Um Caminho Para O Coração escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 41
Capítulo 40 — Poder Do Amor




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O calor tornou-se intenso. O suor escorria no rosto. Enfrentou o perigo, desviando das chamas, respirando com dificuldade devido à fumaça. Alcançou a porta do quarto com um forte pontapé. A pancada assustou Olívia ainda mais. Emmett escutou seu grito de dentro do closet que pertenceu a Sarah.

Desviou dos móveis, sem perder o ritmo apressado com que chegou até ali. O desespero crescia com as labaredas que consumia parte da casa. O medo de perder quem mais amava, impulsionou ir sempre em frente.

— Papai está chegando — avisou. Abriu a porta do closet, ouviu seu choro, porém, não a avistou. A menina estava encolhida atrás do violoncelo. O alívio em encontrá-la bem, foi imediato, embora o perigo persistisse. Segurou seu corpo pequeno e a colocou de pé.

— Estou com medo, papai. Estou com medo.

Doeu ver em seus olhos o quanto estava assustada. Algo estourou no meio das chamas, Olívia estremeceu, e seu olhar assustado foi direcionado a porta aberta do quarto.

Emmett ainda a segurava pelos braços quando olhou o lado de fora do closet, onde Olívia olhava. As chamas se alastravam para dentro do quarto onde estavam.

— Vou tirar você daqui — bradou —, nem que seja a última coisa que eu faça. — Tornou olhar nos olhos da menina. — Espere aqui um instante. Não saia daqui. Papai já volta.

Olívia gritou ao perceber o pai se afastando.

— Não, papai — chorou, assistindo ele correr pelo quarto, desesperado como nunca viu antes.

Emmett parou um segundo, buscando, no desespero, o melhor a ser feito. Puxou a manta em cima da cama, levou até o banheiro do quarto e pôs embaixo da torneira com movimentos acelerados e atrapalhados. Escorreu na água que ficou no chão e por pouco não caiu. Jogou água no próprio corpo e voltou correndo para pegar Olívia no closet.

— Papai, papai.

— Vou tirar você daqui, eu prometo. — Jogou a manta úmida sobre a menina.

Enquanto ele esteve no banheiro, Olívia colocou a mochila com os brinquedos e o cobertorzinho nas costas. Segurou a boneca american girl no braço.

Emmett a pegou no colo de modo que se prendesse a seu corpo com braços e pernas. A boneca ficou entre entres, presa ao agasalho de Olívia. Olhou o violoncelo uma última vez e saiu com a filha nos braços.

— O celo — Olívia choramingou, sem querer deixar o violoncelo da mãe para trás. — O celo.

Protegeu sua cabeça com a mão, correndo até a porta.

— Você é toda minha vida — confessou. — Nada é mais importante que tirar você daqui. — A chama alta moveu-se em sua frente bloqueando a passagem por aquele caminho. As labaredas começavam destruir a cama de casal.

Olívia gritou, agarrada a ele.

— Não olhe amorzinho. Não olhe.

— Papai, papai. Quero sair… papai.

Desesperado em tirá-la dali, tentou novamente à porta. Recuou ao sentir as chamas lamberem seu braço esquerdo. Moveu-se até estar diante a janela, com vista para o jardim da frente. Colocou Olívia no chão, embrulhada na manta úmida.

— Não se mova — disse para ela. Num gesto rápido, alcançou a poltrona lançando direto no vidro da janela.

Olívia gritou assustada com o que o pai fez. Olhou para trás, gritando outra vez por medo do fogo. As chamas estavam cada vez mais perto. O calor, insuportável.

Emmett a pegou de volta no colo.

— Segure-se no papai e não solte por nada. Eu preciso que segure o mais forte que puder.

Sentiu os bracinhos da filha se apertando em volta do pescoço. Ela afirmou com um movimentar de cabeça desesperado, seu pedido. Emmett quebrou o restante do vidro com o pé calçado. Aproximou-se do peitoril, passou uma perna para o lado de fora, o corpo, então, a outra perna. Sempre protegendo a filha, caminhou sobre o telhado da varanda com passos cautelosos sabendo exatamente onde pisar. Olívia perdeu uma pantufa. As chamas aumentaram no interior do quarto se lançando para fora da janela. Não demoraria, alcançariam também a varanda.

— Segure firme — instruiu. — Papai vai pular agora.

— Papai.

