Um Caminho Para O Coração escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 42
Capítulo 41 — Reencontro




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Rosalie levava Emmett no banco do carona, dias depois, do hospital para casa de Norman. A perna que machucou enquanto tentava salvar a filha e a si mesmo do incêndio, permanecia imobilizada na bota ortopédica. As muletas, no banco de trás aguardando o momento que as usariam.

Durante o tempo hospitalizado, Olívia foi vê-lo algumas vezes. O que não mudava o fato de estar ansioso para reencontrar a filha do lado de fora.

Cheryl ajudou Rosalie nos cuidados com a neta e também revezando as idas ao hospital. A última noite, Rosalie foi quem esteve ao lado dele. Foi também quem assinou os documentos e pagou as despesas. Emmett ficou incomodado que estivesse gastando tanto do dinheiro dela com coisas que deveriam ser ele cobrir os gastos.

— Me leva até minha casa?

Rosalie ouviu seu pedido, pensando não ser uma boa ideia a visita ao local do incêndio nesse momento.

— Preciso ver como ficou... Depois de tudo.

Rosalie anuiu concentrada na direção.

— Estou feliz e grato por ter você aqui comigo — disse. — Me desculpe se te chateei ao tentar impedir que pagasse as despesas do hospital. Não quero que pensem que estou te explorando financeiramente.

Rosalie afastou a mão do volante para segurar sua por alguns segundos. Os dedos de suas mãos se encaixaram aos dela.

— Eu te amo — murmurou. — Senti muito medo de te perder. Muitas vezes estive perto de acreditar que não voltaria.

— Não posso viver longe de você e da Ollie — Rosalie confessou. — Minha vida não faz sentido sem vocês ao meu lado.

— Te amo — ele voltou a dizer.

A poucos metros da casa dele, do que restou dela, Rosalie questionou:

— Quer mesmo fazer isso agora?

— Sim, eu quero. Preciso fazer isso.

O veículo entrou na rua onde ficava a casa, com a velocidade reduzida. Emmett ficou ansioso, angustiado, aos primeiros sinais da destruição que causou o incêndio.

O carro parou. Ele olhou para o lado, nas ruínas enegrecidas no lugar onde antes ficava sua casa. Ficou surpreso que a garagem foi à única parte que o fogo não comeu por inteira. Nenhum dos dois disse nada, assimilando. Relembrou os momentos de terror vividos naquela noite. O medo enorme que sentiu de não conseguir salvar a vida da filha. Os olhos se encheram de lágrimas. Abaixou a cabeça, olhando a bota ortopédica, os curativos no braço esquerdo. Os aranhões no rosto haviam cicatrizado durante o tempo no hospital.

Sentiu a mão de Rosalie afagar a sua.

— Você conseguiu, salvou a Ollie do incêndio. Ela tem consciência do ato heroico, e do imenso amor que sente por ela.

Uma lágrima se perdeu na barba crescida que encobria parte do rosto dele.

Rosalie afagou seu rosto.

Emmett criou coragem e voltou olhar as ruínas enegrecidas do que antes havia sido sua casa.

— Nada disso importa — desabafou. — Consegui tirar minha filha de lá a tempo. Agora é lutar e reconstruir.

Rosalie se inclinou para abraçá-lo.

— Eu te amo — ela lembrou. — E amo muito mais o pai incrível que se tornou.

Emmett levou ambas as mãos ao rosto dela com sutileza.

— Às vezes, penso que não as mereço.

Rosalie o silenciou com um beijo. Ainda enquanto se afastavam, após o beijo, percebeu alguns carros nas proximidades. Olhou em volta, sem entender o que significava.

— O que está acontecendo? — pediu.

Rosalie balançou a cabeça, tão sem entender quanto ele estava.

— Eu não sei — respondeu.

Assim que Emmett fez menção de sair do carro, ela se adiantou e pegou as muletas no banco traseiro.

