Solitude escrita por Lillac


Capítulo 16
Agulhas.


Notas iniciais do capítulo

E aí?
Vou começar dizendo que eu adiei um pouco esse capítulo mesmo ele já estando pronto porque... bem. Ele marca oficialmente a "reta final" da história. Ele é uma espécie de "penúltimo" capítulo, MAS CALMA. O que eu quero dizer que com isso é que os últimoS capítuloS (plural mesmo) são contínuos, ou seja, sem flashbacks, sem quebra de tempo... e vocês vão entender logo, logo. Portando, considerem a narrativa mais lenta como uma espécie de... transição.
Uma notícia que talvez alguns de vocês gostem: a partir do próximo capítulo, as atualizações serão diárias ♥ (supondo que nada aconteça com o meu notebook, haha).



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— Nós vamos perder o café da manhã.

Percy virou o rosto, ainda sem levantá-lo de onde estava pressionado contra o travesseiro. Ele havia retornado do habitualmente desconfortável banheiro comunitário que todos eram obrigados a dividir às seis da manhã (a base contava com um tanque de água extenso, mas os militares não eram estúpidos para desperdiça-lo) e embora já tomado banho e de dentes escovados, se atirara diretamente na cama.

O cabelo molhado de Annabeth ensopava a toalha que ela tinha em torno do pescoço, enquanto ela, inclinada, devolvia a própria escova de dentes ao compartimento na mochila surrada.

Preguiçaaaa — Percy resmungou.

— Não me diga — ela respondeu, com uma sobrancelha erguida.

Sentando-se no espaço no canto da cama com as costas para ele, Percy era capaz de observá-la melhor. Não era como se a base militar possuísse um closet com uma extensa coleção de roupas atualizadas com a última moda, então ela estava vestindo as mesmas calças camufladas pretas e cinzas que todos usavam há quase um mês, e uma regata presa já desbotada. Bem diferente do jeans azul-escuro e camisetas de times de beisebol que ela costumava usar na escola, para dizer a verdade.

E ainda assim, Percy sentiu a mesma sensação impertinente em algum lugar dentro de si, expandindo-se pelo seu peito como uma lareira em um dia frio, e deixando-o fraco dos pés à cabeça quando olhava ela.

— Dessa vez é sério — ela deitou uma mão no quadril dele, balançando-o de leve — eu não quero ficar com fome, Jackson.

— Uhum — ele concordou, e, embora também não estivesse afim de perder o café, também não tinha nenhuma intenção de sair daquela cama tão cedo.

Annabeth começou a levantar-se, mas, com um movimento rápido, mas cuidadoso para não a machucar, Percy a trouxe de volta para cama, fazendo-a cair diretamente sobre ele. Quando a fez menção de desvencilhar-se, ele assegurou-a colocando dois braços em torno dela.

— Percy—

— Annabeth — ele chamou, e o tom sério na voz dele a fez parar de se mexer, olhando-o com as sobrancelhas erguidas, esperando que ele continuasse —, ok, isso vai me fazer soar louco.

— Não vai me deixar surpresa, então.

Ei! — Após uma curta risada, ele precisou de um tempo para coletar os próprios pensamentos e transformá-los em palavras — Eu só... faz quase sete anos que a gente se conhece — Annabeth escutava atentamente, ao mesmo tempo em que se aninhava melhor na forma dele, como se já pudesse adivinhar que aquilo fosse demorar — em algum momento você pensou que nós...?

Ele esperava que ela fosse ficar um pouco vermelha, ou ao menos demonstrar algum sinal de timidez, mas Annabeth apenas respondeu:

— De jeito nenhum.

— Sensível como sempre, hein?

— Vai dizer que você pensou? — Annabeth o desafiou, e Percy precisou concordar, porque, afinal, ela estava certa. — Quer dizer, minhas experiências com namoros não foram das melhores, mas eu precisaria ser doida para cogitar namorar com o garoto que importunava a minha vida desde a sétima série.

— Você fala como se você tivesse feito a minha vida muito mais fácil. Deixa eu dizer, ser o rival da srta.-melhor-aluna-da-turma-com-um-GPA-de-4.0-e-basicamente-aceita-em-Havard não era fácil. Eu tinha que estar à altura, ok?

A boca da garota abriu em quase um “O” perfeito.

