Sempre ao seu Lado escrita por Aquela Trouxa


Capítulo 38
Capítulo 34 ➳




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Sempre ao Seu Lado 

↠ .Cole. ↞ 

 

 Carlisle havia dado um jeito de silenciar a maior quantidade de bipe que há nessa sala; em geral, todos os ouvidos de extraordinária extensão sensorial agradeciam. Ele havia me dito, antes de eu entrar, que as máquinas mais importantes não tinham essa opção, mas qual delas não era tão importante para a Lee naquele momento? 

Era perturbador ver tantas coisas necessárias para funções fisiológicas que eu desconhecia. Até o mínimo e impensável precisava de auxílio naquele momento; e isso é, tudo o que compõe a Amberli, nesse caso.  

Olhei para a estante abarrotada de livros de diferentes linguagens e assuntos, como se eu já não estivesse enjoado de olhar para ela diariamente. 

 Me ouvi suspirar. Desviei meu olhar para o meu foco principal. 

O corpo da mulher da minha vida se mantinha inerte em mais uma manhã. Nos primeiros instantes daquele fatídico dia, a palavra “agoniante” não tinha o teor necessário para expressar o que eu senti no momento em que compreendia meus sentimentos e emoções junto com o lobo e a mistura indescritível da minha ligação com a Lee. 

Ela estava atordoada de dor, com medo e confusa. Foram as últimas coisas intensas que senti vindas dela naquela madrugada, antes de ser anestesiada. Ou pelo menos era essa maneira que eu preferia acreditar. 

 

 Estremeci com as lembranças vívidas em minha mente, e não deixei de encarar o corpo dela a minha frente. Todos os segundos que meus olhos passavam sobre ela, uma esperança gloriosa me atingia, e me dava a certeza de que a Lee acordaria; pois ela tinha sonhos, vidas e um futuro para trilhar. Um futuro que eu espero ansiosamente em participar. Encarei mais uma vez seu rosto adormecido; seus olhos são mantidos fechados por faixas autocolantes por algumas horas todos os dias, o tubo de respiração que ocupava sua boca e todos os infinitos apetrechos necessários que eram equipados nela, as enormes agulhas fincadas na pele delicada de seu pescoço, os tons variados de novos hematomas pelas perfurações constantes e rompimento de pequenas veias... É como um show de horrores particular, e o chorinho da Helena se fazia presente a todo instante, era meu constante som de fundo, a todo o santo momento. Uma agonia à parte. A pequena bebê também era, em geral, nossa preocupação em segundo plano. A criatura não parou de chorar desde que nasceu e segundo Edward, sua mentalidade era reprimida, o que dificultava, e muito. Se ele que era o único que saberia nos dizer com convicção os motivos que levam a menina não parar de chorar, não consegue entender os motivos, quem dirá nós

 

 — Ela é uma garotinha insistente. — comentei com ninguém em especial. Mas no fundo desejando que Amberli pudesse de fato, me escutar. 

 

Me recostei sobre o tecido da poltrona que havia ali desde aquele dia, revivendo minhas boas memórias desde que ela estava muito melhor do que nos últimos dias. Meus olhos ardiam por dentro pela angústia de querer tê-la bem e saudável perto de mim novamente, e como algum tipo de anestesia, meu cérebro rebobinava todos os segundos, em mínimos detalhes, estupidamente precisos e perfeitos para que eu pudesse me confortar por meio deles. Algo dolorosamente anestésico. Difícil de entender, mas apaziguador de se fazer. Isso acontecia com tanta frequência, que não havia nenhuma necessidade de eu fechar os olhos para visualizar melhor. Não havia motivos para isso, minhas memórias eram perfeitas, mas ainda assim prefiro não olhar para o seu corpo estendido sobre a maca, enquanto meus pensamentos metralham com exatidão esses momentos. 

 Me preparei para o momento, puxei uma longa respiração, soltando o ar com calma e olhei esperançosamente na direção do meu grande amor, antes de fechar meus olhos, permitindo-me a relembrar. 

Para falar a verdade, eu não gostava nem um pouco de me permitir a fazer isso, mas era inevitável. 