Pessoas saíram dos carros. Algumas retiraram fermentas de porta-malas e carroceria de caminhonete.

Rosalie ajudou Emmett sair do carro e se apoiar as muletas. Ele moveu-se olhando aquelas pessoas se preparando para o trabalho. Avistou Jacob e Kalel entre elas.

— Como você está? — perguntou Kalel.

— Sem entender o que está acontecendo aqui. — Olhou em volta. — Não sei como…

— Sabemos sobre o seguro…

Emmett abaixou a cabeça, envergonhado, há muito tempo não pagava o seguro. O sentimento de culpa pareceu nunca deixá-lo.

— O pessoal se juntou para ajudar reconstruir sua casa.

Rosalie olhou no rosto de Emmett, aguardando a reação ao esforço daquelas pessoas em ajudar sem querer nada em troca.

Balançou a cabeça, custando acreditar que fariam isso por ele. Verdade seja dita, por muito tempo foi rude com a maioria daquelas pessoas.

— Jacob foi o responsável por tudo.

Emmett voltou balançar a cabeça.

— Se tiver que ficar bravo, que fique bravo com ele.

— Eu não sei como agradecer — declarou Emmett. — Não esperava nada como o que estão fazendo aqui. — Prendeu a muleta junto ao corpo e ofereceu a mão a Jacob e Kalel. — Muito obrigado.

Jacob deu um tapa amigável em seu ombro.

— Você e Olívia merecem. — E, olhando para Rosalie, completou. — Sua família merece.

Kalel se afastou. Eles ainda podiam ouvir sua voz orientando o pessoal para aonde ir.

— Muito em breve sua filha terá o quartinho dela de volta, nas cores que mais gosta. — Deram-se um abraço breve, deixando de lado as cutucas e ofensas.

— Obrigado.

Rosalie afagou as costas de Emmett, gostando que estivessem se entendendo.

— Vá ficar com sua família agora. Cuide de se recuperar totalmente. Por aqui, vamos cuidando de tudo para você. Só não vale reclamar que não fizemos direito, depois.

Emmett ficou sem jeito. Rosalie o ajudou voltar para o carro logo que Jacob se afastou.

— Incrível — admirou-se Emmett. — Incrível.

Rosalie apertou sua mão.

— Estas pessoas estão aqui para ajudar você e Ollie voltarem para casa. Eles se preocupam com vocês.

Um sorriso iluminou o rosto de Emmett.

— Estou ansioso por abraçar minha menininha.

— Então, vamos — estimulou Rosalie. Em seguida, se posicionou atrás do volante. — Aposto que está tão ansiosa quanto você.

[…]

Norman, Cheryl e Joseph ficaram cuidavam de Olívia enquanto Rosalie esteve fora. Desde que telefonou, avisando que estavam a caminho, Olívia ficou em cima da cadeira, espiando pela janela. A boneca resgatada por Rosalie no jardim após o incêndio foi posta no peitoril da janela. Após limpa, ficou como nova.

— Olívia, venha sentar um pouco — Cheryl chamou.

— Venha assistir desenho — Joseph sugeriu. — Vai ajudar passar mais rápido o tempo.

— Não, agora não.

— Abobrinha — tentou Norman —, o que você acha se jogássemos uma partida de damas?

— Não, vovô, obrigada. Estou esperando o papai. A mamãe foi buscar ele, porque já pode voltar para casa.

— Eles podem demorar a chegar.

— É melhor se distrair um pouco — Cheryl voltou a falar.

Norman foi até Olívia, se colocando ao seu lado diante a janela. Olívia passou o braço em volta do seu pescoço.

— Posso esperar aqui com você?

— Pode sim, vovô.

Cheryl levantou e foi se juntar a eles. Olívia afagou os cabelos da avó, que sorriu.

Passaram-se alguns minutos. Olívia encostou a cabeça ao ombro de Norman. 

