A sensação desoladora de ter falhado com seu mestre envolveu cada centímetro de seu ser, deixando-o completamente paralisado ao lado do corpo de Qui-Gon. Sua mente girava, sem nunca chegar a lugar algum e seus pensamentos estavam em completa desordem. Se respirar não fosse um ato totalmente involuntário de seu organismo, Obi Wan provavelmente teria morrido sufocado no próprio desespero.

Lagrimas rolavam por sua face ruborizada por conta do esforço que desempenhara no duelo contra Darth Maul, o qual não se orgulhava nem um pouco. Agira feito um louco. Lutou ferozmente contra o Sith, deixando-se dominar pela raiva que sentia. Algo totalmente inapropriado para um Jedi.

Se Qui-Gon tivesse presenciado tal atitude de Obi Wan, o repreenderia com certeza. Mas ele não o fez. Não por que não queria, mas por que estava ocupado demais, esforçando-se ao máximo para se manter naquele plano pelo maior tempo possível, na esperança de fazer um ultimo pedido ao seu padawan e nada que o ruivo fizesse poderia reverter essa situação. Nada poderia devolver a vitalidade de Qui-Gon. Nada. Não importava quantas lutas Obi Wan vencesse. Quantos Sith derrotasse. Nada disso traria seu estimado mestre de volta.

E a vitória, bom, não significava nada para Kenobi. Derrotar Maul não lhe deu satisfação alguma.  Pelo contrario. Fez com sentisse vergonha de si mesmo. Um Jedi não deveria lutar por vingança ou tomado pela raiva, como ele próprio fez. Além de perder seu mestre, Obi Wan temia perder a si mesmo. Se isso acontecesse, como ficaria o legado de Qui-Gon? Que espécie de aprendiz ele seria se manchasse a honra de seu adorado mestre?

Sozinho, Obi Wan não se conteve. Soluçava tão alto e tão sentidamente que era como se seu coração tivesse se despedaçado em milhões de pedaços e toda vez que arriscava olhar para o rosto pálido de seu falecido mentor, uma pontada dolorida de culpa atravessava seu coração mais uma vez.

Se tivesse sido mais ágil. Mais habilidoso. Mais ousado. Talvez...

Talvez tivesse conseguido evitar tudo aquilo.

Entretanto, ele pecou.

Não foi rápido o bastante. Nem habilidoso. Tampouco ousado. Preferiu se manter na sua zona de conforto, enquanto presenciava esperançoso a luta entre seu mestre e o Sith se desenrolar. Acreditava fielmente que o homem conseguiria derrotar o inimigo, nunca duvidou um dia sequer de seu mestre. Mas ele se enganou.

E seu engano custou a vida de Qui-Gon.

Exausto, Obi Wan ergueu os joelhos e afundou a cabeça entre as mãos. Queria acordar daquele pesadelo. Queria poder correr para os braços de seu mestre e pedir orientação sobre o que fazer em seguida.

Mas agora ele não tinha mais a quem recorrer. Não tinha mais o colo de seu mestre. Era praticamente um órfão. Um padawan sem futuro.

Quem o acolheria? Ninguém aceitaria concluir seu treinamento. Sendo assim, seu destino era incerto. O que faria a seguir, Obi Wan não sabia. Qui-Gon acreditava no seu potencial, achava que ele estava pronto para enfrentar os testes e se tornar um cavaleiro, porém não era o que o conselho pensava e como tudo dependida da aprovação dos membros do conselho, talvez nunca tivesse oportunidade. Não depois de ter falhado miseravelmente em proteger seu mestre.

Obi Wan tinha apenas um dever e não fora capaz de cumprir.

E se culparia para sempre disso.

Para sempre.

— Obi Wan! — A voz infantil ecoou em seus ouvidos e o padawan fora obrigado a erguer o rosto inchado. — Obi Wan, eu consegui! Eu consegui... Mestre Qui-Gon não vai acreditar no que eu fiz. Ele não vai...

A empolgação do jovem Anakin se desfez tão rapidamente quanto sua chegada. Ao avistar o corpo caído do homem gentil que lhe oferecera uma vida além da escravidão a poucos centímetros do ruivo, seus brilhantes olhos azuis se apagaram instantaneamente e um semblante confuso tomou conta de sua face juvenil.

