O amor abençoado pelo Nilo escrita por kagomechan


Capítulo 40
Epílogo


Notas iniciais do capítulo

é galera.. chegamos no final.
primeiramente, obrigada a todos que chegaram até aqui. foram mtos altos e baixos com essa fic pois ela passou por alguns períodos de hiatus mas estou feliz por termos chegado aqui.
preparei um capítulo cheio de todo o resto do meu pote de açúcar, então aproveitem e por favor n morram ♥
boa leitura ♥
:')



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A neve havia castigado Londres na noite anterior e, por isso, agora que mais um dia chegava ao fim, a capital inglesa estava coberta com uma bela e gelada camada branca. A neve estava sobre os carros, no alto das casas e nas pontes que cruzavam o rio Tamisa. Molhadas com neve parcialmente derretida pelos carros passando constantemente, as ruas estavam escorregadias e perigosas, e por isso as pessoas dirigiam com a mesma cautela com que andavam na calçada empacotadas com roupas quentes, com medo de escorregarem.

Esse cenário de auge do inverno se repetia nas ruas cercadas por prédios comerciais e empresariais. Alguns modernos, outros ainda mantendo uma aparência externa que dedurava em qual século havia sido construído, apesar de reformas e manutenções. Como era inverno, o sol já tinha se posto às 16:55, assim, as pessoas saíam do trabalho às 18 horas já sendo abraçadas pela noite. As horas de escuridão eram tão longas que chegava a ser deprimente, mas as belas iluminações de Natal espalhadas pela cidade traziam uma alegria extra para a noite.

Mas, apesar dos enfeites natalinos que se espalharam pela cidade e pelas casas dos londrinos, o calendário ainda marcava 22 de dezembro. Aquilo era justamente o motivo de alegria dos trabalhadores que começavam a sair do serviço. Uma sexta-feira 22 de dezembro significava que segunda e terça-feira eram os feriados de 25 e 26 de dezembro, Natal e Boxing Day. O final de semana e os feriados juntos conseguiam criar 4 dias sem nada para fazer.

Uma das pessoas que saía de escritórios pronta para aproveitar 4 dias de pura preguiça era Sadie. Ela checou se todas as suas coisas estavam dentro da bolsa e logo vestiu o grosso casaco preto com interior de pêlo sintético, ideal para um inverno daqueles, e enrolou o cachecol bege no pescoço.

Ela, e mais outras pessoas, saíam do escritório da empresa de jornalismo em direção ao elevador do prédio conversando sobre os planos para o Natal. O fato de terem 4 dias livres, abria mais oportunidades para a imaginação. Assim, não eram raros aqueles que falavam sobre viajar para lugares mais quentes e não tão longes.

— Sei que não dá para fazer muita coisa em só quatro dias, - dizia uma colega que Sadie havia feito a pouco tempo naquele emprego que havia conseguido quase 1 ano depois e Aya nascer - Mas eu quero fugir de toda essa neve ao menos um pouco! Então eu e meu marido decidimos passar o Natal em Faro, em Portugal. Lá está bem mais quentinho.

— Vão amanhã? - perguntou Sadie enquanto apertava o botão do elevador para o térreo.

— Infelizmente. - admitiu a colega - Eu queria mesmo era ir hoje direto do trabalho. Mas não tinha nenhum voo. Ao menos nenhum que não fosse um absurdo de caro e desse tempo de chegar até o aeroporto. Então vamos no primeiro voo de amanhã. E você? Vai aproveitar pra sair desse gelo todo? Você disse que tinha um irmão no Cairo né? É muito demorado ou caro um voo até lá?

— Bem… depende… - admitiu Sadie tentando esconder o fato de que não tinha visto passagens para o Cairo com tanta frequência quanto a colega imaginava - Mas acho que vou passar o Natal em Londres mesmo.

Passar o Natal em Londres era uma mentira, mas era uma mentira necessária. Aquela colega, ao contrário da maioria dos conhecidos de Sadie, não sabia das complicações e detalhes mágicos da sua vida. Assim, não tinha como Sadie ser franca e contar toda a lista de lugares que ela iria naqueles quatro dias ao se aproveitar do fato que seu marido conseguia aparecer em qualquer lugar literalmente num piscar de olhos.

Quando o elevador fez “plim!” indicando que tinham chegado no térreo, a conversa sobre viagens e Natal logo foi substituída por despedida conforme as duas chegaram até a recepção do prédio e se separaram. Para a colega de Sadie, uma jornada nos metrôs entupidos de Londres lhe aguardava, mas Sadie não precisava pegar o metrô.

Enquanto as pessoas iam em direção ao metrô, ônibus ou aos seus carros, Sadie ia até onde estava de pé Anúbis esperando por ela. Ele também estava todo embrulhado em roupas de inverno, pretas, como quase todas as suas roupas. Mesmo que estivesse de luvas, suas mãos ainda assim estavam dentro do bolso do casaco pesado que usava numa óbvia tentativa de tentar protegê-las do frio. Mesmo frio esse que havia deixado a ponta de seu nariz e as maçãs do rosto levemente vermelhos e fez sair fumaça de sua boca quando ele falou.

— Estava pensando… - disse ele quando ela chegou perto - Encontrei novos argumentos de porque frio é pior que calor.

— Já disse que calor é pior. - disse ela rindo - No frio é tão gostoso ficar embaixo das cobertas e tomar um chocolate quente. O calor é tão desconfortável e abafado.

— Admito que cobertas quentinhas e um chocolate quente são ótimos pontos em favor do frio. - disse ele enquanto eles entrelaçaram os braços e começaram a caminhar para o lado mais deserto da rua - Mas quando se compara frio e calor quando você está com as roupas mais adequadas para ambos, e no ar livre, o frio é muito pior. Nunca vou me acostumar com essa sensação de parecer que meus dedos vão cair, não importa quão grossas sejam as luvas e as meias.