Olhou para trás, nas chamas saindo pela janela. Voltou olhar para baixo, avaliando rapidamente onde aterrissar. Lançou-se no gramado seco. No momento do impacto, sentiu a perna direita. As vistas escureceram e o estômago embrulhou. Apertou os olhos por um período muito curto. Segurou Olívia com força. Olhou no alto deparando com a espessa nuvem de fumaça sobre a casa e o clarão alaranjado do fogo.

— Você está bem? — perguntou. Olívia não respondeu. Afastou a manta para olhar em seu rosto. — Amorzinho? Olívia, fale com o papai.

— Papai. — Estava chorando outra vez. — Papai… não quero… — ela soluçou. — Não quero ver o fogo.

Emmett beijou seu rosto molhado de lágrimas, suor e fuligem, voltando protegê-la com a manta úmida.

Tentou levantar, mesmo sentindo dor. Seguiu pelo gramado arrastando a perna, atravessou a rua até estar no gramado do vizinho de frente. Permitiu o corpo grande, ferido e esgotado, deitar no gramado amarronzado.

Seus olhos ardiam devido à fumaça e também seus pulmões. A fuligem aderia ao suor e água que lhe umedecia as roupas, a pele e os cabelos. Sentiu como tivesse acabado de sair do inferno… e saíra mesmo. O cheiro acre de fumaça impregnava o ar, suas roupas e também a Olívia.

Os vizinhos abriram a porta da frente, assustados.

Ouviu o barulho das sirenes do caminhão de bombeiros, ambulância e viatura de polícia chegando à rua.

Sentiu-se fraco e tonto. Desembrulhou Olívia da manta, e lhe deu um abraço apertado.

— Eu te amo, filha. Eu te amo — reforçou, recusando-se soltá-la.

Pessoas uniformizadas começaram sair dos respectivos veículos e se espalhar no entorno da casa em chamas.

— Me perdoe Olívia — pediu Emmett, com uma nota de melancolia na voz, respirando com dificuldade. — Me perdoe por tudo que fiz ou deixei de fazer. Me perdoe... Perdão, filha. Perdão.

— Papai, papai.

Olhou seu rostinho sujo e assustado.

— Eu te amo tanto — ele estava chorando. Ouviu ao fundo os bombeiros se comunicando. Os paramédicos chegaram até eles, trazendo uma maca. Um homem com idade entre trinta e quarenta anos, e uma mulher ainda mais jovem, se colocou ao seu lado. Outros dois estavam mais para trás, esperando.

A mulher tentou tirar Olívia de seus braços, mas ela agarrou forte seu pescoço, gritando:

— Papai, papai. Não, não, não papai.

Mesmo muito fraco, fez um pedido: — Deixe-a vir comigo, por favor. — E para a menina disse. — Está tudo bem. Eles estão aqui para ajudar. — Tossiu.

A mulher tentou pegar Olívia novamente. E, chorando, vendo que o pai não estava bem, permitiu ser retirada dos braços dele pela desconhecida que estava ali para ajudá-los.

O puseram na maca e o levaram para a ambulância. Estava muito frio longe do fogo, eles o cobriram com manta térmica. Pessoas surgiram na rua vendo a tragédia de perto. Puseram máscara de oxigênio nele e também em Olívia. O monitor de oxigênio no dedo.

Em uma imagem oscilante, percebeu Olívia, encoberta por uma manta seca, estender a mão. Segurou sua mãozinha. Viu lágrimas no rosto, assustada, olhando para ele, se recusando ficar longe. A boneca que ela fez questão de resgatar havia desaparecido. Mas a mochila com os outros pertences estavam ali ao lado.

Afastou a máscara com a outra mão para falar:

— Norman Hale. — Puxou o ar com força voltando tossir.

O paramédico pôs a máscara novamente. Olívia permaneceu segurando sua mão, mesmo quando se sentiu fraco demais para segurar a dela com a mesma firmeza.

[…]

Sem fazer ideia do que estava acontecendo, Rosalie tentou algumas vezes a chamada de vídeo. E também a chamada por voz. Tentou mensagens de texto no aplicativo e não obteve nenhuma resposta da parte de Emmett. Queria que soubessem que estava voltando antes do prazo estimado, dizer que Olívia não precisaria mais de um calendário para acompanhar os dias, mas a falta de resposta começou preocupá-la.

[…]

Pai e filha foram levados à emergência mais próxima, em Elizabeth City a 48 quilômetros dali.

