Um Caminho Para O Coração escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 44
Capítulo 43 — Fragmentos do Passado




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Após o café da manhã, Olívia se despediu da avó ainda na cozinha de Norman, pronta para ir à escola. Emmett acompanhou Rosalie e Olívia até a varanda. Olívia ao seu lado disposta ajudar no que precisasse. Rosalie um passo atrás, atenta aos dois. Já na varanda, Olívia abraçou a perna boa do pai, ele se curvou beijando no alto de sua cabeça ruiva.

Rosalie parou ao lado deles, afagando as costas de Emmett, enquanto esperava se despedir.

— Tchau, papai.

— Tchau, amorzinho. Tenha um bom dia na escola. — Olhou Rosalie no instante que se colocou em sua frente. Ela aguardou Olívia descer os degraus na varanda para falar com ele.

— Tenha cuidado — avisou, se referindo à conversa que teria com a mãe de Sarah. — Lembre-se, ninguém irá roubar o amor e carinho que Ollie tem por você. — Segurou a mochila e lancheira da menina em uma só mão e usou a outra para fazer carinho no rosto dele.

Emmett meneou a cabeça, embora não se sentisse seguro.

— Não seja muito ríspido com as palavras. Dê a chance de ela falar também.

Ele tornou balançar a cabeça.

— Vamos, mamãe — Olívia chamou do jardim.

Rosalie virou o rosto na direção da menina um segundo.

— Estou indo, meu amor. — E para Emmett, disse. — Por ela. Fique tranquilo por ela. Amo, você. — Trocaram um beijo breve. Virou as costas para se encontrar com a menina.

Parado ali na varanda, Emmett viu a filha falando com Rosalie enquanto aguardava abrir a porta do carro. Olívia ocupou o assento de elevação e pôs o cinto de segurança. Elas conversavam quando o carro se afastou da casa de Norman. Emmett virou as costas para a rua e voltou para o interior da casa. Parou para retirar o agasalho e pendurar no gancho ao lado da porta. Deu dois passos, apoiado as muletas, viu as pernas de Esme, antes de levantar a cabeça e enxergar seu rosto.

Norman ainda estava na cozinha, podia ouvir a louça do café da manhã sendo recolhida.

— Antes de eu sair — começou Esme —, gostaria de trocar algumas palavras com você.

— Estava pensando a mesma coisa— admitiu. Indicou o sofá de Norman com um pequeno gesto com a muleta. Aguardou Esme sentar para então ocupar a poltrona.

— É uma história longa e triste — ressaltou.

— Tenho todo tempo do mundo — afirmou Esme. — Antes, precisa saber que me divorciei a pouco mais de um ano. É possível que duvide do que vou dizer. Fora muitas às vezes que quis vir conhecer minha neta. Por conta dos anos de distanciamento, tive medo. Não sabia como iriam reagir...  Se me permitira uma aproximação. A cartinha que Olívia me escreveu, deu coragem, por confirmar o que eu também sentia. O desejo de minha neta era o meu desejo, entende? Queríamos nos conhecer. E sentíamos falta desse contato.

Emmett reparou nos olhos de Esme marejando à medida que falava da vontade de conhecer Olívia e do medo de ser impedida. Ele jamais impediria que conhecesse a neta. Ficou confuso. E a pergunta que pedia para ser feita desde que ela chegou, foi finalmente lançada.

— Por que não veio nos ver quando tudo aconteceu? Seu marido…

Esme ergueu a mão fazendo um lembrete:

— Ex-marido.

Emmett balançou a cabeça como não importasse.

— Sei que ele não se interessava em nada relacionado a mim. Ouvi dele certa vez por telefone, simples e de forma direta. Isso incluía Olívia. Carlisle fez questão de dizer que fui culpado por destruir a vida de Sarah. Pelo que eu sei, no começo, você também esteve contra nosso relacionamento.

Esme moveu a mão com um gesto delicado.

