Universo em conflito escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 38
Missão quase impossível




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Faltavam quinze minutos para seis horas quando Agnes chegou. Por mais que odiasse acordar cedo, ela ainda precisava agir de acordo com as regras da organização para não atrair nenhuma suspeita. E isso incluía voltar a usar aquelas roupas horríveis. Pelo menos Penha tinha lhe arranjado uma boa peruca, assim ela não teria que tingir seus cabelos.

O mês de setembro estava quase acabando e sua ansiedade aumentava a cada dia. Será que tudo ia estar pronto a tempo? O que aquele idiota do Cebola poderia fazer para ajudá-los? As sombras não lhe falavam muita coisa, o que era irritante porque ela detestava ficar sem informação nenhuma. Ela não sabia o que fazer com o rapaz, nem da real participação dele para a volta da Serpente.

A única coisa que lhe disseram era que ele tinha grande importância para a nova ordem mundial e por isso deveria ser deixado em paz. Tirando isso, as sombras se recusaram a lhe dizer mais. Era preciso deixar que as coisas seguissem seu curso natural, lhe disseram, e não cabia a ela questionar.

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Cebola não queria colocar as mãos naquela coisa nunca mais. Da última vez que fez isso, quase causou a destruição do mundo e a morte de milhões de pessoas. Felizmente seu lado racional acabou falando mais alto e ele não teve outra escolha a não ser vencer o sentimento de repulsa e pegar a chave. Os papéis também chamaram a sua atenção.

Ele os pegou com cuidado. Eram antigos, mas não a ponto de esfarelar entre seus dedos.

“O que é isso?” eram quatro folhas escritas num idioma desconhecido e alguns desenhos. Mesmo assim ele dobrou com cuidado e guardou dentro da camisa para que não amassassem. Se estavam ali, então deviam ser importantes. Depois fechou o cofre e decidiu que era hora de sair daquele escritório.

— Ei, você! O que fazia no escritório do Sr. Malacai? – uma voz autoritária perguntou rudemente assim que ele abriu a porta e pôs um pé no corredor. Por que aquele maldito segurança tinha que aparecer justo naquele momento?

— Eu... eu só tava limpando e... – ele abaixou o boné e tentou engrossar a voz para parecer mais velho.

— O escritório do Sr. Malacai estava trancado e só é limpo na presença dele! Como você conseguiu abrir?

— Já estava aberto.

O segurança chegou mais perto e olhou o crachá em seu peito.

— Fabrício Almeida? Nunca vi você por aqui!

— E-eu fui contratado ontem, senhor!

— Fique onde está enquanto checo com o RH.

Ele tirou um celular do bolso e fez uma ligação enquanto vigiava atentamente qualquer movimento do Cebola. Ficar onde estava era a última opção e ele se preparou para sair correndo. Mas infelizmente a sorte não estava muito a seu favor. O temido Tonhão veio pelo outro lado e ele ficou cercado pelos dois.

— O que está acontecendo aqui?

— Ele entrou no escritório do Sr. Malacai.

— E como ele fez isso? O escritório está sempre trancado. Quem é você, rapaz? – Tonhão olhou direito e arregalou os olhos. Cebola soube que tinha sido reconhecido no mesmo instante. E como azar pouco era bobagem, ele ouviu uma voz rouca que lhe deu arrepios. 

— Que confusão é essa em frente ao meu escritório? – ele viu Sr. Malacai chegar todo encurvado e apoiado em sua bengala. Será que tinha como ficar pior?

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Ao chegar perto do escritório do Sr. Malacai, Agnes viu o pequeno tumultuo que se formava em frente a porta de entrada. Um segurança, Toni e o próprio Sr. Malacai interrogavam um homem vestido de faxineiro.

— O que houve? – ela quis saber quando se aproximou e logo entendeu. Aquele sujeito magrelo enfiado num uniforme de faxineiro era ninguém menos que o Cebola usando uma maquiagem mal feita imitando cavanhaque e tentando esconder o rosto com o boné. Finalmente aquele moleque resolveu fazer algo de útil!  E pela forma que ele colocava a mão por cima do bolso da calça, ela deduziu que tinha encontrado e sentiu um frio no estômago. Aquilo podia significar um grande avanço para seus planos. Isso, claro, se ele não fosse preso ali mesmo.

Isso não podia acontecer, então ela se concentrou um pouco, só o suficiente. Cebola não ia ser afetado, mas os outros sim e isso ia lhe dar uma chance para fugir.

