Implicância Fora de Série escrita por Saori


Capítulo 3
Desejo paz de espírito.


Notas iniciais do capítulo

Capitulozinho novo no meio do período de provas! Boa leitura ♥



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Rose Granger-Weasley.

É como dizem: um novo dia, uma nova vida. Deixar todos os problemas para trás, no passado, e voltar a rotina como se nada houvesse acontecido. De um tempo para cá, esse tem sido o meu novo lema. De qualquer modo, eu era ótima em deixar as coisas de lado e fingir que nada havia acontecido. 

A minha rotina tem sido a mesma: faculdade, emprego de meio-período e casa. Nada fora do normal, exceto pelo comportamento amistoso entre Scorpius e eu. Fazia cerca de uma semana que não trocávamos insultos ou algo do tipo, o que era, no mínimo, inusitado e educado demais de ambas as partes. Não que fôssemos melhores amigos, na verdade, mal nos falávamos, mas eu reparava nos olhares que ele me lançava, por vez ou outra, embora eu não compreendesse o motivo. Eu tinha que confessar, aquele ar misterioso me matava de curiosidade. E eu odiava ficar curiosa, mais do que qualquer outra coisa. O que Scorpius Malfoy estava planejando agora? A nossa trégua já havia durado tempo demais, eu tinha certeza que aquela mente maligna estava tramando alguma coisa. 

Despertei de meus pensamentos apenas quando ouvi a campainha soar, indicando a entrada de um novo cliente, que era ninguém mais, ninguém menos, que Scorpius Malfoy. Durante um único segundo, trocamos olhares, e eu não saberia dizer o que aquele gesto significava. De qualquer forma, eu dei de ombros, imaginando que, talvez, fosse apenas coisa da minha cabeça. 

Como o de costume, fui até a mesa de sempre, em que ele habitualmente encontrava-se sentado, com o meu típico bloco de anotações e uma caneta em mãos. Eu não sei porque continuava fazendo isso, se eu já sabia exatamente qual seria o pedido. 

— Café preto e sem açúcar. — Pediu, antes mesmo de eu dizer qualquer coisa. 

— Nem imaginava. — Falei, em um tom brincalhão e irônico. — Livro novo? — Indaguei, espreitando os olhos em uma tentativa de ver a capa, mas não consegui. 

— Interessada, Weasley? — Perguntou, sugestivo. 

Eu fiz uma careta ao perceber a pergunta ambígua. 

— No livro, sim. Em você, nunca. — Cruzei os braços. — Não sou como as outras meninas, que ficam caidinhas por caras bonitos, mas idiotas. — Naquele momento, eu oficialmente finalizei a nossa trégua. 

Havia um sorriso orgulhoso em minha face, como se eu tivesse realmente me saído bem ao dizer aquelas palavras, mas foi uma questão de segundos até que ele desaparecesse.

— Então você quer dizer que em acha bonito? — Ele possuía um sorriso malicioso estampado em seus lábios. 

Eu balbuciei, praticamente sem reação, e imaginei que desviar do assunto fosse a melhor saída. 

— Você não me disse qual é o livro. — Insisti, retomando a conversa anterior. 

Scorpius pareceu disposto a mudar de assunto, uma vez que optou por me responder, mas eu sabia que ele não esqueceria o meu comentário infeliz tão cedo. Ele era muito bom quando se tratava de me tirar do sério. 

— Sherlock Holmes. — Ele disse, ao mesmo tempo em que me mostrou a capa do livro. 

— Sir Arthur Conan Doyle, um dos meus autores preferidos. — Falei, animada, com um sorriso nos lábios. — Você deveria ler algum da Agatha Christie, são ótimos. Também são de investigação. 

— Anotado. — Respondeu, seco. 

Eu, por minha vez, adotei uma careta. Ele não parecia minimamente disposto a conversar. Não que eu quisesse dialogar com Scorpius Malfoy, mas, modéstia parte, eu me orgulhava do meu gosto literário e considerava minhas indicações extremamente valiosas. Ele, por outro lado, parecia não se importar nem um pouco. 

— Já trago o café.

