Audeline escrita por Jardim Selvagem


Capítulo 15
Capítulo 13


Notas iniciais do capítulo

Música: Bela Lugosi's Dead - Bauhaus



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Angela nunca teve tanta vontade de chacoalhar alguém na vida. Como era possível Edward Cullen parecer tão articulado em suas composições e ali mal concluir uma mísera frase?

— É… Acredito… — Ele estava naquela palavra há quase um minuto, Angela contou mentalmente. — Acredito que pode-se interpretar o álbum desta forma.

Ela suspirou. Finalmente.

— De onde você tira as inspirações para as letras?

— Hmmm…

— Podemos dizer que a sua vida pessoal é um das fontes de inspiração? Suas antigas namoradas influenciam esse processo?

Ele pareceu surpreso com a menção aos seus relacionamentos.

— Eu… Quero dizer… — Edward passou a mão pelos cabelos, quebrando o contato visual. Angela queria arrancar os olhos de frustração. — Penso que o que vivo exerce até certo ponto uma influência no que escrevo, entretanto…

Edward ficou quieto de repente e Angela esperou por uma continuação que não veio. Arrancar qualquer informação dele parecia uma missão impossível. Ela só começou a tocar no assunto que interessava de verdade — sua vida pessoal — agora e ele já se fechava, desviando de suas perguntas com comentários vagos e insignificantes. Mas ela não desistiria no primeiro obstáculo. Precisava dos bastidores do término com Tanya Denali. A trilha sonora dos seus pensamentos era a voz da chefe: se não conseguir uma pauta decente até o fim do prazo… nem se dê ao trabalho de pisar aqui.

— As músicas do novo álbum têm uma carga mais sedutora do que as do anterior… Como se você tivesse descoberto o romance e o sexo recentemente, quando estava namorando Tan…

Ele foi rápido em interrompê-la.

— Recentemente? — Soltou uma risada melodiosa. — Pelo contrário.

Edward abriu um sorriso torto, e o pescoço e as bochechas de Angela tornaram-se cor-de-rosa. Ela pigarreou, evitando encará-lo.

— E bom, agora que você terminou o relacionamento com Tanya Denali, podemos esperar letras melancólicas no próximo álbum?

— Não necessariamente.

— Então diria que está se sentindo da mesma forma que antes do fim do seu relacionamento? Se arrepende de alguma coisa?

Os olhos de Edward desfocaram-se por alguns segundos.

— Sinto que todo relacionamento, romântico ou não, nos afeta de algum modo. — Ele suspirou. — Para mim, sempre foi especialmente difícil perdoar-me… pelos meus próprios erros. Pelos mesmos erros. Eu…

Edward pareceu notar a curiosidade acendendo-se nos olhos de Angela e logo emendou:

— Desculpe, me expressei mal. Você pode desconsiderar o que acabei de dizer, por favor?

Ele a fitou com aqueles olhos escuros, doces e inocentes como os de um cervo. Edward sorriu adoravelmente para Angela, que viu sair de seus lábios um "sim" antes mesmo de perceber o que tinha dito.

O agente da banda invadiu a sala reservada, interrompendo a entrevista.

— Acabou o tempo. Precisamos ir…

Angela não conseguia acreditar que já tinha se passado uma hora.

— Mas… — Mas eu ainda nem descobri as razões do fim do namoro dele!

— Desculpe, Angela, mas não posso estender essa entrevista, não seria justo com os outros jornalistas que estão nos esperando, entende?

O agente foi até Edward para levá-lo para fora, mas ele continuava sentado como se nenhuma interrupção tivesse acontecido.

Olhou para Angela.

— Ainda temos algum passe VIP para a after party do festival em Phoenix?

O agente pareceu confuso.

— Temos, mas por que você…

— Acho que poderíamos oferecer dois tickets para Angela.

Ele continuava a observá-la. Seus olhos agora não eram doces, muito menos inocentes. Sob a íris escura, Edward parecia esconder alguma informação. Algo que apenas ele sabia.

Dois? Posso liberar só…

— Sim, dois. Um para Angela e outro para que ela possa levar alguma amiga.

Edward finalmente parou de encará-la para olhar o agente.