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A chegada de Agnes só fez seu pavor aumentar mais ainda, pois ela seria capaz de reconhecê-lo mesmo sem tirar o boné.

— Você não tem respeito? Tire esse boné enquanto estiver na minha frente. – Sr. Malacai chegou mais perto e tirou-lhe o boné bruscamente. Seus olhos se arregalaram. – Você! Eu conheço você!

Uma tonteira desagradável tomou conta dele antes que pudesse falar qualquer coisa. Os outros se sentiram da mesma forma, inclusive o forte Tonhão. Cebola decidiu não perder tempo e saiu correndo pelo corredor em direção a saída, só que viu pelo menos quatro homens vestido de preto correndo na sua direção e logo deu meia volta. O grupo que o abordou ainda parecia se sentir mal e não foi difícil esquivar deles.

Não havia nenhuma escada no local onde ele se encontrava e não dava para pegar o elevador. Havia somente alguns escritórios e Cebola entrou rapidamente em um deles, trancando a porta e colocando uma cadeira para reforçar.

— Droga, como eu saio daqui? – ele sabia que iam derrubar aquela porta em pouco tempo. O rapaz correu para a janela e bufou de raiva. Era o último andar de um prédio com doze andares. Só havia duas formas de sair dali: voando ou...

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— Me ajude a levar Sr. Malacai para o escritório. – Agnes pediu e Toni teve que obedecer ainda que estivesse confuso. O que aquele maluco estava fazendo ali?

— Ele não parece bem.

— Não se preocupe, ele vai se recuperar rápido. – Os dois ajudaram o idoso a sentar na sua cadeira. - Agora vá, podem precisar da sua ajuda.

— Tem certeza? – ele perguntou indeciso.

— Sim. Eu assumo daqui por diante.

Ele acabou obedecendo e ia correr na direção do Cebola quando uma idéia totalmente louca lhe ocorreu. Todos os seguranças e inspetores da organização estavam correndo de um lado para outro tentando pegar o intruso. Isso só podia significar uma coisa e ele precisava tentar de qualquer forma.

Sem perder tempo, ele correu até os alojamentos e abriu uma porta rapidamente.

— Que foi, cara? – Manezinho levou um susto com sua entrada brusca.

— Não há tempo pra explicar agora. – Toni abriu seu armário, pois os dois passaram a dividir o mesmo quarto, e tirou de lá um dos seus uniformes de inspetor. – Anda, veste isso rápido. Não podemos perder tempo!

O outro obedeceu sem questionar e vestiu a roupa em menos de dois minutos. Ele mal terminou de amarrar os sapatos quando Toni agarrou o seu braço e os dois saíram correndo.

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As batidas na porta ficaram mais fortes e Cebola viu que não tinha muito tempo. Vozes furiosas bradavam do outro lado.

— Abra ou vamos chamar a polícia! – e mais batidas e socos.

Sem outra opção, ele saiu pela janela e se apoiou no beiral do prédio, que era só um pouco maior que seus pés. Não havia nenhuma árvore, nem um local macio onde podia cair. Só o chão duro de concreto.

A porta foi arrombada com um “crás” forte e ele se afastou rápido da janela, andando de lado, suando frio e tremendo.

“Não olhe pra baixo, não olhe pra baixo!” embora não tivesse muito medo de altura, Cebola se esforçou e olhou só para frente enquanto se afastava da janela.

— Volta aqui, seu louco! – Um segurança gritou com meio corpo para fora da janela.

— Você vai cair! – outro homem falou e Cebola continuou se afastando. Ao chegar na esquina do prédio, ele saiu da vista deles e viu que estava na parte de trás, com um pequeno beco e nada para amortecer sua queda. Não tinha jeito.

— Eu vou ter que pular. Porcaria! – ele era imortal, logo a queda não podia matá-lo. Mas com certeza ia doer mais do que cem coelhadas e ainda tinha o risco de ele perder os sentidos por muito tempo e ser capturado. Bem, ele precisava correr o risco. Não tinha outro jeito.

Respirando fundo, ele fechou os olhos e inclinou o corpo para frente. Os pés se soltaram da beirada e por um tempo ele sentiu o vento contra seu corpo, a sensação da queda livre, o vazio ao seu redor. Um frio na barriga, outro na espinha e o coração batia acelerado fazendo uma descarga de adrenalina correr por todo seu corpo. Ele manteve os olhos fechados porque não queria ver o chão se aproximando rapidamente antes do baque final. E ele nunca chegou a vê-lo.