— Você só pode estar de brincadeira! — Ela acusou, subitamente tomando um tom de voz mais enérgico — eu passei o ensino médio inteiro sendo acusada de só implicar com você porque eu queria “atrapalhar” o seu namoro com a Rachel, sr.-eu-vou-para-a-diretoria-absolutamente-todos-os-dias-mas-não-posso-ser-expulso-da-equipe-de-natação-porque-eu-sou-literalmente-o-melhor-do-país.

— Deuses, você é boa com palavras — Percy rolou os olhos dramaticamente.

Então, ele sentiu alguma coisa... como se algo vibrasse encima de seu peito. Confuso, ele analisou a expressão de Annabeth, apenas para vê-la já ficando vermelha nas orelhas. Mas não era de timidez.

Annabeth estava dando o melhor de si para segurar uma risada.

O que não durou muito.

Percy fingiu irritação enquanto ela passou alguns bons minutos rindo tão alto que poderia muito bem acordar alguém que ainda estivesse dormindo nos quartos mais próximos, mas, secretamente, ele observava a expressão dela com atenção, tentando guardar cada detalhe.

— Eu só... — ela tomou ar — eu só lembrei do término de vocês. Aquilo, deuses, aquilo foi engraçado. Agora que eu a Rachel somos amigas, você precisa me lembrar de agradecê-la, porque aquilo foi incrível.

— Eu usaria “mutuamente humilhante”, muito obrigado — Percy grunhiu — até hoje eu não sei o que deu em mim.

— Bem, eu posso te lembrar sem problema algum! Você chamou-a de “uma minion com cabelo cor de água de salsicha que só pensa em si mesma e provavelmente bebe tinta aguada para ser tão arrogante assim”. O que aliás, não fez o menor sentido, porque eu e você sabemos que o cabelo dela é lindo — Annabeth recontou. — E aí ela tirou a fatia de cima do cheeseburguer dela, juntou os duas carnes de hambúrgueres cobertos de queijo nas mãos e esfregou os dois no seu rosto. Eu nunca te vi tão ofendido.

— Rachel me atacou com cheeseburgers! — Percy chiou — Cheeseburguers, Annabeth! Isso é tipo, profanar um alimento sagrado.

— Foi uma das melhores cenas que eu já vivenciei na minha vida — Annabeth concluiu, como se houvesse terminado de contar uma história épica. — E aí dois dias depois vocês estavam na diretoria juntos porque a sra. Dodds pegou vocês jogando Pokémon no meio da aula.

Percy deu de ombros.

— O jogo era novo, e nós estávamos loucos para testar — admitiu.

— Eu só acho muito legal que vocês dois tenham continuado melhores amigos mesmo depois desse fiasco.

— Ei! Não chame a minha primeira experiência amorosa de fiasco — ele protestou, mas estava sorrindo. — Bem, eu conheço a Rachel desde que nós saímos das fraldas... quase literalmente, então seria ainda mais estranho se nós simplesmente começássemos a ignorar um ao outro. Digo, ela já me viu com a minha cueca dos Jovens Titãs quando tínhamos nove anos. Não fica pior do que isso.

— Ainda assim — Annabeth comentou, correndo os dedos distraidamente pela clavícula dele, soando distante — faz quase dois anos que eu e a Drew terminamos, e mesmo ela tendo ficado mais suportável depois do acidente de carro do Mitchell e tudo o que aconteceu na família deles... eu ainda tenho vontade de bater com um sanduíche mofado na cara dela.

— Eu ouvi dizer que ela só namorou com você para pegar cola...?

Pelo menos, Annabeth riu.

— A Drew é ruim, mas nem tanto assim. Quando eu disse para ela que queria ir para Harvard na faculdade e ela percebeu que isso era... bem, em outro estado, eu simplesmente não tinha mais nenhum lugar na vida dela.

Eles ficaram em silêncio por um tempo.

— Bem... — Percy limpou a garganta — se ainda existir alguma faculdade lá fora quando isso acabar... eu quero que você saiba que eu vou estar feliz por você, seja para onde você decidir ir.

Annabeth pareceu esquecer quaisquer pensamentos estivessem flutuando na cabeça dela previamente, e focalizou o olhar no rosto dele. A maioria dos ferimentos dela já haviam se fechado, mas era óbvio que algumas cicatrizes ficariam, se não para sempre, pelo menos por um bom tempo.

Ela agarrou a bochecha dele com uma mão e puxou.

