Powerless Against You escrita por Shiroyuki


Capítulo 7
Capítulo 7. Distância




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Capítulo 7

Distância


Havia algo de muito estranho na classe 1-A, e Aizawa não tinha ideia do que estava causando aquilo. Fosse ele um professor um pouco mais neurótico (lê-se: Toshinori), já teria movido céus e terra para descobrir a causa de tal distúrbio. Mas como ele era apenas Aizawa, e já havia chegado atrasado para aquela aula, o que consequentemente fazia com que estivesse privado da sua milagrosa xícara de café habitual, ou seja, com a pouca disposição que possuía pelas manhãs em um nível ainda menor do que no resto dos dias, não ousaria investigar isso mais a fundo.

Fosse qual fosse o motivo para aquela atmosfera estranha que o cercava, ele não se preocuparia. Enquanto fitava cada um da sala, com os olhos avermelhados que poderiam muito bem pertencer a um viciado em drogas morando na rua (já o confundiram com um desses algumas vezes durante a vida), mas que eram apenas mais um resultado de ter se atrasado, já que não houve tempo para o colírio que ele costumava usar todos os dias. A idade e o uso irrestrito de uma quirk como a dele tinham seus ônus. Não que ele estivesse velho, longe disso. Apenas desgastado. E cansado – ah, como ele estava cansado.

Distribuiu folhas com exercícios para todos os alunos. Não estava com paciência para explicações. Deixou que eles prosseguissem da maneira que preferissem, e talvez assim ele pudesse tirar um cochilo até o próximo período. Iida  estava ali para manter a ordem na classe, afinal. Os alunos notaram que aquela aula estava mais próxima de ser um período livre, e começavam aos poucos a circular pela sala e falar uns com os outros, inicialmente para resolver os exercícios, mas logo avançando para conversas pessoais paralelas que nada tinham a ver com a aula. Juntavam-se em grupinhos, o que era usual. Mesmo Aizawa, que costumava ser um professor considerado desatento na maior parte do tempo, já conseguia notar esses padrões.

Kirishima sentara sobre a mesa de Bakugou, e era um milagre que ele ainda não tivesse explodido a bunda dele para fora dali. Ashido e Sero haviam se aproximado dali, e junto com Kaminari, rindo alto e agitando ao redor do garoto, que não parecia nada feliz com a situação e mesmo assim não fazia nada para afastá-los.

Ojirou e Hagakure haviam sentado juntos, ou pelo menos era o que parecia, já que ele só conseguia ver o uniforme da garota se movendo no ar. Eles estavam resolvendo os problemas na folha que ele entregara de início, mas agora pareciam animados, então deviam ter se distraído com alguma outra conversa. Não que ele se importasse. Do outro lado, Yaoyorozu e Jirou conversavam, com Tokoyami inclinado na direção das duas, mostrando algo no celular, oferecendo seus fones de ouvidos para que elas escutassem alguma coisa.

Mineta estava sozinho em um canto da sala, assistindo alguma coisa no seu celular e rindo para si mesmo. Não. Aizawa preferia nem saber do que se tratava. Não iria nem pensar nisso. Aoyama tirava fotos de si mesmo com diferentes variações das mesmas poses. Nada novo. Koda, Sato e Shoji eram sempre tão quietos que Aizawa quase não percebia suas presenças, mas eles pareciam ser os únicos ali que ainda tentavam fazer algo, fosse ou não os exercícios da sua aula. Sinceramente, ele não estava se importando tanto assim com as respostas, mas se fosse mantê-los ocupados já que ele não tinha nenhuma atividade importante planejada para aquela semana, melhor.

Como esperado, Asui e Uraraka haviam se transferido para as classes ao redor da mesa de Midoriya, e Iida estava com eles, tentando convencê-las a voltar para seus lugares. Midoriya olhava pela janela, um pouco mais distraído pela vista externa do que os outros, respondia ocasionalmente. Eles riam e conversavam entre si, como todos os pequenos grupos formados por toda sala. O que adolescentes tanto tinham para conversar, afinal? Aizawa mal conseguia acompanhar os assuntos, quem dirá entender o que falavam. Era como se fosse outra língua. Talvez estivesse mesmo ficando velho, como Hizashi gostava de enfatizar para provocá-lo.