O carro de Rosalie alcançou a entrada de veículos.

Olívia levantou a cabeça do ombro de Norman.

— Chegaram! — comemorou. Viu quando Rosalie saiu do carro, em seguida, ajudou Emmett fazer o mesmo.

— Papai. — Pulou da cadeira no chão, apressando-se até a porta da frente, puxando a maçaneta com força.

— Cuidado, Abobrinha, assim você pode se machucar.

— Olívia — Cheryl a repreendeu.

A menina não desistiu. Saiu correndo pela porta, desceu os degraus na varanda e então correu pelo jardim.

— Papai, papai.

Emmett olhou na direção do som de sua voz. Um sorriso largo deu leveza ao seu rosto encoberto de barba ao avistar a filha.

Olívia parou em sua frente. Olhou as muletas em que se apoiava. Sem saber o que fazer, abraçou as pernas do pai. Ele se apoio no carro e a pegou no colo. Olívia se agarrou ao seu pescoço, chegando a chorar de alegria por ele estar de volta.

— Papai.

— Minha menininha — murmurou. Sentiu o cheirinho dela. Olívia olhou em seus olhos e voltou abraçá-lo. — Obrigado, Deus — agradeceu olhando no céu. Respirou, tomado pelo alívio de estar de volta. Cobriu o rosto e pescoço de Olívia com beijos. Desequilibrou-se, e Rosalie o ajudou retirando a menina de seu colo.

— Vem cá, meu amor. Vamos deixar o papai um pouco. Ele ainda precisa das muletas para se movimentar.

Olívia aceitou com um sorriso. Beijou o rosto de Rosalie e ficou observando o pai se apoiar as muletas novamente e se movimentar.

Rosalie a pôs de volta no chão, tomando a mão pequena na sua. Com a outra mão, Olívia segurou a camisa do pai. Os três caminharam juntos, sempre respeitando o tanto que Emmett conseguia se mover rumo à varanda.

Cheryl e Joseph esperavam por eles diante a porta aberta. Norman ainda na janela, sorrindo, feliz por Olívia reencontrar o pai fora do hospital.

[…]

Desde que Emmett retornou há dois dias, estava hospedado na casa de Norman. Assim, Rosalie achou melhor levar e buscar Olívia na escola.

A porta ficou aberta, depois de Olívia sair do carro e correr até a varanda de Norman. Esperou por Rosalie, mantendo as mãos nos bolsos do agasalho. Rosalie parou ao som de motor de carro e olhou para trás.

A caminhonete preta de Jacob estava em frente a casa. Ele saltou e foi pegar na carroceria o objeto pesado que ela logo reconheceu como sendo um cofre. Pelo estado, havia sido retirado das ruínas do incêndio.

— Rosalie — cumprimentou ao se aproximar. — Emmett está por aí?  Encontramos o cofre que ele queria.

O cofre onde foram guardadas as lembranças de Sarah para Olívia, e memórias que Cheryl registrou de seus primeiros anos de vida.

— Emmett vai ficar muito feliz. Olívia também.

Jacob subiu os degraus na varanda logo atrás dela.

— Oi, Jacob.

— Oi, pequenina. Tenho algo que você e seu pai queriam muito recuperar.

— É o celo?

Jacob olhou para Rosalie.

— O violoncelo foi destruído pelas chamas, Ollie — Rosalie explicou a menina. — Já valamos sobre isso, meu amor.

O desapontamento marcou seu rostinho. Rosalie segurou sua mão.

— No cofre tem coisas que queriam muito de volta, como os vídeos e as fotografias.

O olhar de Olívia registrou o cofre nos braços de Jacob.

Rosalie abriu a porta permitindo Jacob ir à frente.

As vozes de Norman e Emmett viam da cozinha.

— Para lá — orientou Rosalie.

Jacob levou o cofre para o local indicado. Rosalie e Olívia foram logo atrás dele.