— Está certo quanto ao que diz respeito o começo. Não é pelo motivo que acredita. Nada mudaria se Sarah não tivesse desistido da música. Ela gostava… Tocava por amor. Eu me sentia orgulhosa. Você sabe que ela havia sido admitida em duas grandes escolas de música e recusou o convite para…

— Ficar comigo — completou a fala por Esme. — Um homem sem grandes ambições e pouco dinheiro no bolso. Preferiu renunciar a uma vida de princesa, abrir mão de algo que gostava para viver um amor. Enfrentou os pais e com isso foi relegada até mesmo em seu leito de morte.

— Nunca releguei minha filha. — Pegou um lenço de papel na bolsa usando para secar os olhos. Repousou a mão com o papel nos joelhos. — Não sabe o quanto me doeu saber da morte de minha única filha e não poder vê-la. Dizer uma última vez o quanto a amava. Não imagina quanto foi difícil não estar no funeral de minha filha. Não segurar minha neta nos braços uma só vez durante esses anos. Não conhecer seu rostinho.

As palavras ditas por Emmett soaram frias e afiadas.

— Não estou convencido. O que te impediu de estar aqui? Porque eu não fui.

— Meu marido me impediu — sentenciou. Os ombros tremeram com um soluço que não pode segurar.

O olhar duvidoso de Emmett era quase agressivo.

— E por que agora permitiu estar aqui? — desafiou.

Esme levou as mãos à altura do rosto e secou o nariz encostando apenas o lenço de papel. Levantou o rosto encarando o olhar acusador.

— Me divorciei — lembrou. — Ele nem mesmo sabe que estou aqui. Foi um processo longo e doloroso, porque se recusava me deixar livre. Recuperei não só meu nome de solteira ao me separar dele, como recuperei também minha liberdade. O direito de ir e vir. Tomar minhas próprias decisões. Pode me culpar de muitas coisas, menos de não ter amado minha filha. — Pegou mais lenços na bolsa e os mantiveram entre ambas as mãos. — Minha Sarah foi muito amada por mim. Espero do fundo do coração que não me impeça de ver minha neta. Não quero atrapalhar a vida de vocês, quero apenas estar com ela por algumas horas durante a semana.

— Como pretende fazer isso?

— Aluguei uma casa na cidade. E também o carro que estou usando, até eu poder me organizar.

— Está dizendo que pretende viver aqui, na cidade?

A porta da frente abriu e fechou. Emmett interrompeu o que dizia para olhar sobre o encosto da poltrona a chegada de Rosalie.

Esme a olhou, envergonhada. Enxugou as lágrimas em um lenço novo. O olhar de Rosalie cruzou com de Emmett e ambos olharam a mulher que chorava, implorando que não a impedissem de estar perto da neta.

— Se me permitir vê-la… Quero comprar uma casa na cidade.

Rosalie chegou ao lado da poltrona onde Emmett estava e sentou no encosto de braço. Passou o braço em volta dos ombros dele. Ele olhou em seu rosto um instante. Pôs a mão na dele, apertando sutilmente. Emmett voltou olhar para Esme.

— Não irei impedir que tenha contado com Olívia — disse por fim. — A verdade é que desejei muitas vezes que a conhecesse. Porém, um sentimento me incomoda. — Voltou olhar no rosto de Rosalie. Ela moveu a cabeça quase de forma imperceptível, apoiando que dissesse o que sentia. — Me sinto ameaçado — desabafou.

Esme o olhou como não entendesse.

— Olívia é minha filha — esclareceu. — Não vou permitir que ninguém afaste ela de mim. Ela tem tudo o que precisa aqui. — Olhou Rosalie outra vez, incluindo sua presença ao que dizia. Rosalie afagou seu braço.

Esme pegou mais lenços de papel na bolsa para limpar o rosto. Angustiada, ficou apertando o lenço manchado de maquiagem entre os dedos.

— Meu Deus — murmurou. — Em momento algum pensei fazer isso. Jamais afastaria minha neta do pai. — O olhar foi direcionado a Rosalie. — Não afastaria minha neta de vocês. Pelo que Olívia me contou e pelo que tenho visto aqui, é a mãe que minha neta conhece e ama. Tem sido para ela o que Sarah exatamente teria sido.

