O Sangue do Mestiço escrita por Júlio Oliveira


Capítulo 7
Sonho febril


Notas iniciais do capítulo

Bom dia e boa leitura ;)



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Edward Muller, Joseph e Muralha tomavam um singelo café da manhã. Enquanto o chefe optou por um forte café preto, os dois guardas comiam bolachas secas com um pouco de suco para acompanhar. A expressão de Muller era fechada como sempre, mas em alguns momentos ele ensaiava um sorriso ao lembrar que os possíveis assassinos de sua filha estavam presos, supostamente. Ainda assim, uma dúvida quanto a veracidade da culpa de seus algozes ainda o incomodava, mas o homem tentava ao máximo não demonstrar isso.

— Cadê o Rico? — Muralha questionou enquanto dava uma mordida em uma bolacha, soltando um estalo.

— Ele está meio mal — Joseph começou a explicar. — Aquela flechada machucou a coxa dele. Soube ainda que adoeceu, mas não deve passar de uma febre.

Os olhos de Edward ficaram arregalados por um breve momento, mas ele não proferiu uma palavra sequer. Muralha resolveu perguntar:

— Quais os próximos passos? Aqueles três parecem covardes demais para admitir um crime.

— Eles vão admitir, Muralha — Edward falou com seriedade. — Eu sei que vão.

Levantando-se da mesa, o chefe resolveu apreciar mais uma vez os quadros da família. Aquela imagem em que ele, sua esposa e sua filha estavam juntos apertava-lhe o coração. “Nunca terei isso de novo”, lamentou em pensamento. Quase que lágrimas alcançaram os olhos, mas ele as reprimiu. Lembrou dos possíveis responsáveis por sua solidão. Sim, eles deveriam ser punidos em nome de Jessica. “Quem sabe assim eu não sinta paz?”, foi o pensamento que percorreu o âmago do seu ser.

Entretanto, todo aquele momento de reflexão e memórias foi interrompido por um grito estridente advindo da vila. Era uma voz masculina carregada e dor e sofrimento quase que palpáveis. Aquilo fez com que Edward se arrepiasse. Ao mesmo tempo, Joseph e Muralha se levantaram de suas cadeiras assombrados. A vila, em sua pequenez, também ecoou aquele grito de horror para os mais variados ouvidos que ali viviam.

— Que diabos foi isso? — Joseph perguntou com a voz trêmula.

Muralha foi até a saída da casa e, abrindo a porta, espiou o lado de fora em busca de qualquer sinal da origem daquele tão terrível som. O grande homem logo viu uma movimentação próxima da pequena casinha de Rico, onde ele vivia com a esposa e seus dois pequenos filhos.

— Parece que foi da casa de Rico — Muralha informou.

— Meu Deus! — Joseph exclamou. — O que será dessa vez?

Com o coração batendo aceleradamente, Edward deu ordens para que os dois guardas descobrissem o que aconteceu. Ele mesmo os acompanhou. Enquanto atravessavam a pequena vila, era impossível não notar o olhar de medo e admiração que as crianças tinham diante de Edward Muller. Ele era uma figura única no local, com suas roupas chiques, mas sem perder a força e o poder que seu comportamento passava. As mulheres e homens olhavam ainda mais admirados ao ver que ele se dirigia à casa daquele homem feinho, o tal do Rico. O que diabos alguém poderoso como Edward faria lá? A verdade era: o senhor Muller estava realmente preocupado e curioso sobre o que poderia ter acontecido.

Finalmente chegando ao destino pretendido, Muralha abriu a porta de madeira sem a menor delicadeza e o trio logo adentrou a residência. Ela era simples, contrastando enormemente do luxo presente na mansão do chefe. Enquanto atravessavam a pequena sala com pouquíssimos móveis e nenhum adorno, eles ouviam os gemidos de dor que Rico soltava de seu quarto. Finalmente puderam visualizar a cena: deitado em uma cama de casal, o homenzinho suava como se estivesse num inferno fervente e a sua perna atingida pela flecha havia adquirido colorações estranhas. Era como se suas veias estivessem se tornando roxas e alargando. Sua esposa, sentada ao pé da cama, chorava intensamente enquanto observava o sofrimento do marido.

— Eu fiz de tudo — ela dizia enquanto chorava. — Mas nada adiantou. Ele só piorou cada vez mais!