— Jacob — disse Emmett ao vê-lo chegar. Então, viu o cofre que carregava.

— Encontramos — se orgulhou o amigo. — Aqui está.

Olívia se aproximou do pai. Ele a colocou no colo e beijou seu rosto.

Rosalie deixou a mochila no sofá, a lancheira na pia da cozinha. Norman estava lavando as xícaras de chá quando se aproximou.

— Vamos ver se ainda conseguimos abrir com a senha — disse Emmett. E tentou uma vez.

— Ollie, vem pra cá amor. Deixe o papai abrir o cofre com o Jacob.

— Vá com a mamãe — Emmett pediu, e ela foi.

— Vovô.

— Oi, Abobrinha. Você se divertiu na escola hoje?

— Hoje teve aula de artes.

— E você gosta muito, não é?

Ela pulou.

— Sim.

Rosalie colocou Olívia sentada na ilha da cozinha. Ela começou contar a Norman tudo o que tinha feito na escola. Cheia de entusiasmo ao falar das aulas de artes.

Deu trabalho abrir cofre, mas eles conseguiram. Os objetos dentro dele permaneciam intactos.

Olívia se juntou ao pai para ver os objetos recuperados de perto. Jacob se despediu pouco tempo depois.

Cheryl e o namorado, Joseph, chegaram do mercado com as compras e se juntaram a eles.

[…]

Um sofá-cama foi colocado na sala de estar de Norman temporariamente, para Emmett. O quarto que Rosalie ocupava, foi cedido a Cheryl e a Joseph no mesmo dia que chegaram.

Rosalie retornou do banheiro, pronta para dormir. A televisão estava sintonizada no canal infantil, mesmo Olívia dormindo há algum tempo. Emmett cochilava juntinho a ela.

Desligou a televisão e foi deitar ao lado deles. Afagou os cabelos e o rosto de Olívia, adorando cada momento ao lado daquela menininha que conquistou seu coração com doçura e inocência.

Fez cafuné na cabeça de Emmett, as unhas raspando no couro cabeludo com delicadeza. E então na barba.

Ele abriu os olhos e ficou olhando em seu rosto na curta distância que se encontravam.

— Está tudo bem? — sondou ela. — Sente dor?

— Estou bem.

Ela sorriu, sem interromper o cafuné.

— Precisa de algo? — continuou.

— Sim, que me dê um beijo.

Adorou o sorriso que desenhou os lábios dela, um instante antes do beijo trocado.

— Que beijinho mixuruca — se queixou num tom de diversão.

Rosalie o beijou novamente.

— Está melhorando — provocou. O som da risada dela foi maravilhoso.  — Linda.

Ela voltou beijá-lo.

— Esse esteve perto de ser perfeito.

— Que pena, porque esse foi o último.

A expressão no rosto dele fez Rosalie gargalhar.

Olívia acordou e sentou sonolenta. Olhou de um lado para o outro como não soubesse onde estava.

— Papai.

Emmett afagou seus cabelos bagunçados.

— Está tudo bem, volte a dormir.

— Não foi nada, meu anjo.

A menina deitou a cabeça em cima da barriga do pai como fosse seu travesseiro voltando dormir tão depressa quanto havia acordado.

Rosalie puxou o cobertor sobre eles.

Emmett beijou sua pálpebra.

— Boa noite — murmurou.

Rosalie aconchegou-se ao lado dele, ouvindo quando sussurrou:

— Está me devendo um beijo de tirar o fôlego. E eu não abro mão.

Rosalie beijou seu pescoço, sussurrando:

— Vai ganhar muito mais que o beijo, no momento adequado.

— É mesmo? — sussurrou ele.

— Para fazer valer à pena todo tempo perdido.

[…]

Cheryl e o namorado, Joseph, voltaram para Pensilvânia ainda na parte da manhã.

Rosalie estava a caminho da casa em reconstrução, depois de pegar Olívia na casa de Megan aquela tarde.