— Tá. Mas se é assim, quando você está de pé, no calor do verão, embaixo do sol, sem nenhuma sombra, vento ou sorvete… não tem muito o que você pode fazer além de ficar lá derretendo e talvez inventar um abanador meia-boca com um pedaço de papel. No frio você pode ao menos tentar se encolher.

— Como sol, falta de vento e falta de chuva deixam o calor pior, você tem que comparar esse calor com um dia frio de neve, de noite, com chuva. - disse ele - Ou melhor, com nevasca.

— Não sei. Ainda não me convenceu. - concluiu Sadie rindo - Mas então? Como foi hoje? Conseguiu ganhar o caso apesar daquele juiz idiota?

— Por pouco, mas sim. Olha, lidar com uma pena mágica e poderosa era bem menos estressante. 

— Não fique assim. Quem sabe até o Natal do ano que vem você consiga ser juiz?

Aquele lado da rua do trabalho de Sadie levava até um beco sem saída que tinha apenas o depósito de alguns dos prédios da rua e uma pequena calçada entre dois muros que levava para uma praça do outro lado desses mesmos muros. Assim, era um lugar bem vazio. Exatamente por isso que aquele dia, assim como todos os outros dias que Anúbis ia buscá-la no trabalho, eles iam andando até aquela parte mais deserta. Eles nem tinham dado três passos na calçada escondida entre dois muros e no segundo seguinte eles não estavam mais lá.

O Nomo britânico não era tão longe assim, apenas numa outra parte de Londres, mas simplesmente surgir na frente dele ao invés de ter que pegar ônibus ou metrôs abarrotados era bem mais cômodo. Depois de surgir na frente do Nomo, Sadie abriu a porta e se virou para Anúbis, que não havia entrado e nem iria no momento.

— Não vá demorar muito lá ok? - pediu Sadie - Sabe que se ela pudesse ela traria Ammit até aqui.

— Acho que cedo ou tarde vamos ter que adotar algum cachorro desse jeito… - admitiu ele.

— Isso ela puxou de você. Mas contanto que não seja como aquela alma de cachorro que ela viu aquele dia no parque… - respondeu Sadie rindo levemente da lembrança - Um vivo seria muito bom.

— Tenho que concordar. - respondeu Anúbis antes de sumir dali.

Sadie fechou a porta e, envolto em névoa negra, Anúbis surgiu novamente no submundo, no Salão do Julgamento. O clima no Salão do Julgamento era quase totalmente oposto ao de Londres. Logo, a primeira coisa que ele fez foi abrir o pesado casaco e afrouxar o cachecol no pescoço enquanto torcia para não ficar muito tempo ali a ponto de ter que tirar mais roupas. Anúbis não só foi recebido pelo clima mais quente, como também foi recebido pelo som de doces e inocentes risadas infantis.

As risadas infantis vinham de Aya que, já exibindo a fofura e o tamanho de uma criança de 3 anos, ria sentada nas costas de Ammit agarrada aos longos pêlos da juba da demônio. Os cabelos pretos, longos e finos da garotinha caíam delicadamente pelo penteado maria-chiquinha amarrado no alto de sua cabeça e balançavam a cada movimento de Ammit. Ammit não estava correndo ou pulando muito, nem fazendo curvas muito bruscas, estava apenas marchando levemente com um sorriso feliz e bobo, mas isso era o suficiente para fazer os doces olhos azuis de Aya brilharem enquanto ela ria feliz.

Um sorriso feliz era também o que estava no rosto da joaninha estampada na camiseta de manga comprida do pijama rosa que Aya vestia. Várias versões bem menores dessa joaninha se espalhavam pela calça quentinha em meio a desenhos de folhas verdes que em nada combinavam com as meias grossas amarelas com bolinhas brancas.

— PAPA! - gritou a garota alegre ao notar que o pai tinha chegado.

Ammit teria de bom grado levado a garota até Anúbis, mas ao notar que ela começou a tentar descer sozinha, a demônio parou de andar e se abaixou um pouco para diminuir a distância até o chão para a pequena garota. Quando Aya tinha começado com a brincadeira de usar Ammit de cavalo, ela precisava de ajuda para subir, descer e para se manter em cima de Ammit sem cair. Mas agora, apesar do jeito meio infantil e desengonçado de descer, ela já era uma profissional nisso.

Ela correu até Anúbis com os braços estendidos e, quando ela chegou perto o suficiente, ele se abaixou um pouco e levantou-a até que estivesse abraçando-a e segurando-a no colo. Alguns podiam ver aquilo como algo muito simples, mas, para ele, abraçar ela daquele jeito, com os bracinhos finos dela ao redor de seu pescoço, era uma sensação tão feliz e gostosa que ela provavelmente nem fazia ideia. 

Mesmo que palavras não fossem ditas, alguns imaginavam sim qual devia ser a sensação que Anúbis tinha naquelas horas. Alguns desses estavam presentes ali no momento, estes eram Ruby Kane, Julius com Osíris, Ísis e Néftis. 

Brincou bastante hoje com a Ammit?— perguntou Anúbis em egípcio pousando a mão sobre a cabeça de Aya de forma protetora.

Sim! — exclamou Aya em egípcio soltando-se do abraço para poder olhar para o pai - A gente… a gente bincou e ouviu história.

Qual foi a história de hoje?— perguntou ele.

— Peter Pan. - respondeu ela 

Você gostou?— perguntou ele e ela afirmou com a cabeça com um sorriso travesso.

Aya,— disse Néftis entrando na conversa delicadamente - porquê você não pergunta pro papai se você pode brincar com aquela boneca que você achou?

Que boneca? — perguntou Anúbis olhando curioso para a mãe.

Aya começou então a tentar se soltar para ir para o chão, nem um pouco preocupada com a possibilidade de cair. Por isto, Anúbis apressadamente colocou-a no chão antes que acabasse de fato caindo. Com os deuses só olhando a fofura dela e as marias-chiquinhas pulando a cada corrida que ela dava, a garota foi até um cantinho onde, sobre um grande tapete típico egípcio, havia um amontoado de almofadas, travesseiros, brinquedos e uma grande bolsa, própria para carregar coisas de bebês, cor de pêssego com quatro animais fofos e sorridentes estampados, um leão, uma zebra, um macaco e uma vaca.