A cena assombrou Edward. Rico, assim que viu o seu chefe e seus companheiros de trabalho, disse:

— Por favor, acabem com isso!

Ele gritava desesperadamente. Aquele era o extremo oposto do Rico tranquilo e despreocupado do primeiro dia. Era uma cena arrasadora, além de causar medo a qualquer um que a presenciasse. Com certa frieza, Joseph examinou a perna do pobre homem e concluiu:

— Aquela maldita flecha estava envenenada. Só pode ser isso!

Muller começou a sentir um calor subir pelo seu corpo. Era ódio e puro desejo de vingança. Aquilo era inaceitável.

— Quem atirou essa flecha? O indiozinho que está preso? — Edward questionou.

— Não — Muralha respondeu. — Quem atirou está morto. Era um mais velho.

Muller cerrou os punhos enquanto refletia sobre toda a onda de eventos recentes, ao mesmo tempo em que sentia pena do pobre Rico. O enfermo suplicou:

— Acabem com isso logo! Eu não aguento mais!

Dessa vez não foram só gritos. Rico tinha espasmos e quase que chegou a cair da cama, sendo segurado por Muralha. Edward olhou com tristeza para a esposa dele, que apenas acenou positivamente com a cabeça.

— As crianças estão no quarto delas — ela disse com tristeza. — Só faça isso do jeito rápido! Não aguento mais vê-lo sofrer.

E tornou a chorar. Muller se sentiu mal por ter que apelar para essa saída. Ele segurou brevemente o inquieto braço de Rico e disse:

— Isso vai acabar, eu prometo. E também prometo que você será vingado.

O homem deitado tentou esboçar um sorriso pela atitude de seu chefe, mas a dor vencia qualquer sentimento que pudesse se formar naquele momento. Edward então olhou para Muralha que, sem pestanejar, pegou um dos travesseiros da cama e começou a sufocar o pobre enfermo. Sua esposa chorava, mas ficou aliviada quando seu marido parou de se debater e se tornou apenas um corpo sem vida. Edward olhou para ela com seriedade e disse:

— Vou proporcionar um enterro digno para seu esposo. Ele morreu pela vila e por todos nós. Pode sempre contar comigo, senhora.

E, com aquelas palavras, ele se despediu da triste casinha. Muralha e Joseph sabiam bem que o trabalho funerário cairia para eles, então não tardaram de começar a trabalhar nisso. Enquanto isso, Muller refletia sobre quais deveriam ser suas próximas ações. “Alguma informação eles devem ter, o contrário não é possível”, refletiu o homem. Os três prisioneiros deveriam ser abordados novamente. Mas antes disso, Edward, do lado de fora da casinha, olhou para as pessoas que se amontoavam ali e pronunciou:

— Um irmão foi morto. Rico, um pai de família, nos deixou de maneira trágica e extremamente sofrida. — Homens, mulheres e crianças ouviam com tristeza cada palavra dita. — Ele foi assassinado. Sim, brutalmente morto por um nativo, assim como aconteceu com a minha Jessica! Isso tem que parar. O tempo de medo vai acabar e eu vou pôr um fim a toda essa violência. Isso eu prometo!

Longe dali e no momento em que o tal grito fora dado, não foram apenas Edward e seus guardas que foram alertados. Patwin, Richard e Adaky também despertaram com um grande sentimento de medo, como se estivessem prestes a voltar à odiosa prisão e a todas as torturas que ela representava. Mas não. Eles ainda estavam na confortável estalagem de Margaret Olsen. Graças a presença de Richard, filho da moça, Patwin e Adaky também puderam se esconder por lá. Ainda que ela tivesse apresentado certo temor quando viu o nativo, eles não podiam reclamar da gentileza dela.

Os três fugitivos dormiram em um quarto de hóspedes vazio, enquanto David permaneceu no quarto alugado. Patwin decidiu dessa maneira para “evitar suspeitas”, como ele mesmo disse para o garoto. “Não que vá adiantar muito”, pensou David, apesar de ter seguido as instruções do jornalista.

— Essa vila só piora — falou Richard assim que despertou.

Patwin não emitiu qualquer palavra. Acordou sobressaltado, mas logo parou para observar que tudo parecia seguro na estalagem. Adaky, por outro lado, estava encolhido, como se já aguardasse a severa punição que receberia. A porta do quarto foi rapidamente aberta pelo pequeno garoto de cabelos claros.

