Universo em conflito escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 28
Quando as luzes se apagam




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Foi com alegria que Cebola recebeu seus amigos.

— E aí, careca? Belê?

— Eu fiquei muito preocupada, viu? – Mônica falou lhe dando um abraço e um beijo no rosto, deixando-o bobo e sem ação.

— Credo, sua cara ficou toda amassada! – Magali falou com seu jeito meio casca grossa.

— Eu tô bem, pessoal. Vamos conversar lá no quarto.

Os quatro foram para o quarto e Cascão perguntou.

— Sua tia tá te deixando ficar aqui?

— O Rômulo sumiu, então tá tranqüilo eu dormir aqui agora.

— Então tá tudo bem entre vocês? – Magali perguntou.

— Tá sim. O Sr. Afonso tá resolvendo as coisas da dívida e acho que vai dar tudo certo.

— Que bom. – Mônica disse. – Olha, eu trouxe isso. – ela lhe deu uma embalagem de plástico que tinha um bolo de morangos rodeado com biscoitos amanteigados que fez os olhos da Magali brilharem.

— Valeu! Vou ver se tem refri pra gente comer com o bolo!

Ele foi até a cozinha, pegou copos, refrigerante e levou para o quarto junto com pratos, uma faca e colheres.

— Poxa, cara, valeu por ter tirado aquele animal de cima de mim! Pensei que fosse morrer!

— O Cascão sempre mandou bem na hora da briga. – Magali falou com a boca cheia de bolo. – Se ele tivesse usado aquela barra de ferro, o seu primo estaria no hospital agora.

O sujinho ficou um tanto sem jeito com o elogio.

— É... acho que ainda dou pro gasto.

Cebola reparou que seu amigo estava um tanto estranho e quis saber.

— Tá tudo bem? Você ficou encrencado por ter batido no Rômulo?

— Não, tá tudo bem. Meus pais até ficaram orgulhosos de mim. É que... bem... você ficou muito mal.

Os três olhavam para ele de forma estranha.

— Mal? Como assim? – Magali falou de uma vez.

— O Cascão falou que você tava morto.

— Ah, tá. Isso. – ele já tinha morrido tantas vezes que nem se importava. Mas é claro que seus amigos alternativos não estavam acostumados com esse tipo de coisa.

— E você fala com essa cara? Cebola, o Cascão falou que seu coração nem tava batendo mais! – Mônica falou sacudindo o rapaz segurando pelos ombros.

Cebola viu que não ia dar para enrolar os amigos porque Cascão garantiu que naquela noite o coração dele tinha parado de bater, ele não respirava e nem tinha pulso. Até os paramédicos acharam que não tinha mais jeito de socorrê-lo.

Magali pensou um pouco e apontou para o braço dele.

— É a marca de IOR, não é?

— É sim. Por causa dela, eu não morro.

— Então tu é imorrível? Véi, que doido! Eu também quero!

O jeito com que Cascão falou acabou fazendo com que todos dessem risada.

— É imortal, cara. – Magali falou enxugando as lágrimas. – Parece que o Cebola tem vidas infinitas então.

— Mais ou menos. Quando os quatro cavalos aparecerem, o selo vai se romper e a Serpente irá voltar. – ele acabou soltando sem querer e depois viu que tinha falado demais. Será que seus amigos estavam preparados para aquele tipo de coisa?

Os três olharam para ele durante um tempo e o crivaram de perguntas.

— Serpente? Tipo assim, uma cobra?

— De quais cavalos você tá falando?

— Como é que essa marca aí vai se romper?

— O que vai acontecer se a serpente voltar?

— Peraí... a tal serpente já esteve aqui alguma vez?

Ele se esforçou para responder as perguntas do jeito que sabia.

— Calma aí, gente, eu também não sei de muita coisa não. Só sei que tem uns cavalos, mas não é cavalo bicho, são pessoas. Aí eles aparecem, o selo se rompe, a Serpente volta e geral morre. Foi o que a Dona Morte me falou. – daquela vez ele mordeu a língua de raiva. Que droga, ele estava parecendo o Cascão com sua boca enorme!

Foi difícil convencer seus amigos de que não estava delirando. Por sorte, Tia Nena tinha falado algumas coisas para Magali, mas ainda assim eles estavam céticos sobre a volta de uma entidade que ia destruir toda a raça humana.

