Vila Baunilha escrita por Metal_Will


Capítulo 63
Na hora do aperto


Notas iniciais do capítulo

Olá. Bem-vindos a mais um capítulo. Boa leitura! ;)



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Luciano tinha apenas um trabalho: entregar panfletos da lanchonete de seu pai enquanto vestia a roupa do Senhor Raposo, um popular personagem de Vila Baunilha alguns anos atrás, na época em que o avô de Luciano ainda estava na ativa. O problema é que ficar muitas horas debaixo de um sol quente, quando o café da manhã já estava começando a fazer efeito somado ao fato da dieta de Luciano não ser das melhores e o sistema digestivo dele já estar em vias de terminar seu processamento, não era a melhor das situações. Apesar disso, o garoto tentava disfarçar seu desconforto aproveitando a música brega de alguma banda de forró conhecida apenas naquela região que tocava no rádio. Os passos de dança eram, na verdade, meios de disfarçar sua angústia intestinal.

—Que bicho engraçado - disse uma criança que passava por ali acompanhada da mãe, pegando um dos panfletos na mesma hora.

Luciano apenas se limitava a entregar os panfletos e não falava mais nada, enquanto mexia as pernas de um lado para o outro. Não dava mais, ele precisava fazer uma pausa.

—Ótimo. Parece que esvaziou um pouco. É a minha chance!

Mas assim que Luciano estava prestes a virar as costas para procurar um banheiro, mais uma pessoa passava pela praça. Era um senhor, por volta de seus sessenta e poucos anos, que parecia ter boas lembranças do Senhor Raposo. 

—Oh, não acredito. É o Senhor Raposo mesmo! - disse ele.

Luciano apenas acenou positivamente com a cabeça e entregou um panfleto.

—Puxa vida. Lembro de quando o Givaldo alegrava a criançada com essa fantasia. O filho dele não tinha o mesmo talento.

—Sei bem - foi tudo que Luciano conseguiu dizer. Givaldo era o nome do pai de Abílio (e avô de Luciano).

—Espera, não me diga que você conhece o filho do Givaldo?

Luciano acenou que sim com a cabeça, ainda tentando disfarçar seu aperto.

—É...meu pai… - confirmou Luciano.

—Não acredito. Lucianinho, é você!

—O senhor...me conhece? - perguntou Luciano, com suas últimas forças.

—Claro, claro. Carreguei você no colo quando era pequeno, menino. Sou o Euclides, era um grande amigo do seu avô! Como são as coisas, né? Estou morando com a minha filha na cidade vizinha, mas, justo hoje, quando resolvo fazer um passeio em Vila Baunilha para relembrar os velhos tempos, encontro o neto do meu amigo. 

—L-legal - balbuciou Luciano, torcendo para o amigo do seu avô cair fora dali o quanto antes.

—E como o seu pai está?

—Bem - foi o que Luciano conseguiu responder. Monossílabos era tudo que ele podia expressar naquela situação.

—Ah, preciso ver aquele cara de novo. O Givaldo era um excelente empresário, mas sempre achei o Abílio meio preguiçoso. Espero que ele tenha melhorado.

“Não tanto quanto o senhor imagina”, pensou Luciano.

—Mas você parece ter puxado seu avô, heim, rapaz? - reparou seu Euclides - Não para de dançar nem comigo falando aqui, heim? Isso que é levar o trabalho a sério!

“Se eu parar de me mexer não vou conseguir segurar”, pensou Luciano.

—Ah, mas a minha netinha precisa ver isso. Vou chamá-la, espera só um pouquinho.

“É a minha chance!”, pensou Luciano. “Quando ele virar as costas, vou correndo para o banheiro!”

Mas, para a infelicidade de Luciano, seu Euclides nem precisou sair dali.

—Ah, nem preciso chamar. Olha ela ali. Ei, Ritinha, vem cá!

“Ah, que ótimo!”, Luciano esboçava um sorriso amarelo por baixo da máscara. Lá vinha uma garotinha, por volta de seus cinco anos, juntamente com a mãe.