— Como se eu fosse deixar meu namorado escapar de mim tão fácil assim — ela pontuou.

E o coração de Percy pulou ao menos umas cinco batidas. Ela começou a se aproximar para um beijo, mas ele não conseguiu evitar, com um sorriso que ia quase de orelha a orelha.

— Namorado?

Annabeth, que já estava com o nariz encostado no dele, também sorriu.

— Você quer um pedido formal, sr. Jackson?

— Não sei — e o sorriso iluminado de Percy foi substituído pelo usual, puxado de canto, que o deixava com a aparência de quem não tinha nada de bom escondido na manga.

Ele avançou então, capturando os lábios dela com os dele, e dessa vez não houve tempo para sutil e delicado. Percy estava literalmente tremendo de alegria. Annabeth e ele estavam namorando.

Namorando.

Portanto, ele dedicou-se a beijar sua namorada com tudo o que tinha, movendo as mãos, previamente pousadas nas costas dela até o rosto, e trazendo-a impossivelmente mais para perto. Annabeth respondeu deslizando uma mão para o quadril dele, arranhando levemente, e colocou a outra, espalmada, em seu ombro. Eles moveram-se em sintonia, ao mesmo tempo eufóricos, mas saboreando o momento em toda sua calmaria.

Quando ela foi aos poucos diminuindo o ritmo do beijo, reduzindo-o à uma série de selinhos demorados que fizeram Percy arrepiar até as pontas dos pés, e chamou:

— Percy?

Tudo o que ele conseguiu responder foi um:

— Sim? — Meio trêmulo e sem fôlego.

Ele sentia-a sorrindo contra a boca dele. Ela arranhou de leve a pele do ombro dele e, no segundo seguinte, pulou da cama com a agilidade de uma ginasta. Enquanto Percy ainda se recuperava da súbita mudança de ambiente, ela inclinou-se, juntou a camiseta igualmente preta que estava embolada no canto da cama e ele ainda não havia vestido e atirou-a no namorado.

— Se veste logo — ela avisou, sorrindo. — Eu realmente não quero perder o café.

E, com isso, deu o fora do quarto. Percy ficou olhando a porta fechada, meio perdido.

E completamente extasiado.

 

 

O bom humor de Percy, outrora inabalável, encontrou-se em falta poucos minutos depois. Ele não estava com raiva, longe disso, mas era impossível manter um sorriso no rosto naquela parte da base.

Ao menos, foi à essa conclusão que ele chegou ao ver os rostos dos demais adolescentes reunidos em torno da cela de Octavian.

Estava no começo da tarde, pouco depois do almoço, e uma luz intensa entrava pela pequena janela gradeada, deixando o ambiente abafado e evidenciando as partículas de poeira que voavam em volta deles.

— Eu espero, honestamente, que vocês saibam que isso é loucura — ele resmungou, de onde estava sentado de pernas dobradas no chão da cela.

— Vamos lá, Octavian, isso pode aumentar as nossas chances de sobreviver. — Rachel inclinou um pouco o ombro, mas não tirou os olhos do desenho que estava fazendo na folha de papel que tinha bem em frente a ela, no chão — E, se me empurrar da escada e esfaquear Reyna serve de exemplo, eu diria que “sobreviver” está no topo da sua lista de prioridades.

Percy estava sentado no chão bem ao lado dela e, embora Rachel não houvesse mexido a cabeça enquanto falava, ele não precisava ver sua expressão. Podia dizer, pelo tom de voz dela, que Rachel estava irritada. Mas ela sempre tivera um tipo de raiva assustador — uma raiva contida e sarcástica que ameaçava como a premissa de um terremoto iminente.

Octavian grunhiu, mas, fora isso, ficou em silêncio pelo restante do tempo que Rachel levou para terminar o desenho. Annabeth e Jason, mais próximos das grades, chamaram a atenção de Octavian, enquanto Reyna e Nico, sentados do outro lado de Rachel, se aproximaram um pouco mais.

— O que você acha? — Annabeth instigou. — Um vírus ou uma bactéria?

— É difícil de dizer — Octavian torceu a boca — a resposta óbvia seria vírus, pelo... “comportamento” e pelo ciclo de duplicação, supondo que o que vocês concluíram seja de fato a verdade. Mas... — ele mordeu a boca.