— Obrigada — agradeceu Rosalie, comovida.

— Olívia é um pedacinho de minha filha. Eu quero e preciso ter contato com ela. Já era difícil antes, agora que a conheci é praticamente impossível estar longe.

— Será muito bom para Ollie ter a avó materna por perto — concordou Rosalie.

Esme aguardou com ansiedade a resposta de Emmett.

— Antes… — ponderou ele — Deve conhecer um pouco de tudo que enfrentamos desde que perdemos Sarah. Somente depois de ter ouvido tudo, e do que me disser, terei segurança em permitir que conviva com minha filha.

— Entendo... E quero muito que me conte tudo.

Rosalie se ajeitou no braço da poltrona. Esme pegou lenços limpos na bolsa. Emmett fechou os olhos, se preparando para reviver momentos dolorosos. Inicialmente, as palavras tiveram dificuldade em deixar seus lábios.

— Não precisa fazer isso se for muito doloroso para você — assegurou Esme.

— Eu preciso fazer — concluiu Emmett. — É importante que tenha conhecimento de tudo. — Fez-se um minuto de silêncio antes de ele voltar a falar. — Você e seu marido sofreram. Eu também sofri, mas ninguém sofreu tanto quanto Olívia nessa história. Ela é quem mais merece a felicidade que tem vivido não faz tanto tempo assim. — Outra pausa, antes de ele iniciar os fatos a partir do início da gravidez de Sarah. O quanto estavam felizes e cheios de planos. Sobre quanto Olívia foi amada e desejada por ambos. O parto. O quão mágico foi assistir ao nascimento da filha e ouvir o primeiro chorinho. E, de repente, tudo foi encoberto por uma grande nuvem de tristeza com a notícia da morte de Sarah. Contou em detalhes como foi voltar do hospital para casa sem Sarah e viver com a dor de perdê-la tão inesperadamente. Chegou à parte que Rosalie entrou na vida deles e como lutou para ele e Olívia não serem afastados um do outro. E como, aos poucos, se tornaram a família que é hoje.

Sofrimento estava no rosto de Emmett a cada situação relatada a Esme. Na voz cansada. Rosalie se emocionou mais de uma vez. Norman se juntou a eles no decorrer da conversa e, vez por outra, esfregava o rosto espantando a expressão de tristeza.

Esme chorou muito em algumas passagens, mas também sorriu com eles em outras.

Emmett estava esgotado emocionalmente quando terminou. Foram horas ininterruptas falando de um tempo difícil. Revivendo coisas que gostaria de esquecer e que o envergonhavam.

Após um longo silêncio, falou:

— Ainda posso confiar que não vai tentar tirar minha filha de mim?

— Agora menos ainda pensaria em tirar Olívia de vocês — Esme respondeu com a voz anasalada. — Eu tenho um pedido a fazer. Não será fácil, mas no lugar de mãe, preciso pedir…

Emmett aguardou.

— Quero que venha comigo. Preciso que me mostre onde está enterrada minha filha.

Emmett anuiu.

— Já esperava que fosse me pedir isso.

Esme recolheu todo o lenço de papel usado por ela para descartar na lata de lixo do banheiro social, onde entrou para se recompor. Quando saiu, Emmett entrou e fechou a porta.

Ela encontrou Rosalie ao lado do avô no sofá ao qual esteve durante toda a conversa.

— Obrigada aos dois por amarem tanto minha neta — disse.

Avô e neta viraram para olhar seu rosto. Rosalie levantou. Esme aproveitou para lhe dar um abraço.

— Obrigada — voltou dizer.

Rosalie sorriu de leve.

Emmett retornou à sala. Aproximou-se da porta da frente e pegou o agasalho do gancho.

Esme fez o mesmo e saiu para a varanda.

Rosalie se colocou ao lado de Emmett, ajudando vestir o agasalho.

