Correio Elegante escrita por Sirena


Capítulo 8
"Sobre de la carta?"


Notas iniciais do capítulo

Obrigada a Isah Doll e Rafa Borges pelos comentários ♥



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“Como você não sabia do filme? Ele é maravilhoso! “Não direi que é paixão” é até hoje minha música predileta da Disney! Espero que o assista, porque realmente vale muito à pena.

Quanto a trocarmos mensagens por whatsapp: por favor, não! Você saberia imediatamente quem sou se te passasse meu número e isto não é do meu desejo. Talvez realmente pudéssemos trocar e-mails, embora eu os ache tediosos. A verdade, é que eu gosto muito de escrever cartas a mão. Pra mim tem todo um ritual nisso que trocar mensagens não têm.

Você pode responder uma mensagem sem prestar atenção de fato no que está sendo conversado, fazendo outras coisas e pensando em noutras infinitas. Agora com uma carta, você realmente precisa se sentar e se concentrar no que está fazendo. Não são apenas palavras bonitas numa folha de papel, é o tempo que você usa preparando algo para a pessoa, é muito mais pessoal! Cada folha parece carregar um significado, um planejamento e um carinho, que é como se dissesse “não me importa o tempo que eu precise gastar, desde que você possa receber isso”. É meloso de minha parte pensar assim, eu sei, mas...

Enfim, se você considerar trocarmos e-mails como algo melhor, eu não me incomodaria, embora como já disse, os ache tediosos, acredito que seja o mais perto de uma troca de cartas que possa existir em um computador.

E, acredite, por mais curtas que sejam suas cartas, é simplesmente impossível não apreciá-las com toda a euforia que cabe no meu ser, Soldeville.

***

— Com toda a euforia que cabe no meu ser. – li em voz alta tentando segurar a risada. — Ele é tão fofo!

— E fresco! – o Gabriel bufou, puxando a Clarisse pra sentar no colo dele. — Qual o problema de trocar e-mails? Eu entendi que o Whatsapp não dá, porque você deve ter o número dele já, mas, quem não tem mais de um e-mail ou nunca fez um Facebook falso que atire a primeira pedra!

— Você acha mesmo que eu já devo ter o número dele? – perguntei, levantando as sobrancelhas.

— Que outra razão pra ele não te passar o número teria? – o Biel deu de ombros, enquanto revirava os olhos.

— Eu gostaria de receber uma carta. – Clarisse comentou, ajeitando o cabelo cacheado sobre o ombro.

— Ai, mas é tão chato isso!

— Hum, então tá, Gabriel. – ela bufou se levantando do colo dele e indo embora se juntar com as amigas.

Franzi a testa, confuso. Eu jamais imaginei a Clarisse tendo esse tipo de reação por uma única frase do Gabriel, embora eles estivessem brigando constantemente já fazia um tempo.

— Eu sempre disse que vocês não combinavam muito. – opinei, enquanto ele continuava com o olhar perdido, encarando a direção por onde ela tinha ido.

— Eu sei, eu sei. Mas, sei lá. Parecia que ia dar certo. – ele suspirou, coçando a bochecha. — Mas, ela anda muito irritada desde que começou a trabalhar. Tipo, trabalhar de verdade.

— Normal, acho. Trabalhar é irritante. – bocejei enquanto falava. — Maravilhoso, mas irritante. E ela tá trampando como balconista, né? Quem quer trabalhar lidando com gente? – era muito triste que agora eu só tivesse aulas com a Clarisse aos finais de semana. Mas, era apenas nesses dias que ela folgava do mercado, então eu tinha que aceitar.

— Falando nisso você conseguiu arranjar algum emprego?

— Ainda to procurando. – suspirei. — Acho que vou fazer que nem a Clarisse fazia e lucrar em cima dos alunos burros das outras salas.

— Pra lucrar em cima de alunos burros, você tem que ser um aluno inteligente e isso você não é. – Gabriel deu de ombros se levantando e me seguindo de volta para a sala quando o sinal bateu, sinalizando a troca de aulas.

