Prólogo

A ruiva mordeu o lábio inferior, provavelmente pela milésima vez na noite e releu tudo o que havia escrito. Riscou algumas palavras do pergaminho que se encontrava à sua frente e apoiou a pena que usava até segundos atrás na mesa. Lily não estava completamente satisfeita com seu trabalho, porém sorriu de qualquer forma para si mesma antes de soltar um suspiro baixinho.

Releu, mais uma vez, o pergaminho levemente rasurado que trazia tanto alívio à ruiva. Era tão bom colocar aqueles pensamentos para fora!

LISTA DE METAS DE L.M.E.

Estando no sétimo e último ano em Hogwarts, eu, Lily Marie Evans, aluna da Corvinal, deixo aqui registrado minha lista de metas para cumprir antes do fim do ano letivo:

Matar uma aula da professora Minerva Mcgonagall;

Tomar chá com o Sr. Hagrid;

Pregar uma pegadinha;

Ficar de detenção pelo menos uma vez;

Ir a um jogo de Quadribol;

Andar na Floresta Proibida durante à noite;

Ir a Hogsmeade escondida;

Voar no campo de Quadribol à noite;

Ir a algum baile acompanhada;

Gritar o mais alto possível na Torre de Astronomia;

Me apaixonar (?);

Viver (?).

Sorriu mais uma vez, feliz com o resultado. Ela sabia que muito provavelmente não cumpriria nem ao menos metade daquela lista (talvez ir a algum jogo de Quadribol, o que não seria de fato, difícil), mas era tão bom escrever tudo aquilo. Sendo tão solitária e quieta durante todos os seus anos naquela escola, era difícil fazer memórias. As melhores recordações que a ruiva tinha naquele castelo se resumiam a poucos momentos com seu ex-colega, Severus Snape e elogios de seus professores. Então, não era proibido sonhar com algumas possibilidades, certo? Era o que ela pensava.

Por ter ficado tão concentrada na lista, não fazia a menor ideia da quantidade de tempo que havia passado ali, sentada na biblioteca. Não que fosse algo incomum, já que aquele lugar era como seu próprio dormitório, visto que Lily passava mais tempo ali lendo e estudando, que em qualquer outro lugar do castelo.

Olhou novamente em volta, buscando algum indício de que horas seriam. Provavelmente ela já havia perdido o jantar, mas não estava com fome naquela noite. O local se encontrava praticamente vazio, exceto por um ou dois estudantes, que estavam organizando suas coisas para saírem. Droga, ela ia chegar ao dormitório depois do toque de recolher do castelo, se demorasse mais algum minuto ali parada. E mesmo que a ruiva quisesse uma detenção (assim como estava escrito em sua lista), não achava essa uma forma muito emocionante de a conseguir.

Apressadamente, Lily pegou sua mochila que estava depositada com cuidado em cima de uma cadeira vazia e começou a guardar seus pertences. Guardou as penas, a tinta e o resto de pergaminho que havia sobrado de suas anotações e seu livro de Transfiguração. O outro livro que tinha em mãos não cabia na mochila, então ela o apertou firmemente contra o peito antes de enfiar de qualquer jeito sua lista dentro dele. Analisou rapidamente o lugar em que se encontrava sentada até aquele momento em busca de qualquer objeto perdido que fosse seu e ao constar que havia pego tudo, começou a andar com pressa para fora da biblioteca, apertando seu livro mais forte contra o peito. “Sem distrações, Lily. Você deve ter alguns minutos ainda para chegar lá” pensou a ruiva, ao enxergar a porta do lugar à sua frente. Em pé e com os olhos atentos, Madame Pince encarava os alunos que saiam sem pressa da biblioteca com tédio no olhar e os braços cruzados em frente ao peito. Lily sorriu para ela, que apenas balançou a cabeça e retribuiu com um sorriso pequeno, enquanto a garota saia com pressa do local, praticamente correndo em direção às escadarias.

Lily gostava de estar na Corvinal. Ela se lembrava da forma como o Chapéu Seletor havia ficado indeciso com ela (Grifinória? Ora essa, ela jamais saberia de onde ele havia tirado isso!), mas ficou feliz com a escolha final dele. A única coisa que a incomodava, nesse momento principalmente, era a distância de seu salão comunal até a biblioteca. Tendo em vista que os corvinos passavam mais tempo na biblioteca que em seus dormitórios, parecia óbvio para a garota que a localização de algum dos dois não estava certa, mas ela deixou isso de lado naquele momento.

Esse era um de seus aspectos favoritos em sua personalidade, embora a fizesse viver distraída: a forma como seus pensamentos estavam em mudança rápida e constante, e como ela pensava coisas demais em um espaço de tempo curto demais. Talvez esse fosse o motivo decisivo para o Chapéu Seletor escolher a Corvinal ao invés das outras casas, embora a garota não tivesse total certeza disso.

Distraída demais pensando sobre o quanto faltava para chegar em seu dormitório (alguns lances de escadas e corredores), Lily nem ao menos notou que alguém vinha com pressa na mesma direção que ela, igualmente distraído. Os dois só perceberam a aproximação quando era tarde demais para se desviar ou sair do caminho um do outro, então a colisão entre Lily Evans e James Potter foi absolutamente inevitável.

O livro que a garota carregava apertado contra o peito caiu no chão produzindo um baque alto no corredor vazio e ela pensou que seu destino seria o mesmo. Porém, as mãos do garoto a ajudaram a se estabilizar e ela soltou um suspiro de alívio, ignorando totalmente sua timidez e o fato de um garoto desconhecido (não tanto assim, afinal, quem não conhecia James Potter?) estivessem segurando seus ombros com firmeza para ter certeza de que ela não iria cair.