Antes que tivesse a chance de poder tocar nas mãos frias e sem vidas do velho Jedi, Anakin foi puxado para longe do corpo. Só então se deu conta de que Obi Wan havia deixado de lado seu estado de lamentação para ir ao seu encontro. Preso pelos dedos que apertavam moderadamente seus ombros, o garoto mal conseguia se movimentar.

— O que aconteceu? Eu quero falar com Mestre Qui-Gon, eu quero falar com ele Obi Wan! —Anakin se exaltou e começou a girar em meio ao aperto do ruivo. — Me solte. Me solte!

— Ele se foi Anakin. Ele se foi... — As palavras morreram nos lábios do padawan desolado e este se permitiu ajoelhar de frente para Anakin. Aos poucos conseguira colocar em ordem seus pensamentos e percebeu que se ficasse na altura do garoto, seria mais fácil para conforta-lo. A empatia pela dor do próximo era algo que deveria ser mais praticado pelos Jedi, lhe dissera Qui-Gon uma vez e Obi Wan faria de tudo para manter os ensinamentos de seu mestre vivos . — Ele está em outro lugar agora. Um lugar bem melhor do que aqui. — Obi Wan engoliu o nó que se formara em sua garganta ao perceber as primeiras lagrimas rolarem soltas pelo rosto do garoto. Com a voz embargada, tentou inutilmente aconselha-lo. — Não chore. Mestre Qui-Gon não gostaria de vê-lo chorando meu jovem.

— Então por que você esta chorando? — Anakin soltou-se de seu aperto e enxugou o rosto com a manga de sua blusa surrada.

Obi Wan não tinha resposta para essa pergunta, embora gostasse de se gabar por quase sempre ter uma resposta pronta na ponta da língua. Mas naquela ocasião, com o seu coração sangrando pela perda de seu mestre, palavra alguma poderia acalentar sua dor e percebeu que o mesmo acontecia com Anakin.

Como era possível, pensou o padawan, que em tão pouco tempo o garoto e seu mestre pudessem ter criado um vinculo tão forte? A resposta para essa pergunta não era difícil de adivinhar. Qui-Gon sempre fora muito querido por todos. Por onde quer que andasse, sua aura reluzente atraia olhares de respeito e admiração.

— Faça alguma coisa, você é um Jedi não é? Faça alguma coisa, traga ele de volta! — Gritou Anakin revoltado.

Anakin não precisaria ter pedido duas vezes se houvesse alguma coisa a ser feita. Se pudesse, Obi Wan trocaria de lugar com Qui-Gon. Daria sua vida pela vida de seu mestre e faria isso sem pestanejar.

Mas, não era possível.

Os Jedi podiam fazer muitas coisas, mas não podiam impedir a morte.

E Anakin teria que aprender isso um dia se quisesse se tornar um Jedi, como era o desejo de Qui-Gon.

E apesar da incerteza do próprio futuro, Obi Wan sabia de uma coisa.

Faria o possível para honrar o ultimo pedido de seu mestre. Treinaria Anakin sozinho se fosse o caso, mas o tornaria um Jedi. Não importava o que lhe custasse.

Ele já havia perdido tudo mesmo.

E embora sentisse um enorme vazio em seu peito, havia alguém que compartilhava de sua dor e que precisava ser amparado naquele momento.

Um pouco relutante, Obi Wan puxou Anakin novamente para perto de si, dessa vez com um pouco mais de carinho e o aninhou contra o peito. Houve certa resistência por parte do garoto inicialmente, mas logo se desfez e ele desatou a chorar como a criança que ele ainda era. Envolvido nos braços do ruivo, o menino entregou-se a dor e chorou até não poder mais. Ali, sentando enquanto continha a própria tristeza pelo bem do jovem Anakin, Obi Wan percebeu que não estava sozinho como pensara instantes antes. Unidos pela dor da perda, ele e Anakin selaram seus destinos para sempre.

Talvez juntos, pensou o padawan, pudessem se recuperar daquela dor e quem sabe, conseguiriam seguir em frente, levando com eles o legado de Qui-Gon.