— Isso é verdade. – suspirei. — Quando eu deixei de ser um aluno inteligente? – eu era tão esperto no ensino fundamental, mas chegou no ensino médio e aparentemente eu tinha ficado com tanto Q.I quanto uma planta. Ok, talvez não como uma planta, porque plantas são inteligentes: elas fazem fotossíntese. Acho que uma comparação melhor seria a de um organismo unicelular.

Estávamos matando a aula de matemática, mas, agora começaria a de filosofia e eu não tinha condição de perder essa aula. Era minha favorita! Todos aqueles pensamentos e reflexões para se aprofundar e que me levavam a questionar tudo que havia ao meu redor de alguma maneira.

Suspirei enquanto entrava na sala de aula e ia para o meu lugar. Enquanto a professora começava a explicar, abri meu caderno em uma folha limpa e comecei a escrever uma carta. Quando terminasse, decidi que iria entregar para o Paulo corrigir o que estava errado, ele era o melhor da sala em português, matéria na qual eu era horrível, então ele poderia me ajudar a saber se estava tudo correto, suponho.

“Tá bom, então eu vou procurar esse filme e tentar assistir ainda hoje e depois te mando uma carta contando o que achei.

Sobre trocar e-mails: eu estou rejeitando minha própria ideia depois da sua explicação. Nunca tinha pensado muito sobre isso, mais, acho que tem sentido. Adorei saber o quanto isso tem significado pra você, de alguma forma conseguiu tornar todas as cartas que já me mandou ao longo dos anos, muito mais profundas e significativas do que eu já as considerava.

Você é realmente um doce, sabia, Quinze?

É engraçado escrever isso como um nome próprio aliás, mas é como eu e meus amigos nos referimos a você, já que não sei seu nome e é o primeiro numero que você escreve no sobre sempre.

Enfim, fico contente que considere essas cartas mesmo que curtas, razões de tamanha felicidade.”

 

— O que diabos é “sobre”? – o Paulo me perguntou, corrigindo a carta.

Franzi os lábios, olhando o que tinha escrito sobre o ombro dele, tentando separar o português do espanhol na minha mente para poder traduzir aquilo. Eu sempre acabava confundindo as duas línguas quando ia escrever, era um inferno quando isso acontecia durante uma prova. Mas, o que posso fazer se as vezes a palavra em português me fugia?

Quando comecei a frequentar a escola as professoras tinham dificuldade de entender o que eu falava; sempre falei ambas as línguas em casa, sem qualquer diferença, quando fui para escola, não era incomum acabar falando "pizzara" em vez de "lousa" e pedindo emprestado o lápis "rojo" ao invés do lápis vermelho.

Apenas com o tempo comecei a entender que espanhol e português não eram a mesma língua e que devia falar só em português. Mas daí para entender o que era português e o que não era, foi um inferno! Até hoje, quando falava ou escrevia no automático acabava embaralhando tudo.

— É aquele negócio onde a gente põe a carta. – dei de ombros, a palavra me escapando por mais que eu tentasse lembrá-la. — Onde vai o selo e o remetente e tudo mais.

— Envelope? - Paulo me encarou, arqueando a sobrancelha e provavelmente me achando idiota. Idiota era ele.

— Isso!

— Sobre de la carta?

— Sobre de carta só, não tem esse la aí não. – bufei. — Quer praticar?

— Tá bom. – ele sorriu, sem perceber que minha sugestão foi brincadeira. Suspirei, aceitando e me preparando para falar apenas em espanhol. — ¿Quieres ir al cinema este fin de semana?

— Cine. – corrigi, revirando os olhos. Ele praticava espanhol comigo desde que nos conhecemos e mesmo assim sua pronuncia era toda enrolada e sua gramática toda errada.  — Me gustaria, ¿qué película veremos?

— En el momento decidimos. – Paulo deu de ombros, falando daquela maneira mecânica de quem não tinha certeza de estar pronunciando e formando frases corretamente, enquanto voltava a prestar atenção na carta e franzindo os lábios para algum erro. Provavelmente outro erro de “mas” e “mais”.

— ¿Llamamos a alguien más?

—... Si tu quiseres. – ele fez careta e deu de ombros novamente, me devolvendo a carta e fechando a cara.


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