— Então? Pode conseguir isso para mim?

O agente assentiu. Edward levantou-se da poltrona, satisfeito.

— Foi ótimo conversar com você, Angela.

Ele sorriu para ela uma última vez antes de ir embora com o agente.

De três coisas Bella estava convicta. Primeira, Edward era lindo. Segunda, ele era rico. E terceira, ela estava incondicional e irrevogavelmente frustrada com ele. Qualquer detalhe sobre sua vida que não estivesse relacionado à banda Maze simplesmente não existia na internet, nos jornais, em lugar algum. Bella não sabia onde ele nascera ou o nome de seus pais, nem mesmo informações corriqueiras como o que gostava de fazer nos fins de semana. Ele também não tinha perfil em rede social nenhuma; por Deus, a própria banda mal atualizava as páginas no Facebook e Instagram — os fãs até brincavam com isso, fazendo piadas nas raras vezes em que havia algum post novo.

O mistério que envolvia Edward Cullen a fazia grudar os olhos na tela do computador, fazia seus dedos digitarem ainda mais rápido, determinados a encontrar qualquer coisa vagamente mais pessoal sobre ele.

Desde o dia daquele show para a imprensa, Bella passou as madrugadas pesquisando e analisando tudo que encontrava sobre a banda. Até aquele momento só conseguiu informações básicas. Recitou mentalmente para si mesma: o primeiro álbum da Maze saiu no ano passado, fazendo sucesso imediato com o público americano. Os integrantes da Maze eram quatro — Emmett McCarty (bateria), Seth Clearwater (baixo), Jasper Whitlock (guitarra) e Edward Cullen (letra e guitarra).

Bella tinha de se contentar em ler nas entrelinhas. Depois de acessar diversas matérias e entrevistas com os membros da banda, ela identificou um comportamento habitual. Quando não estava ocupado em turnês pelo país, Edward Cullen sumia das vistas atentas da mídia e viajava para alguma de suas inúmeras casas espalhadas pelo mundo, normalmente com uma companhia feminina.

Ah, sim, finalmente uma informação que poderia lhe ser útil. Em suas pesquisas, não demorou a encontrar um website criado por fãs da banda. Em uma das páginas, havia todos os links imagináveis de fotos e vídeos de Edward, organizados por data e fonte. Conforme ia acessando cada link, Bella concluía que ele, como um ser humano normal, tinha um certo padrão amoroso: namorava sempre os mesmos tipos de mulheres e as levava sempre aos mesmos lugares. Antes do fim do ano, terminava o relacionamento e começava tudo de novo pouco tempo depois. Um namorador em série.

Bella absorveu a informação. Conhecia o tipo. Aquele era um caso clássico de alguém que não suportava ficar sozinho por mais do que alguns meses, e assim tentava em vão preencher o vazio com relacionamentos amorosos. Mas como nunca tratava seu verdadeiro problema e sim os sintomas, permanecia naquele ciclo ininterrupto de conhecer-namorar-terminar. O que há de errado com você, Edward? O que você não suporta sobre si mesmo que precisa esconder com todos esses relacionamentos?

Bella balançou a cabeça. Bom, fosse qual fosse o problema dele, ela não tinha nada a ver com isso. De certa forma, era até um ponto positivo: o comportamento previsível de Edward era uma garantia tácita do prazo de validade do seu plano. Pela primeira vez desde que começou os golpes, não precisaria se preocupar com o tempo. Ele terminaria com ela de qualquer jeito.

Ela clicou nas fotos. As namoradas de Edward eram todas altas e loiras, narizes arrebitados e lábios carnudos, modelos e atrizes. Bella sentiu a decepção cair no seu estômago, embora lembrasse a si mesma que aquilo não deveria surpreendê-la. Edward parecia tão angelical e doce e verdadeiro no palco que… Bem, ele poderia ser um pouco menos óbvio, não poderia? Bella então se lembrou do mundo em que ele vivia e das muitas prováveis festinhas privadas que frequentava e chegou à conclusão de que ele se relacionava com aquele tipo de mulher porque era justamente o único tipo que pertencia ao mesmo círculo social que ele.

Bella deu de ombros. Ou vai ver ele é só mais um cara superficial e mimado.