— E que cavalos são esses aí? – Cascão quis saber e Cebola respondeu com base nos cavalos que já apareceram.

— Cavalo vermelho da guerra, o pálido da morte, branco da decadência e... e.. – ele não sabia do quarto, pois ainda não tinha aparecido no mundo original.

— Cavalo negro da fome. – foi Magali quem respondeu. – E o terceiro é da peste, não decadência.

— Ah, é. – Pensando bem, cavalo da peste teria combinado melhor com o Capitão Feio.

— E você acha que isso existe mesmo?

— Olha, Mônica, depois do que tem acontecido nesses últimos dias, tô começando a achar que sim. Primeiro a gente não conseguia ficar perto da Agnes, agora podemos por causa dos talismãs que o Cebola fez. Depois o Cascão viu que ele tinha morrido e agora tá aqui vivinho da silva. Então isso pode ser verdade.

— É verdade. – O rapaz falou.

Uma decisão precisava ser tomada e Cebola sabia disso. Ele devia contar a verdade para seus amigos ou ficar quieto por mais um tempo?

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A conversa que teve com Denise não saía da sua cabeça. E o pior era que aquela ruiva danada tinha falado a verdade sobre a queima de livros! Aquilo seria mesmo certo? Tudo bem queimar livros fúteis que não tinham nenhum valor educacional, mas queimar livros didáticos? Aquilo não fazia o menor sentido para ele.

Outra coisa o perturbava. Denise tinha falado que Sr. Malacai não era o santo que ele imaginava. Claro que ela estava mentindo, só que Antônio não conseguia aceitar que alguém pensasse mal do bondoso Sr. Malacai. Mesmo não sendo perfeita, aquela  organização mas estava trazendo ordem para aquele caos em que a cidade estava se tornando. Alguém precisava colocar as coisas nos trilhos.

Ele trabalhava preenchendo alguns papéis enquanto Sr. Malacai falava ao telefone com alguém.

— Ótimo, então está tudo arranjado! O novo delegado vai assumir amanhã. Vocês fizeram um bom trabalho.

Ele tentava se concentrar em seu trabalho, mas estava difícil esquecer o rosto da Denise e o jeito com e ela o olhou. Nunca ninguém o enfrentou daquela forma além da Magali e do cobaia. E diferente deles, ela jamais teria condições para encará-lo numa briga e mesmo assim o desafiou sem medo nenhum. Se bem que ele não pretendia fazer nada.

Ainda assim ele se sentia muito desconfortável por ela tratá-lo como se fosse um valentão que ameaçava as pessoas para impor respeito. O pior era que ele se sentia assim mesmo. Será que no fundo ela tinha razão?

— Antônio. – Sr. Malacai o chamou. – Eu preciso que você busque as cópias de alguns documentos para mim no setor G, terceiro andar. – ele preencheu uma ficha e entregou ao rapaz.

— Sim senhor.

Aquela organização era muito burocrática. Qualquer requisição tinha que ser por escrito e enviada ao setor correto. Muitas vezes era preciso andar de setor em setor porque uma requisição exigia outra e mais outra. Quem não estivesse acostumado poderia enlouquecer facilmente. Pelo menos ele teve a sorte de ir e voltar sem grande demora e ao entrar no escritório, se surpreendeu ao ver um inspetor ao lado de uma moça que parecia ter uns dezessete anos.

Ela não era muito alta, tinha cabelos bem pretos e se vestia como todas as moças da organização, de maneira muito sóbria e sem nenhum enfeite.

— Assim está bem melhor. Aqueles cabelos eram um escândalo! Mulheres devem ser muito recatadas e não chamar atenção de forma alguma. Estão dispensados.

Antonio observou discretamente os dois saindo e ao ver que o rapaz não tinha entendido nada, Sr. Malacai explicou após conferir os documentos.

— Aquela moça tinha cabelos loiros, o que eu acho um absurdo.

— Senhor? – aquilo não fez sentido nenhum, pois ele loiro e Sr. Malacai nunca falou nada.

— Mulheres nunca devem chamar a atenção. Acho que todas, sem exceção, deveriam ter cabelos pretos ou no máximo castanho-escuro. Hum... – ele coçou o queixo por alguns segundos. – Sabe... acho que isso pode ser arranjado facilmente...

Ele não gostou nem um pouco da cara que aquele velho fez.