Apesar de observar isso, ele ainda não conseguia apontar o que havia de errado na dinâmica da sua sala hoje. Todos os pivetes continuavam barulhentos e cheios de energia como sempre, alguns mais do que outros, mas isso também era normal. Mas ainda havia algo ali, que não se encaixava com o resto da imagem com a qual ele já havia se acostumado, e que o impedia de descansar como ele tanto desejara desde o momento em que abriu os olhos naquela manhã.

E então, enquanto esquadrinhava o agitado grupo com seus olhos cansados, ele percebeu. Todoroki estava ali, no centro da sala, em silêncio, olhando para seu caderno, a lapiseira em punho, sem escrever realmente. Não era uma visão tão inusual, verdade seja dita. Aizawa já havia visto isso muitas vezes antes. Exceto que, nos últimos meses, isso já não acontecia com a mesma frequência que no início do ano. Nos exercícios externos, nos momentos livres, nos intervalos ou nos projetos em grupo, Todoroki estava sempre com o pequeno grupo formado por Midoriya e companhia. Quem sabe não era essa a sensação estranha que Aizawa sentiu desde o momento que pisou na sala?

Fazia muito tempo que ele não via aquele semblante no garoto. O olhar perdido, vazio. Frio. Não que ele reparasse – Aizawa mal tinha tempo para cuidar da papelada que envolvia ser professor da turma, que dirá ficar prestando atenção em cada um daqueles alunos. Eles que cuidassem de si mesmos. Eram heróis, não eram? Tinham que aprender, de um jeito ou de outro. Mas que era estranho, era.

Midoriya também, não estava muito normal. Não ria, não respondia nada, não completou o exercício proposto, nem insistiu para ter aula prática naquele dia. Nem mesmo começou um dos seus monólogos intermináveis e emocionados sobre heróis antigos que ninguém mais lembrava. Só olhava para fora, o rosto escorado na mão, parecia cansado. Volta e meia, lançava um estranho e mal disfarçado olhar para trás. Na direção de Todoroki. Oh, aí estava a solução do mistério. O que quer que estivesse acontecendo, era entre esses dois.

Aizawa não se importava. Não tinha tempo para dramas adolescentes e briguinhas infundadas. Iria reportar o que notara para Toshinori, Midoriya era protegido dele não era? Talvez para os outros professores também, eles podiam querer ficar de olho. Talvez ele próprio fosse perguntar para algum dos pirralhos ao redor sobre o que se tratava, afinal, se fosse algo bobo e sem importância – certamente era –  não valia a pena se meter nisso. Mas tanto faz. Não era trabalho dele se importar com todos os alunos. Ele não dava a mínima. E, droga, não ia conseguir dormir naquela aula no final das contas, não é?


—-

 

Midoriya soltou o lápis, ou o que restara dele, depois de ter perdido o controle por uma fração de segundos e reduzido o objeto a pedaços por tê-lo apertado forte demais ao acionar o One for All por descuido. Seu caderno estava cheio de anotações sem sentido que ele se forçara a fazer e agora não sabia mais se eram ou não importantes. Os livros abertos ao seu redor não diziam muita coisa.

Ele já havia recusado polidamente o convite de Uraraka para almoçarem juntos naquele dia, escapando antes que ela pudesse perguntar qualquer coisa. Esperava que assim, ela e Iida pudessem almoçar com Todoroki, em paz. Ainda assim, ficou observando-os de longe, sem ser notado, querendo notar na postura de Todoroki se ele parecia bem.

Após o final da aula naquela tarde, não quis voltar com os outros para o dormitório, alegando que precisava adiantar o seu trabalho de História do Heroísmo, e correu para a biblioteca antes que eles pudesse questionar a decisão ou se oferecer para ir junto.

Odiava o fato de que Todoroki acabaria isolado, na sua tentativa de evitá-lo, e não queria ser o motivo pelo qual ele teria que andar sozinho de novo. Depois de todo o esforço para fazer com que ele se abrisse e fizesse amigos, não colocaria tudo isso a perder só porque as coisas haviam ficado estranhas entre eles. Izuku queria, de verdade, dar espaço para Todoroki decidir o que queria fazer e não pressioná-lo a enfrentar o seu pai ou quem quer que fosse só por sua causa. Sabia muito bem da dificuldade do outro em lidar com sentimentos. Não iria piorar as coisas, forçando a barra e ultrapassando o limite do que era confortável para Todoroki.

