— 926636759 — já era o milésimo número que Joaquim dizia ser o de seus pais.

Davi tentou ligar e adivinha? Número inexistente... de novo. O homem suspirou e perguntou:

— Nenhum de vocês sabe o número dos seus pais? Mesmo? Ou vocês não querem que eles os encontrem? — Os meninos ficaram calados. — O que é que tá acontecendo?

— Pessoal — disse Samuca —, acho que é hora da gente contar a verdade...

A princípio, nenhum dos três teve coragem de falar. Até que Joaquim disse:

— Eu menti. Eu disse que sabia o número dos nossos pais, mas eu não sei. E o Samuca e o Téo também não sabem.

— Por que não disseram isso antes? — Perguntou Davi. — A gente pode tentar pesquisar.

— Não. — Disse Téo — A gente não pode.

— Por quê?

— É que... o Joaquim mentiu mais do que você pensa. — Respondeu Samuca. — Quer dizer, todos nós mentimos. Não sabemos o número dos nossos pais porque eles não existem.

— Como assim? Vocês são órfãos? Não fugiram de casa?

— A parte que a gente fugiu de casa foi verdade. — Explicou Joaquim. — Eu só não disse que a nossa casa era um orfanato... Ah e aquilo que eu disse sobre a gente ter fugido ontem de manhã também era mentira. A gente já tava há uma semana na rua. Desculpa!

— Meu Deus... — Davi ficou muito confuso, ele não imaginava nada daquilo. — Olha, vocês vão ter que voltar! Qual é o telefone do orfanato?

— Olha, não vai dar não. O orfanato já tava pra fechar quando a gente fugiu. Por isso fomos embora, a gente não queria ser mandado para orfanatos diferentes.

E agora? Se os meninos não ficassem com Davi, teriam que voltar para a rua... Ele nem conseguia pensar direito e ainda estava atrasado para o trabalho!

— Meninos, eu tenho que trabalhar agora. Vocês podem ficar um tempo aqui sozinhos? Quando eu voltar, a gente tenta resolver essa situação... Samuca, você fica no comando.

— Ei, mas eu sou mais velho! — Exclamou Joaquim.

— Tá, então pode ser você. Não se preocupem que eu volto antes da hora do almoço!

***

Tia Flora havia acordado e as Chiquititas foram falar com ela. Disseram tudo o que pensavam sobre como era importante que fossem à escola, que era um direito de toda criança, mas não tinha jeito. A tia achava que era um absurdo uma escola ser tão longe e tão cara como a que as meninas estudavam e que a educação não devia ser comprada. De uma certa forma, ela até tinha razão, mas os pais das garotas sabiam que um ensino bom como o daquela escola era difícil de encontrar, principalmente em escolas públicas.

Porém, como a realidade das meninas agora era outra, elas consideraram a possibilidade de estudar numa escola pública. Sandy não achava a ideia nem um pouco atraente, mas sabia de sua situação. Além disso, algumas escolas públicas são realmente boas, é só saber procurar. Entretanto Tia Flora não estava nem um pouco interessada em sair procurando escolas para as meninas. Disse que, do jeito que a escola cara delas era exagerada, elas já deviam saber coisas o bastante para entrarem na faculdade. Depois de dizer isso, ela saiu para fazer compras.

— Então é isso? A gente não vai mesmo pra escola? — Eleanora perguntou, retoricamente.

— Que injustiça! — Disse Janete, que já não estava com raiva, mas triste.

— E se a gente tentasse se matricular sozinha?

— Não dá! — Respondeu Sandy. — Um adulto tem que fazer a matrícula.

— Tive uma ideia! — Disse Janete. — E se nós mesmas procurássemos uma escola pública perto de casa? Aí a gente só pedia pra Tia Flora fazer a matrícula, ela não teria nenhum trabalho e não ia precisar pagar!

— Boa ideia, Janete! — Exclamaram Sandy e Eleanora ao mesmo tempo.

Então as meninas foram procurar na internet as escolas públicas mais próximas de onde elas moravam e ler comentários de pessoas que matricularam seus filhos nessas escolas para saber o que achavam do ensino. A melhor que encontraram foi a Escola Estadual Dom João do Nascimento.

***

Clipe musical: "Pequeno Cidadão" por Joaquim, Samuca e Téo.

***

Davi não havia deixado os meninos totalmente sozinhos, ele pediu para a senhora da casa da frente ficar de olho neles, caso acontecesse alguma coisa. A vizinha não entendeu de onde ele tinha tirado aqueles meninos, mas também não questionou. Ela ficou cuidando das rosas de seu jardim, e, de vez em quando, dava uma olhadinha na casa de Davi. Mas ela só via parte de fora da casa.

Foi uma péssima ideia Davi ter aceitado que Joaquim ficasse no comando! A casa estava um caos! Como aqueles meninos conseguiam bagunçar tanto? E eles só ficaram sozinhos por umas duas horas. Samuca morria de medo de que Davi ficasse decepcionado com eles. Samuca devia mesmo ter ficado no comando, apesar de que Joaquim provavelmente ia dar um jeito de comandar...

Quando Davi chegou, nem reconhecia a própria casa. Sua única reação foi gritar:

— JOAQUIIIM!!!

Os meninos ficaram realmente arrependidos pela bagunça! Eles nem tinham se tocado (só o Samuca) de que, se Davi cansasse deles, poderia muito bem expulsá-los de sua casa. Graças a ele, os meninos puderam jantar e dormir muito bem. Para a sorte dos Cuecas, Davi aceitou suas desculpas, mas eles tiveram que arrumar toda a casa.

Depois, Davi disse que havia conversado com uns amigos e todos achavam que o melhor a se fazer era procurar um novo orfanato para os três. Eles ficaram assustados, mas Davi assegurou que eles continuariam juntos. Então ele e os garotos foram pesquisar orfanatos com vaga para três meninos.