O Passado do Lobisomem escrita por Heringer II


Capítulo 7
Capítulo 7


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem! ^^



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Quando deu oito horas da noite, voltei para o asilo, e a primeira coisa que eu fiz foi ir direto ao balcão, para falar com a supervisora.

— Olá, Evelyn! – disse ela, sorridente. – Pronta para sua segunda noite?

— É exatamente sobre isso que eu queria conversar hoje.

— Por quê? Algum problema?

— Eu queria saber se existe alguma forma de... Digamos... Mudar o idoso que eu estou cuidando.

— Sinto muito que esteja tendo problemas com Aldo.

— É... Muitos problemas...

— O que aconteceu?

— Ele é muito arrogante, ignorante, mal-educado... – parei de falar ao deixar a raiva me controlar.

A supervisora me olhou compreensiva.

— Realmente, você não é a primeira a reclamar da personalidade de Aldo. Já tivemos enfermeiras que pediram demissão justamente depois de tentar cuidar dele.

— É, ele me falou sobre isso... Por isso eu queria saber se existe alguma forma de...

— Não, Evelyn, sinto muito. Todos os outros idosos já possuem enfermeiras e outras pessoas pagando serviço social para cuidar deles, ou você cuida de Aldo, ou vai ter que pagar sua pena da forma convencional.

Triste, virei os olhos para baixo por alguns segundos, e voltei a olhar para a supervisora.

— Tudo bem. – respondi.

— Eu só peço um pouco de paciência. Eu prometo que, se alguma enfermeira sair, ou se outra pessoa acabar o serviço social antes, eu te coloco para cuidar de outro idoso, tá bem?

— Ok. – forcei um sorriso. – Bom, acho que devo ir nessa agora.

— Sabe, até que você está fazendo bem ficando por aqui.

— Como assim?

— Ontem à noite, ele não deu nenhuma “escapulida”. Foi a primeira vez em duas noites que isso não aconteceu.

— Acho que ele não queria pular a janela, ou seja lá qual for o meio que ele escapa, comigo presente. – falei e ri. – Eu vou lá.

— Tudo bem, Evelyn. Boa sorte!

Enquanto cruzava o corredor a caminho do quarto 32, me lembrava do que a supervisora tinha dito: “foi a primeira vez em duas noites que ele não escapuliu”. Automaticamente, me lembrei do que Denis tinha dito: “ontem à noite, foi a primeira vez em duas noites que o tal lobisomem não apareceu”. Quando isso me veio à mente, eu parei por um instante.

NÃO, claro que não!

Ora, isso não faz sentido nenhum! Era apenas uma coincidência! Uma estranha e oportuna coincidência... Mas ainda assim, uma coincidência!

Quando cheguei na porta do quarto de Aldo, percebi que ele estava conversando com alguém. Mas quem seria? Quem o visitaria?

Parecia ser um diálogo normal, mas eu percebi que quando Aldo parava de falar, não tinha uma voz que o respondia. Presumi, então, que ele falava ao telefone. Não consegui escutar direito toda a conversa, apenas uma frase que ele falou:

— Isso mesmo, deles eu era o oitavo. Agora, vou desligar.

Quando percebi que ele tinha parado de falar, bati na porta.

— Quem é?

— Sou eu, a sua cuidadora.

Ficamos em silêncio por uns breves segundos, até que ele mesmo abriu a porta.

— Entre.

Surpresa com aquilo, entrei no quarto.

— Devo admitir que você tem perseverança. – disse ele. – Afinal de contas, ainda voltou aqui hoje.

— Voltei porque tenho obrigação legal de voltar, não pense que fiquei feliz com a noite passada.

— Você acaba de admitir que não vem até aqui por espontânea vontade. Então, por que eu deveria te receber com gratidão no meu quarto? Você por acaso não pediu para trocar de idoso?

Senti um calafrio quando ele disse isso.

— Como você sabe?

— É o que a grande maioria faz. Poucos aguentam ficar comigo mais de uma noite.

— E você se orgulha disso?

— Se eu me orgulho de manter longe de mim pessoas falsas? Quer mesmo que eu responda?

— Eu não sou uma pessoa falsa, senhor...

Ele olhou para mim com raiva.

— Digo, Aldo... Eu sei que o motivo de eu estar aqui é apenas para cumprir minha pena de serviço social, mas se você tiver boa vontade me receber, eu terei a boa vontade de cuidar de você.