Mas ainda assim, a vontade que tinha de mandar tudo para os ares, correr até Todoroki e anunciar que sabia muito bem cuidar de si, jamais sairia do seu lado e o protegeria de todos que ousassem falar qualquer coisa sobre ele só aumentava a cada instante. A vontade de chutar a bunda (com o perdão da palavra) de Endeavor, era mais forte do que nunca. A única coisa que o impedia de fazer isso naquele exato instante era a lembrança do olhar perdido de Todoroki na última noite e a possibilidade de magoá-lo ao ser impulsivo dessa forma.

Seu coração doía toda vez que ele lembrava, e por isso ele passou a última noite tentando inutilmente se distrair com filmes cheios de explosões e lutas frenéticas, livros que ele esteve acumulando e nunca tinha tempo para ler, ou as últimas edições dos quadrinhos que acompanhava. Pulou de um para o outro em fração de minutos, mas nada prendia sua concentração por muito tempo. Dormir foi um martírio, ele só havia conseguido pregar os olhos por pura exaustão, quase ao amanhecer.

As aulas não estavam ajudando nesse sentido, mesmo na aula prática depois do almoço, porque ele sempre se pegava observando Todoroki por mais tempo do que deveria. As aulas comuns eram piores ainda, porque se tornaram massivas horas de tempo ocioso no qual ele não conseguia focar no que o professor dizia e sua mente tinha liberdade para vagar por terrenos perigosos, como planos mirabolantes para fugir com Todoroki e casar escondido em um drive-thru de Las Vegas com um juiz de paz vestido de All Might (NÃO! Eles eram jovens demais para casar ainda, mente estúpida), ou o discurso no mesmo estilo das novelas que costumava assistir com sua mãe, que ele faria na cara de Endeavor quando fosse tirar Todoroki das suas malignas garras – o que não fazia o menor sentido já que agora eles estavam morando no dormitório.

No fim das contas, por mais que quisesse, planejasse, imaginasse , não havia nada que pudesse fazer se o próprio Todoroki não desejasse assim. Ele estava de mãos atadas, e se tinha algo que Izuku de fato detestava mais do que qualquer coisa, era se sentir inútil e incapaz.

Ele tentou agir normalmente, fingir que tudo estava bem e nada havia acontecido, mas acontece que ele era um ator terrível. Já havia perdido a conta de quantas vezes Uraraka já perguntara se ele estava bem, ou se queria conversar, só naquela manhã. Iida havia feito um longo discurso poucas horas atrás sobre dividir o peso com os amigos e se abrir (como se ele fosse alguém para falar sobre isso. Mas Midoriya ficava feliz de saber que ele havia aprendido sua lição). Até mesmo All Might já havia saído do seu caminho para perguntar se Midoriya estava com algum problema e precisava de ajuda! Eles nem haviam tido aula com ele naquele dia, como ele sabia?!

Midoriya apreciava a preocupação de todos, mas ele não queria ter que lidar com isso agora. Esperava sinceramente que eles estivessem dispensando a mesma atenção à Todoroki, era ele quem precisava de alguém para conversar e desabafar, não ele. Além disso, ele não pretendia dizer nada à ninguém. Tudo o que dizia respeito à Todoroki era algo que só eles dois sabiam, e apenas Todoroki poderia ou não dar permissão para que ele contasse sobre sua vida pessoal e familiar para os outros. Midoriya jamais quebraria a promessa de manter o segredo dele. Mesmo quando tudo o que queria fazer era gritar, correr na direção dele e salvá-lo de tudo o que lhe causava sofrimento.

Essa vontade crescia dentro de si a cada silenciosa hora que se passava. Midoriya aguentaria firme. Porque Todoroki aguentou da mesma forma aqueles anos todos, e ele faria de tudo para não acabar com aquela confiança duramente conquistada. Era mais difícil do que ele imaginara. Vê-lo durante aquele dia inteiro, estar tão perto e não poder nem ao menos ouvir a sua voz. Acordar de manhã e assistir de longe enquanto ele andava sonolento pela cozinha do dormitório, com os cabelos naquele bagunçado natural que Izuku morria de vontade de afundar os dedos até ajeitar os fios alvos e escarlates, ou talvez, bagunça-los ainda mais. No intervalo, perceber o lugar vago ao seu lado na mesa que dividia com os amigos, e apesar de querer tanto sentar ali e deitar a cabeça no seu ombro como fantasiava fazer poucos dias antes, a consciência de que nada disso poderia se realizar  o esmagava.

