O Mágico e os Ladrões de Som escrita por André Tornado


Capítulo 9
Surpresas e mais surpresas




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A Cammy estava furiosa, porque o doutor que eles tinham chamado nunca mais resolvia o que quer que estivesse para ser resolvido. Mike teve, primeiro, que acalmá-la e explicar-lhe que o médico… que o Doutor, emendou ao captar o olhar de censura afiada que o homem lhe mostrou, que o Doutor estava a tratar do assunto e que eles iriam tocar naquele fim de tarde em Milton Keynes, que seria um espetáculo épico e que seria o melhor de todos os concertos inseridos no Projekt Revolution.

Depois de fazer todas as promessas e mais algumas, de assegurar que estava tudo muito bem encaminhado e de esclarecer que o Doutor era competente, pediu a carrinha da banda, sem motorista. Aguentou outros tantos gritos da Cammy, reforçou os votos de confiança naquela empreitada, continuou a guardar segredo e passados dez minutos ouviram bater à porta. Era a Cammy que vinha entregar-lhes as chaves da carrinha, que estava estacionada do lado de fora dos bastidores, nas traseiras do contentor que lhes servia de camarim. Brad abriu uma nesga da porta, recebeu as chaves, agradeceu e tornaram a trancar-se ali dentro. Dave destapou um reposteiro, que escondia a parede oposta e havia ali uma segunda porta mais estreita que, assim que foi aberta, revelou o veículo solicitado.

O Doutor fez a sugestão de transportarem o Joe no tapete, acrescentando que o facto de se mostrar chamuscado seria mais uma evidência que os ajudaria a combater o parasita, pois desconfiava que essa alteração no tecido se devia à contaminação. Foram Dave e Rob que fizeram do tapete uma espécie de cama suspensa, com o DJ lá estendido e levaram-no para o banco de trás da carrinha, onde o deitaram.

Mike ocupou o lugar ao volante, seria ele a conduzir. A Clara sentou-se ao seu lado e o Doutor juntou-se-lhes no banco da frente. No banco do meio, entalados uns nos outros, acomodaram-se Chester, Dave, Rob e Brad, que trazia a trouxa com a tigela onde tinham recolhido a massa verde dormente.

O motor ligou-se, a carrinha balançou pronunciadamente.

— Vais ter de me dizer onde está essa TARDIS, Doutor – pediu Mike, arrancando devagar, contornando as divisórias que estabeleciam os bastidores do anfiteatro.

— Darei as direções, Mike. Segue para a estrada principal – indicou Clara. – Depois, é fácil.

— Muito bem.

O Doutor estava pensativo. Apoiava o queixo no braço, cotovelo na porta do pendura. Os outros quatro iam também calados. Brad tinha os pés em cima do banco, joelhos fletidos, parecido a um gafanhoto. Evitava a proximidade à trouxa, que se pousava no chão da carrinha.

Os seguranças estavam avisados de que a carrinha iria passar, indicações da Cammy e abriram a cancela que dava acesso à estrada sem fazerem perguntas, ou verificarem o seu interior. Nem Mike fez um aceno ou entabulou conversa. Tinha enfiado um boné na cabeça e até puxara a pala sobre os olhos para não ser reconhecido.

— Doutor? – chamou a Clara.

— Estou a tentar lembrar-me de algum detalhe que me faça reconhecer este invasor. Mas até agora, continua a ser uma novidade para mim – admitiu ele, olhando-a.

— E a relação com o som? Começaremos por esse facto.

— O som!

— O parasita tem uma relação com o som? – perguntou Mike.

— Efetivamente – respondeu o Doutor. – Vamos ter de relembrar as propriedades do som para perceber a reação do parasita de há pouco. Adorou as vibrações da minha chave de fendas sónica e detestou os berros do vosso amigo.

— Chamo-me Chester! Para ti é tudo amigos, é? Não és o meu amigo, meu. De certeza que não és o meu amigo!

— Chester, não o provoques.

— Ei, Dave! Essa cotovelada doeu-me! Por que raio me deste uma cotovelada nas costelas, hum?

— Chester, deixa o Doutor explicar a sua teoria – pediu Rob.

— Sim, também quero ouvir, Chester – pediu Brad.

O Doutor olhou brevemente por cima do ombro. Depois, começou:

— Bem, como sabem, o som possui quatro propriedades fundamentais. A duração, a intensidade, a altura e o timbre. Ou seja, o tempo que o som dura, a amplitude das ondas sonoras, a frequência dessas ondas sonoras e a pureza do som. O som pode ainda ser refletido, refratado ou difratado. Qualquer destas propriedades e características do som ajudam o nosso pequeno amigo…

— O parasita também é amigo? – troçou Chester. – Ei, Dave! Acaba com as cotoveladas.

— Não o interrompas, Chaz!

O Doutor respirou fundo e prosseguiu:

— Qualquer destas propriedades e características do som ajudam ou eliminam o parasita. Devemos descobrir qual e iremos fazê-lo na TARDIS. Por enquanto sabemos que se trata de um ladrão de som. O parasita rouba, efetivamente, som. Armazena-o para crescer ou pode acabar por ser demasiado que se autodestrói. – Esticou um dedo indicador, voltando-se para trás. – E tu, meu rapaz, se me voltas a interromper, ponho-te uma mordaça na boca! Haveremos de encontrar alguém que grite como tu e que nos ajude a lidar com o parasita!

