Matsu escrita por Zatanna


Capítulo 5
Quinto — Futatabi


Notas iniciais do capítulo

Olá! :)
Esse capítulo tá o que cês queriam ver mesmo. Assim, real.



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O mesmo ocorreu quando uma figura apressada surgiu no corredor.

Quem vinha não a tinha percebido, mas ela sentiu todo o seu mundo parar por um segundo. Ou havia sido seu cérebro? A jovem não sabia reconhecer a diferença, talvez nem quisesse.

  Os cabelos de Kohaku estavam maiores, alguns fios das longas madeixas caíam para frente, respingando mais água ainda sobre o quimono branco com detalhes esverdeados, quase transparente por estar completamente encharcado. Diferente de outrora, a roupa parecia ser extremamente nobre e ia até os calcanhares. O rosto tinha perdido o formato infantil e ganhado um traço mais maduro e másculo, tanto quanto os olhos verdes sob as sobrancelhas mais grossas do que antes.

Chihiro quis gritar e chamar pelo nome da pessoa que almejava, mas a voz se perdeu no fundo da garganta. Enquanto isso, o rapaz estava prestes a passar por ela, sem nem sequer saber de sua presença, sem parecer nem lembrar de sua existência, como se estivesse sumindo, aos poucos, da mesma maneira de quando chegou no mundo dos espíritos anos atrás.

Rogou, como se rezasse para todos os deuses de todas as culturas, por alguma solução, cerrando as pálpebras fortemente. Sabia que a culpa poderia ser da emoção e da dúvida pela a espera, mas preferiu encontrar qualquer pessoa, que não fosse ela, para responsabilizar. Qualquer um serviria, inclusive Kohaku. Entretanto, sempre que precisasse, a sua obaa-san disse que a ajuda viria e uma saída seria encontrada.

Como havia cumprido no passado, Zeniba não agiu de modo diferente dessa vez.

Exatamente debaixo da janela, Kohaku parou de andar. Uma estranha sensação se apossava do homem dragão, como se algo necessário estivesse ali; invisível aos olhos, mas imponente sobre a alma.

O coração que batia em seu peito pulou enigmaticamente. Uma. Duas. Três. Ele não passava por aquilo fazia anos e não entendia a razão para estar ocorrendo o mesmo naquele momento. Até, finalmente, encarar o chão.

Um elástico arroxeado fez com que engolisse em seco. O tom se tornava fosco por um instante; no outro, brilhava incessante. Com o objeto entre os dedos e um olhar espantado, Kohaku levantou a cabeça o suficiente para encarar a janela semiaberta.

Era uma leve dobra, porém era capaz de ver uma mão feminina segurando-se no parapeito, quase que imperceptivelmente, para não cair. Sua mão estava meio coberta por uma manga branca, que o rapaz não sabia identificar.

Seu corpo inteiro tremeu enquanto apertava aquele elástico.

— Quem está aí? — sussurrou quase como se contasse um segredo.

A moça, surpresa, abriu as pálpebras, revelando a outra extremidade da janela, a que não apoiava as costas. Seu corpo, todo endurecido, sentiu o peso da culpa recair nos ombros femininos.

Era por seu medo que não conseguia gritar por ele; também pelo mesmo sentimento que não conseguia abrir uma fresta sequer da janela. Recordou-se de seus momentos mais temerosos, que mal conseguia olhar para o lado sem desejar gritar.

— Quem é você?

A voz soou de novo, como se pedisse por algo inalcançável. Ela temeu que a impossibilidade estivesse na reação de Kohaku quando se revelasse, porém, havia chegado até ali.

Por que desistir agora?

Sem muita força de vontade e explodindo por causa dela, ao mesmo tempo, as emoções mais felizes e as mais tristes que poderia surgiram. O amor que nutria e o medo de não ser correspondida; a esperança de vê-lo sorrir e a decepção ao observá-lo descrente. Tantas sensações e sentimentos provindos de algo que nem sequer tinha acontecido.

Mas poderia.

Ela conseguia evitar aquele encontro por mais tempo? O seu coração clamava por ele tão profundamente quanto seu cérebro precisava que respirasse. Era, no final das contas, involuntário – como todo desejo.

Subiu completamente a janela, apoiada por seu braço. A moça demorou muito tempo para fitar Kohaku, sem conseguir desviar o seu olhar da parede branca à sua frente. Aquele instante foi o suficiente para perder as expressões mais honestas do garoto.