— Merlin, você está bem? Me desculpe, eu estava distraído — ela assentiu, afastando-se do garoto. Ele pareceu acordar de sua distração, porque abaixou as mãos e deu um passo para trás também, olhando-a com atenção. — Você se machucou? O livro acertou o seu pé? — ele perguntou ainda preocupado, o que fez a ruiva arquear a sobrancelha e negar. — Graças a Merlin. Seria terrível se tivesse acertado… — a sobrancelha de Lily se arqueou mais ainda e ele deu um riso extremamente sem graça. — Digo, por ele ser tão grande e tudo mais…

Lily assentiu novamente e James tirou as mãos de seus ombros, percebendo finalmente que ainda segurava a garota. Ela se abaixou para pegar seu livro (que realmente era muito pesado e havia caído aberto no chão) antes que James oferecesse ajuda ou dissesse mais alguma coisa. Que situação embaraçosa! Lily não fazia ideia se devia dizer algo para o garoto... Mas ela não tinha tempo para pensar nisso naquele momento. Estava atrasada. Muito atrasada.

Arregalou os olhos, pensando no horário. Porcaria, ela já devia estar no dormitório! E estar sozinha com um garoto em um corredor vazio, provavelmente já após o toque de recolher, não era exatamente o correto. E, novamente, não era exatamente dessa forma que ela esperava arranjar uma detenção.

A ruiva levantou rapidamente com o livro em mãos, ajeitando sua mochila que estava pendendo de seu ombro com pressa e saiu andando rápido, praticamente correndo, sem dizer uma palavra ao garoto. James continuou parado encarando-a com um pouco de choque no olhar. Quando ela já estava a bons metros de distância dele, ouviu um “Ei!” alto, o que só fez ela andar ainda mais rápido.

E enfim, ela chegou ao seu destino. Esperou a Águia fazer sua charada e a respondeu, revirando os olhos, extremamente impaciente. Lily subiu para seu dormitório aliviada, sorrindo para suas colegas de quarto (as quais nem ao menos conhecia direito, embora dividissem o quarto há tanto tempo) e sentou-se em sua cama. Deixou sua mochila no chão e tirou seus sapatos. Abriu o livro que havia derrubado (e se sentiu um tanto mal por nem ao menos ter agradecido ou respondido James Potter, embora ele tivesse sido gentil com ela) e suspirou, começando a procurar sua lista, determinada a rasgá-la em milhares de pedacinhos. Ela quase havia surtado só pela possibilidade de ser pega fora de seu dormitório depois do toque de recolher, era impossível que fosse cumprir qualquer uma de suas metas (mesmo a do Quadribol, porque a ruiva morria de medo de um balaço a acertar) então para que se enganar? Não era muito justo com si mesma.

Lily Evans não havia nascido para viver grandes aventuras e ela sabia muito bem disso. A garota era muito boa no estilo pacífico de vida que vinha levando desde sempre, sem arranjar nenhuma confusão, então não parecia muito certo deixar tudo isso de lado para cumprir algumas metas idiotas. Pelo menos naquele momento, ela achava que não.

Folheou o livro com impaciência, procurando pelo maldito pergaminho e nada. Chacoalhou, balançou e folheou o livro mais vezes, atraindo até mesmo a atenção de suas colegas. Uma chegou a perguntar se ela estava bem, o que ela respondeu com um sorriso sem emoção, assentindo.

Ela sentia o nervosismo crescendo em seu peito, fazendo suas mãos suarem, folheando com mais calma, procurando a lista com atenção. Sem sucesso, mais uma vez.

Finalmente desistiu, colocando o livro em cima da sua mesa de cabeceira e suspirou longamente, passando as mãos pelo rosto.

Só esperava que ninguém encontrasse a lista. Ela podia ter caído em qualquer lugar, já que estava distraída e apressada demais para perceber, então não tinha nem ideia de onde começar a procurar ou do que fazer naquele momento. Suspirou mais uma vez, levantando-se e indo vestir seu pijama.

De nada adiantaria ficar se sentindo nervosa por isso agora. Talvez fosse até melhor que ela tivesse perdido a lista! Vai ver, alguém a encontrasse e decidisse viver aquelas experiências por ela. Isso seria bom, Lily pensou, ao terminar de pentear seus cabelos ruivos. E ela não se importava por seu nome estar naquele papel, já que ninguém naquele castelo a conhecia, de qualquer forma.

Suspirando ao se deitar, Lily fechou os olhos, pensando em como seus próximos meses em Hogwarts seriam. Afinal, seu ano letivo acabaria em breve…

E ela não sabia o que esperar disso.

***

Enquanto isso, do outro lado do castelo, James Potter encarava o pedaço de pergaminho que estava em suas mãos com a testa franzida. A ruiva que ele havia esbarrado tinha saído correndo tão rápido que ela nem ao menos tinha ouvido quando ele a chamou, para devolver o papel que havia caído de seu (enorme) livro. Sem saber o que fazer, ele foi para seu próprio dormitório pensativo, tentando se lembrar do nome da garota.

Com toda certeza, já havia a visto pelos corredores e algumas aulas, mas não conseguia lembrar do seu nome. Então, depois de cumprimentar os Marotos, sentou-se em sua cama, tirou seus sapatos e abriu o pergaminho curioso. Leu-o com agilidade e sua testa acabou ainda mais franzida, mas o maroto acabou esboçando um pequeno sorriso ao chegar ao fim da lista. Ele sabia o nome da garota agora, mas tinha outra dúvida em mente.

Deitando-se sem nem ao menos se trocar, desejando boa noite aos amigos, James ficou ali observando as cortinas de sua cama, curioso e pensativo.

“Quem é você, Lily Evans?” perguntou para si mesmo, antes de fechar os olhos.