Annabeth inclinou-se um pouco mais. O cabelo dela estava preso de forma a não permitir que nenhum fio de cabelo atrapalhasse sua visão, e os olhos delas permaneciam inabaláveis, cravados como balas no rosto de Octavian.

Mais cedo, ela não parecera muito animada pelo prospecto de ter que trabalhar com o garoto, mas a verdade era a verdade, por mais ruim que fosse — Octavian era inteligente, e, com nenhum dos soldados além de Clarisse os levava a sério naquele lugar, eles precisavam de todos que pudessem ajudar.

Principalmente agora, sem Leo.

— Me dá a caneta — Octavian pediu, e Annabeth o entregou.

Percy ajudou Rachel a deslizar até estar de frente para a cela dele, segurando o desenho em frente ao corpo, e Octavian ergueu um braço entre a barras para alcançar o papel. Rachel havia reproduzido quase perfeitamente, com exceção de um toque artístico aqui e ali, os vários desenhos do interior de um corpo humano que ele havia visto nos livros de biologia.

— Você disse que o lobo frontal do Ethan estava deformado — Octavian recapitulou — o que explica a perda de funções cognitivas e impulsividade intensificada. Nós sabemos que Ethan foi mordido, e que isso possivelmente acelerou o processo de... zumbificação.

— Sim — Jason cruzou os braços, olhando-o de soslaio.

— Desse modo, eu acho que a forma mais simples de o compreender é comparando-a com a teníase — Octavian continuou. Annabeth, Jason, Frank e Reyna acenaram, mas ele pareceu perceber que os outros não haviam compreendido tão bem assim. Com um longo suspiro, emendou: — é uma espécie de verme. Ele entra na corrente sanguínea através da ingestão de carne de porco ou de boi contaminada. O processo é longo e eu não estou afim de explicar, mas, basicamente, dependendo da situação, ela alcança o cérebro e se aloja lá, onde causa mais dano.

— Você está dizendo que acha que o objetivo final desse vírus ou bactéria é chegar no cérebro? — Reyna perguntou.

— Quase — Annabeth respondeu antes que Octavian tivesse a chance. — Ele está dizendo que o ciclo só tem início quando ele alcança o encéfalo, não é?

— Isso. Se o que vocês me disseram for verdade, então eu diria que o ele não começa a agir assim que entra no corpo. Acredito que isso só aconteça quando alcança o cérebro.

— Quê? — Thalia fechou a cara em uma careta.

— Não, não — Annabeth balançou a cabeça. — Faz sentido. O parasita se aloja no cérebro e começa a corrompe-lo. Talvez ele precise de alguma propriedade orgânica que só exista lá. Então o sangue infectado é mandado de volta para o coração e bombeado pelo resto do corpo. A única diferença é se as células sendo transportadas estão passando pelo ciclo lítico ou lisogênico.

— Ou seja — Jason completou — quando todas as células sanguíneas já foram infectadas...

— Você se torna um zumbi — Percy completou amargamente.

Grover limpou a garganta.

— Quando elas fazem o ciclo lisogênico, logo que as primeiras células são infectadas e começam a ser redistribuídas pelo organismo, o corpo automaticamente entra em uma hibernação forçada — ele explicou, por fim.

Octavian estalou as costas.

— Fico feliz que nós tenhamos alcançado uma hipótese tão plausível e tudo o mais... no entanto, eu sei que vocês não estão aqui por isso.

Annabeth trocou um olhar com Jason. Os dois ainda pareciam muito incertos em confiar no garoto. Quando o momento se estendeu demais, Percy decidiu que eles não tinham tanto tempo a perder:

— Nós queremos saber se existe uma cura.

Octavian literalmente engasgou com a própria saliva.

— Uma cura?

— Não exatamente — Jason interviu. — Nós estávamos meio confusos até agora, mas... se tudo isso que descobrimos estiver certo, então deve haver um modo de combater o parasita nos primeiros estágios.

Annabeth estalou os dedos.

— Isso! Nós poderíamos... interromper o ciclo! Exterminar as células infectadas.

Reyna batucou com a ponta dos dedos no piso.

— Parece bom, mas... e se a infecção já estiver avançada? Exterminar os glóbulos vermelhos infectados poderia resultar, na melhor das hipóteses, em um caso sério de anemia.

— Melhor? — Percy repetiu.

Annabeth apertou a ponta do nariz entre os dedos.

— Sim. Na pior delas, vamos ter um monte de sobreviventes leucêmicos.

