Annileen era gentil e agradável, mas um pouco curiosa demais. Ben se instalara ali, em meio às colinas, justamente para manter-se afastado dos seus ``vizinhos´´ e o fato de ela ter ido até ele, por mais que suas intenções fossem boas, o deixou incomodado.

   Enquanto ela montava em seu landspeeder, ele conseguiu captar uma parte de seus pensamentos e concluiu, para seu azar, que a moça tinha razão. Havia fracassado no quesito discrição. Ela acertou também a parte em que ele tinha uma história, mas descobrir que Annileen o achava deprimido, bem, o deixou ainda mais deprimido. Não era essa impressão que queria passar para as pessoas, pois isso só aumentaria a curiosidade dos moradores locais. Dor e sofrimento são como néctar para as abelhas: As pessoas adoram saber das tragédias,  parecem se deliciar com a dor alheia.

  Olhando para os sois, Ben removeu o capuz - mesmo tendo noção das consequências a longo prazo que Annileen fez questão de lhe alertar antes de sair - e suspirou.  Outro dia estava terminando e em breve outro começaria... E seria assim pelos próximos anos.

  Um formigamento então o despertou de seus devaneios. Alguém o espionava e estava bem perto. Fez menção de sacar seu sabre de luz, mas o deixou dentro de casa na hora em que o pequeno bantha começara a ``atacar´´sua humilde residencia achando que era sua mãe, afinal não era uma ameaça a sua integridade. Porém, agora estava desprotegido e qualquer movimento poderia desencadear o ataque de seu espião.

— Olá Kenobi... Vejo que tem andado ocupado. — A voz soou divertida de uma forma maldosa.

  Devagar, Ben se virou com as mãos para cima. Ela não era bem uma ameaça, não agora, mas não deixava de ser perigosa. A poucos metros de distância, Ventress estava de pé, portando um único sabre de luz verde e vestia uma túnica preta, com seu rosto coberto por um capuz e uma mascára, deixando em evidencia apenas seus olhos penetrantes.

— Ventress... — Ele disse sem emoção. — Eu te convidaria para tomar um pouco de água, mas digamos que eu prefira que saia imediatamente da minha casa. Não é bem vinda e você com certeza não é um colírio para os olhos.

— Quanta hostilidade. — Ela caçoou. — Achei que tínhamos uma química, mas vejo que já me superou. — Ela indicou o queixo coberto pela mascára na direção em que Annileen seguiu. — Não esperava esse tipo de atitude de um mestre Jedi. Estou desapontada.

  Ben então baixou as mãos e fuzilou Ventress com o olhar. Em seu intimo, agradeceu por Annileen ter partido antes de sua antiga rival aparecer. Teria sido um encontro desastroso.

— Você não teve o prazer de me ver ser hostil. — O Jedi rosnou as palavras. — O que quer afinal? Veio me capturar para me entregar  para o Império? Acredito que me queiram vivo... Devo estar valendo uma boa quantia de créditos para fazer você vir até aqui. — Ele esticou as mãos e cruzou os pulsos. — Acho que esse é o momento em que você me ataca, aproveitando que estou desarmado. Não terá outra oportunidade, acredite.

  Olhando-o com desdém, Ventress desativou seu sabre de luz e o guardou na cintura, retirando sua mascára e o capuz logo em seguida, revelando uma cabeleira prateada e rebelde. Ben percebeu que sua intenção não era ataca-lo. Era como se ela apenas estivesse ali sem interesse algum nele, o que o deixou desconfiado mesmo assim. Ventress era extremamente habilidosa e durante um bom tempo, serviu como aprendiz para Conde Dooku. Embora tenha demonstrado algumas vezes -poucas vezes -  ser alguém que poderia se redimir, Ben não tinha como ter certeza. Um passo em falso e tudo estaria perdido e ele não estava nem um pouco a fim de arriscar.

— Não tenho interesse algum em capturar você. Muito menos entrega-lo para aquele lixo que se tornou a republica. — Ela cruzou os braços. — Vim alerta-lo. — Disse  de forma arrogante.