Era tarde da noite quando o telefone fixo tocou na casa de Norman. Ele saiu da cama, preocupado, com roupas de dormir. Caminhou devagar pela casa até alcançar o telefone. A notícia o pegou desprevenido e causou choque. Ainda assim, conseguiu trocar de roupas, pegou a chave do carro e dirigiu ao encontro deles.

Chegando lá foi informado que Emmett estava recebendo atendimento por conta da fumaça que inalou e que seu estado era delicado. Que precisaria, também, passar uma cirurgia na perna direita devido a uma fratura. E tratar algumas queimaduras.

Ao perguntar da criança, foi informado que estava bem. Apenas ficaria em observação devido à fumaça inalada.

Foi levado a pediatria para encontrar Olívia. Abriu a porta do quarto e a encontrou dormindo. O suporte ao lado da cama, a mangueira de silicone hospitalar transportando as substâncias com soros e gases interligados nos aparelhos médicos até a pequena paciente que se favorecia das substâncias de seu tratamento.

Não havia mais fuligem ou suor na testa de Olívia. Suas roupas haviam sido substituídas pela roupa hospitalar. Separá-la do pai foi certamente um dos momentos mais difíceis desde que chegou a emergência.

A assistente social estava a sua espera, e, antes de entrar no quarto, precisou responder algumas perguntas. Informou-lhe, também, o número de telefone da mãe de Emmett.

Aproximou-se da cama, pegando a mão de Olívia cuidadosamente.

— Abobrinha — falou com ela.

Uma enfermeira estava do quarto com a menina quando chegou.

— É o avô de Olívia?

Confirmou, balançando a cabeça.

— Ela vai ficar bem? — pediu.

— Não se preocupe, ela vai estar bem quando acordar. A medicação a deixou sonolenta.

Norman anuiu, comovido.

— Pelo que sei, o pai salvou a vida dela — comentou com um tom de orgulho na voz. Escreveu no prontuário, em seguida, se retirou.

Norman sentou na poltrona ao lado da cama, segurando a mão de Olívia o tempo todo. Mesmo ela dormindo, contou histórias para embalara seus sonhos.

Era dia quando foi à recepção telefonar para Rosalie. Ligou duas vezes, mas a ligação caiu na caixa postal. Não falou sobre o ocorrido, apenas pediu que retornasse a ligação assim que possível.

Pegou um copo de café antes de retornar para Olívia.

[…]

Ansiosa, contando os segundos para reencontrá-los, Rosalie dirigiu por quase oito horas, até a casa de Emmett, sem passar na casa do avô antes. Mesmo sabendo que Olívia poderia ainda estar na escola e Emmett no trabalho.

Ao se aproximar com o carro da rua, sentiu-se angustiada. Algo estava errado, mas não soube o quê. Diminui a velocidade reparando com atenção a vizinhança. Ao se aproximar enxergou as marcas do incêndio. O que restou da casa deles.

As mãos tremeram de tal forma, que teve dificuldade em mantê-las ao volante. O coração, que já estava angustiado, passou a bater num ritmo acelerado. Pisou no freio com força. Saiu do carro, assustada, deixando a porta aberta.

Caminhou em direção as ruínas da casa. A respiração pesada, as pernas fraquejando, temendo, imaginando o pior.

— Ollie. Emmett — seus nomes soaram com desespero e angustia. Apressou-se por debaixo da fita zebrada de isolamento de área. — Ollie. Emmett. — Tropeçou nos resíduos do incêndio no jardim. Olhou em volta, desesperada, e novamente no que restou da casa. A garagem foi a única parte que não foi consumida pelas chamas. Pisou em algo, e, ao se dobrar para ver, encontrou a boneca que Olívia ganhou da avó paterna. Estava molhada e suja de fuligem. Os olhos marejaram, pensando na menina. Tentou limpar o rosto da boneca com a mão e acabou sujando ainda mais. — Olívia. — Seus pés chegaram bem perto de toda aquela destruição.

Uma voz desconhecida soou atrás de suas costas.

— Você não pode entrar aí.

Uma segunda pessoa completou:

— Os bombeiros ficaram até que os últimos focos de fogo fossem considerados completamente extintos, e o local, seguro, apenas como garantia para o caso de uma nova ignição.

Parecia perdida no próprio desespero. Voltou à calçada.