Sentada cuidadosamente nas almofadas, estava uma boneca de pano que certamente já tinha visto dias melhores. Era indiscutivelmente velha mas a aparência não mostrava de fato quão velha era, pois o passar do tempo havia sido magicamente reduzido para aquela boneca. Isso porque quando Aya pegou a boneca em suas pequenas mãos e estendeu para o pai, Anúbis reconheceu aquela boneca como sendo a que, tantos e tantos séculos atrás, uma garotinha chamada Merti havia lhe dado como oferenda.

Como encontrou ela?— perguntou ele. 

Na caixa. — explicou Aya.

— Ela e Ammit acabaram indo brincar num baú onde não deviam mexer e encontraram isso. - explicou Ruby em inglês se aproximando dos dois - Eu tinha deixado ela brincar mas… os outros disseram que você podia não gostar, que era uma boneca sentimentalmente importante.

Ouvindo a explicação de Ruby, Anúbis se agachou até ficar na altura da filha e pegou a boneca momentâneamente olhando-a com saudade e uma gota densa de tristeza. Tocando o tecido desgastado pelo tempo, ele notou que a boneca, apesar de velha, parecia bem e limpa, mas os sentimentos que aquela boneca lhe traziam eram mais fortes do que essa mera informação. Todavia, ele logo suspirou não se deixando levar pela vontade de chorar e olhou para a filha novamente.

Pode bincar com boneca?— perguntou Aya.

Duas outras meninas brincaram com essa boneca antes de você.— explicou ele voltando a conversa toda para o egípcio - Se eu deixar você brincar com ela, promete cuidar direitinho dela?

Prontamente Aya afirmou com a cabeça exibido um sorriso no rosto enquanto estendia a mão querendo receber a boneca de volta nos braços.

Eu botei ela pa dormir. — explicou a garota.

Muito bem.— disse Anúbis orgulhoso entregando a boneca para a garota que de fato a abraçou com muito cuidado como se fosse um bebê recém nascido.

— Está tudo bem mesmo? - perguntaram Julius e Osíris se aproximando falando baixinho para que Aya não escutasse, afinal a menina falava em inglês também - Se só não estiver conseguindo dizer não para ela… bem sei que isso pode ser difícil, podemos dar um jeito de tirar a boneca sem ela notar. Afinal a boneca também foi da-...

— Não precisa, está tudo bem mesmo. - respondeu Anúbis enquanto Aya se afastava indo na direção de Ammit, mas logo tinha sua direção trocada por Ísis que lhe chamava para guardar os brinquedos na bolsa cor de pêssego para que ela pudesse ir para casa.

O rumo da conversa acabou criando alguns segundos de silêncio enquanto Aya guardava os brinquedos na sua enorme bolsa apesar de seu interior também ter outras coisas, como roupas extras, mamadeira e comida. 

O Salão do Julgamento dificilmente era o melhor lugar para uma criança de 3 anos passar o dia enquanto os pais trabalhavam. Consequentemente, as vezes eles deixavam ela ali quando o Salão do Julgamento estava parado, outras vezes deixavam com Bastet e a avó de Sadie, que bem que precisava de uma companhia agora que o avô de Sadie havia morrido, e outras ela ficava Nomo Britânico com Bastet e brincando com os vários aprendizes de lá. Creches sempre foram uma opção, mas como todos queriam aproveitar o tempo com Aya um pouco, ninguém reclamou de recebê-la enquanto ela não tivesse que começar a ir para a escola, algo que mudaria na chegada do próximo ano letivo.

— Vocês estão mesmo conseguindo fazer os julgamentos por aqui? - perguntou Anúbis.

— Bem… - disseram Julius e Osíris com um suspiro - Mais ou menos. Estamos tentando mas… se quiser sair de sua aposentadoria será muito bem vindo. Não tem muita gente para julgar mesmo.

— Não, obrigado. - respondeu Anúbis com um pequeno sorriso.

— Imaginei que fosse dizer isso. - admitiram Julius e Osíris dando de ombros mas com um sorriso.

— Vão passar o Natal com Carter e Zia? - perguntou Ruby ansiosa e Anúbis afirmou com a cabeça enquanto Ruby já acrescentava outras perguntas - Como está Sadie? Já conseguiram ir ao médico? Nem tive tempo de perguntar hoje de manhã quando deixou Aya aqui… 

— Ela passou mal de manhã então ficou muito em cima da hora para ir para o trabalho, desculpe. Ela não está passando tão mal quanto na vez da Aya mas hoje de manhã foi exceção. - disse Anúbis com um sorriso calmo - Fomos à médica ontem e está tudo bem. Ela disse que ela está só de dois meses.

— Bem, ao menos Néftis burlou as regras e contou para vocês que é menino…  - disse Ísis soltando um suspiro e se aproximando segurando a mãozinha de Aya numa mão e a enorme bolsa cor de pêssego na outra.

Ísis então estendeu a bolsa para Anúbis que pendurou-a no ombro enquanto Néftis desviava o olhar envergonhada de ter sido desmascarada daquele jeito. Anúbis não deixou de notar, mas olhou para Aya que estava abraçada à sua nova boneca. Ela já tinha se soltado de Ísis levemente e ignorava toda a conversa e ficava ao lado de Ammit fazendo carinho na barriga da enorme devoradora de corações estava deitada com a barriga para cima sacudindo o rabo de hipopótamo de um lado para o outro como se fosse um cachorro. 

— Mais importante do que isso… ainda bem que já sabem feitiços para proteger tanto Sadie como ao bebê. - lembraram Osíris e Julius - Aliás… quando virem o Carter, pergunte quando vem algum filho dele também e peça para ele passar aqui mais vezes… Faz tempo que não aparece.

— Passarei o recado. - respondeu Anúbis olhando para Aya novamente e voltando para o egípcio - Aya, vamos? A mamãe pediu para a gente não demorar muito. Você vem brincar com a Ammit outro dia.