—O que foi, pai? - perguntou a mãe da Ritinha.

—Encontrei o neto de um grande amigo, meu - disse Euclides - Ei, Ritinha. Já conhece o Senhor Raposo?

—Não - respondeu a menina.

—Ele é bem legal - disse Euclides - Fala oi para ele.

—Oi - disse a menina.

Luciano apenas entregou um folheto, enquanto fingia dançar. A menina achou engraçado.

—Ele é engraçado - falou ela - Olha esse rabo.

“Vai embora logo, pirralha!”, pensava Luciano, enquanto a família parecia não ter a menor pressa.

—Acho que podemos visitar essa lanchonete, não podemos? - perguntou Euclides.

—Ah, mas só viemos para o almoço mesmo - disse a mãe da garota - Melhor deixar para outro dia.

—Faço questão de voltar e visitar o Abílio. Quero ver como ele está - falou Euclides - Mas primeiro deixa eu ver o seu rosto, Lucianinho. Como você tá?

“Droga”, Luciano não parava de mexer as pernas, mas conseguiu tirar a máscara, após um certo sacrifício. Sua expressão era de suor e desespero.

—Olha só, que garoto forte. Hehe! - comentou Euclides - Mas é a aparência de um trabalhador.

—Prefiro com a máscara - disse a menina.

—Filha! - reclamou a mãe.

—Hahaha! - riu seu Euclides - Você sabe como são essas crianças de hoje. Falam tudo que vem na cabeça!

—É, sei como é - disfarçou Luciano, com um sorriso mais amarelo que gema de ovo.

—Bom, vamos indo. Tenha um bom trabalho, Lucianinho - disse Euclides.

—Tchau, seu Raposo - falou a menina.

Luciano apenas acenou com a mão.

—Ele não fala muito, né? - comentou a filha de seu Euclides.

—É, deve ser um rapaz bem responsável. Não é de falar enquanto está em serviço.

Finalmente, Luciano se viu livre para procurar alívio para seu sofrimento. Mas o atraso foi tanto que não parecia haver tempo para chegar em um banheiro. Por sorte, em uma praça há muitas moitas e era sua única opção para evitar um desastre.

—Droga - Luciano correu para a moita mais próxima, arrancou sua fantasia rapidamente e fez o que precisava fazer. Seu café da manhã não havia caído bem mesmo e seu intestino parecia um pouco desajustado.

“Pai, em tuas mãos entrego meu espírito”, o rapaz orou aos céus. “A situação era pior do que eu imaginava!”

Apesar dos pesares, ele conseguiu fazer suas necessidades biológicas sem ninguém incomodá-lo. Só tinha um problema. Ao contrário dos banheiros usuais, uma moita não tinha algo muito importante: papel higiênico. Infelizmente, Luciano só foi perceber isso tarde demais. Poderia usar seus folhetos! Mas eles ficaram lá longe, junto ao rádio. Poderia usar folhas! Mas só tinha folhas minúsculas ali por perto que não seriam suficientes. Só restava uma coisa...sua cueca. Como estava muito quente, Luciano foi só de cueca por baixo da fantasia. Não teve jeito. Ele teria que ficar pelado dentro da fantasia. Com lágrimas nos olhos, Luciano sacrificou sua roupa de baixo e se limpou. Triste, mas foi o que deu para fazer.

“Bem, pelo menos não pode ficar pior”, pensou Luciano.

É, foi o que ele pensou. Mas assim que tentou recolocar a fantasia, a idade dela se revelou. O zíper emperrou quando ele tentou fechar e, ao fazer um movimento um pouco mais brusco, acabou rasgando a pobre roupa de Senhor Raposo. O rasgo foi brusco o bastante para aparecer justamente a parte de trás de seu corpo...é, bem ali mesmo.

“Ai, caramba”. Pelo visto, podia, sim, ficar pior.


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Notas finais do capítulo

E no próximo capítulo, veremos como ele se sairá dessa.

Até lá! ;)



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