O Caminho das Estações escrita por Sallen


Capítulo 61
∾ E mesmo depois de todo esse tempo, eu ainda amo você.




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— Este é um brinde a todos aqueles que, não só acompanharam, como ajudaram nossa história a ser escrita — Theo anunciou, de pé com a taça erguida, enquanto olhava para cada convidado. — Parte de sermos quem somos, é por termos vocês em nossas vidas. E, apesar dos conflitos, desavenças e obstáculos, estamos sempre juntos. 

Em seguida, Hester se levantou. Também trazia na mão uma taça, embora vazia. Não estava bebendo. Ela emendou: 

— E para cada um de vocês que fizeram parte dessa história, bem, gostaríamos de compartilhar um novo capítulo: eu estou grávida! 

A surpresa veio tão forte quanto o trovão que estremeceu todo o lugar. Uma coincidência tão única estourou as risadas por toda a tenda. 

— Não me digam que não esperavam por isso! — Theo brincou, arrancando mais risadas. — Enfim, só gostaria de dizer mais uma coisa: que todos sejam capazes de escrever suas próprias histórias. E que não estejam sozinhos ao escrevê-las. 

Juntando-se às vivas, Nirav aplaudiu o casal de amigos. Sua mãe, ao seu lado, o cutucou seguidas vezes para perguntar-lhe se já sabia da gravidez de Hester. Ele, sem compreender bem por conta do barulho, meneou a cabeça em negação. Mas não sabia, de fato. A surpresa o pegou também. 

Imaginar seus amigos sendo pais era um tanto eletrizante, se pensasse bem. A vida deles estaria prestes a mudar de um jeito irreversível. E Nirav perguntava-se como era o processo de uma mudança dessa? 

Interrompendo seus pensamentos, o turbulento murmúrio das conversas no salão de festas cessou diante dos violinos que começavam uma outra melodia. Observando os noivos darem os passos em direção ao centro do salão para dar início a primeira dança, Nirav tomou um generoso gole de vinho branco. 

Theo segurou Hester pela cintura, conduzindo-a pela tapeçaria que cobria o gramado do jardim. Sob as luzes amareladas, envoltos por uma melodia suave e romântica, os amantes dançaram sozinhos, abraçados um ao outro, com os olhares fixos entre si. Era como se o mundo não existisse, apenas os dois. E tomaram seu tempo, dançando intimamente diante de olhares admirados e emocionados. 

Não demorou muito para que os pais de Hester se juntassem, complementando a dança. Em seguida, os pais de Theo. Como uma coreografia há muito ensaiada que começava a se improvisar, outros casais juntaram-se à pista para dançar a mesma melodia dos noivos e os abençoá-los com suas presenças. Quando Juan tomou a mão de Adhira e a conduziu, Nirav soube o que fazer. Repousou sua mão sobre a de Alice, que estava ansiosa por esse momento. Com um sorriso tímido, ela o seguiu em direção ao centro. 

Sendo uma tenda tão grande quanto à cerimonial, os casais conseguiam dançar um ao lado do outro sem sequer se esbarrar. Ainda assim, havia um bom amontoado de pessoas que permaneciam sentadas. Enquanto era assistido junto dos outros pares, Nirav rodopiou Alice pelo braço, trazendo-a para dançar mais de perto. Ela colocou o braço em volta de seu pescoço, balançando o corpo junto do seu de acordo com a música. 

Em determinado momento, ela o olhou. Seu sorriso permanecia. 

— Pensei que nunca mais iríamos dançar outra vez — murmurou, com o rosto próximo do seu. — vou sentir falta disso. 

— Tem certeza? — ele riu, sem jeito. — Nunca fui dos melhores dançarinos. 

— Mas pelo menos sempre dançou comigo. 

— Não teve nem a decência de negar que sou mau dançarino? Estou decepcionado! 

Alice riu, se divertindo. E ele ficou feliz por vê-la bem. Tornou a rodopiá-la pelo salão, investindo na dança. 

— O amor é uma coisa engraçada, não é? — ela perguntou, de repente, com a mão envolta na sua. — Nós nos conhecemos há tempo suficiente para construirmos uma família como Theo e Hester e, no entanto, ainda não é nada comparado com o que você sente por ela. 