— Tchau Ammit. Tchau vovó. Tchau vovô. Tchau vovó. Tchau vovó. - disse a garotinha dando um tchau com a mão para cada um deles.

Depois de dar tchau para todo mundo, ser respondida com um toque na bochecha pelo focinho de crocodilo de Ammit e um tchauzinho de todas as suas avós e um sorriso de seu avô, Aya se virou para o pai e estendeu um de seus braços apenas, já que o outro segurava a boneca. Ele pegou ela no colo e tão facilmente como ele chegou no Salão do Julgamento, ele o deixou para trás e apareceu depois dentro do Nomo Britânico perfeitamente protegido do inverno por um sistema de aquecimento. 

Algumas risadas e conversas de aprendizes vinham de vários cômodos do Nomo, mas, mais importante que isso, Aya notou que a voz da mãe parecia vir da cozinha.

— MAMA! - gritou Aya ainda da sala já tentando sair do colo do pai.

Anúbis apressadamente colocou ela no chão e a garotinha imediatamente saiu correndo em direção a cozinha. Ao chegar lá, Aya encontrou Sadie conversando com Hannah que preparava um generoso macarrão com molho bolonhesa. Os anos tinham feito a adolescência passar para Hannah e agora a jovem, uma mera caloura na faculdade, também cuidava de muitas coisas no Nomo já que havia se tornado a mais velha e aplicada dos aprendizes. Quanto a Sadie, ela claramente não teve tempo de fazer muita coisa desde que chegou do trabalho, afinal ainda estava com as mesmas roupas ao invés de uma roupa mais confortável para ficar em casa. 

— Oi minha bonequinha! - disse Sadie se agachando e abraçando Aya enchendo-a de beijos que esmagavam suas bochechas fofas e rosadas - Desculpa que a mamãe não estar podendo te deixar e te pegar lá com o vovô e as vovós.

— Mama, olha! - disse Aya mostrando que era perfeitamente capaz de falar em inglês com a mãe e em egípcio com o pai - Ganhei uma boneca nova!

Não era nada muito incrível até ela conseguir usar os dois idiomas. Sadie e Anúbis tinham basicamente usado uma técnica que pesquisaram bastante sobre e era muito recomendada por casais de diferentes países chamada de “um pai, um idioma”. Basicamente, Sadie só falava com Aya em inglês e Anúbis em egípcio. Egípcio podia estar até muito bem morto em quase qualquer sentido possível, mas foi quase unânime, principalmente quando alguns deuses se intrometeram na votação, que ela tinha que ter ao menos aquele pedaço da antiga cultura egípcia.

Sadie parou o abraço para ver a tal boneca e não precisou olhar muito para notar que ela não parecia exatamente nova. Mas pelo menos parecia ter só no máximo 20 anos ao invés de milhares. Notando isso, ela trocou um olhar com Anúbis que havia seguido Aya até a cozinha e ele simplesmente deu de ombros para a pergunta silenciosa escondida no olhar dela.

— Longa história - respondeu ele.

— E tem alguma história que não é longa com você? - perguntou ela com um pequeno sorriso desafiador.

Assim, depois de um bom jantar, banho e alguns minutos na tv, eles foram dormir. Aya também não havia aguentado ficar acordada até o final do desenho e isso tornou bem mais fácil deitar ela no berço, que indiscutivelmente começava a ficar pequeno para ela.

Pensando em como Aya já estava perto de precisar de uma cama e como seria despejada do berço em alguns meses pelo novo irmão, Anúbis e Sadie se aconchegaram, cansados, nos cobertores quentinhos. O cansaço era tão grande que eles não demoraram nada para dormir e podiam sentir o corpo dolorido agradecendo pela maciez da cama.

Quando Anúbis e Sadie acordaram, já quase 11 horas, foram ao quarto de Aya e encontraram-na brincando com Bastet. Aya estava com cabelo solto e ainda de pijama enquanto, junto com Bastet, se empenhava em remontar as várias peças de plástico que montavam um trilho de trem de brinquedo enquanto a nova boneca de pano de Aya, sentada na cadeira de balanço, quase parecia assistir a cena.

Podemos colocar a ponte bem aqui para fazer o trenzinho passar por baixo…— dizia Bastet em egípcio ajudando a menina a montar as peças.

 - Bom dia. Acordaram cedo. - disse Sadie em inglês toda descabelada entrando no quarto.

— A mamãe que acodou tarde. - respondeu Aya em inglês.

— Mas olha… - disse Sadie rindo com a resposta - Alguém está inteligente e malandrinha demais pelo o que parece.

— Isso ela puxou de você. - disse Anúbis rapidamente dando um beijo na bochecha de Sadie antes de parar na porta ao começar a sair do quarto de Aya - Ela já comeu, Bastet?

— Vitamina de morango e panqueca. - respondeu a deusa gata.

Satisfeito com a resposta, Anúbis saiu do quarto para se preocupar com o almoço, já que haviam perdido o café da manhã mesmo. Sadie, por outro lado, ficou conversando e ajudando Aya a montar o trilho do trem. Com o trem pronto, a garota começou a empurrar, com sua pequena mão, a locomotiva pelos trilhos enquanto a boca fazia a trilha sonora de “chu chu chu” para o trem.

— Aya, a mamãe vai comer. - disse Sadie - Depois escolha com a Bastet quais brinquedos vai querer levar para a praia ok?

— Ok…- respondeu a garota se levantando do seu cantinho e pegando a boneca, a qual colocou sentado sobre um dos vagões do trem.

Se preparar para uma viagem, mesmo em situações ideais, não costumava ser muito rápido. Ter que levar uma criança de 3 anos junto deixava tudo mais lento ainda. Era muita coisa para pegar e às vezes surgia uma emergência de banheiro. Além disso, perderam alguns minutos tentando convencer Aya que a nova boneca dela ficaria mais segura em casa. Por isso, muitos minutos se passaram até que os três estivessem prontos para deixar a Inglaterra para trás pelos próximos dias. 