— Nós estamos falando de literalmente exterminar a parte infectada do sangue das pessoas — Jason pontuou. — É um risco muito grande.

Um silêncio frio engolfou-os por um momento, e Percy soube que ninguém estava muito propenso a dizer alguma coisa que, provavelmente, só pioraria os ânimos.

— E se não fosse? — A voz de Nico surgiu. — Grover, qual seu tipo sanguíneo?

O garoto pareceu genuinamente feliz pela primeira vez em um longo tempo.

— O negativo — respondeu — doador universal.

Annabeth encontrou o olhar de Nico, e Percy pensou que, por um instante, ela pareceu realmente assustadora — de um modo meio gênia maluca.

— É um grande tiro no escuro, Nico — ela o lembrou.

Nico sorriu com o canto dos lábios.

— Eu estou disposto a tentar.

 

 

O burburinho no refeitório era ao mesmo tempo enervante e assustador. Percy estava sentado com os amigos e Sally em uma mesa mais afastada. Naquela tarde, Clarisse havia passado o aviso de que Ares tinha um grande comunicado para fazer no jantar, e que era estritamente necessário que todos estivessem presentes. Todos estavam cochichando, confabulando sobre o que seria daquela vez, e Percy quase conseguia sentir o nervosismo no ar.

O fato de que Annabeth houvera sido solicitada para acompanhar o Coronel no comunicado também não o deixava mais calmo. Toda vez que a porta era aberta, Percy encontrava a si mesmo imediatamente buscando a cabeleira loira com o olhar, apenas para ser decepcionado.

— Percy... — Sally colocou uma mão aconchegante em seu ombro — fica calmo. Ela vai ficar bem.

Percy retribuiu o aperto, mas ele soube que seu sorriso não alcançava seus olhos. Era apenas que a ideia de que Annabeth — e Grover também — estavam praticamente sozinhos com o coronel lunático fazia seu estômago de revirar.

Finalmente, as portas duplas foram completamente abertas e uma pequena comitiva de soldados, liderados por Clarisse, entrou. Eles postaram-se próximos ao balcão onde a comida era servida, formando quase uma barricada. A sargento estava péssima, com o rosto cansado e o cabelo desgrenhado.

Percy prendeu a respiração quando Annabeth entrou. Ela parecia confiante, como sempre, mas havia um nervosismo em seu olhar que ele não havia visto. Um tipo diferente de nervosismo.

Grover e Nico, que praticamente a flanqueavam, não pareciam muito melhores.

Por fim, Ares fez sua entrada. Ele ainda estava usando os estúpidos óculos escuros.

— Pois bem, eu tenho certeza que todos vocês estão se perguntando o porquê dessa reunião tão misteriosa — ele anunciou. — Lawrence, por favor.

Um solado na ponta da fila tomou a frente e depositou uma maleta escura encima de uma das mesas. Os sobreviventes assistiram com curiosidade enquanto ela e a abria, e revelava...

Um conjunto de ampolas cheias de sangue escuro.

Uma série de exclamações foram ouvidas, e algumas pessoas tentaram afastarem-se. Percy tentou não pensar muito em como a mera visão de sangue havia se tornado algo tão temido por eles.

— Acalmem-se — Ares ordenou. — Esta tarde, alguns de nossos sobreviventes mais jovens parecem ter encontrado... uma cura. Eu vou deixar que eles próprios expliquem.

— Nós achamos que é possível interromper a infecção usando células imunes. Ainda é cedo para adivinharmos a dosagem certa, mas, usando as informações que nós já temos, eu diria que nossa chance de sucesso é bem alta.

— Nós retiramos meio litro de sangue de Grover Underwood, e comparamos uma amostra do sangue dele com o de outra amiga nossa — Nico explicou. — O microscópio mostrou claramente a diferença no estado dos glóbulos vermelhos. Como Annabeth já disse, é muito cedo para falarmos em exatidão, mas os resultados até agora foram... animadores.

— Após a transfusão de sangue, nossa amiga entrou em coma poucas horas depois. Está nesse mesmo momento senda assistida pela equipe médica na sala de cirurgia, para o caso de algum... imprevisto. Mas o simples fato de que a substâncias no novo sangue de Grover foram capazes de imediatamente encerrar o ciclo lítico e coloca-la em um ciclo lisogênico como o dele, por si só... — Annabeth continuou — é incrível.