Nirav suspirou, diminuindo o ritmo da dança. 

— Mas eu também amei você, de verdade. E eu continuo amando você. — Alice sempre seria uma parte importante em sua vida, negar isso era inútil. — O que tivemos não foi uma perda de tempo, muito menos foi em vão. E eu dei a você tudo o que poderia dar de mim. 

— E eu sempre serei grata por isso — ela tocou seu rosto com carinho. — Eu sinto o seu amor. Mas está na hora, não acha? 

Quando ela soltou dos seus braços, ele soube o que deveria fazer. Observou Alice sorrir, uma última vez, antes de dar as costas e desaparecer entre os convidados, deixando-o sozinho para que pudesse, enfim, seguir em frente. 

Em um primeiro instante, nada fez. Permaneceu de pé, parado no meio da pista de dança, sendo evitado pela dezena de pares que iam e vinham ao bailar. Seus olhos encontraram Helena dançando com Sarah, testa colada em testa. Próxima delas, Theo e Hester trocavam beijos românticos. Louise não dançava e não parecia estar em lugar nenhum. E sua mãe dançava de olhos fechados junto de Juan, seu novo namorado. Todos eles pareciam distraídos o suficiente para não notar o sujeito parado no meio da dança. Eles não o viam, mas Nirav torceu para que o apoiassem. E que se sentissem felizes pelo que estava prestes a fazer. 

Então, ele deu o primeiro passo. 

Como uma brincadeira sem graça, tudo parecia entrar em seu caminho de propósito. Pessoas o paravam para perguntar algo que não tinha resposta, garçons entravam em sua frente e precisava se conter para não causar um acidente, casais barravam sua passagem e o obrigavam a procurar outras saídas e espremer-se entre os convidados. Como se soubesse de suas intenções, aquela maldita tenda tornou-se infinita, repleta de uma multidão descabida que o impedia de chegar até o seu destino. O destino que perseguiu sua vida inteira. 

Com os olhos treinados em buscar incessantemente aquela figura tatuada em sua mente, Nirav olhou ao redor. Procurou em todos os rostos aquele sorriso exagerado tão característico. Buscou em cada silhueta o corpo que conhecia tão bem. E, principalmente, procurou os olhos cor de avelã que tanto brilhavam por ele. 

Do outro lado da multidão, parada entre os convidados agitados, segurando uma taça de vinho entre os dedos, Juno o esperava sem saber. Seu corpo balançava suavemente de um lado para o outro, implorando pela necessidade de dançar. O rosto cheio de expectativa acompanhava a festa sem ousar participar dela sozinha. Precisava de alguém que a buscasse, segurasse sua mão e não soltasse. E lá estava Nirav, indo ao seu encontro. 

Como algum tipo de intuição, ela notou sua aproximação. Os olhos nervosos encontraram os seus. E brilharam tão intensamente quanto antes. Duas chamas cor de avelã, chamuscando em sua direção, ardendo só de olhar para ele. 

Ajeitando a postura, Juno se preparou para a colisão. Em seu semblante, a ansiedade da imprevisibilidade daquele reencontro. Os dedos que seguravam a taça estremeceram. E ele conseguiu notar a alteração em seu fôlego de tão nervosa que parecia. Mas quando estendeu a mão para ela, todo o nervosismo pareceu se dissipar. 

Segurando seus dedos, Juno não disse nada. Apenas deixou-se ser guiada pelo salão por Nirav. Seus olhos vidrados sequer piscavam, permaneceram focados no rosto dele. Então, Nirav segurou sua cintura com a mão esquerda e entrelaçou os dedos da mão direita nos dela. E, apenas assim, ela pareceu retornar à realidade. 

— O que estamos fazendo? — perguntou tão surpresa quanto nervosa. 

— Dançando — respondeu com um sorriso, conduzindo-a através dos outros pares. — Como na primeira vez que nos conhecemos. 

— Estão todos olhando. 

Nirav concordou, sem mais nada a dizer. 