 

                                                       Tudo estava aparentemente bem. 

 Amberli estava um misto de emoções, como de costume; nisso eu não poderia deixar minha preocupação crescer, eu estive ao máximo de tempo possível ao seu lado, desde o momento em que a encontrei com o vestido xadrez da noite anterior molhado, evidenciando meu perfume ao redor de seu corpo, até os últimos minutos após o método pouco convencional de escolher um nome a uma criança; inevitavelmente eu tive que partir, havia mais ocupações para mim entre o vínculo de Ilwaco e La Push que precisavam de atenção nesse início da semana. Precisei mesmo ir. 

 Minha mãe estava em sua casa, o que era o esperado, mas algo na sua ligação no momento em que dirigi para o acostamento da rodovia assim que saí do território dos Cullen, não me deixou tranquilo. Ela estava agitada por conta da sua sensibilidade espiritual, bem mais do que durante aquela manhã, chegando a se embaralhar entre nossa língua e o inglês. Através da chamada eu consegui assegurar de que a Lee estava bem, eu não poderia dirigir para a sua casa no momento, eu estava indo para o porto e isso não era uma escolha, houve algumas divergências nas últimas contagens dos desempenhos pesqueiros marinhos e ninguém além de mim poderia se posicionar diante dos associados para apresentar uma resolução num prazo de vinte e quatro horas.  

Deixei meus receios da vida de lado naquele momento e assumi as minhas responsabilidades com a minha empresa entrando em contato com Embry e Mark, que já me aguardavam, providenciando todo o histórico semanal que tínhamos para que houvesse a reparação e recontagem, eu ainda teria que contatar a terceirização vinculada à essa parte e pedir o adiantamento de sistemas da minha empresa num nível de medidas emergenciais. Ficamos em conexão até altas horas da madrugada e assim que a maior parte já estava em andamento eles puderam se desligar. Naquela mesma noite eu deixei meu carro na garagem e cumpri meu horário de ronda com o Leovanni até ao final da manhã, e pela primeira vez em muito tempo; me senti verdadeiramente aliviado em não deixar mais o lobo contido dentro de mim. Aquelas horas passadas foram tão estressantes, que eu me mantive duas vezes mais tenso do que a situação causava porque eu estava mantendo o controle tanto da situação com os meus empregadores, quanto com o lobo encolerizado dentro de mim. 

  As horas daquele dia passaram voando, a companhia do Leo foi essencial e esclarecedora em diversos aspectos e convergências da minha racionalidade com o meu Eu Lobo, a meu ver eu estava muito bem; muito melhor do que há meses atrás, porém pela visão dele naquele dia em especial havia algo naquela mescla de sentimentos e emoções em mim. Para ele, estavam muito mais sensitivas, fazendo-o se questionar se havia alguma influência das emoções da Lee irrompendo ali também. Eu não soube o que dizer. 

 Passei toda a tarde agrupando as documentações regulamentação portuária, e anexos de revisões na companhia de Embry e outros colaboradores tripulantes e portuários, ficamos atentos a cada introdução registradas nas últimas semanas; deixei que Embry tivesse ajuda do Carl e a colaboração de Mark por videochamada para administrarem num consenso, as possíveis diferenças que afetariam o andamento e negociação das grandes possibilidades financeiras multilaterais que eu já havia tido progresso durante todos esses anos exclusivamente apenas com o comércio marítimo e pesqueiro. Não podíamos retroceder justamente agora. Mark poderia ter um infarto se isso acontecesse. 

 Quando todas as possíveis documentações, registros e simuladores estavam a nossa disposição, eu pude ser encaminhado pelas diretrizes municipais de Forks a fazer a apresentação de provas e condutas da minha responsabilidade mercante juntos aos patrocinadores legais vinculados a mim. Não tirando os créditos de apuração ligados a empresa terceirizada com a minha empresa.  

