Billy vem emagrecendo nos últimos tempos. Ele não vê muita graça na ração, tampouco nos petiscos outrora tão irresistíveis. Passou a comer bem menos desde que o menino foi embora.

Por mais que o homem e a mulher deixem o seu pote sempre cheio quando saem — e eles saem cada vez mais e demoram bastante a voltar —, Billy mal toca no alimento. Ou na água. Ou na bolinha vermelha esquecida no meio da grama em crescimento irregular.

Miguel nunca mais voltou desde aquele dia em que jogou o brinquedo para ele pela última vez e entrou no carro com os pais.

O vira-lata não é capaz de guardar rancor, porém está com o coração ferido mesmo assim. Ele não entende por que o seu dono jogou tudo que eles tinham fora e o deixou para trás. Billy só quer que ele volte depressa, que esteja ali outra vez e não se afaste de novo.

Com certeza, receberia o menino com a característica alegria que os cachorros devotam aos humanos. Tão logo colocasse os olhos e as patas nele, esqueceria por completo a agonia que a ausência lhe causou e entregaria sua lealdade de novo sem pestanejar. Entregaria seu coração junto também, afinal ele sempre pertenceu ao menino.

O problema é que Miguel não está ali. Para a agonia de Billy, ele ainda não voltou do lugar misterioso para onde foi levado. A verdade é que nem os pais do garotinho sabem se ele irá retornar um dia, embora mantenham a fé no transplante que pode salvar a sua frágil vida.

Houve complicações que o impediram de deixar o hospital após mais uma bateria de exames. Os médicos acharam prudente que ele ficasse internado até melhorar. Infelizmente, Miguel não melhorou e foi por isso que não retornou para casa e para o seu melhor amigo.

Billy não sabe de nada disso, afinal é apenas um cachorro. Apenas um leal amigo que sofre em silêncio.

Às vezes, esse silêncio é vencido por longos uivos de saudade. Geralmente, durante as solitárias horas da madrugada.

Às vezes, o cãozinho tenta se esgueirar pelo portão ou pular o muro para seguir o carro da família e descobrir aonde o menino foi parar. Até agora, ele não teve sucesso nisso.

E, às vezes, Billy fica simplesmente quieto. Como está agora.

Deitado num canto do quintal, com a cabeça entre as patas, ele sente ainda mais falta do tempo que passaram juntos. Do tempo que era só deles. Do tempo que desapareceu no ar, como as bolhas mágicas dos banhos que o menino lhe deu um dia.