— O que aconteceu aqui? — pediu, olhando do homem para as ruínas da casa.

— O incêndio começou no início da noite durando três horas, antes de ser debelado. É necessário esperar mais de 24 horas para os peritos divulgarem a causa. Porém, acreditasse que o motivo tenha sido um curto-circuito na rede elétrica precária.

Rosalie continuou recuando sem deixar de olhar as marcas do incêndio. Caiu ao tropeçar novamente e se levantou, desejando que tudo não passasse de um pesadelo.

— O homem e a criança? — gesticulou na direção da destruição. A boneca de Olívia na outra mão. — O que aconteceu com eles? Eles…

— O pai e a filha foram levados à emergência ainda durante a noite. — Tudo começou fazer sentido na mente de Rosalie. Emmett teria atendido sua ligação, tivesse tido a oportunidade de fazer isso, antes de o incêndio começar.

— Eles? — continuou, com a voz angustiada.

— O pai fez o que pôde para salvar a filha e a si mesmo das chamas. Ele conseguiu tirá-la a tempo. A menina parecia bem, apesar do susto e da fumaça inalada.

— E o pai? — o interrompeu.

— Ele, sim, estava ferido.

— Onde fica a emergência para onde os levaram?

— Elizabeth City.

Rosalie virou as costas, correndo de volta para o carro.

— Conhece os dois? — ouviu perguntar.

Sem olhar para trás, respondeu:

— É minha família. — Entrou no carro, fechando a porta com um baque. Pôs a boneca no banco de trás. Pegou o telefone celular no banco do carona, embaixo da bolsa, mas estava sem bateria. O celular ficou com as marcas de fuligem de suas mãos, após pegar na boneca. Colocou o cinto de segurança. Manobrou o veículo com impaciência, chegando se atrapalhar ao fazer a curva. A boneca caiu do banco. — Por favor, Deus, que eles estejam bem — pediu. — Por favor, por favor.

[…]

Respirou fundo, com a mão na porta do quarto, onde Olívia estava hospitalizada. Passou a mão no rosto como isso fosse aliviar a aparência e a enorme preocupação.

Abriu a porta devagar, espiando no lado de dentro. Encontrou o avô na cadeira ao lado da cama, segurando um livro de colorir, um caderno de desenhos e uma caixa de giz de cera. Olívia com a cabeça no travesseiro, mesmo a cama inclinada. A ovelhinha e o cobertorzinho estavam com ela. Ficou surpresa que não tivessem sido destruídos pelo fogo junto a maior parte da casa. Ainda assim, parecia tão triste.

Reconfortou o coração saber que não estavam sozinhos.

O olhar seguiu a mangueira de silicone que levava a mediação a veia. Viu-a mover a mãozinha onde estava o dispositivo agulhado usado para fazer infusões intravenosas.

— Tem certeza que não quer colorir, Abobrinha?

A menina recusou, balançando a cabeça bem devagar. Doeu vê-la tão triste. Memórias de quando a conheceu a fez voltar no tempo. Mesmo naquela época adorava colorir, e agora se recusava.

Abriu um pouco mais a porta. Norman a viu, e abriu um sorriso cansado. Rosalie olhou outra vez Olívia. Norman fez o mesmo, seguindo seu olhar.

— Ollie — chamou cautelosa. Emocionada a cada passo que dava na direção da cama onde estava a menina.

Olívia seguiu o som de sua voz, virando o rosto. O coração pulsou forte no peito.

— Mamãe — sua voz saiu chorosa. — Mamãe, mamãe.

Rosalie chegou perto da cama.

— Minha menina — murmurou. — Meu anjinho. — A abraçou bem juntinho ao peito. Olívia se agarrou a ela com desespero. Ambas choraram abraçadas, acalmando o coração cheio de saudades e medo. Reconhecendo uma a outra, no amor que as uniu desde o início. Reencontrando no calor do abraço e no cheiro, conforto e segurança.

Rosalie afrouxou o abraço, olhou no rostinho dela, com lágrimas nos olhos.

— Do que me chamou?

— Mamãe. Minha mamãe.

Uma olhou nos olhos da outra, suas testas se tocando. Rosalie beijou todo o rosto de Olívia e seus olhinhos molhado de lágrimas. Avaliou toda ela e voltou abraçá-la.

— Obrigada Deus — murmurou. — Obrigada.