Enquanto a colega de trabalho de Sadie precisava de horas para ir em sua casa, pegar suas coisas, ir ao aeroporto e então ir para uma cidade litorânea no sul de Portugal, tudo que Sadie e Anúbis precisaram foram alguns segundos para deixar Londres para trás e surgir numa praia à vários e vários quilômetros de distância da Europa.

Era 23 de Dezembro, sábado, e muitos teriam vários dias de folga. A visita à Carter no Natal só seria feita durante a janta do dia 25, afinal, ele estava morando no Egito e por lá 25 de Dezembro não era feriado. Assim, Sadie, Anúbis e alguns outros viram naquele feriado levemente prolongado a chance de se reencontrar com alguns amigos. Considerando o inverno no hemisfério norte, Cléo teve a brilhante ideia de convidar alguns amigos para passar alguns dias na terra dela, o Rio de Janeiro.

Com um enorme calçadão com pedras brancas e pretas formando desenhos que pareciam ondas, Sadie, Anúbis e Aya haviam aparecido na entrada vazia de um prédio residencial virado para a praia de Copacabana. Felizmente eles haviam se vestido para o verão, pois o sol ali estava tão forte que até mesmo doía os olhos olhar para a areia branca cheia de turistas, barraquinhas, vendedores ambulantes e coqueiros.

— Nossa… eu não sei se eu vou aguentar esperar até amanhã para entrar nesse mar. - disse Sadie.

— Amanhã não! - pediu Aya no colo de Anúbis - Quero ir pa praia agora!

Agora o sol está ficando muito forte. — explicou Anúbis - Vamos encontrar Cléo, comer e vamos mais tarde, quando o sol estiver indo dormir. Tudo bem?

— Tá… — disse Aya não muito feliz com a ideia e, exatamente por causa do biquinho triste que fez, Anúbis ficou com dó e deu-lhe um beijinho na bochecha.

Esse é o endereço do Airbnb que a Cléo reservou pra gente? - perguntou Sadie virando-se para o prédio que eles tinham surgido em frente.

— Acho que sim. - respondeu Anúbis.

Sadie pegou o celular dentro da bolsa e checou rapidamente o endereço e a localização. Tendo confirmado que o lugar era o certo, eles entraram e passaram alguns minutos de mímicas e Google Tradutor tentando explicar para o porteiro qual apartamento eles queriam. Cléo havia avisado que tinha um porteiro e ele era o único motivo pelo qual eles não só surgiram do nada no apartamento, era melhor ele ver os três entrando no prédio.

Um elevador e um corredor depois, a família chegou diante do apartamento que eles queriam. O indicador de Sadie nem alcançou o interruptor e imediatamente a porta se abriu revelando o enorme sorriso de Will.

— Já estava achando que vocês não iam chegar nunca! - reclamou ele.

— Quando tiver um filho vai entender que nenhuma saída de casa, muito menos uma viagem, é algo que acontece muito rápido. - disse Sadie.

— Ah… estou doido para isso. - admitiu Will - Vão fazer só três meses que enviamos a papelada para adoção. Não tenho a menor ideia de quando vão responder ou sugerir alguma criança. Pode levar anos! Enquanto isso… deixa eu apertar as bochechas da Aya!

Para motivos de risadas da garota, Will imediatamente pegou ela do colo de Anúbis e começou a esmagar num abraço esfregando a bochecha na bochecha dela. A garota ria, mas ao mesmo tempo tentava se soltar. Nisso, Will colocou ela no chão e imediatamente o apartamento se tornou um campo de pique-pega.

Correndo com as marias-chiquinhas pulando e com um vestido fresco listrado unicamente com 7 grandes listras montando o arco-íris, Aya corria de Will desesperadamente rindo e gritando alegre enquanto ele fingia ser lento demais para pegar a garota. Numa clara tática de mestre, a garota se jogou no chão engatinhando apressada por debaixo das pernas de Nico, que estava largado no sofá com os pés sobre uma mesa de centro assistindo TV,  como se Will não pudesse simplesmente passar por cima das pernas do marido.

— Gostei do vestido dela. - disse Nico.

— Claro, vocês que deram. - disse Anúbis enquanto largava a enorme bolsa cor de pêssego de Aya sobre a mesa de jantar.

— Eu teria escolhido um parecido que tinha na loja e que era todo cinza mas Will insistiu que tinha que ser algo alegre. - disse Nico.

— Para de se fingir eternamente e completamente gótico trevoso pra tudo porque você topou o vestido arco-íris desde do começo. - disse Will com um sorriso interrompendo o pique-pega por um segundo enquanto Aya se escondia como uma bolinha entre o braço do sofá e a parede claramente transformando aquilo num pique-esconde.

— Então? O que acharam do apartamento? - perguntou Cleo logo ao lado da porta de entrada, mas indicando com a cabeça a enorme varanda com uma bela vista do mar.

— É lindo! - respondeu Sadie - Já disse antes e vou repetir, você foi sensacional em conseguir achar esse lugar para alugar por uns dias no meio do verão e em cima do Natal.

— Bem, eu poderia ter sido mais sensacional… - disse Cléo dando de ombros - Só tem três quartos. Queria ter achado algum com um quarto a mais e um berço para vocês terem um tempinho para vocês.

— Está tudo bem. - garantiu Anúbis.

— Ah, também fui no supermercado e comprei as coisas que pediram. - disse Cléo - Se demorassem mais ia ficar complicado, por causa do Natal.

— Cléo, você é um anjo! Me diz depois quanto estou te devendo, incluindo te receber tão bem assim na Inglaterra. Mas então… onde tá esse tal namorado novo, eim? - perguntou Sadie passando o braço ao redor dos ombros de Cleo - Vai nos apresentar?

— Ele tá tomando banho. - respondeu Cleo vermelha - Fomos para a praia mais cedo e voltamos cheios de areia.