As últimas fotos mostravam Edward ao lado de uma tal Tanya Denali. Ele a abraçando por trás. Suas mãos afagando as bochechas dela. Os dois grudando-se num beijo de despedida. Ela e suas pernas ridiculamente longas, uma modelo desfilando nas passarelas do coraçãozinho frívolo de Edward Cullen.

Bella agora estava consciente de todos os detalhes de sua aparência. Como cargas d'água vou fazê-lo sequer olhar para mim? Sem a peruca e as tintas, seus cabelos eram de um tom castanho comum, seu nariz não tinha nenhuma curva arrebitada, seus olhos não eram claros, e ela não era super magra muito menos super alta — a única coisa que se encaixava nas preferências de Edward eram seus lábios volumosos. E só. Suspirou. Teria de fazer o melhor com o pouco que tinha.

Desligou o computador. Ligou para um salão indicado por Angela e agendou um corte e tintura de cabelo. Fez uma lista das lojas onde faria as compras de suas novas peças de roupa. Mandou um e-mail para H. com dois pedidos: produzir um relatório detalhado sobre a vida de Edward Cullen. E fazer uma nova carteira de identidade com o nome de Audeline Blanc.

Quando Rosalie terminou de contar tudo durante o café da manhã, as duas permaneciam em silêncio. Bree pegou mais uma vez a xícara com o chá de camomila — a sua xícara, aquela que Rosalie tinha mandado fazer escrito "F*CK VAMPIRES". A novata desenvolvera uma obsessão com esse negócio de chá de camomila. Rosalie revirou os olhos. Como se um punhado de ervas em água quente fosse capaz de acalmar o eterno nervosismo de Bree.

Leah foi a primeira a abrir a boca:

— Desculpe, Rosalie, mas isso tudo não quer dizer que ele não esteja envolvido nos assassinatos. Não podemos descartá-lo. Não depois do que você disse.

— Não estou dizendo que o Emmett não está envolvido, estou dizendo que sim, ele está e muito, mas não desse jeito!

— Ele conhecia as vítimas… — Bree lembrou.

— E daí? É óbvio que ele está acobertando alguém, merda! Ele pode ser um panaca com cantadas ruins, mas não é um assassino!

— Por que você insiste nessa teoria? Só porque ele não tentou te matar da primeira vez? Eu me lembro do espaço de tempo entre as mortes… O assassino tem um método específico, levaria uns bons meses antes de…

— Cala a boca, novata. Você não estava lá quando eu conversei com ele pela primeira vez, você não tem ideia de como ele ficou. Emmett soube instantaneamente que eu era uma caçadora e sabe o que ele me disse? Ele me disse para sair de lá o mais rápido possível. Cacete, ele me ajudou a procurar vocês! Se fosse mesmo o assassino, ele faria isso? Hein? Vocês não acham que se ele fosse o assassino ele não iria querer acabar com a nossa raça?

Leah suspirou, os olhos escuros subitamente cansados.

— O que isso importa? A única informação que temos sobre ele é o primeiro nome. Não é como se pudéssemos avançar muito com um único nome. Há milhares de Emmetts espalhados pelos EUA… Precisamos de mais informações.

Bree terminou seu chá e colocou a xícara ao lado do celular em cima da mesa. As duas olharam para Rosalie.

— O que foi?

Rosalie não gostou nada quando Leah e Bree trocaram olhares. Não gostou nem um pouquinho.

— Você ainda tem o número do telefone dele, não tem?

Ah, merda.

— Nem fodendo que eu vou fazer isso.

Rose…

— Não vai rolar, Leah — Rosalie disse, já se levantando para deixar a sala.

O telefone de Bree começou a vibrar, tremendo contra a superfície da mesa.

Funciona. — Bree parecia maravilhada e incrédula ao mesmo tempo. — Ah, meu Deus.

Então ela mostrou a tela do celular para as outras. O aplicativo de rastreamento estava aberto. O mapa virtual exibia o carro de Victoria indo em direção àquela casa noturna em Forks.