— Você parece ser uma garota inteligente, Evelyn. O que estava fazendo naquela manifestação de idiotas?

— Não era uma manifestação de idiotas. Estávamos tentando livrar nossa cidade das garras do prefeito.

— Dando mais popularidade a ele?

— Como assim?

Ele veio em minha direção, andando vagarosamente.

— Sabe, vocês jovens o que têm de disposição, têm de vento na cabeça. Fazem uma manifestação daquelas para derrubar o prefeito, mas não percebem que naquela mesma manifestação vocês estavam se fazendo vilões, e consequentemente enaltecendo a imagem do prefeito.

— Como assim?

— Não é verdade que muitos do que estavam na rua naquela noite saquearam lojas, provocaram incêndios, entre outras coisas horríveis?

— Mas você não pode julgar todos que estavam na manifestação pelo que alguns fizeram. Sim, tinha um grupo fazendo coisas criminosas, mas tinha um grupo que estava ali realmente para tentar provocar uma revolução.

Ele ficou um tempo calado, olhando para mim.

— Me diga, garota... Qual o grupo que mais foi notícia na mídia?

Eu realmente não sabia o que responder, aquela pergunta dele me pegou como um soco no rosto. Eu não sabia como responder aquela pergunta, então fiz outra.

— Você quer dizer que nossas manifestações são inúteis?

— Não são inúteis, pelo contrário, são muito úteis... Para o prefeito. Para vocês, sim, são inúteis.

Ele continuou a olhar para mim, esperando talvez que eu tentasse contrariar o argumento dele. Mas eu não sabia o que dizer.

— Eu vou pegar uma xícara de café. Não mexa em nada no meu quarto enquanto eu não voltar.

— Eu... Posso fazer uma ligação enquanto você não volta?

— Não tem telefone neste quarto.

— Como não? Você não estava... – pensei em perguntar se ele não estava falando no telefone há pouco, mas tive medo de que ele me desse um sermão por ouvir a conversa dele às escondidas. De fato, olhei no quarto, não havia um telefone. – Digo, como pode não ter um telefone no seu quarto? Como você se comunica com seus amigos, ou sua família?

— Eu não tenho ninguém para me comunicar. E se eu tivesse, usaria o telefone que está na sala principal do asilo.

Ele saiu, e me deixou esperando-o no quarto. “Ótimo, estou cuidando de um velho maluco que fala sozinho”, pensei. Comecei a olhar no quarto para ver se achava algo para me distrair. Era um quarto bem cuidado, tenho que admitir. Diferente de muitos lugares do asilo, não haviam marcas de infiltração nas paredes. Tinha umas decorações que remetiam ao nordeste brasileiro, com uns desenhos que lembravam muito os de cordel pintados, e o que eu achei mais legal: um tabuleiro de xadrez, só que no lugar das peças tradicionais, haviam figuras nordestinas para se jogar.

Mas o que realmente me chamou a atenção foi um álbum de fotos encadernado. Tinha uma capa feita de couro claro, com detalhes vermelhos nas bordas e desenhos de cactos no meio. A curiosidade era grande, então fui até o criado-mudo onde esse álbum estava e peguei-o nas mãos.

Imediatamente a porta se abriu, e Aldo entrou, segurando uma xícara de café na mão. Quando ele me viu com o álbum de fotos nas mãos, ele se irritou. Se irritou MESMO! Nunca tinha visto alguém com tanta raiva assim!

— EU DISSE PARA NÃO MEXER EM NADA! – gritou ele. Seus gritos eram tão altos que eu fechava levemente os olhos a cada palavra que ele dizia.

— Me desculpa, Aldo!

— NADA DE DESCULPA! ME DEVOLVE ISSO! – ele tomou bruscamente o álbum de fotos da minha mão. – E DA PRÓXIMA VEZ QUE VOCÊ PEGAR QUALQUER COISA DO MEU QUARTO SEM PERMISSÃO, VAI TER QUE SE CONTENTAR COM A CADEIA, OUVIU?

Eu não conseguia dizer nada, estava com a respiração ofegante e muito assustada para dizer algo. Eu não conseguia sequer ficar de pé, me sentei no chão aos pés da cama de Aldo e comecei a chorar.


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Notas finais do capítulo

Nem sei o que deixar nas notas finais depois disso. KKKKKKKKKKK.

Espero que tenham gostado! ^^