Aos poucos, ela entregou-se ao ritmo da música, como se fosse incapaz de se conter. Permitiu-se repousar a mão em seus ombros e ser conduzida de um lado para o outro. Seu corpo correspondia ao dela, entrando em perfeita harmonia enquanto os pés se arrastavam juntos pela grande tapeçaria. Nirav a rodopiou para longe, devagar e delicado, trazendo-a de volta até seu corpo, abraçando sua cintura por trás com ambos os braços. Nirav respirou fundo, sentindo o perfume doce de seu pescoço. Com o rosto tão próximo do dela e os corpos abraçados, não a beijar era uma tortura que não conseguia suportar. 

— Tive medo de que não aceitasse dançar comigo — murmurou contra seu ouvido. — Na verdade, tive medo que me odiasse. 

— Não estou com raiva de você. Afinal, você não estava errado. — Juno repousou as mãos nas suas, segurando-as. Seus dedos ainda tremiam um pouco. — Desculpe por bagunçar sua vida, eu nunca quis ser a pior parte dela. 

— O que te faz acreditar nessa bobeira? 

Seu nariz roçou na bochecha dela ao tentar se encarar. Com as mãos sobre as suas, ela desarmou seu abraço para que pudesse olhá-lo nos olhos. Parecia confusa, sem entender. Temendo que pudesse escapar outra vez, puxou-a para perto. 

— Olhe para mim — disse, soltando de sua mão para segurar seu rosto. A dança inevitavelmente parou. — Minha vida foi uma bagunça sem você. Quando você foi embora, tudo ficou tão bagunçado que eu não sabia se seria capaz de consertar. De alguma forma, de algum jeito improvisado, eu consegui contornar essa bagunça. Eu aprendi a viver sem você e você sem mim. Nunca soubemos o que seria de nós, pois fomos roubados. Quando voltou, não bagunçou minha vida, Juno. Só me fez perceber que estava bagunçado por faltar você. 

Seus lábios tremeram, abrindo e fechando algumas vezes. Ela franziu o cenho, confusa. 

— O que está tentando me dizer? 

— Eu nunca quis duvidar de nós dois. No fundo, eu sempre soube a verdade... 

Com um repentino clarão, interrompendo sua fala de modo rude, a energia caiu. Toda a tenda foi engolida por uma súbita escuridão que assustou a todos. Logo em seguida, um trovão violento engoliu as vozes alteradas, exigindo um silêncio sepulcral. Do lado de fora, a chuva se intensificou consideravelmente. 

Um pouco assustados, tanto Juno quanto Nirav olharam ao redor, sem muito enxergar. Os olhos ainda sem se acostumar com o breu. Mesmo assim, Juno soltou-se de suas mãos. 

— A verdade, Nirav... 

Naquele escuro, tudo o que conseguia enxergar era o brilho de seus olhos. E agora, eles estavam marejados. 

— A verdade é que eu amo você. Não houve um dia em que não amei você. Não há um dia em que eu não ame você. E eu iria amar todos os dias até o último se eu tivesse a chance. Mas temo que você já sabe como essa história termina. Nós dois sabemos, Nirav. Eu só gostaria de ser capaz de mudar esse final. 

Sem esperar sua resposta, Juno o deixou para trás, fugindo com o rosto escondido em ambas as mãos. Por um momento, ele não reagiu, quase sem entender. Porém, quando seus olhos se acostumaram com a escuridão, ele percebeu o que havia acontecido. Ela o amava! 

Com pressa, ele se engalfinhou no meio das pessoas, sem se importar em trombar ou derrubá-las. Praticamente correndo entre os convidados, conseguiu encontrar a silhueta vestida de azul. Quando segurou seu pulso, ela se assustou, sem esperar que ele viesse atrás. 

O vento soprou, adentrando a tenda com violência. Os cabelos dela foram soprados com força até se soltarem do belo coque, derramando suas madeixas castanhas por seu belo rosto. Um outro relâmpago brilho no seu e, assim, Nirav notou que ela chorava. Sua garota boba, quis dizer a ela. Por que está chorando? Mas, no fundo, já sabia. Viu em seus olhos marejados que ela não havia desistido, nem por um instante. Apesar das lágrimas, o brilho insistia e brilhava como nunca. Ela o queria, ela o amava! E a sua resistência em ficar e a necessidade de fugir, nada mais era do que um mero mecanismo de defesa para protegê-lo. No fim, Juno não queria errar com Nirav novamente. Tudo o que queria era fazer o certo por ele. E ele a amava ainda mais por isso. 