Emmett esperava por elas. Rosalie tinha deixado ele mais cedo para esperar a pessoa que comprou o carro que pertenceu a Sarah, apesar dos problemas que pudesse ter pelo tempo parado. Emmett ainda não podia participar da obra, apesar da muita vontade. Era grato pelo esforço daquelas pessoas para que ele e Olívia voltassem a ter onde morar.

Olhando pela janela, Olívia reconheceu o trajeto o qual estavam fazendo de carro. Algumas memórias do incêndio reacenderam, deixando-a inquieta. Chegou sentir como as chamas voltassem ao seu redor com estalos e calor.

Ao estacionar, Rosalie olhou para trás e a encontrou com os olhos fechados, as mãos encobrindo os ouvidos.

— Ollie — chamou. — O que houve meu anjo? — Se inclinou entre os assentos soltando o cinto de segurança em volta da menina.

— Fogo, fogo, fogo — repetiu sem abrir os olhos.

Rosalie tocou sua perna encoberta pela calça com estampas de coelhinhos.

— Não tem fogo, Ollie.

A menina balançou a cabeça, recusando.

— Está quente. Está estalando. É fedido. Não posso respirar. — Levou a mão à garganta como lhe faltasse o ar.

Rosalie chegou mais perto.

— Olhe para a mamãe. Ollie abra os olhos. — Tocou seus braços. — Abra os olhos, querida. Não tem fogo.

— Está quente.

Rosalie sentou no banco traseiro. Retirou Olívia do assento de elevação passando para o seu colo.

— Está com a mamãe, no carro. Não tem fogo aqui, meu anjo. Está tudo bem.

Olívia ainda ficou com o rosto encostado em seu peito, se recusando olhar em volta.

— O pessoal está todo lá fora. Estão trabalhando para deixar a casa bonita, para podermos voltar a viver nela. — Beijou no alto da cabeça de Olívia. — O papai também está lá fora. Está esperando por nós.

Finalmente, conseguiu com que a menina levantasse a cabeça e olhasse em seus olhos.

— Papai está aqui? — pediu.

— Sim, o papai está aqui.

— Não tem mais fogo?

— Não, você pode olhar para fora.

Devagar, Olívia ganhou confiança para olhar pela janela do carro. Ainda era possível ver que ali aconteceu um incêndio, mas não sentiu medo. As pessoas estavam trabalhando com entusiasmo. Os barulhos de ferramentas se mesclavam ao som de suas vozes.

 Avistou o pai sentado, com as pernas pendidas, na carroceria da caminhonete de Jacob. As muletas sustentadas na lataria.

— Papai está lá — disse, movendo o braço.

— Está esperando por nós. Para voltarmos para casa do vovô. Você não quer ir até lá falar com ele?

Ela moveu a cabeça.

— Sim, eu quero.

Rosalie beijou seu rosto. Esticou o braço para abrir a porta traseira e a deixou sair. Saindo depois dela. Segurou sua mão indo juntas encontrar com Emmett.

Olívia chegou perto das pernas do pai, dizendo:

— Oi, papai.

Emmett sorriu. E se inclinou puxando ela para sentar ao seu lado na carroceria.

— Oi, amorzinho. — Beijou seu rosto. — Brincou bastante com a Megan?

Rosalie se aproximou.

— Sim, brincamos de várias coisas.

Rosalie passou o braço em volta dos ombros de Emmett, e ele, passou os seus ao redor de sua cintura. Trocaram um beijo breve. Olívia sorriu assistindo aos dois trocando carinhos.

— Deu tudo certo? — tentou Rosalie, sobre o carro que vendeu.

Ele beijou seu pescoço.

— Sim.

— Papai, não tinha mais fogo quando você chegou? — pediu Olívia, movendo o dedo na direção do local onde ficava a casa deles.