— Apenas isso? — Com os braços esticados em direção a sua cabana, Ben imaginou seu sabre de luz sobre o balcão e o mentalizou vindo em sua direção. — Acho difícil de acreditar.

— Claro que não! — Ela sorriu. — Você me conhece Kenobi, sabe que eu gosto de ver a desgraça dos outros, principalmente quando se trata de antigos desafetos. Você por sinal me surpreendeu. — Ela abriu os braços. — Chegou realmente ao fundo do poço. No começo duvidei que você fosse capaz de viver aqui, sozinho, longe de toda aquela baboseira de Jedi, longe dos seus amigos... — Precisava ver com meus próprios olhos...

  De forma abrupta, a situação se inverteu. Ao visualizar seu sabre voando em direção a ele, Bem levantou as mãos e o apanhou no alto de sua cabeça. Com um salto, aterrissou atrás de Ventrss, que não teve tempo de reagir.

— Diga a verdade! — Ele exclamou. Sentia seu sangue ferver, mas não sabia se era por causa da adrenalina ou do calor escaldante. — Quem te enviou? — Ele aproximou a luz do sabre no pescoço dela. — Diga Ventress!

— Vamos Kenobi. — Sua voz estava firme. — Termine o serviço. Se isso irá lhe fazer se sentir melhor, então o faça!

  Ele fechou os olhos e inspirou fundo. Durante as Guerras Cônicas, inúmeras vezes duelou com Ventress e em nenhuma delas, sentiu a paz que emanava de sua adversaria naquele momento. Isso o deixou desconcertado. Paz era uma coisa que ele não sentia há um bom tempo, desde os acontecimentos que o levaram até ali, em seu exílio.

  Sentiu a respiração leve e controlada da mulher presa entre seu braço e o sabre e afrouxou o aperto. Assassinar alguém desarmado... Isso sim era chegar ao fundo do poço e ele não fazia questão de descer mais fundo do que já estava.

— Foi o que pensei. — Ela se virou e o empurrou com as mãos. —  E Ainda se acha um Jedi.

— Os Jedi caíram. — Ele evitou olhar em sua direção. — Sou apenas um homem, tentando lidar com seus fantasmas. — Ele desativou o sabre e o guardou. — Mas isso não significa que irei deixar meus ideais de lado e me transformar em um monstro.

— Jedi ou não. — Disse ela, torcendo o nariz. — Me sinto na obrigação de lhe contar sobre o que descobri a respeito do braço direito do Imperador. Acredito que seja do seu interesse. — Ela o analisou. — E pelo que eu soube a seu respeito, estando completamente isolado aqui, não deve saber dos últimos acontecimentos.

— E por que seria do meu interesse? Se não percebeu... — Ele gesticulou ao redor. — Quero me afastar de tudo relacionado ao Império- ele acrescentou em seguida. — E a galáxia.

  Com um sorriso maldoso nos lábios, realçando sua beleza cruel, Ventress balançou a cabeça, em negação. Parecia estar se divertindo.

— Pobre Kenobi. Por mais que eu esteja me deliciando com sua vida miserável, acho que tem o direito de saber que esta em perigo.

— Acredite ou não, o perigo tornou-se um convidado mais prazeroso em minha vida do que você ventress. — Ele passou a mão pela barba e contemplou a mulher a sua frente por alguns segundos. — Mas então diga logo, quem mais esta atrás de minha cabeça que eu já não saiba?

  Pela primeira vez, desde que a conhecera no inicio das Guerras Cônicas, Ben notou a hesitação em Asaji. Toda aquela arrogância e divertimento havia ido embora, deixando apenas uma escuridão em seu rosto.

— Realmente não faz ideia não é? — Ela disse e seus olhares se cruzaram por um instante. — Consigo sentir.

— Não... — Ele disse, massageando a espessa barba ruiva. Seu desinteresse era evidente.

  De repente, uma sequencia de imagens transmitidas pela ex-aprendiz de Dooku invadiram a mente do Jedi e o deixaram tonto. Eram imagens desconexas que mostravam um rastro de destruição e morte e  todas elas tinham em comum uma coisa: Um homem vestindo uma armadura negra e um capacete ocultando sua face. 