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Rômulo ressonava na cama como se o resto do mundo não existisse. Todo o apartamento foi revirado, muitas coisas quebradas e espalhadas pelo chão. No banheiro, ela chorava de raiva ao ver seu rosto cheio de hematomas. Como ela foi se envolver com aquele sujeito?

Enquanto namoravam, ele parecia carinhoso e protetor, mas desde que se mudou para seu apartamento, sua vida se tornou um inferno. Fazia uma semana desde que ele atacou aquele rapaz e precisou ficar escondido ali para não ser preso, mandando e desmandando como se fosse dono de tudo e pagasse as contas.

E agora isso: ele se achou no direito de lhe agredir porque não tinha mais cerveja e ela se recusou a pedir dinheiro emprestado.

— Sua vagabunda, eu te enchi de presente caro e você não pode fazer isso pra mim?

Seus gritos ainda ecoavam, assim como os socos. Como se isso não bastasse, ele também a ameaçou. Se chamasse a polícia ou contasse para alguém, ele ia dar um jeito de fugir e lhe perseguir até no inferno se fosse preciso. Ela ficou com muito medo e chorava no total desespero.

— Hum? – a jovem se assustou ao ouvir um barulho e foi dar uma espiada no quarto. Rômulo continuava dormindo. Ela voltou para o banheiro e tratou de limpar e cuidar dos ferimentos. Como explicar aquilo aos seus colegas de trabalho?

Enquanto aplicava um curativo, ela ouviu novamente o barulho e ficou em alerta. Não era exatamente um barulho e sim um som estranho que não havia como definir. Talvez um sussurro, misturado com o som de algo que parecia rastejar pelo chão. Seu coração batia descompassado a medida que o som foi aumentando. Será que ele tinha batido tão forte em sua cabeça a ponto de fazê-la ter alucinações?

“Denuncie. Peça ajuda.” Ela ouviu muito baixo e por pouco não gritou de medo.

— Quem tá aí? – perguntou com o corpo tremendo.

“Apague a luz.”

Essa era a última coisa que ela queria fazer. Como apagar as luzes tendo uma coisa estranha dentro de casa?

“Ajudar... ajudar... apague a luz... ajudar...” as palavras foram sendo repetidas várias vezes até que por fim ela criou coragem e apagou a luz do banheiro. Um medo irracional tomou conta dela e sua vontade era de sair correndo. Apanhar novamente do Rômulo não era tão assustador quanto aquela coisa desconhecida que ia muito além da sua compreensão.

“Chame ajuda. Chame a polícia!” os sussurros voltaram mais altos e também mais nítidos.

— Ele vai me matar. – ela sussurrou.

“Você estará segura. Saia de casa enquanto ele dorme. Chame a polícia, diga onde ele está. Ele nunca mais irá lhe fazer mal.”

— Quem é você?

“Castigo dos perversos, punição para quem faz o mal. Ele pagará. Chame a polícia e ele nunca mais irá lhe machucar outra vez. Vá agora, ou nunca mais terá outra chance. Vá!”

O final da frase lhe encheu de medo. E se ele lhe matasse? Ninguém sabia que ele estava em seu apartamento. Ela vivia sozinha e tinha poucos amigos. Ia demorar muito até que percebessem sua falta e até lá Rômulo já estaria longe. Sem hesitar, ela saiu do banheiro tomando cuidado para não fazer barulho e foi até a cozinha.

Em cima do armário havia potes de plástico. Ela pegou um deles, que estava cheio de açúcar, e tirou de lá um saquinho plástico contendo algumas notas de dois, cinco e dez. Era uma espécie de reserva para emergências. Havia trinta e cinco reais ao todo. Por enquanto devia bastar. O dinheiro foi guardado no bolso da calça e após pegar sua bolsa, saiu do apartamento trancando a porta e fugiu para a rua rapidamente, indo em direção a delegacia mais próxima. Aquele cretino não ia lhe ferir nunca mais!

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— E agora tô sem saber se falo ou não pra eles. – Cebola finalizou após contar tudo ao Paradoxo que o visitou pela manhã antes dele ir a escola.

— Eu prefiro que você não fale a meu respeito. Quanto ao resto, creio que a decisão é sua. Por acaso eles poderiam ajudar em alguma coisa?

— A Magali talvez porque a tia dela entende dessas paradas do sobrenatural. A Mônica e o Cascão eu não sei. É que, sei lá, tô tão acostumado a fazer as coisas com meus amigos!