Tanto a conversa quanto o pique-esconde continuaram até que o tal novo namorado de Cléo saiu do banheiro. Ele se chamava Daniel e era um rapaz nascido em Miami mas filho de brasileiros. Cleo e ele ainda não haviam namorado por tanto tempo para ele ficar sabendo de toda a loucura mágica que o rodeava no momento, então todos estavam tentando ser o mais normal possível. 

Quando a conversa acabou se concentrando em pedir uma pizza, o pique-pega também já tinha acabado. Nico havia deslizado do meio do sofá para uma das pontas pois agora Aya estava no assento do meio, de pé, segurando um copo para bebê repleto de suco de maçã. Logo ao lado dela, Anúbis estava sentado mais prestando atenção nela do que na televisão ligada apesar de que não parecia que Aya fosse cair. Will estava sentado no braço do sofá logo ao lado de Nico se apoiando um pouco nele e, no outro sofá que era menor e não ficava de frente para a televisão, Sadie e Cléo estavam sentadas com Daniel se apoiando por trás do encosto do sofá enquanto escolhiam uma pizza para pedir num aplicativo de comida.

— Vocês tem que experimentar a pizza de calabresa! - dizia Cléo - É maravilhosa! Tem gente que traduz pra pepperoni mas não tem nada a ver.

— Se parece com a de pepperoni então… - dizia Sadie pensando um pouco e ficando mais perto de Cléo para ver a foto da pizza no celular - essa carne é parecida com a de pepperoni? 

— Um pouco. - disse Daniel - É como… sabe a salsicha alemã? Pensa nela só que abrasileirada….

— Hum… não vou querer por hoje então. - disse Sadie com um sorriso torto pois a gravidez ainda era segredo para a maioria das pessoas e uma carne processada como uma linguiça calabreza não era uma boa ideia - Quem sabe outro dia. Mas podem pedir para vocês se quiserem. 

— Tio Nico… - disse Aya encarando a orelha de Nico curiosa e acabando por desviar a atenção dele da televisão - O que é… isso na orelha?

— São piercings. - respondeu Nico - É tipo brinco. 

— São novos… Quando colocou? - perguntou Anúbis ficando curioso com a conversa enquanto Aya chegava mais pertinho de Nico se apoiando no ombro dele para ver a orelha do mais perto possível.

— Antes de ontem. - respondeu Nico - Só não coloca o dedo tá Aya? Ainda dói um pouco.

— Tá. - respondeu Aya já encolhendo de volta o dedinho curioso que tinha esticado.

— E infecciona. - acrescentou Will - Não esqueça que não deixa de ser uma ferida aberta.

Imediatamente Anúbis pensou em porquê Will não tinha simplesmente fechado o furo com seus poderes como filho de Apolo. Não podia perguntar isso em voz alta pois Daniel não sabia de nada. Felizmente, Nico pareceu ter notado que essa pergunta surgiria eventualmente.

— Eu quero fazer outros furos ainda nessa orelha, mas o cara disse para fazermos por partes. - disse Nico - Então eu vou ter que voltar lá e o cara vai olhar como está a cicatrização desses furos.

— Entendo… - disse Anúbis compreendendo a parte não dita também, os furos não podiam parecer magicamente mais cicatrizados do que deveriam - Foi muito caro? 

— Um pouco até. - respondeu Nico - As peças custam mais que o furo dependendo do material. Tá pensando em colocar também?

— Talvez... - admitiu Anúbis aparentemente pensativo.

— Se quiser eu te passo onde eu fiz. - ofereceu Nico.

Já não tão interessada na orelha de Nico, Aya largou-se no colo do pai voltando sua atenção para o suco e para a televisão enquanto Nico mostrava a página do piercer que ele havia ido em Nova York. E assim, intercalando entre conversas e desenhos infantis na televisão, os minutos foram passando até que as pizzas chegassem. Com as pizzas em mãos, todos encheram a barriga e foram aproveitar o Rio de Janeiro.

Aya se empanturrava de sorvete enquanto visitavam o Cristo Redentor e já estava cansada de andar, constantemente pedindo colo, quando foram pegar o bondinho para subir o Pão de Açúcar. O plano inicial era ver o pôr do sol da praia de Copacabana, mas não tiveram tempo para isso pois, quando desciam o bondinho, o sol estava se pondo. Não era o que tinham planejado, mas também foi muito bonito. 

Todos eles voltaram para o apartamento depois de um bom jantar e dormiram muito bem durante a noite, até mesmo Sadie e Anúbis que tiveram bem menos espaço na cama já que Aya estava dormindo no meio dos dois. No dia seguinte, bem cedinho, todos foram aproveitar a praia de Copacabana. Era difícil para alguns deles imaginar uma véspera de Natal sem frio ou neve, mas lá estavam eles se banhando no mar, cavando piscinas na areia para Aya ou usando essa areia para construir um castelo de areia.

O costume dos americanos era um jantar especial no dia 25 de dezembro, mas os brasileiros simplesmente adoravam se reunir com a família na véspera de Natal e ficar acordados até virar para o dia 25. Cleo até convidou todos para passar a véspera de Natal com a família dela, mas eles se recusaram porque adicionar tantas bocas num jantar não era algo feito assim em cima da hora, também não queriam atrapalhar o momento em família. Assim, Cléo e Daniel eventualmente foram para as próprias festas de Natal, deixando Nico, Will, Anúbis, Sadie e Aya sozinhos para explorar o Rio de Janeiro.

Os cinco foram ao Jardim Botânico, no Parque Lage, e comeram perto do parque. Com o celular cheio de fotos e notando que as lojas, atrações e etc começavam a fechar conforme as pessoas iam passar a noite da véspera de Natal em família, eles compraram comida japonesa para viagem e comeram no apartamento ouvindo as ondas do mar batendo na areia da praia.

Cléo e Daniel só voltaram na manhã do dia seguinte, 25 de dezembro, todos se divertiram em ver Aya abrindo os presentes de Natal que magicamente estavam esperando por ela na sala. Alguns haviam surgido até mesmo sem Sadie e Anúbis perceberem enquanto eles arrumaram os presentes ali durante a noite quando Aya dormia. 