Embry me convenceu a deixar meu carro bem estacionado em casa, para que fossemos juntos ao local informado, eu sabia que ele estava atento às minhas reações e deixei que suas ações de irmão sobressaíssem sobre mim naquele momento. Ele me distraiu durante todo o caminho, comentando eventualidades do seu casamento e sua desenvoltura em ser pai para Kaylee, foi nesses instantes que ele segredou o desejo mútuo de que tanto ele, quanto Rebecca estarem novamente na fase tentante. Em breve teriam mais uma criança. 

 Durante a reunião, mesmo diante da minha tensão pobremente mascarada, agimos de acordo com as diretrizes e expomos os depoimentos excessivamente importante relatados nos sistemas e o que estava ao meu alcance para ser apresentado aos meus patrocinadores e colaboradores internos e externos, de modo geral. Nós teríamos que aguardar o veredito, até o manifestar individual da empresa vinculada em propagar o resultado colhido. Eles apresentaram um prazo que varia entre dois à dez dias, mesmo em circunstâncias emergenciais como esta. 

A frustração pela resposta final ser resultada em espera me dera a impressão de que eu estava inflando de ódio por dentro, sendo pressionado em cada poro do meu corpo. Minha vontade era de sair detonando todos os carros que eu pudesse ver pela frente, na porrada. Embry não se limitou nas ações; me conduziu a um ambiente mais distante dos demais e deu um jeito de por minha cabeça no lugar sem que eu rosnasse consternado pela necessidade de extravasar os intentos do Lobo. Ele dirigiu até a minha casa me direcionando numa visão de sucesso ante as circunstâncias imprevistas do sistema portuário, quando estávamos próximos de Forks, ele acabou perguntando por Amberli, em resposta apenas disse o que eu sabia sobre ela, nada mais e nada menos. A reação das minhas emoções ante aos sentimentos de não ter contato com ela me deixou ainda mais impaciente. Eu não via a hora de sair do carro para externalizar os reclames do Lobo. 

 

 

 

↣ ↢ 

 

 

 

 Quando me desvinculei do corpo lupino, minha mãe já me esperava nos fundos da minha casa, era provável que ela estivesse por ali há algumas horas. Suas mãos estavam encolhidas sobre seu tórax, suas roupas eram peças que ela só usava quando havia alguma festividade do ciclo ancião e sua inseparável bota de tricô. Sua expressão evidenciava a preocupação que pressentia, por um momento pensei que ela inundaria minha casa com incensos, chás ancestrais e diria frases difíceis e religiosas, mas ao invés disso ela apenas mencionou Amberli, nada mais. Durante a primeira hora na companhia dela eu fiz e respondi tudo o que estava ao meu alcance mesmo que eu não estivesse entendendo suas intenções. Minha mãe manteve o diálogo todo apenas em uma língua e nas poucas vezes que eu a respondia em inglês, seu rosto expressava falta de compreensão, sua cabeça pendia minimamente para um lado e após um breve silêncio ela repetia a mesma frase e esperava pela resposta.  

 Só depois ter reagido assim três vezes foi que eu pude entender o que estava acontecendo: minha mãe estava sendo guiada pelos Espíritos Guerreiros e só eu que não entendia. 

 Sua versão mística era bem mais autoritária do que ela mesma, com poucas palavras exigia e fazia acontecer o que era da sua vontade; não que ela se transformasse em outra pessoa, mas havia algo divino na maneira que as sílabas soavam de sua boca que não faziam parte dela em si. Era bonito poder presenciar algo que antes só ouvíamos de histórias passadas, minha mãe era a alma que mais evidência a verdade do sangue quileute para toda a tribo, ela não era só respeitada pelos lobos, mas por todos os indígenas residentes tanto em La Push quanto nas ilhas vizinhas. 

 

— Filho. — me chamou, senti que estava aproximando-se de mim. Ergui meus olhos para a sua figura, suas mãos unidas a frente do corpo seguravam as alças da sua bolsa artesanal de tiras de palha, e os olhos brilhantes estavam fixos em mim — Eu esqueci algumas coisas minhas em casa, você poderia me levar até lá para buscar? — fez o pedido estendendo as chaves do seu carro para mim. 