Dei meia-volta e fui até a parte de trás do balcão, onde preparei o café do Malfoy. No entanto, confesso que nesse curto período de tempo, peguei-me pensando sobre ele. E, honestamente, detestei isso. Não fazia sentido, afinal, não é normal que você pense muito sobre alguém que odeie. Ou será que é? Odiar seria uma palavra forte demais? Eu não sei, mas posso afirmar, com total certeza, que não nos dávamos bem. Se isso era uma verdade, então por que raios eu estava interessada em saber qual era o livro que ele estava lendo? Porque eu era curiosa, de fato. Mas porque eu também queria saber se ele ia na festa do James na sexta à noite? Porque ele é amigo do Albus, é óbvio, e é esperado que amigos convidem uns aos outros para uma festa. Não havia interesse da minha parte. Interesse nenhum, na verdade. Era apenas a minha curiosidade falando mais alto do que deveria, como sempre. 

Despertei dos meus pensamentos ao notar o café quase despejando da xícara, por pouco, não houve um pequeno acidente. Durante o meu curto trajeto até a mesa em que Scorpius encontrava-se sentado, eu já havia me decidido: eu não pensaria mais em Scorpius Malfoy. Nem mesmo coisas ruins, absolutamente nada. Ele não era digno do meu precioso tempo. 

Quando cheguei na mesa, servi a xícara de café e, sem dizer nada, virei de costas, prestes a ir embora. Todavia, por alguma espécie de karma, o ouvi me chamar, em um tom de voz nada agradável, o que fez com que eu automaticamente me virasse para ele. 

— O que foi? — Indaguei, estranhando a situação. 

Por que ele estava irritado agora? O que a mente dele havia inventado para me estressar agora? Será que eu não conseguia ter um momento de paz? Dez minutos de sossego, era tudo o que eu pedia.  

— O café. Você adoçou o meu café. — Ele carregava uma careta em sua feição carrancuda. 

Descrente do meu próprio erro, eu peguei a xícara de café e experimentei um gole, sem nem sequer pedir permissão. Respirei fundo, indignada comigo mesma. Era a primeira vez que eu errava o pedido de um cliente e, como uma boa admiradora da perfeição, eu estava frustrada. Todavia, eu não deixaria esse mínimo sentimento de culpa impedir a minha língua afiada de agir. 

— Mas não foi você quem disse que um dia poderia mudar o seu pedido? — Perguntei, em um tom de voz levemente afrontoso. — Esse dia finalmente chegou. 

— Rose Granger-Weasley. — Ele se levantou, batendo os pés fortes contra o chão e fazendo com que os outros clientes olhassem para nós. — Eu venho aqui todos os dias procurando por um pouco de paz, mas você consegue tornar esse lugar mais estressante do que a faculdade, de tão irritante que é. Eu só quero tomar o meu café sem açúcar e ler. Só isso. — Ele cuspiu as palavras, sem qualquer piedade.

Se eu fosse uma menina um pouco mais sensível, eu certamente teria chorado após ouvir a sua fala. No entanto, eu sempre gostei mais do silêncio. Foi por isso que eu simplesmente peguei a xícara de café, virei-me e caminhei de volta para o balcão. 

Não que aquelas palavras não tivessem me ferido. Na verdade, eu odiava ter que admitir, mas elas haviam me machucado mais do que eu gostaria. Só que se havia uma coisa que eu tinha aprendido na vida era: não dê suas lágrimas para alguém que não merece, e Scorpius Malfoy certamente não merecia. Aliás, ele sequer merecia um milésimo de minha atenção. A partir daquele dia, ele se tornaria insignificante, apenas mais um cliente qualquer.

Scorpius Malfoy era um idiota. Eu havia concretizado aquelas palavras como uma verdade absoluta em minha mente. Mas, se eu de fato o achava um babaca, por que eu me importava tanto com as suas palavras? Alguma coisa nessa equação nada complexa não fazia sentido.

Movi a cabeça de um lado para o outro, a fim de afastar os meus pensamentos e voltei a minha atenção para o café novamente. Preto e sem açúcar, como o habitual. Terminei de encher a xícara mais uma vez e respirei fundo, antes de me dirigir até ele. Tentei parecer o mais calma possível quando coloquei o pires sobre a mesa, enquanto ele me observava com atenção, como se quisesse dizer alguma coisa que não tinha coragem. Dei de ombros, tentando me convencer de que eu não me importava com qualquer coisa que o Malfoy dissesse, embora houvesse uma pontinha de curiosidade me atiçando. 