— De qualquer forma — Grover pronunciou-se — nós precisaremos esperar que ela acorde para termos uma reposta. Mas achamos que compartilhar a informação era essencial.

— Isso! — Ares informou, abrindo um sorriso — Compartilhar a informação é essencial. Ainda mais se estamos tão perto de encontrarmos uma cura. E é por isso mesmo que eu vim oficialmente prestar a minha confiança à essa jovem equipe que está fazendo tanto pela nossa sobrevivência.

Percy encontrou o rosto de Annabeth, e, a julgar pela expressão dela, aquilo não estava no roteiro. O corpo dele começou a ficar tenso, mas Ares já havia recomeçado a falar:

— Mais do que isso... eu quero mostrar que todos nós confiamos. Inclusive... Frank, filho, por que não vem aqui por um segundo?

O corpo de Frank enrijeceu, e Percy notou-o engolindo em seco, pomo de adão subindo e despencando dolorosamente. Ele foi lembrado do que Sally havia dito sobre Emily e Ares, e seu primeiro instinto foi agarrar a mão do garoto, dizendo:

— Frank, você não precisa... —

Mas as mãos ensopadas de suor frio do garoto escaparam das suas. O olhar de Frank parecia trêmulo, perdido, e Percy perguntou-se o quão completamente aterrorizado pelo próprio pai aquele garoto era.

— Vai ficar tudo bem — ele tentou garantir, mas nem ele parecia acreditar. — Meu pai não vai me machucar, Percy.

Ele andou até onde Ares estava, cabeça abaixada sob os olhares de todos. O coronel o recepcionou com um meio abraço. Percy notou o olhar alarmado de Clarisse.

— E para provar ainda mais nossa confiança, meu garoto vai se oferecer como voluntário também — ele apertou o ombro de Frank com tanta força que o garoto vacilou — como ele deveria ter feito logo no começo — grunhiu.

Ares esticou um braço e tirou da maleta uma seringa ainda selada. Percy ficou de pé imediatamente, mas todos os olhares estavam presos no coronel. Grover tentou avançar, mas foi impedido pelo mesmo soldado que carregava as ampolas.

— Obrigado, Bryce — Ares comentou, tomando uma das amostras na mão.

— Senhor Coronel, isso não é necessário — Annabeth disse, rodeando o soldado corpulento — nós agradecemos pela confiança, mas, honestamente, Frank não precisa—

Ares já estava abrindo uma das ampolas, mas pausou para olhar para a garota, erguendo uma sobrancelha.

— Não, não, eu insisto... — disse, em uma voz aveludada, enquanto os olhos de Annabeth ficavam cada vez mais assustados. — Exceto pelo fato de que eu não acredito em uma palavra da merda que você falou, sua garota estúpida.

O som de vidro quebrando cortou os tímpanos de Percy quando Ares apertou a ampola entre os dedos enluvados e fez com que o sangue de Grover espirrasse sobre ele, Annabeth e Lawrence. Clarisse exclamou:

— Frank!

E o garoto tentou desvencilhar-se.

Mas a mão de Ares deslizou do seu ombro para o seu braço, e ele o puxou com mais força. A outra — ainda coberta de sangue — cravou a seringa no próprio pescoço e puxou.

— Vocês dizem que o sangue “imune” acelera a cura... — ele rosnou, dobrando o braço de Frank para trás e empurrando-o até que o garoto batesse a cabeça na mesa, derrubando a maleta e as outras coisas no chão — então eu me pergunto o que o “infectado” faz.

Os olhos de Percy encontraram os de Frank como o de um motorista, vendo um cachorro de rua nas luzes dos próprios faróis, segundos antes da colisão.

— Não!

E a agulha afundou na nuca de Frank.


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Notas finais do capítulo

Não galera, eu não shippo Annabeth e Drew, mas eu achei que seria legal fazer com que os dois já houvessem tido relacionamentos antes (conheço muitas poucas pessoas que com 18 anos nunca tivera, embora, claro, NÃO SEJA IMPOSSÍVEL) e além do Luke ser muito mais velho, ele já estava com a Thalia.
Obrigada por lerem, comentários são sempre apreciados, e eu espero que gostem!

P:S: à moça com os comentários mais extensos do mundo que eu adoro responder (MissValdez) eu espero que a morte do Leo não tenha feito você odiar a autora aqui, hehe.