A mão pequena de Olívia acariciou seu rosto. Então, suspirou como um grande alívio a tocasse. Beijou o rosto de Rosalie e voltaram se abraçar.

— Como senti falta desse abraço — falou agarrada a menina.  Sentou na cama ao lado dela e ficou fazendo carinho em seus cabelos ruivos.

— A nossa casa pegou fogo — contou Olívia, com uma nota de tristeza na voz.

— Tenho certeza que logo, logo tudo vai estar bem. E uma casa bem bonita vai estar no lugar da que pegou fogo. — Beijou no alto de sua cabeça.

— Tinha muito fogo. E estava muito quente. Eu fiquei com medo.

— Está tudo bem agora. Não tem mais fogo.

— Eu não vi mais o papai — a voz tremeu. Rosalie sentiu que a menina voltaria a chorar a qualquer momento. — Não me deixaram ficar com ele.

— Os médicos estão cuidando do papai agora.

Olívia voltou a chorar, como imaginou que aconteceria.

— E se o papai morrer? Eu ouvi quando disseram que o papai não estava bem.

Rosalie voltou abraçá-la.

— O papai não vai morrer. Ele não vai se entregar. Sabe por que isso não vai acontecer?

Olívia olhou em seus olhos como não soubesse.

— O papai te ama. Não há nada que ele mais ame que ser o seu papai. — Limpou as lágrimas no rosto de Olívia com um lenço de papel. — Assim que puder receber visitas, levarei você até ele. — Rosalie olhou no rosto do avô. — O vovô e eu vamos cuidar de você até que o papai fique bom e possa voltar para casa. Então seremos os três cuidando de você novamente. Vamos te abraçar, apertar e encher de beijos.

— Você não vai mais embora, mamãe?

— Nunca mais irei me afastar de você, meu lindo arco-íris. Nunca mais.

Os olhos de Olívia ganharam um novo brilho a esta afirmação.

— Me chama de novo de mamãe?— pediu Rosalie.

— Mamãe — disse Olívia. — Mamãe, mamãe, mamãe.

Rosalie a agarrou, balançando de um lado para outro. Parou antes que Olívia machucasse o braço que recebia o soro.

Norman levantou para abraçá-las.

— Como você soube? — perguntou Norman, instantes depois. Olívia finalmente aceitou o livro de colorir, o caderno de desenhos e o giz de cera. Estava distraída, ao menos por agora, de todo trauma que viveu na noite anterior.

Rosalie afastou uma mecha dos cabelos de Olívia para detrás da orelha.

— Estive no local — respondeu sem dar nomes. — Encontrei alguém, que me disse para aonde vir.

— Tentei te avisar por telefone.

— Estava dirigindo, não reparei que o telefone ficou sem bateria. — Beijou a testa de Olívia e levantou. Chegou perto da poltrona e sentou no apoio do braço. Olhou Olívia colorindo, sentada na cama. — Poucas vezes em minha vida senti tanto medo como senti hoje — confessou ao avô abaixando a voz.

A mão de Norman afagou a sua.

— Eles são sua família agora — afirmou.

Rosalie balançou a cabeça, emocionada.

— Emmett salvou nossa garotinha.

— Ele teria morrido por ela — sussurrou Norman.

Rosalie concordou com um movimentar de cabeça.

— Ele a protegeu com o próprio corpo. Nosso anjinho não tem um único ferimento.

— Mamãe — Olívia a chamou, aquecendo o coração de Rosalie com sua doçura e amor.

— Oi, meu anjo? Estou aqui. — Olívia voltou a desenhar. — Posso ver seu desenho? — Olívia virou a folha para ela ver. Rosalie enxergou no desenho infantil o medo que a menina sentiu quando tentavam escapar das chamas. Mas viu também o imenso amor e cuidado que o pai transmitiu ao resgatá-la. De um lado desenhou a casa em chamas, a nuvem escura de fumaça sobre ela. Pessoas no entorno. E do outro lado, desenhou a si mesma e o pai dentro de um coração enorme. Olívia encostou o dedo no coração que os envolvia.

— Este é o nosso escudo. O papai usou ontem à noite. Ele é um super-herói.

Rosalie voltou para perto dela e a abraçou.

— O papai tem o poder do amor? — tentou Rosalie. E Olívia balançou a cabeça, confirmando.