Havia presentes vindos de cada um dos integrantes da família e amigos mais próximos. Cada embrulho colorido aberto apressadamente revelava algum presente. Dois livros infantis, um coelhinho de pelúcia, um kit de massinhas Play-Doh para montar Pizzas de mentira com massinha, umas roupas e mais peças de trilho e acessórios para seu trenzinho de brinquedo.

Depois de um almoço leve, descobriram que havia uma rede que poderia ser posta na varanda do apartamento. Por causa do fuso horário, meio dia no Brasil significava que faltava uma hora para Carter sair do trabalho no Cairo, então Sadie aproveitou que tinha algumas horas para enrolar antes de ir para a casa do irmão e tirou uma soneca na rede com Aya agarrando-se a sua roupa, abraçando o novo coelhinho de pelúcia e babando nela enquanto sentia a dose brisa do mar.

Era uma tarde preguiçosa então não demorou muito para outras sonecas começarem pelo apartamento. Embora Anúbis também quisesse dormir, alguém tinha que preparar a comida para levar para o jantar com Carter e Zia. Sadie até se ofereceu para fazer, mas ele resolveu deixar ela com a honra da soneca. Como podiam usar a cozinha do apartamento, graças à ida ao supermercado que Cléo havia feito antes de eles sequer chegarem ao Rio de Janeiro, Anúbis tentou se aventurar na cozinha para preparar uma torta de nozes picadas, canela, açúcar e noz-moscada que Sadie estava com desejo de comer no Natal.

Ele não era o único que tinha que surgir com um prato para um jantar de Natal, Nico e Will iam passar o Natal com a família de Will no Texas, então eles acabaram se juntando para tentar fazer algo na cozinha. Em três as chances de dar algo errado eram um pouco menores, especialmente com eles usando mágica já que não tinha ninguém de quem esconder. Assim, depois de um tempo, Anúbis terminou sua torta que, apesar de ter ficado um pouco queimada nas pontas, parecia suficientemente boa e Nico e Will terminaram uma torta exatamente igual.

Depois da soneca, Sadie, Anúbis e Aya se arrumaram, pegaram a torta pronta, uma caixa de suco de caju que Cléo insistiu para que eles levassem para experimentar junto com Carter e Zia, algumas coisas de Aya, como seu novo coelhinho, e deixaram magicamente o Rio de Janeiro para trás.

A pequena família apareceu diante da porta de um apartamento no Cairo e, enquanto Sadie tocava a campainha, Anúbis, que estava com Aya no colo, a colocava no chão. Uma pequena arrumada no vestido xadrez vermelho e preto da menina foi necessária também, já que ele havia ficado um pouco torto. Logo em seguida, Carter abriu a porta.

— Feliz Natal, tio Carter! - exclamou Aya.

— Feliz Natal, Aya. - respondeu Carter sorrindo para a garota - Esse coelhinho é presente novo por acaso?

— É! - respondeu Aya.

— Acho que ele vai gostar também do presente que eu tenho para você. - disse Carter já deixando a menina animada - Quer ver?

— Quero! - gritou ela pulando alegremente.

— Vai lá dar “Feliz Natal” pra tia Zia e pede pra ela pegar pra você. - disse Carter tirando o corpo do caminho para aquele pedacinho de gente entrar na casa.

—  TIA ZIIIIIIA! - gritou Aya enquanto corria pra dentro da casa.

— Olha… dá pra começar uma competição de qual é o parente que mais mima ela. - disse Sadie fazendo Carter rir e dar de ombros enquanto os três entravam dentro da casa - Feliz Natal mano.

— É a única criança da família, o que esperava? - perguntou Carter.

— Você bem podia mudar isso… - pediu Sadie mas dando uma leve risada mostrando que estava brincando - Tem vez que é uma briga pra ver quem vai ficar com ela enquanto trabalhamos.

— Ah nem me fale disso. O pessoal da Casa da Vida e nossos pais não param de me encher com isso de ter um filho… toda essa coisa de herdeiro que parece até que estou num filme ou livro medieval. - disse Carter revirando os olhos enquanto entrava na cozinha para, aparentemente, continuar a fazer a ceia de Natal - Estou até evitando ir muito lá por causa disso. E daqui uns meses você vai ter outro bebê pra dividir as atenções deles mesmo.

— Até pediram para te perguntar sobre filhos e pedir para você ir lá mais vezes. - disse Anúbis enquanto botava a torta que ele fez na bancada da cozinha - Eu sinceramente só ia fazer a segunda parte.

— Pois é… sobre a primeira parte… - disse Carter suspirando e desligando o fogão - A não ser que algo mude no futuro mas… eu e a Zia conversamos e…. não queremos ter filhos.

— Não? - perguntou Sadie surpresa e Carter negou com a cabeça como se aquilo não fosse muito importante.

— Não. - disse ele dando de ombros - Mas não tive coragem de contar isso para ninguém ainda. 

— Alguma hora vai ter que contar para eles. - disse Anúbis - Isso se não já suspeitarem.

— Pois é… - concordou Carter com um suspiro.

— MAMAAA! PAPAAA!! OLHA!! - gritou Aya correndo pela casa surgindo na cozinha em seguida acompanhada de Zia e segurando nas suas mãos não só o coelhinho de pelúcia de antes, como também uma maleta que parecia ser de um kit veterinário de brinquedo - É um kit vetenário!

— Um Kit de Veterinário? Que legal! - disse Sadie.

— Viu? - disse Zia olhando para Carter - Eu disse que ela ia gostar.

Aya logo colocou o kit sobre a bancada da cozinha, mesmo que não alcançasse essa direito, e começou a abrir a maleta de plástico pronta para montar o consultório veterinário dela ali mesmo. Ao abrir, revelou-se que dentro da maletinha, além de todo o kit veterinário, havia também um pequeno cachorro de pelúcia para ser o primeiro cliente.

— Não não. Aqui não é lugar de brincar. - disse Sadie docemente pegando os brinquedos com uma mão e a mão de Aya com a outra - Vamos montar sua veterinária lá no tapete da sala. Tem bem mais espaço para você cuidar dos bichinhos lá.