A jovem vestia uma roupa simples de colegial, um casaco alvo particularmente felpudo, que não parecia fazer parte do uniforme, e uma saia rósea, quase na metade das coxas.

Kohaku pensou que nem mesmo os quimonos mais exuberantes fariam qualquer mulher estar mais bela do que Chihiro naquele momento. Os lábios dela estavam prensados um no outro e toda a forma infantil deu espaço a uma sedutora mulher que não parecia perceber seus atrativos.

Os olhos esverdeados iluminaram-se a cada fração de segundo, tentando entender o que Ogino Chihiro fazia ali, tão próxima de si que poderia ser capaz de tocar. Ele entreabriu os lábios para dizer alguma coisa.

Mas nada saiu.

No instante seguinte, percebeu que finalmente a moça o fitava de volta. Nenhum dos dois se importou com os segundos e minutos que transcorreram, fixando-se em observar o que o tempo tinha feito com os dois.

— Eu.

Disseram no mesmo instante, sem concluir qualquer linha de raciocínio. Engoliram em seco e pensaram começar de novo, abrindo os lábios, de novo, juntos. Riram sutilmente, sem deixar que a risada virasse gargalhada.

Sem deixar aquela tensão de reencontro desaparecer.

— O que faz aqui? — sussurrou o jovem, depois de alguns minutos em silêncio. — Perdendo-se em um mundo novo?

— Sim.

A resposta foi simples, porém com tantos significados que poderia ser interpretado de mil formas. Kohaku somente notou a ambiguidade quando viu o rosto avermelhado da mulher acima de si, com menos do que a sua altura em forma de dragão.

Ele também estava se perdendo, pouco a pouco, no olhar dela, nos lábios e nos cabelos. Em sua fraqueza e sua ânsia por beber pelos olhos, não conseguia dar um passo para frente ou para trás, com medo que fosse uma miragem prestes a desaparecer.

— Eu acho prudente que eu desça, não?

A questão dela o pegou desprevenido, fazendo-o piscar duas vezes. Dessa forma, Kohaku conseguiu voltar um pouco para o mundo em que estava seu corpo, raciocinando em que lugar ela se encontrava e as razões para que isso tenha ocorrido.

— Fique — retrucou suavemente, dando um leve sorriso de quem estava livre de uma maldição. — Confie em mim, aparecerei do outro lado em menos tempo do que poderá perceber.

Chihiro contou nos dedos o minuto que passou, percebendo que nada impediu o rapaz de entrar, mas algo o impossibilitava de ir até ao seu encontro. Contudo, não conseguia ver a expressão dele, virado para a porta.

Kohaku percebeu que, definitivamente, não sabia como agir com a Ogino. Não sabia que palavras ceder, que conforto lhe dar e nem como segurá-la sem sentir todo seu corpo estremecer. Seu coração estava tão acelerado e sua mente tão perdida em frases clichês que demorou quase sessenta segundos para finalmente mirar como ela tinha conseguido chegar até ali.

Riu de leve, não tão surpreso como deveria estar com a engenhosidade dela. Sempre foi criativa demais, boa com os amigos e em situações de risco. O olhar dele percorreu-a mais uma vez, agora perdido por toda a menina que, claramente, havia se tornado uma mulher.

Na infância, havia sido mais fácil lidar com o que sentia ao ver Chihiro porque os sentimentos eram puros como as nuvens e a libido uma brisa leve, sem pensamentos luxuriosos que misturavam o amor doce e a paixão tenaz, sem desejá-la além do toque nobre e do afago gentil.

As bochechas, tanto quanto todo o resto do corpo, do jovem dragão esquentaram enquanto se aproximava da escada de objetos. Sussurrou algumas palavras mágicas bem baixo, mas foram suficientes para que cada mesa, cadeira e bandeja retornasse ao seu lugar de origem.

Chihiro continuava no mesmo parapeito, esperando uma oportunidade de descer. Ela mordeu os lábios, pensando em como se sentiria nos braços de Kohaku. Debaixo, ele pensou na mesma coisa, porém não teve coragem para encará-la até pedir:

— Eu vou segurar você, pode vir.

A voz saiu tão baixa que a moça achou que ele não tinha dito nada, mas sabia que sim. Seu corpo, outra vez, não se moveu e se sentiu estúpida por hesitar tanto. Ela não aguentava mais a mesma atitude.

Ela precisava fazer algo além de esperar.

