Aquele com quem a Morte conversa escrita por Kemur


Capítulo 1
Dois Encontros


Notas iniciais do capítulo

Eis que em preparação para minha próxima long-fic, eu irei publicar essa short-fic contando um pouco sobre Shiro, que terá um papel muito importante no futuro.
Essa fic se passa 14 anos depois de Dragonize, mas não sendo necessário ter lido ela para entender.
Enfim, boa leitura!



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Uma cafeteria antiga, escura e vazia. Suas paredes estavam com a tinta desgastada, parecia até que iria cair a qualquer momento. Porém, numa mesa onde a luz da entrada iluminava somente a metade da mesa, do lado escuro estava sentando um homem de terno que tomava uma xícara de café.

— Por que me chamou aqui? – pergunto ao me aproximar da mesa.

— Ora, e precisa de motivos para querer ver os amigos? – o homem responde, enquanto aponta para a outra cadeira.

— Não somos amigos. – digo ao me sentar. — Eu te vejo apenas como um encosto, uma assombração, um...

— Um fã curioso?

— É, agora tenho que concordar com você.

O desgraçado a minha frente não é uma pessoa comum, ele é um dos que surgem apenas quando seu trabalho demanda. Quando não está trabalhando, fica vagabundeando e incomodando os outros. Para meu azar, nossa escala de folgas costuma bater com muita frequência.

— Não entenda errado, Shiro. – ele diz servindo café numa xícara e me oferecendo. — Eu apenas adoro as histórias do seu trabalho.

— E eu odeio contar elas à você. – pego a xícara e então brindamos. — Então, o que quer saber?

— Após me enganar e fugir pela milésima vez, você desapareceu por uns sete meses. – ele me lança um olhar sério. — O que aconteceu que te fez sumir por tanto tempo?

— Direto ao ponto, né? – dou um gole naquela horrível bebida com sabor de terra. — Tudo começou naquela noite, no Lady Noh.

...

Uma música clássica tocava de uma jukebox antiga. Era incrível como um aparelho com mais de 100 anos de vida ainda funcionava com tanta perfeição. O local possuía um cheiro de carvalho recém-envernizado e a iluminação fraca dava ainda mais o clima de filme de máfia. O bar conhecido como Lady Noh é o meu favorito. Um lugar simples, porém sofisticado que ficava escondido num dos becos de Ikebukuro. O único lugar onde eu posso beber sem ser incomodado por velhos bêbados ou delinquentes que não tem nada da vida pra fazer.

— Ei, chefe. – chamo pelo barman. — É impressão minha ou só eu venho a esse lugar?

— Meu estabelecimento é pequeno e pouco notável, senhor. – ele responde, enquanto abria uma garrafa de whisky e servia num copo para mim. — Posso ter poucos cliente, mas quando se tem clientes iguais ao senhor, falir é o menor dos meus problemas.

— Isso é um suborno? – aponto para o copo.

— Sim. – e ele me responde com um sorriso no rosto.

— Suborno aceito. – peguei o copo e vira todo o líquido de sabor forte numa golada só. — Eu vou querer a garrafa, por favor.

— Aqui. – o barman pega a garrafa já aberta e me entrega, logo começo a beber direto do gargalo. — Essa é última garrafa do seu favorito.

— Enquanto você tiver whisky, eu vou ficar aqui e beber. – Shiro responde, enquanto faz uma pausa para respirar.

Entre as pessoas mais resistentes à bebidas alcoólicas no mundo, sou a que está entre os primeiros se não o próprio campeão, pois meu fator de cura é mais potente que o de um humano comum devido ao sangue demoníaco que corre em minhas veias, dessa forma minhas células se regeneram mais rápido, assim eu posso beber dez vezes a mais que um humano normal que não fico bêbado de maneira alguma, no máximo, levemente embriagado.

— Eu te deixo esperando por alguns minutos e você já está nessa selvageria? – uma voz masculina ecoa no local. — Não venda nada pra ele chefe, ele ainda é menor.

— Saiba você Wolf, que na Coréia eu já tenho 21 anos. – reclamo.

— Mas não estamos na Coréia. – o homem loiro cuja franja lhe tapava o lado direito do rosto se senta ao meu lado. — O de sempre, por favor.