— Amo você, hoje mais que ontem — sussurrou.

— Venha também.

Ela ergueu a mão até estar no rosto dele, fazendo um afago em cima da barba.

— É um momento delicado. — Olhou pela porta, Esme na varanda esperando por ele. — Ela deve estar sozinha com você. Tenho certeza que irá preferir assim.

— Está quase na hora de pegar Olívia na escola — comentou.

— Vou pegar nossa menina. Ela vai estar aqui quando voltar.

Emmett se inclinou para beijar seus lábios.

— Eu volto — disse.

— É claro que sim.

Chegou para trás dando espaço para ele se mover, com ajuda das muletas, até a varanda. Esme esperou descer os poucos degraus e se aproximou do carro para abrir a porta. Ajudou guardar as muletas para somente então se sentar atrás do volante.

Rosalie se virou para o avô na sala.

— Vem buscar a Ollie comigo?

[…]

No caminho para o cemitério, Esme fez uma parada para comprar flores.

Emmett notou suas mãos trêmulas ao volante enquanto dirigia. Estacionou e ficou olhando a entrada do cemitério, focada, e, ao mesmo tempo, distante.  Os olhos marejaram. Ele aguardou em silêncio o tempo dela.

— Me desculpe — ela pediu. Um instante depois virou o rosto para olhá-lo. — É difícil para mim… Vêm-me muitas coisas a mente.

— Eu entendo — afirmou Emmett. E começou sair do carro quando ela fez o mesmo.

Esme segurou as flores que ele também havia comprado para poder se apoiar as muletas com segurança.

O outono ficou para trás e o inverno avançava. O vento gelado castigava o rosto de ambos.

Mais um pouco, poderiam começar escolher as flores que plantariam no jardim, na chegada da primavera.

— Você está bem? — Esme perguntou chegando ao seu lado.

— Estou sim. — Indicou que fosse adiante. Cruzaram os portões. A grama estava em sua maior parte queimada pelo frio. Não falaram muito pela maior parte do trajeto. Emmett conhecia bem cada lugar por onde passaram.

Esme olhava os nomes, datas de nascimento e morte, nas lápides, angustiada, antevendo o momento que encontraria o nome da filha.

— Por aqui — Emmett indicou o caminho à esquerda. Mais adiante, ouviram um corvo crocitar. Parou a poucos metros da lápide de Sarah. Havia um pouco de neblina no local.

Esme parou, aguardando que dissesse alguma coisa. 

— É logo ali — disse, gesticulando com a muleta brevemente.

Esme voltou olhar para frente, o local onde ele indicou. Foi com sofrimento que seus olhos alcançaram na lápide branca os dizeres. Chegou mais perto, sem conseguir enxergar direito com as lágrimas e neblina. Ficou de joelhos no gramado marrom e gelado. O vento frio soprou seu rosto e a ponta do cachecol. Retirou uma folha seca de cima da lápide. Pôs as mãos ao lado do corpo, um segundo depois, voltou erguê-las tocando com a mão enluvada o nome da filha.

Emmett ficou dois passos atrás dando o tempo que precisava para se despedir da filha. Não se abaixou a perna machucada não permitia fazer isso com facilidade. Estava bem consigo mesmo, estar ali já não causava a mesma dor de antes. Hoje, recuperado do luto, conseguia visitar o túmulo de Sarah e falar sobre ela sem pensar em desistir da vida ou mesmo querer encontrar um culpado.

Notou que Esme soluçava. Ela colocou as flores na frente da lápide, seus gestos eram cuidados e delicados. Percebeu o pedido de perdão sendo sussurrado. Ouviu dizer que as rosas-brancas eram da parte dele e os lírios de sua parte. Levou a mão à altura do coração como a tristeza machucasse causando dor física. Falou sobre coisas do tempo que estiveram juntas, assim como Emmett fez tantas vezes. Relembrou momentos. Falou de Olívia, de como era uma menininha doce. O quanto se parecia com ela, Sarah. Jurou nunca mais ficar tanto tempo longe da neta. Então, mencionou Rosalie. Disse saber por que chegou até Olívia, dando entender que Sarah as uniu e esteve ao lado da filha cuidando e protegendo pelo tempo que precisou. Quando mencionou Carlisle, Emmett recuou se negando ouvir o que quer que tenha a dizer sobre ele. Carlisle até poderia ter amado a filha e querer o melhor para ela. Hoje entendia, queria o melhor para Olívia também. Ainda assim, não estava preparado para aceitar como estava aceitando a presença de Esme.