Chester cruzou os braços e espetou o queixo.

— Pfff! Boa sorte, velho, para encontrares alguém que grite como eu. – Deu um grito e um salto. – Dave, merda! Os teus cotovelos magoam, meu!

— E que parasita é esse? E como foi parar ao anfiteatro de Milton Keynes? – perguntou Mike. – Será algum tipo de fungo, normal por aqui? Afetou o Joe porque não tem imunidade, ou alguma coisa dessas… Somos americanos, não estamos habituados aos ares da Europa. Por vezes, o Rob fica cheio de alergia e o Brad queixa-se dos ossos.

— Isso não acontece só na Europa – emendou o guitarrista, abraçado às pernas. De vez em quando espreitava a trouxa, pousada aos seus pés.

— Não, Mike – respondeu a Clara, muito séria e pousou-lhe uma mão no braço. O Doutor reparou nesse gesto. – Não se trata de um fungo local. É um organismo… mais específico.

— Mais específico? O que quer isso dizer? – perguntou Dave.

— Ah, deve ser uma treta qualquer tropical que não devia estar na Europa – adiantou Rob. – É isso, de certeza. Um fungo parasita que gosta de som.

— É isso, não é? – indagou Mike. – Desculpa, querida, mas acho que não fomos formalmente apresentados. Podias dizer-nos como te chamas? Só sabemos que és a assistente do Doutor. E nem o nome do Doutor sabemos. Será que nos podiam dizer os vossos nomes? Obrigado.

— Somos todos amigos, quem precisa de nomes se somos todos amigos? Dave, porra! Daqui a nada levas um murro.

— Chaz, acaba com as piadas – protestou o baixista.

— Chamo-me Oswald, Clara Oswald.

— Muito prazer, Clara – Mike estendeu-lhe a mão direita que ela apertou. O Doutor franziu uma sobrancelha. – E o senhor… e o Doutor?

— Sem formalismos, Mike! Afinal, somos todos…

— Cala-te, Chester! – pediu Brad, desta vez.

— Sou o Doutor.

— Certo… o Doutor.

Clara agitou-se, mexeu os braços.

— É aqui, Mike. Chegámos!

O japonês carregou no pedal do travão e a carrinha parou no meio da estrada com um enorme solavanco. Escutaram-se protestos e gemidos. Ele olhou para todos os lados e apenas se via uma normalíssima rua de um bairro residencial inglês, mas não quis perguntar nada para não parecer que estava a sabotar o Doutor. Para isso já bastavam as observações descabidas do Chester.

O Doutor e a Clara saíram da carrinha, seguiram-se os quatro passageiros do banco do meio. Coube outra vez ao Brad carregar a trouxa, Chester recomeçou a roer as unhas. Dave e Rob puxaram o tapete do banco de trás e aguentaram com o Joe nos respetivos braços. O DJ continuava adormecido e sem dar mostras de qualquer tipo de recuperação.

Depois de se apear, Mike trancou a carrinha, usando o comando que se ligava à chave. Juntou-se aos outros. Apoiou as mãos na cintura e olhou para todos os lados. Era uma rua pacata e anónima. O Doutor dirigiu-se para uma cabina telefónica azul.

— Vamos, vamos! Não percam tempo! – chamou-os, impaciente, com um aceno.

— Vamos, sigam-me – pediu a Clara.

Chester disse:

— Seguir para onde? Onde é essa clínica?

De rosto corado, Dave bufou.

— Eu vou atrás do Doutor. Este Joe voltou a engordar. Pesa para caraças!

Rob concordou, bufando também.

— É verdade. Parece que carregamos um mastodonte. Estou em boa forma física, costumo usar os meus braços de forma intensiva ao tocar bateria, mas está a custar-me carregar o Joe. Bolas! Este tipo devia cuidar mais do corpo! Isto não é saudável.

Mike empurrou Chester.

— Anda e cala-te.

— Também estás a embirrar comigo, Mike?

— E tu estás a embirrar com toda a gente.

— Com toda a gente, não. Só com o velho.

Brad saltitava atrás da Clara, tentando manter a trouxa bem longe de si.

O Doutor abriu a porta da cabina telefónica azul e sumiu-se no seu interior. A Clara agarrou na porta entreaberta e fez-lhes um gesto para que a seguissem. Brad nem pestanejou e entrou, queria descartar-se depressa da trouxa perigosa.

— Que merda é esta?! – indignou-se Chester.

Recebeu outro empurrão de Mike.

— Vai!

— Vou para onde? Então, a clínica deste velho é nesta caixa azul?

— O Brad entrou. Vai!

— Oito pessoas dentro daquela caixa… não vamos caber todos.

Mike adiantou-se e puxou Chester pela manga da blusa. Os dois entraram na cabina. Depois foi a vez de Dave e de Rob, a carregar o Joe desmaiado no tapete. Assim que os dois franquearam a entrada da cabina, soltaram um grito de assombro, abriram as mãos e o DJ caiu no chão com um baque seco.

Chester repetiu, num gaguejo:

— Que… merda… é… esta…?


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo:
Noutro local, noutra dimensão.