Queria mandar uma mensagem para ao menos saber se ele estava bem, lembrá-lo de se alimentar direito – ele tinha uma péssima mania de esquecer e pular refeições se não estivesse prestando atenção – pedir que ao menos contasse para ele se os pesadelos retornassem e se ele acabasse não conseguindo dormir direito nos próximos dias. Ainda podiam trocar mensagens nesses casos, certo? Izuku se preocupava, ainda queria cuidar dele e garantir seu bem estar, mesmo de longe.

Talvez fosse uma boa ideia sugerir isso, mas no mero pensamento de ir até Todoroki e conversar com ele, Izuku fechou os olhos, escondendo o resto entre os braços sobre os livros diante de si. A imagem de um sorriso discreto, uma risada melodiosa e quase inaudível, olhos de duas cores distintas brilhando na sua direção, surgiram de imediato na sua mente, e ele não conseguia lidar com o sentimento que queimava dentro de si, a vontade intensa de estar perto dele, mesmo que fizesse apenas um dia desde a última vez que estiveram juntos.

Parecia um sonho distante, mas era uma lembrança de poucos dias atrás. Quando é que Izuku teria permissão de ver essa imagem novamente? Ele mal podia esperar.



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A aula já havia terminado há horas, e Shouto sabia que Midoriya não havia retornado junto com todos os outros para o dormitório. Ele tentou não pensar muito nisso, nem se preocupar. Não havia motivo, certo? Tudo estava bem, e ele esperava que repetir isso para si mesmo enquanto andava de um lado para o outro no limitado espaço do seu quarto, parando ocasionalmente para olhar pela janela e não ver nem sinal de Midoriya retornando,  fosse ajudar a clarear os pensamentos. Não estava dando muito resultado.

Aquele dia havia sido penosamente longo e potencialmente mais difícil do que Shouto previra. Ele não havia pensado no quanto a decisão de se afastar de Midoriya – para o próprio bem dele – seria tão complicada de colocar em prática. Ele imaginou que seria apenas uma questão de voltar ao que ele era antes, no início do ano. Não havia se dado conta de que a presença de Midoriya, tão lentamente que ele mal notara o quanto, havia se tornado uma constante em sua vida, e ocupava uma parte tão grande dela que, sem isso, ele se sentia vazio.

Durante toda a aula, Todoroki tentou não olhar na direção dele, embora fosse ridiculamente fácil perder o controle sobre isso e descobrir que seus olhos haviam novamente vagado em direção à fileira da janela. Mais de uma vez seus olhos se esbarraram durante essas escapadas, e Todoroki sentia aquela batida falhada do seu coração, que fazia sua garganta apertar e toda sua pele se eriçar de uma maneira completamente não-natural. Será que algum dia ele se acostumaria o suficiente para não ter mais essas reações não planejadas? Parecia quase impossível, ainda mais quando ele estava tendo todo o trabalho de tentar evitar justamente essa perigosa proximidade.

Era por uma boa razão, ele repetia para si mesmo a todo instante. Era pela razão certa, ele dizia, de novo e de novo. Era pelo bem de Midoriya. Ele não permitiria que seu pai chegasse até ele, e causasse o mesmo estrago que ele sempre causava em tudo o que o cercava. Talvez fosse esse o seu destino, afinal de contas. Assim como ele parecia causar feridas nos braços dos seus amigos, mesmo sem ter a intenção de fazer isso. O seu lado esquerdo ainda era capaz de estragar tudo, mesmo quando ele tentava aceitá-lo, fazê-lo ser parte de si, e não algo imposto por Endeavor. A natureza do seu poder era um destino tão inevitável assim? Ele jamais escaparia?

Mesmo quando se esforçava, ainda havia aquela sombra que cobria sua visão e repetia sem parar, com a voz intensa como um trovão, que ele não era capaz de andar com alguém ao seu lado, que ele só servia para ferir, para lutar… uma ferramenta e nada mais. Sozinho, ele iria mais longe. Para chegar ao resultado que almejava, não precisava de distrações. Amigos eram distrações. Midoriya era a maior de todas as distrações que ele já experimentara na vida.

No entanto… esse não era seu desejo. Era o de Endeavor. Aquelas eram as palavras que seu pai repetia dia e noite, até que estivessem encravadas como marcas na pedra dentro da sua mente. Ele queria ser o melhor, verdade seja dita. Queria sim, provar o seu valor, todavia, seu desejo era fazer isso pelos seus próprios métodos. Seguir sua vida e fazer suas escolhas sem precisar se restringir nunca mais. Era algo que ele não sabia que poderia possuir até pouco tempo atrás, e o sentimento de estar livre e tomar decisões era tão libertador que ele não sabia lidar direito com tudo o que acabava descobrindo por acaso durante a jornada.