A neblina estava aumentando. Suas mãos congelando no frio. Lamentou não ter pegado as luvas e uma touca, como Esme havia feito. Começou se sentir cansado de estar tanto tempo de pé apoiando-se as muletas. As costas começavam incomodar assim como a perna. Ainda assim, deixou que Esme tivesse o tempo que precisava. Era importante desabafar ainda que a pessoa com quem fizesse isso não ouvisse de fato. Trazia conforto ao coração pensar que sim. Tornava a dor suportável. Dava forças para continuar vivendo.

Quando levantou, Esme parecia fraca, chegando a desequilibrar.

— Você está bem?— pediu, mas foi como não tivesse ouvido. Ela conseguiu se equilibrar e veio andando em sua direção.

— Obrigada por me trazer até aqui — agradeceu, com uma nota de melancolia na voz. — Foi muito importante. Sinto meu coração menos angustiado.

— Entendo — murmurou Emmett.

— Desculpe fazer você ficar tanto tempo de pé, quando ainda está se recuperando.

— Não se preocupe, estou bem.

Começaram fazer o caminho de volta num ritmo cadenciado.

Emmett viu quando enfiou as mãos nos bolsos do agasalho.

— Tenho mais um pedido a fazer — falou. — Olívia me disse que o cofre onde estavam os vídeos caseiros e outras coisas importantes que pertenceram a Sarah, resistiu ao incêndio.

Emmett anuiu. Esme continuou atenta ao caminho por onde seguiam. Retirou um lenço do bolso e limpou as lágrimas no rosto.

— Prometo devolver tudo. — Olhou no rosto dele, mas havia muita neblina. Não soube dizer se estava bem com o pedido.

— Não vejo problema desde que traga de volta quando acabar. Você sabe… são de Olívia agora.

— Sim. Não se preocupe, devolverei assim que terminar de ver.

Continuaram andando sem nada ser dito. Do lado de fora, alcançaram o carro estacionado. Foi bom sair do frio. Emmett esfregou as mãos uma na outra. Viu que Esme voltou retirar as luvas, depois ligou o carro.

[…]

O carro de Rosalie estava de volta na entrada de veículos, na casa de Norman. Emmett entendeu que Olívia estava em casa.

— Olívia chegou? — ouviu Esme falando atrás de suas costas.

— Rose nunca atrasa quando se trata de Olívia. Conhecendo bem minha garotinha, sei que deve está tentando descobrir onde estou agora.

Esme alcançou a varanda antes dele. E aguardou até estar ao seu lado.

— Não vou demorar — se explicou. — Não quero atrapalhar. Vou entrar apenas para me despedir dela, por hoje.

Emmett, junto à porta, apoiou a muleta embaixo do braço para tocar a campainha.

A porta abriu. Seu olhar encontrou o de Rosalie e foi como conversassem sem a necessidade de palavras. Ela entendeu que estava tudo bem. Emmett passou para o lado de dentro, ela chegou ao seu lado e o ajudou retirar o agasalho.

Esme retirou o agasalho e cachecol deixando, também, no gancho.

— Papai — ouviu Olívia falar em voz alta, logo depois viram sair de debaixo da manta quentinha no tapete em frente à lareira. Parou ao lado do pai envolvendo sua cintura com um abraço.

— Não parava de perguntar onde o papai estava — Rosalie entregou.

Emmett abriu um sorrio para ambas.

Olívia se afastou para ir falar com Esme.

— Vovó, você estava com o papai? Onde estavam?