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Toni e Manezinho corriam acompanhando o fluxo de inspetores e seguranças, depois deram a volta e entraram em uma sala no segundo andar.

— O que a gente tá fazendo aqui? – Manezinho perguntou olhando para os lados.

— Todas as saídas devem estar sendo vigiadas, então a gente vai ter que dar outro jeito.

Ele foi até a janela e avaliou a altura. Uma janela no segundo andar não era exatamente fácil, mas por sorte tinha muitos tijolos soltos na construção e alguns sacos de lixo lá em baixo. Devia ser o suficiente.

— Vem, a gente precisa pular.

— Tá doido?

— Doido é você se não aproveitar essa chance! Anda! Olha como eu faço e tente fazer igual.

Toni subiu na janela e foi descendo se apoiando nas falhas dos tijolos. Quando viu que não estava tão alto assim, soltou as mãos e caiu em cima dos sacos de lixo. Foi com muita dificuldade que Manezinho o imitou e por pouco não quebrou a perna ao cair.

— E agora?

— Eu conheço o cara que invadiu a organização. Você vai fugir com ele.

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Duas mãos fortes seguraram a gola da sua camisa, parando a queda bruscamente quando ele estava a pouco mais de um metro do chão. Seu corpo foi descendo lentamente até seus pés tocarem o solo. O rapaz desmoronou porque suas pernas tinham virado gelatina.

— Mas o que... – ele virou-se rapidamente para ver o que tinha acontecido e a única coisa que pode ver foi uma pena bem negra caindo lentamente. Ele a segurou no ar, mas não teve tempo de contemplá-la. O som da porta dos fundos se abrindo lhe chamou a atenção e ele saiu dali rapidamente em direção a rua. Tarde demais. Outros homens cercaram a saída do beco. Devia ter mais de dez e ele não tinha condições de enfrentar nem ao menos um deles.

— Você está cercado! Não resista que é pior! – um deles falou e o grupo avançou para segurá-lo.

Um deles gritou, e mais outro. Um sujeito encapuzado abatia os homens um a um usando uma barra de ferro. Ele desviava dos golpes, girava a barra agilmente entre as mãos e derrubava um por um. Um deles ainda tentou agarrar o Cebola por trás e caiu no chão rapidamente. Uma corrente estava amarrada aos seus pés.

Outros também foram golpeados com a corrente e um terceiro elemento apareceu como um tornado, distribuindo chutes, socos e homens de preto voaram para todas as direções. Antes que Cebola pudesse entender o que estava acontecendo, o terceiro membro pegou sua mão e o puxou com força.

— Vamos logo! – uma voz feminina falou fazendo-o sair do choque e eles correram com o grupo. 

— Vocês não vão a lugar nenhum! – Dois seguranças apareceram e estavam armados, para desespero de todos.

— Levantem as mãos agora! – o segundo homem falou apontando a arma para eles e ergueu um rádio para chamar reforços.

Os dois estavam tão distraídos que não perceberam dois rapazes fortes chegando por trás e foram golpeados na cabeça, perdendo os sentidos na mesma hora.

— Vocês precisam sair daqui agora. – Toni falou. – Mas quero que o levem com vocês. Ele precisa fugir daqui.

Cebola entendeu quem era o outro rapaz e não protestou.

— Valeu, cara!

— Não fiz isso por você. Agora vai logo! - ordenou saindo de lá rapidamente.

O grupo fugiu dali e viram mais três inspetores correndo atrás dele.

— Nós vamos pegar vocês... droga! - um cesto de lixo bem grande e pesado voou na direção deles, atingindo-os em cheio e espalhando restos de comida e lixo para todos os lados. Quando conseguiram se livrar de toda aquela nojeira, o grupo já tinha sumido.

— Eles vão pegar a gente! – Cebola falou quase pondo os bofes para fora de tanto correr.

— Não mesmo. Por aqui! – Mônica liderou o grupo em direção a um carro que já estava com o motor ligado.

— Andem logo! – o motorista gritou apressado e Mônica abriu a porta da frente enquanto Cebola abriu a de trás e saltou para dentro de qualquer jeito, seguido por Magali e Manezinho. Cascão entrou por último e o carro saiu em disparada chiando os pneus com a porta ainda aberta e as pernas dele balançando do lado de fora.

— Vai, vai vaaaai! – Magali gritou enquanto ajudava a colocar o namorado para dentro. O carro saiu em ziguezague, assustando as pessoas pela rua e quase batendo nos outros carros.