Sadie e Aya foram para a sala de estar e começaram a montar o consultório veterinário, Sadie acabou se tornando a enfermeira da veterinária enquanto Aya usava todo o kit que ganhou para tratar machucados e doenças imaginárias no coelhinho e no cachorro de pelúcia. A televisão ligada acompanhava o som das conversas que cada vez mais se concentravam na sala conforme a janta ficava pronta.

Com a janta pronta, eles começaram a comer alegremente o que Sadie batizou de “a janta feita só pelos maridos”. Zia arranjou uma robusta almofada para ajudar Aya a ganhar uns centímetros a mais ao sentar-se à mesa enquanto Sadie cortava a comida de Aya e Anúbis colocava suco no mesmo copo para bebês que ela tinha usado no sofá ao lado de Nico outro dia. E como comer sozinha ainda era algo que Aya estava pegando o jeito, Sadie e Anúbis ficavam sempre checando com o canto do olho se a garota precisava de alguma ajuda.

— Como está o passeio ao Brasil? - perguntou Carter - Vão voltar para lá depois daqui?

— Sim. - disse Sadie - Quero aproveitar ao máximo aquele sol e calor. Está muito frio em Londres. Vamos ficar lá até amanhã.

— Inveja. - disse Carter com um suspiro - Estava hoje mesmo pensando em como é estranho o Natal não ser feriado. Assim… ao menos o Natal do dia 25 de dezembro. O Natal que eles usam é o copta, que é em outra data no começo de janeiro. Esse sim é feriado.

— O Natal e todas as suas complicações de data… - resmungou Anúbis - Eu particularmente ainda acho estranho comemorar o Natal. 

— É mais pela comida e ficar em família do que pelo lado religioso… - disse Sadie como se estivesse lembrando ele disso.

— Eu sei… - disse ele - É que eu não consigo parar de pensar que também é aniversário de Hórus e… sei lá… é meio estranho. Não que eu não goste de ficar em família, comida, presentes e tudo mais.

— Eu gosto do Natal. - disse Aya com a bochecha suja de molho de carne.

— O que você gosta mais do Natal? - perguntou Sadie pegando guardanapo e limpando a bochecha suja da filha.

— Tuuuuuudo. - respondeu Aya balançando as pernas que ficavam bem longe de sequer sonhar em tocar o chão. Sadie achou a cena particularmente muito fofa e olhou para Zia imediatamente.

— Sério que você não olha e fica com vontade de ter uma dessas coisas fofas? - perguntou Sadie.

— O Carter contou então? - respondeu Zia, não muito surpresa.

— Não vão contar pra ninguém né? - pediu Carter - Não quero que chegue aos nossos pais e até a Casa da Vida sem ser por mim ou pela Zia.

— Relaxa maninho. - garantiu Sadie - Vou te deixar toda a honra de ver eles surtando com isso. Espero que esteja preparado.

— Também espero… - admitiu Carter - Na verdade eu bem esperava que desse para empurrar eternamente isso com “estamos pensando” ou “estamos tentando” para poder evitar essa conversa. Devia ouvir como é Sadie, especialmente com a galera da Casa da Vida, parece uma conversa vinda direta da Idade Média ou algo do tipo.

— Bem, eles não podem obrigar você a ter um filho… mesmo se quisessem…. - lembrou Sadie - Então relaxe.

— Estou relaxado… - defendeu-se Carter - Na medida do possível ao menos…Mas vamos falar de algum assunto melhor. Tipo… Anúbis, quem sabe poderia me dar umas dicas… estou pensando em montar uma equipe da universidade para explorar Sheikh Abd el-Qurna.

— Não e sabe bem disso. Isso é… Luxor, né? - perguntou Anúbis - Perto do templo da Hatshepsut.

— É! Perto também do….- disse Carter deixando a frase no ar como se esperasse Anúbis terminar ela.

— Se isso é uma tentativa de fazer eu acabar falando sem querer algo que está lá perto que vocês não desenterraram ainda… - disse Anúbis.

— Não não... - negou Carter veementemente.

Uma conversa do tipo não era nenhuma novidade entre os dois e nunca Anúbis revelava nenhuma informação. Sobrava para Carter algumas fracas tentativas de pegar informações nas entrelinhas. Aquelas complicações de ser um egiptólogo tendo alguém que viveu no Egito Antigo como cunhado estavam presentes na longa lista de coisas bem diferentes para a maioria das pessoas mas que eram normais para eles já. 

Apesar de tão diferente que era toda a vida deles, tudo havia se transformado num estranho normal. Trabalhar, desaparecer do nada para ir buscar a filha no submundo depois de ela ter passado o dia com os avós, ter deuses e semideuses como familiares ou amigos, ficar preocupado com quais poderes, além de ver almas de cachorros mortos perdidos, sua filha teria, como proteger ela de usar eles sem querer ou acabar se machucando ou se assustando com eles … essas coisas faziam parte do normal deles, e tava tudo bem. 

Aquela vida cheia de magia, poderes, seres imortais e muita história antiga podia até ter seus perigos e peculiaridades complicadas de disfarçar, mas eles estavam felizes com ela e não a trocariam por uma normal e sem graça. Não estavam sozinhos, podiam encarar os problemas que surgirem pelo caminho e o histórico de problemas resolvidos provava isso. 


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Notas finais do capítulo

;A; NÃO CHORA GENTE! Não chora... mas acabou..
e é isso. espero q tenham gostado. estou mto mto mto mto mto feliz por terem chegado até aqui. muito obrigada à todos ♥

e lembre-se, se quiserem mais de Anúbis e/ou Sadie, tem as fic:

Os Deuses da Mitologia - https://fanfiction.com.br/historia/747866/Os_Deuses_da_Mitologia/

A Morte das Areias do Saara - https://fanfiction.com.br/historia/750415/A_Morte_Das_Areias_do_Saara/

ainda estão sendo escritas então, vejo vocês lá (espero) ^^'
beijos de luz e até a próxima fic ♥



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