Olhei para o rapaz novamente, com certa expectativa. Talvez, por algum milagre, ele fosse fazer um pedido de desculpas por tamanha grosseria desnecessária. Honestamente, eu não sabia o que esperar, só desejava que fosse algo um pouco menos grosseiro do que o costumeiro e, talvez assim, conseguíssemos manter uma relação cordial entre nós. 

— Eu não vou pagar pelo café errado. — Ele proferiu, por fim, quebrando qualquer espécie de expectativa que eu pudesse ter.

Eu não saberia dizer se estava querendo jogar na minha cara o fato de eu ter errado o pedido ou se estava apenas sendo o mesmo babaca de sempre. Mas uma verdade incontestável era: eu não tinha paciência para nenhuma das opções. Apesar da minha vontade de virar as costas e marchar até o balcão, eu precisava, no mínimo, ter algum resquício de postura profissional. 

— Isso é óbvio. — Respondi, com o sorriso mais forçado que já dei na minha vida. — O pagamento hoje será feito apenas no balcão. 

— O quê? — Ele indagou, parecendo confuso. — Mas eu sempre pago diretamente a você. 

— Uma pena. — Disse, ainda com um sorriso. — Desta vez, terá que pagar no balcão. 

— Weasley… — Ele riu, incrédulo. — Está agindo como uma criança. 

— Espera aí. — Dessa vez, fui eu quem gargalhei. — Eu? Eu, Rose Granger-Weasley, estou agindo como uma criança? Porque não fui eu quem acabou de fazer um escândalo simplesmente porque o pedido veio errado!

— Eu pago no balcão, então. — Respondeu, sem demonstrar muita emoção. Havia ficado, nitidamente, sem palavras.

— Ótimo.  — Concordei, ainda forçando um sorriso, mas bufando logo em seguida, quando julguei estar longe o suficiente para que ele não escutasse. 

Olhei ao redor, analisando se havia algum cliente ainda para ser atendido. Nenhum. Espiar o celular de vez em quando não é crime, certo? Recostada em um dos armários, peguei o aparelho e comecei a dar uma olhada nas minhas mensagens. Dominique perguntando qual roupa eu preferia: um vestido azul ou um vermelho, Victoire contando que Ted havia pintado o cabelo de novo, desta vez, de verde e, por fim, uma mensagem de Albus, que, por algum motivo, foi a que me despertou mais interesse: Festa do James, na casa deles, porque tio Harry e tia Gina estariam viajando. Peguei-me pensando sobre o quanto aquilo parecia um clichê de filme americano e fiz uma careta, mas logo dei uma risadinha baixa.

Pensei um pouco sobre a ocasião, afinal, eu não era uma garota que gostava muito de festas. Além disso, as amigas e amigos de James costumavam ser insuportavelmente fúteis ou chatos ao meu ponto de vista, o que me desanimava ainda mais. Decidi ignorar a mensagem de Albus por alguns segundos e ver as outras mensagens, até que me deparei com uma de Lily, pedindo para que eu fosse na festa ou ela se sentiria sozinha. A típica chantagem emocional. E ela era realmente muito boa nisso. Respirei fundo, tentando solidificar a ideia de que eu não iria em minha mente, mas não consegui, porque eu sabia que me sentiria culpada caso Lily ficasse deslocada e, além disso, ela certamente ficaria jogando isso na minha cara no dia seguinte. 

Ainda que parcialmente contra a minha vontade, retornei para a mensagem de Albus e concordei, afirmando que eu iria na festa de James no sábado a noite e o que recebi como resposta foram as seguintes palavras: 

“Não é possível voltar atrás com suas palavras. Agora, Rose, você terá que ir a festa!”

Revirei os olhos com tamanha infantilidade, mas, mesmo assim, aceitei aquele trato, respondendo a mensagem com um sutil “Feito!”. Afinal, estava fazendo aquilo por Lily, que, além de minha prima, era a minha melhor amiga. E que espécie de amiga eu seria se não fosse na festa organizada pelo meu primo, James? Péssima, eu sei. Eu poderia abrir aquela exceção, não morreria e, além disso, meus pais também não encrencariam se eu dissesse que iria para a casa dos Potter, ou seja, as circunstâncias eram absolutamente perfeitas. 

Minha atenção desviou-se totalmente de meus pensamentos quando ouvi o som da voz do Malfoy chamar pelo meu nome, nada sutil. Suspirei, buscando reunir um pouco de paciência e, falsamente, tentando manter a postura de boa funcionária, eu sorri para ele. 