— Vocês ouviram essa desgraça? — David perguntou.

Patwin acenou positivamente com a cabeça, ainda tentando despertar totalmente. Adaky finalmente soltou algumas palavras:

— Eles estão vindo?

Sua voz era trêmula e claramente assustada. Patwin tentou se aproximar para acalmar o nativo, mas o jovem se afastou. Richard então disse:

— Por que viriam? Edward nem sabe ainda que estamos aqui. Imagino que o xerife ainda esteja mal da cabeça, o que é ótimo para todos nós.

— Sim — Patwin concordou quando finalmente se sentiu disposto para opinar. — Ainda assim, acredito que não vale o risco. Não só por nós, mas sua mãe também seria punida por nos dar abrigo. E, pelo pouco que conheço do Edward, não gostaria de ver ela recebendo culpa alguma.

Richard fez uma careta de nojo, como se tivesse sido ofendido.

— O que você acha que sou? Eu amo minha mãe, seu estúpido. Mas é fato que estamos numa vila idiota e não temos opção de lugar algum para ir. A não ser que você queira roubar um barco e fugir. Enfim, o fato é que estamos completamente encrencados.

Patwin riu ironicamente enquanto começava a juntar suas coisas. As palavras do estranho artista não mais o impressionavam. David e Adaky assistiam a discussão tensos.

— Você me disse que morava aqui há 23 anos — Patwin começou. — Estamos numa maldita ilha, garoto. Mas essa vila é só uma pequena parcela. Não faltam lugares para fugir, disso eu tenho certeza.

— Ah, claro — Richard se expressou jocosamente. — Quem sabe damos sorte e nos encontramos com um índio canibal!

Pat demonstrou incredulidade, tendo em vista que ambos estavam em um quarto com um índio da ilha. Adaky observava tudo, mas pouco parecia compreender. O medo e o trauma ainda invadiam sua mente violentamente. O jornalista iria começar a responder o artista de maneira menos educada, mas suas palavras foram engolidas quando ele viu a mãe do seu rival entrar no quarto.

— Acordados também? — Margaret parecia ter dormido extremamente mal, o que era totalmente compreensível em decorrência do contexto.

— Margaret — Patwin quis explicar. — Temo que não tenhamos tempo. É só questão de horas, ou talvez menos, para que Edward descubra que fugimos. Temos que sair daqui.

— Eu imaginei. Por sorte preparei alguma comida para vocês levarem para onde quer que forem.

A mãe de Richard aparentava estar serena diante da desesperadora situação. Aquilo, de certa forma, chegou até mesmo a acalmar Patwin. O fato é que ele estava vivendo uma onda de tragédia e sofrimento desde que chegara naquela maldita ilha. Em seus pensamentos, o jornalista até mesmo chegava a tripudiar seu objetivo primários: conhecer mais suas raízes. “Aonde você me levou, pai?”, ele se questionava incredulamente.

— O que o mestiço não sabe, mãe, é para onde devemos ir. Ele quer nos levar para o meio do nada! — Richard se opôs.

— Bem — a discreta voz de Adaky finalmente foi ouvida por Margaret. — Existe um lugar: a tribo.

“Que ideia ridícula”, pensou o artista. David acompanhava tudo com tensão, sem saber como se posicionar. Já Margaret engoliu seco quando ouviu a ideia do nativo.

— Você acha, Adaky? Depois de tudo, será que nos receberiam bem? — Patwin perguntou.

— Eu irei com vocês. Eles não atacam irmãos ou aliados — explicou o jovem.

O silêncio imperou naquele pequeno quarto. Ninguém esperava por aquela solução, nem mesmo Patwin. Solução? Mesmo com o objetivo de encontrar uma tribo próxima de seu pai, aquele não era nem de longe o contexto imaginado pelo mestiço. Ele estava vivendo um pesadelo.

— Sem chance! — Richard protestou. — E depois? Ficamos vivendo como animais? Sem arte, sem conforto, sem vida?! Essa é a ideia mais idiota que alguém poderia pensar!

— Cale a boca, Richard!

A voz foi dura e inesperada. Margaret estava insatisfeita com o comportamento do filho e sabia que, diante daquela situação, algo deveria ser feito, ainda que não fosse o ideal.