  Tonto, ele cambaleou e Ventress segurou seus ombros para que não caísse de encontro ao chão. Suando frio, ele ergueu o rosto pálido para a mulher.

— Quem é... Quem é esse?

— Skywalker... — Ela disse num sussurro.

— Não! — Ele afastou-se dela e se desequilibrou, caindo de joelhos na areia quente. — Não, ele está morto, o matei... Eu o matei! — O desespero tomou conta de seu coração. — Não pode ser... Não acredito em você.

— Pense o que quiser. — Ela encarou os dois sois. — Estava em divida com você e agora estamos quites. — Colocou as mãos na cintura. — Achei que tinha o direito de saber a verdade.

  Atônito, o Jedi sentou-se no chão e descansou as mãos nos joelhos. Balançava quase que inconscientemente para frente e para trás. Tentava absorver aquela informação, mas parecia uma peça num quebra cabeça que não se encaixava direito. Aflito, fitou Ventress e procurou em seus olhos, respostas.

— Como... - as palavras morreram em sua boca.

— Pouco depois da queda da Republica, Coruscant se tornou um inferno. — Ela sentou-se, colocando uma perna em cima da outra, de frente para Ben. — Vi quando queimaram os sabres de luz dos Jedi mortos, nas escadarias do templo. Por mais que eu odiasse vocês — Ela engoliu em seco. — Senti como se uma grande escuridão, ainda maior do que aquela para a qual me entreguei, envolvesse toda a vida existente na galáxia. — Ela parou e olhou para suas mãos. — Decidi que era hora de sair de lá e assim como você, me esconder. Porém fui capturada antes que tivesse chance. — Deu um longo suspiro e encarou o Jedi, ainda mais pálido do que antes. — Como você bem sabe, minha reputação me precede, então pode imaginar o que aconteceu.

  Ele assentiu, quase que automaticamente.

— O próprio Skywalker me ofereceu um lugar ao seu lado...

— Aquele não é Anakin. — Disse Ben com firmeza.

  Asaji deu de ombros.

— Como queira... Ele me ofereceu um lugar ao seu lado e eu recusei. Estava farta de obedecer ordens e queria dar outro rumo para minha vida. — Tirou seu sabre da cintura e o colocou ao seu lado, despertando uma centelha de curiosidade em Kenobi. — Por pouco não fui morta como os seus amigos Jedi. Consegui fugir antes disso. Infelizmente, perdi meus dois sabres naquele dia.

  Abatido, Ben fechou os olhos. Já não bastasse toda a dor que vinha sentindo nos últimos meses, o remorso que remoía seu coração, a duvida que habitava seus pensamentos... Agora isso. Não sabia se sentia alivio ou medo do fato de Anakin ter sobrevivido, mas algo o alertava para se preparar para a segunda opção.

— E você de repente tornou-se uma boa samaritana e veio até mim me dizer essas coisas?  — Ele abriu os olhos cansados e a encarou.

— Fiz o que achei que era certo. Fui traída uma vez, então sei o que deve estar sentindo. — Dessa vez foi Asaji que fechou os olhos e ergueu a cabeça. — Acabou-se o tempo para essas rivalidades Kenobi. Tempos ainda mais sombrios se aproximam, posso sentir.

  Infelizmente ele também tinha essa sensação e por mais que tentasse, não conseguia reprimir a sensação de que no fundo, sempre soube que Anakin ainda estava vivo. Sentia também que mais cedo ou mais tarde, o reencontro entre os dois seria inevitável e dessa vez, ele suspeitava que não tivesse chance de vencer.

  Deixando de lado seus pensamentos por um instante, percebeu surpreso que Ventress estava meditando. Aquilo era uma das coisas que o Jedi jamais imaginou que iria presenciar em sua vida: A mulher que outrora havia tentado inúmeras lhe matar, agora meditava a sua frente, totalmente a vontade como se fossem velhos conhecidos.

  Exausto demais para continuar pedindo que ela fosse embora e com uma baita dor de cabeça, resolveu se juntar a ela e buscar as respostas que precisava no único lugar que julgava ser confiável o bastante:

A força.