Esme afagou os cabelos ruivos que Rosalie penteou minutos atrás, quando Olívia saiu do banho e vestiu o pijama.

— Seu pai e eu fomos visitar alguém que amamos muito.

Iria perguntar quem era, quando Norman chamou:

— Abobrinha, seu chocolate quente ficou pronto.

Olívia esqueceu a pergunta e saiu para encontrar-se com ele na entrada da cozinha. Norman segurou sua mão e a conduziu até a mesa.

Emmett se acomodou na poltrona.

— Rose — pediu ele —, você poderia pegar lá em cima, onde estão as nossas coisas, o pendrive e os álbuns de fotografias? Esme gostaria de ficar com eles por essa noite.

Rosalie olhou dele para Esme tentando entender o que significava.

— Vou passar essa noite na casa que aluguei. Vim para me despedir de Olívia e… Gostaria muito de ver as últimas lembranças de minha filha.

— Ollie iria adorar que ficasse conosco mais essa noite.

— Não quero atrapalhar.

— Você não atrapalha. Mas, tudo bem se prefere assim… — concordou ao reconhecer que não queria tirar o espaço deles. E o pouco de intimidade que ainda tinham, até mesmo por estarem na casa de Norman.

Depois de algum tempo, Rosalie desceu a escada com a caixa de estampa floral onde estavam os pendrives e os álbuns de fotografias. Olharam-se durante a troca da caixa das mãos de uma para a outra.

Esme sentia-se ansiosa por rever a filha, mesmo nas lembranças que eles guardavam. Rosalie imaginou como seria para ela assistir a tudo sozinha.

— Obrigada — murmurou, olhando a caixa que tinha em mãos.

Olívia chegou à sala com um bigode de chocolate. Colocou-se ao lado de Rosalie, que pôs as mãos em seus ombros. Olívia levantou o rosto para olhar para ela, tentando entender porque a avó estava segurando a caixa.

— Mamãe.

— A vovó está indo embora — disse para a menina.

Olívia olhou para Esme.

— Você vai embora, vovó? — a expressão preocupada.

Esme se abaixou para ficar na mesma altura que ela. Inevitavelmente, Rosalie se lembrou de nunca ter visto Cheryl fazendo o mesmo.

— Vou, mas eu volto.

— Vai para sua casa? A que fica muito longe daqui?

Esme ergueu a mão acariciando o rosto da neta.

— É aqui mesmo na cidade. Amanhã, eu estarei de volta.

Olívia a abraçou.

— Eu te amo, queria — falou perto do ouvido da menina. Olívia levou a mão ao seu rosto e voltou abraçá-la.

Emmett prestou atenção a tudo da poltrona onde estava.

Olívia foi de mãos dadas com a avó até a porta. Esme beijou sua testa, em seguida, pôs o agasalho, mudando a caixa de mão para passar o braço, e saiu para a varanda.

Olívia moveu a mão sinalizando um até logo. Esme se afastou até estar no carro alugado. A menina saiu na varanda vendo-a partir.

Rosalie foi buscá-la.

— Vem, meu amor. — Pegou sua mão pequena. — Não pode ficar aqui. Está muito frio.

— Queria que a vovó não tivesse de ir.

— Ei — Rosalie afagou sua mão gelada. — Já contou ao papai a novidade? — lembrou.

A pergunta fez os olhinhos se iluminarem, por lembrar o que tinha para contar.

— É mesmo.

— Conte para o papai agora.

Olívia entrou correndo em casa. Rosalie ficou para trás fechando a porta.

— Papai, papai, papai.

Emmett abriu os braços a sua espera. A segurou pela cintura, colocando sentada na perna boa.

Norman chegou à sala e, assim como Rosalie, esperou que Olívia falasse.

— Vai ter uma peça de teatro, na primavera. — Olhou com atenção o rosto do pai ao falar. — E advinha, papai? É “O mágico de Oz” — respondeu ela mesma, entusiasmada.

Foi fácil se sentir feliz junto à filha.