— Eu conheço Edward Muller e sei que ele é um completo desgraçado. Isso é um fato. Se ele acha que você fez algum mal à filha dele, Richard, ele com certeza irá acabar com você. Ficar aqui não é opção — declarou a senhora.

O artista ficou sem reação diante das palavras da mãe. Patwin assentiu com a cabeça enquanto coletava suas coisas e as colocou em sua pequena mala. David, observando tudo, gesticulou para que o mestiço o seguisse. A trajetória do pequeno garoto foi encerrada quando adentrou o quarto onde estava originalmente hospedado. Lá dentro, começou:

— Devemos levar tudo? Digo, o quão longe é essa tribo? Pode não ser a melhor opção.

Patwin deu uma risada melancólica antes de fechar a porta e, finalmente, revelar seus pensamentos:

— Você entendeu errado, David. Você fica — Pat falava de maneira serena, ainda que fosse perceptível um certo pesar em sua voz. — Não quero colocá-lo em risco. Fique com o dinheiro e, em caso de emergência, fuja. Sempre deve ter alguém no píer com um bom barco, acredito.

— Que estupidez! — David soltou suas coisas com espanto e raiva. — Vai fugir com dois desconhecidos? Ou melhor, duas pessoas bem suspeitas? Isso é uma ideia idiota, Pat. Perdoe minha sinceridade, mas é como penso.

Patwin deu uma gargalhada enquanto observava o pequeno garoto inflar o peito para tentar se equiparar a sua altura.

— Parece inteligente eu levar você para uma tribo? Pense, David. Eu sou um mestiço, sou semelhante a eles. Você tem a cara de um europeu, por Deus. Além do mais, ficando aqui você poderá encontrar mais informações. Vamos, raciocine comigo: essa vila não é comum. Existe muita coisa estranha acontecendo e sejamos francos: a morte dessa Jessica Muller está longe de ser resolvida. Deve haver alguma pista, algum sinal. Eu não poderei ver isso lá da tribo, mas você pode descobrir um mundo de informações estando aqui — o jornalista sorria enquanto dizia aquilo para seu amigo, tentando incentivá-lo como podia. — Você já provou que é capaz de coisas incríveis, David. Nos tirou sozinho da delegacia, como que pode? Eu não esperava, mas você se mostrou muito maior do que sua altura pode revelar. Fique aqui, esteja seguro e descubra o que estiver ao seu alcance. Eu não pretendo ficar na tribo para sempre.

Após o extenso discurso, o pequeno David se viu sem uma resposta à altura. “Odeio admitir, mas ele tem completa razão nessa”, pensou o garoto. Não haveria opção: ficaria na vila e buscaria mais informações. “Espero continuar sendo útil”, refletiu.

Enquanto isso, em outro quarto da estalagem, um resoluto Richard dava uma última olhada em algumas de suas obras remanescentes. “Os malditos levaram meus melhores quadros”, pensou. Aquilo revoltava o jovem artista. Era como se tivessem roubado parta do seu ser, parte da sua própria alma. Ainda assim, não faltavam papéis, rabiscos e pequenas pinturas naquela colorida desarrumação. Richard pôde dar uma última checagem com um misto de raiva e saudade. Ele ficava a imaginar como seriam os próximos dias em que não poderia sequer tocar em um pincel ou um lápis. “Um tédio, certamente”. Ainda assim, também não se via muito disposto a encarar uma tortura advinda das mãos do odioso Edward Muller e seus capangas. “Aquele velho covarde vai pagar pelo que me fez e pelo o que me tirou. Ah, isso vai”, passou por sua cabeça enquanto finalmente se despedia do seu quarto e ateliê.

Prontos para sair da estalagem, os três fugitivos transitavam entre sentimentos distintos que se misturavam entre um momento e outro. Havia o medo de serem pegos, o medo do sangue e da tortura. Mas o alívio se fazia presente: estavam em território amigo e logo mais estariam longe dos olhos de seus algozes. Havia ainda um sentimento de curiosidade, exploração e aventura. Sim, apesar de todos os males e tragédias, Patwin tentava de alguma maneira pensar em como excitante poderia ser conhecer uma tribo por dentro. “Não tem como dar errado estando com Adaky”, pensou, sendo esse pensamento logo interrompido quando o mestiço lembrou que tudo deu muito errado da última vez.

— Tomem cuidado — recomendou Margaret.