— Como desejar. – O barman pega uma taça e serve vinho tinto nela. — Aqui está.

— Obrigado. – Wolf responde com um sorriso. — Então, como foi lá na Coréia?

— Era só um goblin fazendo confusão por lá. – respondo dando um gole em seu whisky. — Deviam chamar um exorcista, não eu.

— Na Coréia goblins não são um tipo de divindade? – Wolf pergunta.

— Deviam ser, mas aquilo era só um fantasma preso numa vassoura. – explico. — Não era pra trabalho pra mim.

— Na verdade é bem sua cara. – Wolf ri.

— Calado!

Wolf Magnus, é o meu melhor amigo e professor. Nós dois atuamos como caçadores de criminosos e detetives sobrenaturais de uma organização conhecida como “A Providência”, uma agência de detetives sobrenaturais que cuida de casos envolvendo magia, espíritos, demônios, tráfico humano, de armas e de drogas, assassinatos e outros casos envolvendo o sobrenatural para aqueles que não entendem.

Nós costumamos viajar muito para outros países por conta de nossos trabalhos que são, em sua maioria, terceirizados, pois as outras duas grandes organizações: A Academia Arcana e A Igreja costumam mandar esses casos menores para a Providência.

— Como andam as coisas aqui? – pergunto.

— Já fomos designados para um caso. – Wolf responde e então eu me engasgo.

— Hã?! Aquele careca acha que somos o quê?! Máquinas?!

— Eu só cumpro ordens. – Wolf termina sua taça de vinho. — Sou muito bem pago pra isso. Outra, por favor.

— Eh... – eu encaro Wolf com desgosto. — Então, qual é a da vez?

— Kagutsuchi. – Wolf responde.

— De novo esses caras? Todo ano essa merda de reviver o deus deles. – reclamo.

— Dessa vez vamos atrás de criminosos procurados que estão tendo algum tipo de envolvimento com eles. – Wolf abre uma mochila que estava com si, pega um envelope e me entrega. — Esses são os envolvidos.

— Ei, chefe. – pego o envelope e o ergo. — Isso aqui é o que está te sustentando, agradeça por eu precisar desse lugar.

— Muito obrigado pela preferência. – o barman solta uma risada boba.

Mesmo tendo esse momento descontraído com Wolf no bar. Eu vivo num mundo estressante, onde quase todo dia tenho que lidar mortes causadas por mim mesmo ou o trauma que carrego comigo desde que ganhei o sangue demoníaco. Melancolia é um tipo de depressão muito forte, normalmente causada por um forte sentimento de culpa e ódio a si mesmo e é assim que me sinto todos os dias, mesmo soltando um sorriso ou outro, meus olhos só emanam tristeza. E o único momento em que consigo esquecer tudo é quando estou com o sabor do álcool em minha boca.

— Ei, pare de dizer essas coisas pro chefe!

— Ele sabe que é verdade, né? – o barman assente. — Viu?

— Você tomou uma garrafa e já está todo bêbado, assim?

— Não que eu só tenha bebido uma garrafa, então sua resposta será um “talvez”.

— Talvez? Espera ai... A gente marcou de se encontrar às 19h... Desde quando você está aqui? – Wolf pergunta.

— Desde às 18h. – respondo ao finalizar minha garrafa.

— Você pode ser o cara mais resistente ao álcool do mundo, mas beber assim ainda pode te fazer mal, sabia?

— De todos que tentaram me matar, o álcool é o único digno disso. – me espreguiço. — Eu vou querer o meu segundo favorito agora.

— Como desejar. – o barman pega outra garrafa e entrega a Shiro.

— Obrigado. – Shiro abre a garrafa, mas é interrompido de beber por causa de Wolf.

— Ei, vai com calma cowboy. – Wolf pega sua taça. — Vamos brindar antes de começarmos a comer.

— Brindar? Ao quê? – pergunto confuso.

— Aos cães de caça da Providência. – Wolf responde erguendo sua taça.

— Heh. – ergo minha garrafa de whisky. — Aos cães de caça da Providência.

...

— Entendo, então o prólogo dessa história é apenas o motivo de você me parecer bem mais melancólico que antes. – ele me pergunta.