— Não, filha. Os bombeiros apagaram o fogo naquele mesmo dia. — O olhar cravou em Rosalie, esperando que dissesse alguma coisa.

— Ela não reagiu muito bem — murmurou.

Emmett entendeu o que quis dizer. Era a primeira vez desde o incêndio que Olívia voltava ao local.

Kalel, que passava por perto, carregando madeiras, ouviu parte da conversa sobre Olívia sentir medo de voltar ao local do incêndio. Quis amenizar o medo da menina de alguma forma, e escolheu cantar em voz alta, caminhando como fosse um dos sete anões na floresta.

— Eu vou, eu vou, pra casa agora eu vou. Pararatimbum, pararatimbum. Eu vou, eu vou, eu vou!

Sua atitude chamou atenção não só da criança, de Rosalie e Emmett também. Os dois riram. Olívia ficou de pé, andando de um lado para outro na carroceria da caminhonete, cantando junto com Kalel. E isso se repetiu por todas às vezes que Kalel passou perto de onde estavam.

— Você viu no jardim da senhora Smith? — Rosalie comentou a terceira passagem de Kalel, enquanto Olívia estava distraída.

— Está se referindo a placa de venda?

Rosalie afirmou com um balançar de cabeça.

— Ela ainda está com muito medo de você — reafirmou. — Duvido que volte aqui algum dia.

— É melhor assim. — pontuou Emmett. — Vai ser melhor para todos.

Olívia parou atrás das costas do pai, abraçando, juntando seus rostos como fossem tirar uma foto.

— Papai, nós vamos à igreja manhã?

Ele segurou sua mão pequena dando um beijo.

— Sim, todos nós vamos. Eu, você, a mamãe e o vovô.

— Megan pode ir brincar na casa do vovô depois?

Emmett esfregou a barba em seu rosto, arrancando uma gargalhada.

— Faz na mamãe também — sugeriu entre risos.

Ele pegou Rosalie, segurando uma em cada braço, raspando a barba no rosto de uma e da outra. Rosalie gargalhou junto a Olívia.

Kalel passou novamente por perto, trazendo a canção com ele. Olívia tentou cantar, mesmo o pai a segurando e fazendo sorrir.

[…]

Pouco a pouco, as pessoas foram levantando dos bancos e saindo para o lado de fora da igreja.

Norman se despediu de um casal de amigos.

Rosalie ao lado de Emmett, que se movia com ajuda das muletas, chegaram do lado de fora.

Megan estava se despedindo dos pais. Como combinado, ficaria o resto do dia brincando com Olívia na casa de Norman.

— Seja uma boa menina — pediu Helena a filha. — Comporte-se.

 — Não seja barulhenta — Alice sorriu ao falar com a sobrinha.

Megan sorriu. — Você é barulhenta, tia Alice.

— Por isso mesmo. Você puxou a mim.

Megan voltou a sorrir.

Helena beijou a menina no rosto. E acompanhou o marido até o carro da família.

As duas crianças retornaram correndo para junto de Rosalie e Emmett.

— Podemos ir — perguntou Rosalie as meninas.

Ambas responderam:

— Podemos!

Elas foram à frente e se encontraram com Norman. Olívia segurou na mão dele.

— Vovô, a Megan pode jogar damas?

— Ela pode, sim.

— O vovô que me ensinou jogar damas. Não foi, vovô?

— Foi sim.

— Eu não sei jogar muito bem — contou Megan. — Olívia disse que vai me ajudar.

Olívia olhou no rosto de Norman, orgulhosa.

— Muito bem, Abobrinha. É muito legal, você querer ajudar sua amiga.

— Eu gostei que seu avô te chama por Abobrinha.

Ao lado do carro, Olívia soltou a mão de Norman. Rosalie destravou as portas, todos entraram e puseram o cinto de segurança. Olívia ficou no assento de elevação, Megan no meio e Norman junto à outra janela. As meninas conversaram todo o caminho de volta para casa. Em alguns momentos os adultos participaram da conversa, e até riram com elas.