Ela claramente tentava esconder a preocupação, de maneira que não piorasse os sentimentos que seu estranho filho sentia naquele momento. Pat percebeu isso e logo tratou de falar:

— Estaremos juntos e não demoraremos. Quero muito acreditar que Muller vai largar essa loucura.

— Haja fé, homem — respondeu a senhora enquanto entregava os alimentos preparados.

Daquela maneira, o trio finalmente se despediu daquele confortável e aconchegante lugar. David, de longe, olhou mais uma vez para seu amigo Patwin com preocupação e certo pesar. Diante de tantas mortes e pessoas perigosas, será mesmo que o jornalista teria chance de sobreviver? “O que passa na cabeça dele?”, refletiu o pequeno. O fato era que nada ele podia fazer, a não ser cumprir com o que prometeu. David estava disposto a fazer de tudo para descobrir qualquer coisa que pudesse ajudar seu amigo e retirá-lo daquela situação. “Sim, eu consigo”, buscou palavras confortantes em sua cabeça.

No ponto de destino do trio, a tribo também se organizava em torno de uma ideia. Mahpee e Macawi ainda discutiam toda a questão da recente violência apresentada por parte dos brancos. Como agir? O que fazer? O debate já havia desgastado ambos, mas uma decisão precisava ser tomada.

— Eu mesmo irei até a vila. Irei sem armas, em demonstração de boa fé — propôs Macawi.

Mahpee riu jocosamente do homenzinho e respondeu sem medir palavras:

— Você é um tolo, Macawi. Tolo por querer dialogar com esses monstros e mais tolo ainda por pensar em fazer isso sem armas. O que acha que irão fazer contigo? — Mahpee temia o mal que seu irmão de tribo poderia sofrer.

— Eu posso acompanhá-lo — disse uma voz forte e feminina.

Mahpee olhou para o lado com certo espanto, tendo esse sentimento ampliado ao reparar que se tratava da sua filha, a forte e bem preparada Eyanosa. A nativa trazia consigo um bom arco, uma aljava cheia de flechas e ainda uma lança deveras afiada. Já estava pronta para qualquer combate e, como todos na tribo bem sabiam, seu talento nessa área era inquestionável.

— Não pretendo permitir que minha filha também seja enviada para a morte — Mahpee censurou.

Macawi não sabia bem o que dizer: conhecia Eyanosa e sabia de seu espírito forte, do seu talento para a caça e da sua impaciência. Seria ela realmente uma boa opção para acompanhá-lo? O índio imaginava se ela não poderia causar um incidente, gerando mais mortes e sofrimento para os envolvidos.

— Você ouviu Macawi. Ele não pretende lutar e tenho certeza que suas palavras serão bem pronunciadas, mesmo para os homens da vila. Mas não custa nada que eu o acompanhe, mesmo que nas sombras para protegê-lo caso algo saia do controle. Não sou eu que serei enviada para a morte, pai, mas todos que cruzarem nosso caminho com intenções malignas — Eyanosa demonstrava um olhar de pura determinação e confiança. Não parecia mais a garota assustada de outrora, quando presenciou a discussão durante seu ápice após a morte de Wohali. — Confie na mulher que você criou.

Mahpee ficou calado após aquela declaração, mas seus pensamentos eram de puro orgulho em relação a sua filha. Ela realmente puxara a ele e tinha um espírito aguerrido, sem medo e explorador. Lembrava-o quando jovem. Com um sorriso discreto no rosto, ele finalmente falou:

— Não posso dizer “não” diante de tais ideias. Não podemos arriscar perder Macawi, ao mesmo tempo em que confio plenamente em seu talento, Eyanosa. Façam o que deve ser feito, mas lembrem-se de uma coisa: esses homens não são confiáveis.

Macawi ainda permanecia calado. Continuava a pensar se a garota seria uma boa companhia para uma missão puramente diplomática. Ainda assim, não podia criticar a força de vontade dela e o evidente esforço que ela empreenderia para defendê-lo caso tudo fosse por água abaixo. Sim, iria confiar em Eyanosa.

— Vamos — Eyanosa sorria enquanto ouvia tais palavras saírem da boca de Macawi. — Teremos uma longa conversa com os homens brancos.


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Notas finais do capítulo

As coisas estão esquentando em Roanoke e não haverá uma só pessoa que escape dos eventos que estão por vir ;)



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