— Quer saber a minha versão da história? 

Juno revirou os olhos, tentando impedir que as lágrimas continuassem a rolar por sua face. E, relutante, aceitou ouvi-lo. 

— Não houve nenhum dia em que não amei você também. E não vai haver nenhum outro dia em que eu não ame você. Eu não sei como essa história termina, mas se há alguma coisa que eu tenho certeza é que sempre haverá amor enquanto houver nós dois. 

Ela assustou-se, um tanto surpresa. Com um sorriso trêmulo, Nirav segurou a face dela com ternura, observando seus olhos tão brilhantes, quase incendiados em sua presença. 

— Não importo que tenha bagunçado minha vida, se é nisso o que acredita. Pois bem, bagunce mais uma vez. Vire tudo de ponta cabeça. Deixe meu mundo virado do lado avesso. Seja uma tempestade e uma ventania. Arruine tudo, eu não ligo. Só fique comigo, apenas fique comigo. 

Juno sorriu aquele sorriso exagerado que tanto gostava. 

— Você realmente quer isso? 

— E você não? 

No escuro, ao som dos trovões e da tempestade, Juno se lançou em seus braços, aceitando seu abraço mais apertado. Nirav a segurou, quase sem acreditar que a tinha ali.  

Momentaneamente, nada daquilo parecia real. Teve medo de que se ousasse se mexer o mínimo que fosse, iria acordar daquele sonho e Juno não estaria mais ali. Então, conseguiu sentir o coração acelerado dela batendo ao mesmo ritmo do seu. E soube que ela estava ali e que era sua. 

Roubou-lhe um beijo de seus lábios úmidos, sentindo o gosto do vinho misturado com o de lágrimas. Beijou-a sem intenção de parar, beijou-a como se fosse tudo o que precisava fazer para sobreviver. Era tudo o que queria fazer, apenas beijá-la até seu fôlego se extinguir. Beijá-la por todos os beijos que nunca conseguiu dar a ela. Beijá-la por todos os beijos que ainda a daria. 

Mesmo quando a energia retornou e as luzes foram acesas, Nirav ainda beijava os lábios da mulher que amava. E entre um intervalo e outro, murmurava a ela todo o amor que guardou por tanto tempo à espera. Agora, a espera havia acabado e teriam todo o tempo do mundo. 

Porém, alguém os afastou com uma exclamação. Helena os encarava com seriedade ao se aproximar. 

— Vocês estão roubando a atenção dos noivos. 

Juno riu sem graça, escondendo o rosto no ombro de Nirav, que também se divertiu. 

Quando a música recomeçou, eles permaneceram na pista sob os olhares admirados de seus amigos e até daqueles que não conheciam tão bem. Dançando juntos, Juno encostou a testa na sua e fechou os olhos. Ele correspondeu, respirando de alívio. Estavam juntos e estavam bem. E era tudo o que importava. 

Amar alguém é apenas dar o melhor de si mesmo por livre e espontânea vontade e esperar que seja o suficiente. 


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Notas finais do capítulo

Dois capítulos de uma vez só, pois essa conclusão merecia não ser interrompida. Finalmente, meu amigos, finalmente nossos queridos corações se encontraram e se aceitaram.

Mas ainda não é o fim, ah não é mesmo! Afinal, precisamos de um pouco de felicidade e alegria pra esse casal que, por tanto tempo, ficou em falta disso. Ao longo dessas semanas, vou trazer uns capítulos extras dessa conclusão. Eles merecem ♥

De qualquer forma, quero agradecer a todo mundo que acompanhou até aqui e não desistiu dessa história, apesar de alguns atrasos e outros empecilhos. Fico eternamente grata de compartilhar com vocês essa história que eu amo tanto e, com os ajustes necessários, espero transformar em um livro em breve! Portanto, obrigada ♥



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