A menina virou para olhar Rosalie.

— Mamãe, você quer contar?

— Conte você, amor.

Emmett achou graça de como Olívia olhou em seu rosto em seguida. Os olhos brilhando de pura satisfação.

— Eu vou participar — cantarolou. — A senhorita Hannah me escolheu.

— É mesmo? — Suas testas se tocaram e eles riram um para o outro. — É uma grande notícia. Quem minha menininha vai interpretar na peça?

— Advinha, papai? Advinha?

Ela olhou para o lado quando Rosalie e Norman riram.

— O Homem-de-Lata?

— Não, papai.

— Totó?

Olívia pôs a mão na testa.

— Agora eu vou acertar. — Coçou a barba fingindo pensar. — A tia Emma?

— Não, papai.

— Dorothy Gale?

— Sim, papai. Sim.

Emmett olhou na direção de Rosalie e novamente a filha sentada em sua perna boa. Orgulho estampado no rosto.

— Igualzinha à mamãe Sarah. Porque ela também interpretou a Dorothy Gale quando era criança. E o vovô deu o DVD do filme para ela. Aquele que a gente assistia na nossa casa antes de pegar fogo. Também o livro que o vovô Norman me deu. E o celo… — ficou com a expressão triste no rosto ao se lembrar das coisas que perderam no incêndio.

Emmett segurou seu queixo para que olhasse em seu rosto.

— Papai vai procurar um DVD para você.

— Mas esse que você encontrar, não terá a dedicatória do vovô para mamãe Sarah. Não será a mesma coisa.

— Não, mas vai ter a dedicatória do papai para Olívia.

Conseguiu colocar o sorriso de volta no rosto dela.

— Você vai gostar?

— Sim, papai. Eu vou gostar muito.

Emmett a abraçou e beijou no alto de sua cabeça ruiva.

— Vai ser tão especial quanto o da mamãe foi para ela. Eu me esqueci de contar para vovó Esme. Ela iria gostar de saber.

— Não tem problema, amanhã ela vai estar aqui. Pode contar depois da escola.

— Ela vem mesmo, não é?

— Sim, com certeza virá.

[…]

Norman se preparava para fazer um chá, quando a campainha tocou avisando da chegada de alguém na porta da frente. Deixou as coisas em cima da ilha para ver quem era.

Encontrou Esme na varanda, segurando a caixa que levou no dia anterior junto ao peito. Embaixo do braço, um unicórnio de pelúcia lilás com a crina nas cores do arco-íris.

Mesmo usando maquiagem, Norman a achou abatida.  Olhos inchados. Claramente havia chorado bastante desde que chegou a cidade para conhecer a neta.

— Olá — a voz serena o cumprimentou.

— Abobrinha ainda não chegou.

Esme abaixou os olhos para a caixa e a pelúcia que carregava.

— Minha neta e Emmett devem estar com ela agora. Rose foi com ele ao médico, de lá pegariam a menina na escola.

Esme voltou olhar em seu rosto.

— Aconteceu mais alguma coisa?

— Não, não, está tudo bem. Foi só para ver como está se recuperando a perna de Emmett.

— Que bom! Eu volto outra hora então…

— Ia começar preparar um chá… Você gostaria de entrar e me fazer companhia? Não demoram estão de volta.

— Obrigada. Eu vou aceitar, sim.

Norman saiu do caminho permitindo-lhe passagem pela porta da frente.

Esme retirou o agasalho e o acompanhou até a cozinha. A caixa ficou em cima da mesa junto à pelúcia. Acomodou-se em uma das banquetas atrás da ilha enquanto Norman levava o bule com água para o fogão.

[…]

— É o carro da vovó Esme — comentou Olívia sobre o carro na frente da casa.

— Com certeza é o carro da vovó Esme — Emmett concordou.

Olívia correu para perto do carro carregando a lancheira. Rosalie ficou para trás com a mochila.

— Ollie, vem amor. A vovó já deve estar em casa.

A menina voltou para junto deles correndo.