 […]

Norman foi para casa descansar, cerca de duas horas depois da chegada de Rosalie, por insistência dela. Alice passou para deixar roupas novas para Olívia sem saber que Rosalie havia comprado roupas e brinquedos em Atlanta.

No início da noite, Cheryl chegou ao hospital na companhia do namorado, Joseph.

Olívia recebeu alta, horas depois. Cheryl aconselhou Rosalie ir para casa com a menina. E ficou no hospital com Joseph para acompanhar Emmett.

Antes de sair Rosalie conseguiu autorização para ver Emmett, mesmo do corredor, por detrás da parede de vidro, junto a Olívia. Chegaram lá de mãos dadas. Encontrou Emmett na cama, sedado. A máscara de oxigênio encobrindo seu rosto, o soro gotejando na mangueira levando a medicação à veia. Ele tinha alguns machucados nos braços e no rosto. Uma queimadura no braço esquerdo. E a perna direita, imobilizada.

Encostou a mão no vidro, desejando poder tocá-lo. Dizer que estava ali e que Olívia estava bem. Falar do orgulho de saber que salvou a vida da filha. Dizer que o amava. Que estava de volta, para retomar o amor deles de onde havia parado. Que nada mais estaria entre eles.

Olívia ficou nas pontas dos pés tentando enxergar do outro lado do vidro. Rosalie percebeu seu esforço, então, a pegou no colo.

Olhinhos curiosos buscaram a presença do pai, avaliando todos os detalhes em volta dele. Encostou as mãos pequenas no vidro.

— Papai… — murmurou. — Papai — na segunda vez, falou um pouco mais alto.

— O papai não consegue te ouvir daqui, meu anjo.

— Então vamos ao outro lado.

— Ainda não podemos entrar lá.

— Por que papai está dormindo? Eu não faço barulho não, mamãe. Eu vou bem quietinha.

Rosalie beijou seu rosto.

— Logo ele será transferido para outro quarto e então nós poderemos entrar para falar com o papai e cobrir de beijos.

Ainda com as mãos no vidro, perguntou:

— O papai não vai morrer, não é?

— Claro que não, meu amor. O papai vai se recuperar rapidinho. Ele é forte. — Beijou outra vez no rosto de Olívia.

— Forte como um urso? — tentou a menina.

Rosalie sorriu.

— Forte igual um grande urso pardo.

Olívia beijou a palma da mão soprando o beijo para o pai através do vidro. Imaginou o beijo chegando até ele e descansando em seu rosto com um estalo.

— Funcionou — falou. — Meu beijo chegou ao papai.

— Com certeza funcionou. — Rosalie voltou sorrir.

Olívia soprou outro beijo.

— Fica bom logo, papai — pediu.

— Estamos esperando por você — completou Rosalie. Ajeitou Olívia no colo e começou se afastar pelo corredor vazio. Olívia não deixou de olhar as paredes até estarem em outro ambiente do hospital. Somente então deitou a cabeça no ombro de Rosalie. Encontraram Cheryl na sala de espera, com Joseph, o homem de cabelos e barba grisalha, que segurava sua mão.

Cheryl levantou e ao se aproximar afagou as costas da neta. As coisas de Olívia estavam com eles, exceto o cobertorzinho que a menina não desgrudava.

Joseph recolheu a mochila e entregou a Rosalie, que pendurou no ombro por uma das alças.

— Vai ficar tudo bem — Cheryl falou com Olívia. — Em breve seu pai vai cuidar de você de novo. — Beijou na cabeça da neta, em seguida, se afastou.

— Me avise, caso precise de algo — sugeriu Rosalie.

— Vá tranquila — respondeu Cheryl. — Vou estar aqui o tempo todo com ele.

Joseph emendou:

— Vamos estar aqui para o que ele precisar. Você e amenina precisam descansar agora.

Rosalie anuiu. E, com Olívia no colo, começou se afastar deixando a sala de espera para trás então o hospital. Cruzou o estacionamento com o vento frio soprando no rosto. A menina se agarrou ao seu pescoço. Afagou as costas dela, tentando espantar o frio. Destravou o alarme do carro e colocou Olívia no assento de elevação, comprado recentemente. Fechou o cinto de segurança. Pôs a mochila no banco.

Olívia encostou o cobertorzinho ao rosto. Rosalie lhe fez um afago.

— Te amo pequena. — Se afastou e fechou a porta. A boneca que encontrou no jardim, suja de fuligem e água, ainda estava no carro, mas, como havia caído do banco, Olívia nem reparou nela.

