra do seu lado e estala a língua. Apesar das bochechas coradas, lhe resta coragem o suficiente para pressionar um beijo rápido em minha boca e imediatamente fugir para o seu próprio quarto.

 

— Dana, é pra você. - Eleonora estende o telefone para ele. 

Dana se levanta do sofá, o lugar onde ele esteve pelas últimas 4 horas, imóvel e fitando a televisão.

— Alô? Ah, é você. Não. Aliás, muito obrigada por isso. Sim. Não. Não. - Ele olha Eleonora sobre o ombro. Posso imaginar o que Elisheva acabou de perguntar. - Eu não tenho celular. Tchau.

— Você pode ligar do meu. - Eleonora murmura. Seu rosto é a única parte visível entre as dobras do edredom no qual ela se enrolou.

— Não precisa. - Ele responde em voz baixa.

Eles voltam ao silêncio tenso, o mesmo que passaram a tarde inteira compartilhando. Eleonora não quer brigar, Dana não quer ceder e contar. Até eu estou desconfortável entre eles. 

 

— Eu acho que ela te odeia e nunca mais vai falar com você.

— Idiota. - O som é abafado pelo travesseiro que Dana segura contra o próprio rosto. 

Há alguns minutos Eleonora abriu a porta do quarto, despejou uma mão cheia de preservativos em cima da cômoda e saiu, sem dizer uma palavra. Desde então, Dana tem contemplado a possibilidade de facilitar meu trabalho.

— Você acha que… a Elisheva e o- O outro travesseiro atinge meu rosto tão rápido que não consigo terminar a frase.

— Não. - É a resposta enfática vinda dentre as penas de ganso.

— Hm.

O travesseiro cai ao seu lado depois que ele adormece. Corro o dedo pelos hematomas visíveis em seu pescoço, até onde eles continuam na gola da camisa. Dana suspira em seu sono e eu espero que não seja nada bom.

 


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Notas finais do capítulo

Minha vó morreu 9.4.21


Sério gente as sugestões de música dos capítulos são muito boas escutem mesmo só música foda, só um trecho:
"E as mãos deles são exatamente iguais as suas ao redor do meu pescoço,
Mas a voz dele não soa como a sua,
Me implorando pra voltar pra casa"
Muito foda misericórdia pqp

Comprei uma máquina de costura usada, se nada der certo vou fazer e vender roupa de cachorro

Esse capítulo seria o último mas aí eu não consegui parar de escrever e temos mais uns 4 capítulos
Uns tempos atrás uma senhora cujo filho matou o pai foi hóspede na minha casa ( veio do interior visitar o filho preso na capital) e eu me senti um lixo tão grande que parei de escrever mas enfim estamos aqui beijos até a próxima estou bêbada quero morrer



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