 

Aquiesci, pondo-me em pé, juntos caminhamos até a garagem e partimos para a sua casa. Antes que eu pudesse destravar o cinto de segurança para entrar junto com ela, sua mão me impediu e ela me garantiu de que seria breve ali dentro, não precisando da minha companhia para isso; então aguardei pelo seu retorno dentro do carro mesmo e quando, momentos depois ela saiu da casa, trancando-a, eu saí do carro e abri a porta para que ela pudesse entrar.  

Quando chegamos na minha casa, minha mãe pediu para que eu ficasse nos fundos, para falar a verdade, ela ordenou com autoridade para que eu ficasse nos limites do terreno de casa, eu sequer contestei, apenas pedi para que ela me mantivesse informado de tudo que pudesse ver ou sentir. Ela apenas assentiu, pediu meu celular e me despachou para fora de casa. 

Deixei minhas roupas num canto coberto ladeado ao canteiro abandonado que tinha ali e deixei que o lobo assumisse parcialmente o comando. 

Alguns dos meus irmãos que faziam ronda se questionaram quando perceberam que eu estava ativo ali entre eles, desviei meus pensamentos deles para prestar a atenção a o que minha mãe fazia dentro de casa, suas mãos se ocupavam numas multitarefas entre manter o celular em sua orelha esquerda e manusear um recipiente com algum líquido, para o centro das grades de ferro dos queimadores do fogão, possivelmente ela estava colocando uma chaleira cheia de água para ferver e discando para alguém; eu ainda não poderia saber quem era, já que a pessoa não tinha atendido ainda. Deitei-me com o abdômen sobre a relva, estendendo as patas para frente olhando para a minha casa com atenção. 

 

Algum problema, Cole? — a voz de Jacob chiou através do falante do celular que estava nas mãos da minha mãe; Era o meu celular. Apertei meus olhos, dobrando minha atenção sobre minha mãe dentro de casa, quais eram seus motivos? 

 

— É a Franchesca, Jake. — o informou em nossa língua nativa. Ele a respondeu na mesma língua com surpresa e interesse, houve os cumprimentos automáticos e logo ela direcionou a chamada ao foco principal — Eu sei que meu filho pode me ouvir da distância que ele está agora, mas..., eu preciso que você se transforme daqui a uns quarenta minutos. 

 

Algum motivo em especial? — ele sondou. 

 

— De mim, sempre haverá um motivo... — lhe garantiu, andando de um lado ao outro na cozinha. Pude ouvir a água borbulhar dentro da chaleira, e suas mãos foram diligentes em desligar o fogo, ouvi também potes serem destampados e ingredientes adicionados à água e misturados nela. —... Logo irá começar, e preciso que você o detenha daqui, hãn... Uns quarenta minutos. 

 

 — Deter o quê, exatamente? — pude imaginar claramente as sobrancelhas grossas dele pesarem sobre seus olhos. 

 

Minha mãe hesitou por um momento. O som baixo de sua respiração saindo pelas abas nasais predominaram ao redor do ambiente interno abrigado contra a chuva. Tanto eu, quanto Jacob aguardamos por sua resposta. 

 

— Renesmee te avisou de algo? — ela quis saber, sua pergunta quebrou totalmente a tensão que parecia existir em mim. Não que isso tenha sido o suficiente para que eu ainda desconfiasse das suas palavras inconclusivas. Minha mãe sabia de algo, ela só estava ganhando tempo com isso. 

 

Ness? — ele a chamou. Sua entonação deixava subentendido a pergunta por trás do seu chamado. 

 

Eu só fiz um favor para a minha mãe naquela noite. — pude ouvir sua voz bem ao fundo da ligação. Um barulho contra o microfone do aparelho que ocasionou um chiado — Levei meu pai para um lanchinho, eu estava com fome. — sua voz saiu mais alta e clara, ela havia pegado o celular — Aí ela aproveitou para visitar a Amberli. 

 

O lobo grunhiu, querendo saber os motivos que levariam Isabella Cullen a pedir para a filha dar um chá de sumiço no pai para que ela pudesse ter o livre acesso à Lee. Me senti inquieto e culpado por ficar tantas horas longe dela, mas não havia o que ter sido feito. O lobo expulsou o ar para fora de seus pulmões, as orelhas giraram atentas ao que acontecia dentro de casa. 