James acordou com a garganta desértica. Seus olhos se abriram. Ainda a mesma saleta da boate em Forks. Mas havia algo errado. Aquele cômodo estava diferente. Ele estava diferente. Agora conseguia enxergar os grãos de poeira flutuando e rodopiando com a luz do sol que irradiava da janela. Enxergava as farpas no chão de madeira. Os fiapos do estofado do sofá. A constelação de linhas na pele de sua mão. Os pontos de brilho no sangue derramado no chão, formando uma poça próxima a ele.

Quando avistou o sangue, sua garganta ardeu ainda mais, e o cheiro férrico e adocicado o fez salivar em antecipação. James se pegou respirando fundo, cada vez mais fundo, tentando aspirar todo o aroma, fazê-lo entrar em suas narinas, consumir seus pulmões, inebriar suas veias. Sem pensar, arrastou-se até a poça e lambeu o líquido com sofreguidão, deixando-o escorrer pela boca. Culpa e êxtase a cada gole.

A porta se abriu com um estrondo.

— Veja só quem acordou… Já estava passando da hora.

Ele parou de engolir o sangue para encará-la.

Você… Sua vagabunda!

No próximo segundo, James tinha saído do chão e agora apertava o pescoço delicado de Victoria. Ela ria, apesar da respiração entrecortada.

— Exatamente do jeito que eu gosto… — Ela traçou círculos no pulso de James, observando-o com olhos atentos.

James aplicou uma força ainda maior em suas mãos, mas ela continuava apenas a rir entre tossidas.

Ele a soltou. Sua garganta já ardia de novo. Os olhos dele rastejaram até o chão, onde antes havia a poça de sangue.

Victoria riu ainda mais, a risadinha estridente inundando a sala. Ela colou os lábios em sua orelha.

— Posso conseguir mais para você… se fizer o que eu quero.

As mãos delicadas de Victoria envolviam o volante com determinação. Em seu rosto, um esboço de um sorriso satisfeito. James olhava pela janela do passageiro da frente, vendo os pastos e montanhas substituírem os prédios e o asfalto.

A Blazer dela seguia firme morro acima, subindo, subindo e subindo. Dentro do carro, o silêncio era absoluto, e os vidros da frente tornaram-se embaçados com o assalto de uma neblina no meio da estrada.

— Para onde estamos indo?

— Acalme-se.

— Você prometeu me…

Victoria virou o rosto em sua direção, mas os dedos continuavam a dirigir normalmente. James engoliu em seco.

— Preste atenção porque não vou repetir: me importune mais uma vez e vou injetar acônito direto nas suas veias.

E do mesmo jeito repentino que Victoria começou a falar, ela se calou, permitindo que o silêncio voltasse a sufocar o carro.

Após mais um tempo dirigindo na estrada, Victoria parou o carro, pulou para fora e destrancou um cadeado grande e enferrujado num enorme portão que cobria uma propriedade.

Depois de liberar a passagem, voltou para a Blazer e seguiu adiante por uma estrada de terra, a grama alta dos dois lados, como se ninguém cuidasse daquele lugar há muito, muito tempo.

Ela estacionou perto de uma árvore sem folhas. Na frente de James, havia um casarão caindo aos pedaços. Seus olhos fixaram-se no outro cadeado desproporcional que jazia na maçaneta da porta de entrada.

Ela pediu para ele acompanhá-la. Destrancou a porta e entrou. Os flocos grossos de poeira giravam diante dos olhos de James. O cheiro de mofo e carniça atacou seu olfato. Ele franziu o nariz, prendendo a respiração. O cômodo era úmido e escuro, com papel de parede velho descascando pelos cantos, a única janela do lugar trancada e com o vidro cheio de teias de aranha.

Mas que mer…

Um feixe de luz chamou sua atenção para ela. Amordaçada com um pano sujo, a pele coberta de hematomas, o pescoço fino como o de um cisne adornado com marcas avermelhadas, o vestido rasgado e sujo nas pontas. No chão empoeirado, encontrava-se uma jovem de cabelos loiros, o corpo longo espalhado como se ela fosse uma boneca de pano.

Victoria virou-se para James e sorriu com seus dentes brancos e grandes, caninos afiados como faca.

— Quem é essa…

Ela deu um tapinha em suas costas.

— A sua primeira vítima.

 


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler! Comentários são sempre bem-vindos!



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