— Sei... entendo.

Cascão, Mônica e Magali estavam muito interessados e não paravam de lhe perguntar sobre a volta da Serpente e os mistérios que se escondiam por trás da organização Vinha. Só que Cebola não queria colocá-los em perigo. Seus amigos originais estavam acostumados com aquele tipo de coisa, mas os alternativos não.

— Agora que você deixou seu emprego, creio que terá mais tempo para investigar. Eu lhe ajudarei no que for possível, mas não posso fazer muita coisa. Talvez seja boa idéia contar com seus amigos.

O cientista estava certo e Cebola sabia disso. Ele fez vários planos para investigar a sede da Vinha, mas precisava ter alguém para criar uma boa distração. Com ajuda dos amigos, tudo podia ficar mais fácil.

Paradoxo foi embora e ele se preparou para começar o dia muito aliviado por ter deixado o emprego. Rosália lhe disse que ele não precisava trabalhar porque não precisava mais daquele dinheiro, pois tinha o aluguel da casa. Sr. Afonso ainda não tinha dado nenhuma definição sobre a dívida, mas a instruiu para suspender o pagamento até que aquela situação fosse resolvida. Ainda havia o quarto que estava alugado e por enquanto eles iam dividir o dinheiro. Depois decidiriam o que fazer depois que o inquilino fosse embora.

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Sr. Malacai tinha saído há bastante tempo e Boris ainda estava em choque. Será que aquele velho estava ficando louco?

— O senhor está bem? – a secretária perguntou ao ver que o diretor estava daquele jeito há bastante tempo.

— Duas aspirinas por favor. Céus, como eu vou fazer isso? Os pais dos alunos vão me esquartejar!

— Creio que não tem outro jeito, senhor. O Sr. Malacai deu uma ordem e se o senhor não obedecer...

— Nem me fale! Argh, isso não tem como ficar pior!

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Assim que chegaram a escola, eles notaram que alguma coisa estava errada. Todas as meninas de cada turma foram chamadas no auditório enquanto os rapazes puderam ir para a sala de aula normalmente.

— Depois você contam pra gente. – Cebola falou antes de se separarem.

Alguns minutos depois, já na sala de aula, Magali junto com Keika e outras alunas chegaram, mas ele não viu Mônica, Marina, Cascuda e Sarah. Não deu para falar nada porque o professor estava marcando em cima e foi preciso esperar pelo intervalo até eles descobrirem o que estava acontecendo.

— E foi isso. Dá pra acreditar? – Magali finalizou após contar sobre a nova regra do colégio: todas as moças tinham que ter cabelos pretos. Nem mesmo o castanho era permitido.

— Véeeeeiii! O que deu nesse povo?

— E eu vou saber? As meninas com cabelos pretos foram dispensadas, mas as outras tiveram que ficar pra tingir. Vocês tinham que ver o escândalo que a Carmem fez. Ela ficou pra morrer, coitada!

Cebola não conseguia acreditar a que ponto as coisas estavam chegando.

— Eles falaram que mulher não pode chamar atenção nenhuma, vê se pode? Esse povo vive nas cavernas! – Keika reclamou sentindo pena das amigas.

Pouco a pouco as alunas foram chegando, sendo dispensadas à medida que tiveram seus cabelos tingidos. Mônica estava com os cabelos bem pretos, assim como Marina que chorava sem parar. Quando a moça debruçou na carteira, Cebola viu a razão: seus cabelos tinham sido cortados pela metade.

— Eles disseram que tava grande demais e cortaram! E ainda falaram que eu só posso usar preso porque ele é cacheado! Vou contar tudo pros meus pais, não quero mais ficar nessa porcaria de colégio!

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Denise andava pelo corredor de cabeça erguida e sem derramar nem uma lágrima. Se aqueles imbecis pensaram que ia deixá-la derrubada, estavam enganados. Alguém conhecido entrou em seu caminho. Ela virou os olhos e cruzou os braços.

— Tá bom. Ri logo que eu preciso voltar pra sala.

Para sua sorte, não tinha ninguém ouvindo naquele momento, por isso Antônio resolveu ignorar.

— Eles estão fazendo isso para o bem de vocês.

— Igual ao que fizeram com você, não é? Tá bom, vai acreditando. Um dia você aprende.

Ela ia embora quando Antônio a chamou de volta.

— O que você sabe sobre o que me aconteceu?