Os jovens olharam para trás à tempo de ver um grupo grande de pessoas vestidas de preto correndo atrás do carro. Aos poucos eles foram tomando distância até perderem o grupo de vista.

Quando estavam em segurança, eles recostaram no banco do carro e tiraram o capuz que cobria suas cabeças.

— Vocês estão bem? – o motorista perguntou tirando o capuz enquanto a outra mão conduzia o volante. Cebola estava totalmente desorientado e ainda sob efeito do susto que passou momentos antes.

— Tá tudo bem, Quim, obrigada! – Mônica respondeu e voltou-se para o Cebola — Tudo bem com você? Nossa, você tá pálido!

Cebola respirou fundo e respondeu com outra pergunta.

— M-mas como vocês...

Magali veio ao seu socorro.

— Eu pedi pro Quim ajudar a gente nos dando carona. Ele conseguiu um carro emprestado, a gente cobriu a placa e tamos aqui. – Cebola olhou para todos com gratidão.

— Puxa, gente! Nem sei como agradecer! Valeu mesmo, Quim!

— Tranqüilo.

Para o Cascão não estava exatamente tranqüilo porque não lhe agradou muito ver Magali pedindo ajuda ao ex-namorado, mas era por uma boa causa e ela garantiu que não havia mais nada entre eles. E passado o susto, ele desatou a rir.

— Cara, isso foi muito doido! Parecia coisa de filme! – Magali acabou rindo também.

— Rapaz, fazia muito tempo que eu não batia em ninguém! Tava até com saudade!

Mônica também ria e comemorava o resgate bem sucedido do Cebola e até ele deu umas risadas também sentindo-se muito aliviado e feliz por não estar sozinho naquela empreitada.

Os quatro tentaram se acomodar direito no banco de trás e Cebola falou para Manezinho.

— Fica tranqüilo que vou arrumar um lugar seguro pra você ficar. Depois a gente vê o que faz.

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— Como vocês o deixaram escapar? – Sr. Malacai bradou furioso dando um soco na mesa. Os homens a sua frente estavam de cabeça baixa e muito envergonhados.

— Três cúmplices apareceram, senhor, e abateram vários dos nossos homens. Alguns tiveram que ser mandados ao hospital e...

— Basta, não quero desculpas! Eu espero que ele não tenha roubado nada de valioso ou vocês pagarão caro por isso. Agnes!

— Sim Sr. Malacai. – ela respondeu com a voz calma e monótona.

— Chame o delegado. Eu sei muito bem quem é aquele rapazinho e quero que uma viatura seja mandada à casa dele agora mesmo!

Seu rosto frio e calmo escondeu o nervosismo e medo. As sombras deixaram bem claro que nada podia acontecer ao Cebola. Então ele não podia ir preso de forma alguma. Era hora de agir.

— O que está esperando para cumprir minhas ordens? Exijo o delegado agora mesmo e... maldição, por que estou me sentindo tão cansado?

— O senhor sofreu um estresse muito grande, Sr. Malacai. Precisa descansar.

— Só vou descansar quando aquele delinqüente for preso!

O velho ficou cada vez mais pálido e cansado. Até os homens dentro da sala também se sentiam mal.

— O Sr. Malacai não parece bem, acho que devíamos levá-lo a enfermaria. – Agnes falou solenemente amparando o velho. Antônio, chame o médico. Senhores, peço a sua licença.

Toni foi cumprir a ordem e os outros homens se retiraram, deixando Agnes e Sr. Malacai sozinhos.

— O que aquele moleque roubou? Eu preciso saber! – o homem se levantou rapidamente, surpreendendo até Agnes que pensou que ele estivesse fraco demais.

— Senhor, precisa ficar parado.

Ele foi até a parede e a tocou, fazendo com que um cofre aparecesse. Rapidamente, ele abriu e sua voz saiu angustiada e rouca.

— Céus... não pode ser! Ele roubou a chave de ossos! E as folhas! Estamos condenados! – o ancião falou sem importar com a presença de Agnes, sem se importar com mais nada. Todos os seus esforços para proteger o mundo foram em vão.

O velho caiu de joelhos, cada vez mais fraco e Agnes colocou uma mão no ombro dele.

— Descanse, Sr. Malacai. Descanse, tudo ficará bem.

— Você não entende... aquela chave... a barreira...

— Shhh... Não fale mais. Acabou.

— Como acabou? Agnes... Não pode ser... – sua visão foi ficando cada vez mais turva até ele fechar os olhos por completo. A última coisa que conseguiu ver foi um sorriso perverso naquele rosto de porcelana.


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