— Esqueci que vovô Norman pode abrir a porta para ela.

Rosalie lhe ofereceu a mão, Olívia aceitou pondo a mão livre na dela.

— Cuidado, papai — disse para Emmett vendo se movimentar com auxílio das muletas.

Rosalie abriu a porta. Olívia saiu pela casa à procura de Esme. Os encontrou na cozinha, terminando o chá. Abraçou a cintura de Norman e ele beijou no alto de sua cabeça. Ao abraçar a avó, ela a colocou no colo e beijou seu rosto.

— Você se divertiu hoje?

— Sim, foi muito legal. Vovó, eu não te contei ontem porque esqueci. Eu vou interpretar, na peça de teatro da escola, a Dorothy Gale.

— Que maravilha, Olívia.

— Hoje teve o primeiro ensaio.

— Quando vai ser a apresentação?

— Na primavera.

Rosalie chegou à cozinha acompanhada por Emmett.

— Eu fiquei tímida…

— Foi o primeiro ensaio — lembrou Rosalie. — No próximo, vai se sair melhor.

Emmett puxou uma cadeira e sentou junto à mesa.

Olívia avistou, em cima da mesa, a caixa que a avó levou no dia anterior, e sobre ela o unicórnio de pelúcia.

— Que lindo! — Saiu do colo de Esme. — Eu posso pegar ele, mamãe?

— Eu não sei. — Rosalie olhou da menina, que admirava a pelúcia de unicórnio, para Esme.

— Eu trouxe para Olívia, espero que não se incomodem.

— Pode pegar Ollie, a vovó trouxe para você — Rosalie falou.

Olívia agarrou a pelúcia. Olhou toda ela, por fim, abraçou.

— É tão bonito. É tão fofo. Obrigada, vovó.

— Que bom que você gostou, querida.

Olívia foi mostrar a pelúcia de perto ao pai.

— É a sua cara — ele brincou. Abraçou e beijou seu rostinho.

— Ollie, vem lavar as mãos para comer seu lanche.

— Tá bom, mamãe. Segure meu unicórnio fofinho, papai.

Esme esperou Olívia estar com Rosalie diante a pia da cozinha, para se aproximar de Emmett. Ela pôs a mão sobre a caixa em cima da mesa.

— Obrigada.

Olhando ela de perto, Emmett notou, assim como Norman, que havia chorado bastante.

— Fiz uma cópia dos vídeos. Espero que não se importe.

Emmett fez sinal com a mão para ela sentar na cadeira mais adiante.

— Sarah foi muito feliz ao seu lado… — seu tom de voz era baixo. — Obrigada. Muito obrigada por tê-la feito tão feliz. Foi muito bom assistir aos vídeos caseiros e ver as fotografias. — Olhou no outro lado da cozinha, ocupando uma banqueta, Olívia comendo frutas picadas na tigela com iogurte. Norman falando sobre plantas e Rosalie alguma coisa sobre fadas. — Minha filha amou muito você e Olívia. — Olhando nos olhos dele, pediu. — Me desculpe se alguma vez fiz ou disse algo que o feriu.

Emmett pôs a mão sobre a dela.

— Você não foi o problema.

Esme anuiu. Apôs um instante em silêncio, fez um pedido:

— Posso ajudar Olívia com a lição de casa hoje?

Emmett virou o rosto na direção de onde estava a filha.

— Olívia.

— Sim, papai?

— A vovó vai te ajudar com a lição de casa hoje, tudo bem?

— Sim.

Do outro lado da ilha, Rosalie sorriu para ele.

— Você contou para vovó o que vai ser quando crescer? — pediu Rosalie.

— Eu vou ser uma fada. E também vou ter um violoncelo.

— Que coisa linda. Mas tem que estudar bastante para ser uma fada que toca violoncelo — brincou Esme.

— Isso é um pouco chato, estudar. Mas eu vou me esforçar muito.

— Vai, sim — Emmett apoiou. O rostinho de Olívia ficou radiante, com um sorriso que alcançou os olhos.

 


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