Todoroki piscou, sentindo os olhos arderem, mais úmidos do que ele estava acostumado a sentir. Só então ele percebeu as lágrimas que lentamente percorriam seu rosto. O que ele estava fazendo consigo mesmo? Por que ele estava fazendo isso tudo? Por quem?

Ainda olhando através da janela, ao longe Todoroki viu a figura solitária e pequena que se aproximava pelo caminho até o dormitório. Os cabelos verdes revoltos eram reconhecíveis mesmo com a luz alaranjada e tênue do por-do-sol que tornava as sombras confusas. O coração de Todoroki doeu novamente. Ele passou a mão no peito. Isso não iria passar tão cedo, iria?

O que ele estava fazendo…? Na hora, pareceu tão certo. Afastar-se de Midoriya, garantir que ele estaria bem, seguro, fora do radar de Endeavor e da influência dele. Longe de Shouto, Endeavor jamais o alcançaria. Então, eles poderiam se concentrar no que estavam ali para fazer. Virar heróis, ter sua própria vida, independentes. Shouto não precisaria mais viver à sombra de seu pai, pois teria seu próprio nome. Ninguém na rua o reconheceria como Filho do Herói Número #2. Não haveria aquele tipo de comentário ridículo, nem o medo de ser descoberto, porque eles não estariam fazendo nada de errado. E então, somente então, estar com Midoriya pelo resto dos dias, lado a lado, não seria um problema. Seria a maior alegria da sua vida.

Sim, fazia sentido na sua cabeça. Mas já não parecia mais tão simples assim. E doía tanto pensar que ele ainda teria que esperar muito tempo, dias, meses, anos dessa dor excruciante e desse vazio interminável para conquistar esse objetivo. Midoriya estava ali, tão perto. E ele se recusava a alcançá-lo.

Havia decidido que esse era o melhor caminho. Sabia que estava certo sobre isso. Mas a cada momento que passava, sentia suas certezas fraquejarem e caírem por terra. Exatamente como na última prova da competição no festival esportivo, e como em todos os dias que se seguiram àquele. Midoriya parecia ter esse tipo de efeito nele. Fazê-lo duvidar de tudo o que sabia e em tudo o que acreditava ser verdade.

A voz rouca, ferida, gritada no meio de um estádio, mais elevada que o alvoroço das milhares de pessoas que os assistiam, ecoou dolorosamente clara em sua mente. “É o seu poder.”

Era o seu poder. A sua vida.

E ele ainda se continha tanto, se restringia tanto. Havia se acostumado em ter pouco e em desejar quase nada, pois durante toda a sua vida até ali, tudo o que ele amava sempre era arrancado de si. Restava a dor, os treinamentos exaustivos, as ordens, os castigos, e o silêncio.

Seu pai sempre o privou de tudo, dizendo que era para o seu bem. Exatamente como ele havia feito com Midoriya na noite anterior. Todoroki cerrou os dentes, o peso daquela breve contestação ferindo-o por dentro. Ele estava fazendo exatamente como seu pai queria, não é mesmo? Estava agindo como ele.

Até quando ele deixaria que Endeavor continuasse a ditar todas as regras, comandar mesmo os seus pensamentos, e impedi-lo de viver?

— Fraco. Você é tão fraco, Todoroki Shouto. – ele murmurou, desabando sobre a própria cama. Aquele ódio cru, capaz de ativar as chamas há tanto adormecidas, dessa vez direcionado a si mesmo, ainda ameaçava surgir, mas havia algo além disso. Sempre algo além. A imagem de Midoriya, seu rosto decepcionado e triste, ontem. Seu rosto vazio durante todo aquele dia. O caminhar lento e solitário no caminho de volta ao dormitório. Ele havia feito aquela expressão por sua culpa. Todoroki jamais se perdoaria por tê-lo feito sofrer (tentando protegê-lo! Que piada).

Não. Isso não podia ficar assim. Não iria acabar assim.

Todoroki havia estava se dando conta de que havia cometido um erro.

Teria que consertá-lo.

(Mas como?).





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Notas finais do capítulo

Run, Todoroki, run!



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