— Sei de muitos casos iguais a você. Mas continue alimentando suas ilusões, eu não me importo.

— Ei, espera!

A moça virou o corredor antes que ele pudesse lhe perguntar qualquer coisa. Se aquele imbecil não queria entender o que estava acontecendo, ela não ia perder seu tempo valioso com ele.

Antônio resolveu voltar aos seus afazeres e esquecer aquele assunto.

“Aposto que ela quer encher minha cabeça com mentiras! Preciso ficar atento!”

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Sons de batidas ecoavam como se viessem de um mundo muito distante. Rômulo virou para o lado e continuou dormindo aquele sono bom. As batidas foram ficando cada vez mais fortes até acordá-lo de vez. Pela força e intensidade, ele logo percebeu o que estava acontecendo: a polícia.

— Abra logo, sabemos que você está aí! – uma voz masculina gritou do lado de fora enquanto as batidas continuavam ainda mais fortes. Dentro de pouco tempo, a porta ia ser arrombada.

“Porcaria, aposto que aquela vadia me denunciou! Eu mato aquela desgraçada!” antes de matar alguém, no entanto, ele precisava fugir dali rapidamente e correu para a janela da sala, pois sabia que tinha uma árvore na frente do prédio.

Era uma arvore grande e bastante ressecada, mas parecia forte o suficiente para suportar seu peso. Ele ouviu o som da porta se quebrando saltou sobre a árvore se agarrando nos galhos desajeitadamente. Como estava sem camisa, os galhos pontudos o machucaram bastante e por pouco ele não despencou até o chão.

Havia gritaria dentro do apartamento e ele sabia que era só questão de tempo até os policiais descobrirem que tinha fugido, então deu um jeito alcançar o chão e saiu correndo a toda velocidade. Tendo ganhado a rua, ele correu o máximo que suas pernas permitiam. Droga, ele malhava todos os dias numa academia, mas seu condicionamento físico estava péssimo! Claro, ele fazia musculação, não aeróbica.

Ele entrava num beco, saia em outro, corria pelas ruas procurando se manter escondido e se afastando o máximo possível. Quando se sentiu seguro, começou a andar pois já não agüentava mais correr e seus pés descalços estavam começando a se ferir com o asfalto. Só lhe faltava encontrar um lugar para esconder, mas onde?

Por mais de uma hora ele foi andando a esmo, com olhos e ouvidos atentos a qualquer sinal da polícia. Ele não sabia exatamente para onde estava indo, apenas andava e andava como se algo o guiasse. Uma esquina que lhe parecia mais atraente, uma rua mais segura, era algo que ele não sabia explicar. As casas foram ficando mais escassas até ele entrar numa área mais deserta, com poucas casas à vista.

“Tô cansado e morrendo de fome, droga! Ah, se eu pego aquela cachorra!” ele foi pensando cheio de rancor e deu um sobressalto ao ouvir o som de uma sirene. A polícia estava na área? Como? Ah, claro. Muita gente deve ter notado um sujeito grande, tatuado, sem camisa e todo machucado correndo pelo bairro. Foi muita burrice sua não ter pensado nisso.

Sem saber o que fazer, ele correu até a casa mais próxima. O terreno era grande, com vegetação que parecia morta e um aspecto bem sinistro que ele não gostou nem um pouco. Bem, não era hora para frescura. Era isso ou ser pego pela polícia.

Rômulo pulou o pequeno muro e deu a volta pela casa procurando um lugar para se esconder. O som da sirene ficou mais forte e ele percebeu que o carro tinha parado, o que era ruim. Dentro de pouco tempo ia ter vários policiais ao seu encalço. Quando chegou aos fundos, viu que a entrada de um porão estava aberta, o que era muita sorte para acreditar.

“Me dei bem!” ele correu para a entrada e estancou quando olhou lá para baixo e viu somente escuridão. Desde quando ele tinha medo do escuro? Mas seus pés não obedeciam e uma espécie de aviso começou a ecoar com toda força em sua cabeça para fugir dali. Era preferível ser pego pela polícia do que entrar naquele porão.

Mas é claro que ele não deu a menor atenção, achando que aquele nervosismo era apenas falta de uma boa cerveja. Sem pensar em mais nada, ele entrou no porão e fechou a entrada pouco antes de alguns policiais entrarem no terreno.

Essa foi a última vez que ele viu a luz do dia.


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