[…]

Olívia estava dormindo, quando chegaram à casa de Norman. A carregou no colo até a varanda e apertou a campainha.

O avô apareceu para abrir a porta em roupas de dormir. Não disse nada, apenas fechou a porta depois que entrou com a menina dormindo nos braços.

— Vou levar ela para a cama — disse, cruzando a sala, alcançando a escada. Pôs Olívia na cama do quarto que foi de Dorothy quando jovem. Retirou seus calçados, encobriu e beijou sua testa. Deixou a luz do abajur acesa ao sair.

Encontrou o avô na sala com duas xícaras e um bule de chá na bandeja sobre a mesinha de centro.

Aproximou-se sentando ao lado dele no sofá. Deitou a cabeça em seu ombro, passou o braço por debaixo do dele.

— É tão bom estar de volta — comentou em voz baixa.

Norman afagou seus cabelos.

— Talvez se eu não tivesse...

— Não pense dessa maneira — pediu o avô. — Foi uma fatalidade o que aconteceu a casa deles. Não teria conseguido evitar ainda que estivesse aqui.

— Se ao menos eu estivesse com eles quando tudo aconteceu.

— Seriam três vidas em perigo. Não sabemos como poderia ter terminado. Graças a Deus, os dois estão vivos. Emmett fez de tudo para retirar Abobrinha de lá ilesa. Ela está conosco agora e em breve o pai também estará. O pior já passou.

Rosalie anuiu.

— Casa a gente reconstrói — lembrou Norman.

— Obrigado, vovô, por ter ficado com eles até eu chegar.

— Não precisa me agradecer. — Pegou o bule e serviu o chá. Entregou a xícara nas mãos da neta. — Sua família, é também minha família.

Roalie beijou o rosto encoberto pela camada fina de barba grisalha.

— Vai ficar tudo bem. Eles podem ficar aqui pelo tempo que precisar.

Rosalie tomou um pouco do chá.

— Isso pode levar um tempo.

— Não importa, esta casa está de portas abertas. Vou ajudar com o que puder.

— Já está ajudando, vovô.

Passos no alto da escada os levou olhar naquela direção. Avistaram Olívia carregando o cobertorzinho, com o rosto molhado de lágrimas.

— O que foi meu anjo?

— Estou com medo, mamãe.

Rosalie levantou. Norman fez o mesmo.

— Você teve um sonho ruim? — Rosalie foi encontrá-la na escada.

— Tinha fogo em todos os lugares.

Rosalie a alcançou e pegou no colo.

Norman olhava as duas da sala.

Olívia deitou a cabeça no ombro de Rosalie.

— Acabou, meu anjo. Está tudo bem agora.

— Não vai pegar fogo na casa do vovô?

Encostou o rosto ao da menina.

— Não. Foi só um sonho ruim. — Levou ela de volta para o quarto. — Eu vou deitar com você agora. Fique tranquila, não tem fogo aqui. Nem onde o papai está. — Deitou a menina outra vez na cama. — Você quer fazer uma oração agora com a mamãe?

Olívia concordou, balançando a cabeça.

Rosalie sentou ao lado dela na cama, segurando suas mãos pequenas.

— Quer começar?

A menina tornou balançar a cabeça.

— Querido Deus — começou —, obrigada por nós amar tanto. Por cuidar e proteger. Cuida bem do papai para ele voltar logo para mim. E também da vovó e o namorado dela. Do vovô Norman. Obrigado por trazer minha mamãe de volta.

Rosalie continuou:

— Obrigada Deus por cuidar e proteger minha família. Por permitir eu estar com eles outra vez. — E juntas disseram: — Amém!

Na porta do quarto, Norman agradeceu em voz baixa.

— Obrigado por esse anjinho que tanto amor e alegria traz as nossas vidas. Somos todos gratos pela oportunidade de tê-la conosco.

Rosalie deitou com Olívia pertinho de seu corpo e ficou fazendo carinho nos cabelos dela até estar novamente dormindo.

— Obrigada por tê-la protegido tantas vezes. Por devolvê-la aos meus braços sem qualquer ferimento. Irei amá-la e cuidá-la para sempre — murmurou vendo a menina dormir.

 


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado. Não se esqueça de deixar o comentário.

Seria muito bom saber o que achou. Qual sua parte favorita?

Boas festas a todos!