— Pensei que sua espécie não entendesse de sentimentos humanos. – digo.

— Ora, eu já fui um humano antes mesmo de me tornar o que sou hoje. – ele me responde e então o brilho escarlate de seus olhos semiabertos se destacam na escuridão.

— Não passa de um demônio velho que foi punido por um crime estúpido. – tomo outro gole de café. — Essa raça de vocês que me impede de descansar em paz.

— Nós não te impedimos, você que sempre nos engana e foge. – ele sorri. — Acha que virei seu fã por quê?

 Aquele cara me irrita mais que tudo no mundo. A personificação da coisa que mais almejo não passa de um velho demônio que veste ternos caros e ridículos e um vicio descomunal por café. Se não fosse por conhecer ele, eu provavelmente já estaria feliz em outro lugar.

— Acabou de confirmar que é por sua causa que ainda estou sofrendo.

— Assim como você eu apenas recebo ordens, você que não da a sorte de ter seu nome na minha lista. – ele ri. — Até para um mestiço como você, escapar da nossa lista é algo fascinante.

— Então sugiro que dê o seu jeito de colocar meu nome na sua lista. – encho minha xícara com mais café e pego uma torrada que estava num cesto sobre a mesa. — Se já sou obrigado a te aturar vivo, quero deixar de te ver nem precise morrer pra isso.

— A morte é algo tão incrível assim? – ele pergunta. — Minha espécie e eu somos os últimos que humanos desejam ver e somos os seres mais temidos desse planeta. Já você, quer tanto morrer, mas quer nos evitar a todo custo. Você é um existência curiosa, Shiro Kagerou.

— A morte é o fim de um ciclo. – respondo. — Meu ciclo devia ter acabado naquele dia no armazém, mas você se negou a fazê-lo. E hoje se estou aqui, a culpa é inteiramente sua.

— Alguém que mesmo nos últimos momentos desejava a todo custo salvar uma vida, não achei nada mais justo do que estender o seu tempo de vida para que a garota sobrevivesse. – ele responde. — Não tenho culpa de seu nome ter se apagado da lista naquele momento.

— Inútil. – digo.

— Obrigado. – ele sorri. — Mas por favor, continue sua história.

— Te odeio. – reclamo, como minha torrada e tomo café. — Naquela noite, assim que cheguei em casa e fui dormir, eu sonhei de novo com aquele dia...

...

Uma armazém em chamas após uma explosão de diversos explosivos C4. Graças aos diversos tanques de gasolina e de pólvora que estavam ali dentro, houve muitas explosões secundárias e por conta disso o armazém estavam se desfazendo.

Eu me via no centro de todas aquelas chamas, enquanto observava sem poder fazer nada um garoto de 14 anos que foi pego pela explosão se arrastando pelo local para tentar salvar uma garota que carregava em suas costas.

— Um esforço inútil. – disse um homem de terno que surgiu ao lado do garoto. — Ambos estão destinados a morrer nesse local, apenas desista.

— Não... Apenas... Deixe... Ela... Viver... – disse o garoto.

— Não adianta tentar negociar comigo garoto. – ele fala. — Tenho certeza que sabe quem eu sou.

— Eu... Não... Ligo... Apenas... Deixe... Ela... Viver...

— Está realmente disposto a salvá-la? Nunca vi um quase morto ter tanta vontade de viver como você. – o homem encara a criança com  uma expressão de surpresa.

— Ela... É... Minha... Preciosa... Irmã...

— Entendo, agora que vejo aqui... – ele começa a ler um papel. — Nascidos no mesmo dia com apenas uma diferença de minutos... São gêmeos então. Você provavelmente deve ser o mais velho.

— Ajude... Ela...

— Você não vai sair daqui tão cedo nesse estado. – ele olha para um relógio. — Vou prolongar sua vida por mais alguns minutos. Será o suficiente para que a garota sobreviva, mas em troca, você vem comigo.

Eu lembro de que na hora eu só pude imaginar que estaria fazendo um pacto com o diabo. Ele levaria minha alma para o inferno e então, minha irmãzinha sobreviveria. Acontece que eu estava certo.


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Notas finais do capítulo

E então, o que acham?



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