— O que deseja? — Indaguei, apesar de eu pouco me importar e rezar mentalmente para que ele fosse logo embora. 

— Eu desejo paz de espírito. — Mesmo que suas palavras parecessem frias, o seu tom de voz era calmo e centrado. — Mas já que não consigo isso, eu só quero pagar a minha conta. 

— E? — Eu realmente não compreendia. — A Alex está na sua frente, bem no caixa, não está?

— Ah, sim. — Ele concordou, com um aceno de cabeça. — Ela está, de fato, e você disse que eu deveria pagar pelo meu consumo no caixa, mas não disse que não poderia ser com você e adivinha por quem eu quero ser atendido? Rose Granger-Weasley. 

— O quê? —  Eu ri, completamente descrente do que eu estava ouvindo. Naquele instante, o Malfoy havia ultrapassado todos os limites possíveis de criancice. — Isso é ridículo. 

— Não, Granger, não é. — Afirmou, com um tom levemente sarcástico em sua voz. — É a vontade de um cliente, vai negar? 

— No último livro que eu li, o casal que brigava terminou casando. — Alex falou, fazendo com que, tanto eu, quanto o Malfoy, olhássemos para ela, surpresos por uma declaração tão desnecessária. 

A menina, por sua vez, deu de ombros, pouco se importando com nossos olhares nada discretos. Em seguida, encaramos um ao outro, e o rapaz parecia tentar conter uma espécie de riso. Eu não o culpava, era mesmo cômico pensar em nós dois como um casal, mas, além de engraçado, eu diria improvável, impossível, inviável, e qualquer sinônimo que essas palavras possuíssem. Honestamente, se Alex não fosse minha amiga, eu estaria ultrajada por ter que ouvir tamanha baboseira. 

Eu e o Malfoy? Fora de cogitação. Definitivamente. 

— A sua amiga ali é bastante criativa. — Falou, ainda tentando prender o riso. 

Eu queria ficar séria, mas não me contive em rir do comentário de Scorpius. Talvez aquela fosse a primeira e única vez em que concordávamos veemente com alguma coisa em comum. Eu diria ser um verdadeiro milagre. 

— Realmente. Eu e você? Jamais. Tem que ser insano para sequer pensar nessa possibilidade. — Respondi, por fim. 

Ele não pareceu abalado pelas palavras, mas também não pareceu nem um pouco feliz. E, na minha mente  normalmente assertiva, o Malfoy responderia com algum insulto idiota. No entanto, não aconteceu e, particularmente, não compreendi o motivo de ele 

— É esse o valor, certo? — Ele indagou, colocando o dinheiro sobre o balcão. 

— Na verdade… — Peguei algumas moedas de troco na caixa registradora. — Seu troco. — Estendi a minha mão na direção dele, entregando-lhe as moedas.

Por um único segundo, nossas mãos se tocaram e eu pude sentir o gélido de sua pele pálida. Preferi ignorar a sensação agradável que o toque dele me despertou, inclusive o arrepio sutil que me causou. Afinal, era apenas o Malfoy, o cara insuportavelmente chato da cafeteria. Simplesmente e unicamente isso. 

— Te vejo no sábado. — Ele proferiu, um pouco sarcástico e, sem dar muita importância a própria fala ou a minha reação, foi embora. 

Eu estava tão imersa em meus próprios pensamentos que demorei para racicionar as palavras ditas. Por um tempo, pus-me a pensar sobre o que ele estava falando, já que eu não trabalhava nos fins de semana. Talvez ele houvesse se enganado. Aliás, ele não ia vir para a cafeteria amanhã, na sexta? Ele sempre vinha, fazia parte de sua rotina assustadoramente metódica. Mais uma vez, perguntei-me: por que eu encontraria o Malfoy no sábado? E foi apenas quando respondi aquela pergunta mentalmente pela oitava vez que as coisas começaram a fazer sentido. Scorpius Malfoy e Albus Potter eram melhores amigos, James, irmão de Albus, daria uma festa no sábado e, obviamente, Albus convidou o seu melhor amigo. A pergunta de um milhão de galeões era: por que diabos Scorpius Malfoy havia aceitado ir? Ele nunca ia em festas. No entanto, a pergunta mais correta a se fazer era: por que raios eu sequer me importava?


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado! Fiquem atentos que, em breve, postarei o último.