[…]

O Audi Q5 na cor preta, seguiu pela rua em baixa velocidade. A mulher atrás do volante seguia as instruções do GPS. Os dedos com unhas pintadas de esmalte nude, batiam pausadamente ao volante. Ela olhava com atenção as casas no caminho.

Avistou a placa de venda no jardim de uma delas. Encontrou três carros estacionados no ponto onde marcava o destino procurado, logo mais a frente.

Observou a casa sendo reerguida. Percebeu sinais do incêndio que aconteceu ali dias atrás. O nervosismo que vinha sentindo desde que tomou a decisão de procurá-los foi substituído por angústia. Essa angústia se transformou em medo.

Passou os dedos entre os fios de cabelos puxados para o tom caramelo. Respirou fundo. Reparou na movimentação de pessoas trabalhando, mesmo ao domingo.

As mãos tremeram ao volante. Abriu a porta, pondo o pé para fora, relutante. Não podia ser ali. Tinha de estar no lugar errado. Fechou o agasalho indo em direção a casa.

— Com licença — pediu ao homem que encontrou no jardim. O moreno alto olhou em sua direção. — O que aconteceu aqui? — pediu.

O homem parou com o martelo na mão e um cinto de ferramentas preso a cintura.

— Não soube o que aconteceu aqui?

— Cheguei recentemente.

— Foi um incêndio dos grandes.

— O que aconteceu com as pessoas que moravam na casa?

— Foram levados à emergência mais próxima.

Sentiu as pernas tremerem, obrigando se apoiar a um dos carros que ali se encontrava.

— Meu Deus — o lamento deixou seus lábios em forma de sussurro. — Não posso ter chagado tão tarde assim.

— Você está bem? — pediu o homem.

A recém-chegada passou a mão no rosto.

— Há quanto tempo aconteceu?

— Faz alguns dias.

Moveu a mão trêmula na frente do corpo.

— A menininha? Tinha uma menininha? Ela tem seis anos. Sabe alguma coisa dela? — estava apavorada, era nítido pelo seu tom de voz. Outra vez se apoiou no carro. Os olhos escuros enevoaram com lágrimas.

— Você a conhece?

— Sim — respondeu depressa. — Na verdade, não. Mas… é… eu…

Notando a confusão nas palavras, o rapaz emendou:

— O nome da menininha é Olívia?

A mulher levou as mãos trêmulas à boca.

— Sim — se pegou afirmando —, esse é seu nome. Como ela está? Está bem?

— A menininha está bem — essa única afirmação foi suficiente para permitir respirar melhor. — O pai a salvou.

— Obrigada meu Deus — sussurrou de olhos fechados. — Então, a criança e o pai estão bem?

— Ele precisou ficar um tempo a mais no hospital. Agora se recupera bem. Não está mais no hospital. — Olhou a construção atrás das costas. — Estamos trabalhando duro para eles voltarem para casa quanto antes.

— Onde estão ficando? É casa de algum parente?

— Não sei se posso passar essa informação.

A mulher deu um passo à frente, angustiada. 

— A menininha é minha neta.

O homem tornou olhar para trás como quisesse falar com alguém. Estavam todos ocupados com suas funções. Deixou o martelo em cima da pilha de madeiras.

— Vou com meu carro e você me segue — avisou.

— Obrigada — a voz soou trêmula agradecendo ao homem que passou em sua frente. — Pode me dizer seu nome?

— Sam Uley.

— Obrigada, Sam, por me levar até minha neta — viu quando entrou num dos carros estacionados na frente da casa, então, se apressou voltar para o seu. Aguardou o carro de ele estar em movimento e o seguiu de perto. Os pensamentos na criança que nunca pôde conhecer. O coração pulsando forte no peito, aumentando, a cada instante, o desejo de encontrá-la.

 


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