Empurrou-se, aproveitando as mãos no parapeito para tomar impulso. No entanto, não sentiu mais nenhum receio quando percebeu que Kohaku a segurava com tanto zelo quanto os homens fariam com diamantes. As mãos dele arrastaram-se por suas costas, segurando-a com carinho e cuidado; os braços dela se penduraram acima dos ombros, temerosa com a queda e enlaçando-o pelo pescoço.

Não tinha chegado tão perto de um garoto em toda sua vida; nunca esteve tão à vontade ou próximo de um corpo feminino. Cheios de incertezas e seguranças com os sentimentos e as razões um do outro, nenhum dos dois teve coragem de questionar algo, muito menos de afastar-se.   

O tempo tinha passado para seus corpos, mas seus corações pareciam não ter sentido um minuto sequer. As memórias de Chihiro, todas voltaram em sua forma mais nítida e crua.

As lembranças de Kohaku salvando-a também.

Tudo voltou. Ela se sentia completa, finalmente encontrou o que estava esperando e procurando por todos aqueles anos. Não era Kohaku que procurava para completá-la, mas a si mesma, perdida dentro dele.

Perdida nos sentimentos que ele poderia despertar nela.

Antes que pudesse se conter, enroscou-se ainda mais nos braços masculinos, maiores e firmes, mesmo que tremessem. Tão diferentes e iguais ao mesmo tempo, abraçaram-se fortemente. Sentiu a fragrância única de chuva molhada nas longas madeixas, as roupas úmidas não a incomodavam, porque seu corpo estava quente o suficiente para secá-las.

Os braços dele a envolveram de volta, espremendo-a sem machucá-la. Kohaku inalava o cheiro floral dos cabelos femininos, sentia a pele macia que tocava a sua e passeou com o nariz pelo pescoço delgado, inspirando até os pelos do pescoço de Chihiro eriçarem.

Os dois se encararam por um tempo, as emoções transbordavam em pequenas camadas. Desde os lábios entreabertos até os narizes encostando suavemente. A boca se entreabriu mais um pouco quando Kohaku finalmente tocou os lábios de Chihiro, que fechava os olhos sem comando.

Primeiro, vagarosamente, apreciando o toque e a respiração que se encontrava e se perdia. Não muitos segundos depois, as mãos ávidas da menina subiram vertiginosamente à direção das madeixas negras, puxando-o para mais perto enquanto ele a tocava na boca sem mais nenhum pudor, somente com urgência.

As bocas mais se perdiam do que se encontravam, a língua mais lambia do que se enroscava, porém, em cada segundo que passava, as mãos apressadas começaram a tocar nos lugares mais íntimos, os lábios acertaram o compasso e um encontrou o outro, mais do que antes.

Talvez, mais do que nunca.

O suficiente para ambos tremerem com um gemido uníssono de quem ansiava por mais, porém sabia que ainda havia obstáculos a superar.


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Notas finais do capítulo

Eu quero saber se gostaram, se acharam muito apressado o fato deles se beijarem, matutei isso por muito tempo - cinco minutos muito longos - e pensei que a espera dos dois foi tanta, a ânsia maior ainda (como vocês vão ver pela parte do Kohaku, nos próximos capítulos, inclusive), daí perguntei aos universitários (mamãe) e expliquei tudo, ela disse "caramba, como tu enrola, garota" e eu "ué". O diálogo acabou e ela disse que estava tranquilo. Aí vocês me dizem se passou a sensação de ter sido apressado ou não. Eram para ser sete páginas, mas não dava para fazer assim, no supetão, se a Chihiro nem lembra de nada do mundo dos espíritos.

Confesso que eu só queria acabar também, foi outro motivo que me fez perguntar a mamãe, inclusive, porque eu tava achando que não foi apressado, mas para quem quer acabar, engana a si mesmo. Aí vocês dizem.

E sim, calma, ainda tem mais capítulo porque não é porque eles se beijaram que vão ficar juntos, não é mesmo? Sim, que nem o textão daqui, esse textão que vocês estão vindo ler parece que não acaba.

Enfim, o título de hoje foi "Futatabi". É um advérbio que significa: de novo, mais uma vez, uma segunda vez. Eu pensei em colocar "kurikaesu", que tem o significado de "repetir, fazer algo de novo", porém, se eu usasse esse verbo, poderia ficar ambíguo com a cena do beijo. Eu resolvi não arriscar. Vocês podem me dizer se a escolha foi boa, porque acho que se ver de novo, mais uma vez (quase que com desespero, né), faz mais sentido.

É isso aí.
Beijos. :)



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