 

— Por quê? — o som suave da voz da minha mãe exigiu uma resposta. 

 

Ah!, — estalou a língua contra o céu da boca — Ela precisava conversar algo sério com a Lee. Eu só sei que ela está em monitoramento desde anteontem, pouco tempo depois do Cole sair. Ela até passou algumas horas de bobeira com a gente na sala, mas quando eu saí, ela estava indo fazer mais exames. E minha mãe foi para lá agora à tarde. 

 

Isso já explicava muita coisa que eu sentia de modo apercebido, não era a primeira vez ou o primeiro dia. O lobo se levantou, alongou o corpo e se inquietou entre sair do terreno ou continuar a prestar a atenção ao que ainda podíamos ouvir dentro de casa. Minha mãe continuava a se comunicar com eles, pedindo por mais detalhes e comentando uma coisa ou outra. Renesmee sabia como ela estava, não apresentava definições médicas, mas ainda assim posicionava muito bem sua explicação. De acordo com ela, Amberli só estava fazendo longos exames, que para mulheres com gravidezes normais, seriam de rotina. Tudo com ela era bem mais trabalhoso de ser coletado. 

 Rocei os pelos nas fissuras dos troncos das árvores quando me entrelacei entre elas para adentrar ao bosque. Havia uma comichão inquietante dentro de mim, que me impulsionava a ir atrás, a buscar o que me pertencia. No entanto, antes que eu me embrenhasse muito adentro do bosque eu captei a voz da minha mãe com mais atenção quando pude ouvir o nome da Lee sair de seus lábios numa conversa em inglês. Retornei alguns metros de volta para o terreno, curioso para saber mais do que ela falava. Suas palavras esclareciam algo que Jacob deve ter lhe perguntado e agora discutiam a respeito. Pude ouvir o som do pequeno impacto da xícara de porcelana contra a madeira da mesa, onde estava assentada, e agora o celular descansava no móvel a sua frente.  

 

— ...Eu apenas preciso do último manifestar, eu não posso sair antes de estar abastecida. Sorte a de vocês por não precisarem desse chá. Ele tem um gosto horrível. — a vi gesticular para o celular. 

 

Pude vislumbrar seu corpo pela visão limitada que a porta francesa do acesso aos fundos, me proporcionou, ela se levantava da cadeira, verificando as horas no ponteiro do relógio de pulso que ela havia ganhado do meu pai, há alguns anos atrás. 

Ela tragou uma longa respiração e levantou seu olhar para fora de casa. Seus olhos mirando-me certeiros e convictos. Seu dedo correu sobre a tela do seu celular e em silêncio caminhou até a porta que a levava para a minha direção. Seus passos eram determinados e sem pressa alguma, quando ela destravou a abertura das portas duplas para se expor à garoa que caia sobre a grama, senti a atmosfera do lugar se transformar, meus pelos se eriçaram ante a mudança repentina atmosférica que a presença dela causou em nós. Minha mãe não parou de caminhar até ao lugar escuro cercados pelas árvores, vindo diretamente para mim. Se seus olhos tivessem a capacidade de alteração eu tinha certeza de que eles brilhariam na escuridão predominante do local. Ela não parou de andar até ficar a frente do corpo imenso do lobo. Sua aproximação causou-me mais sensibilidade ainda, os Espíritos a acompanhavam, eu percebi isso. 

 Tudo internamente se calou. Não havia mais as vozes e fragmentos pensantes de outros lobos que estavam num vínculo ininterrupto comigo. No momento havia apenas as minhas partes viventes, minha mãe sensiva e a garoa fina que perdurava sobre o céu carregado de toda a península. 

  

— Eu sempre soube que você estava destinado a conquistar grandes coisas, independente da maneira que elas se apresentassem a você, meu filho. — baixei meus olhos lupinos, para olhá-la — E sempre soube que eu teria apenas você. — sua mão se ergueu de modo sugestivo, ela queria me tocar. 

 

 Abaixei meu rosto, permitindo que ela acarinhasse a parte do meu maxilar superior e corresse sua mão sobre a base nasal. Fechei os olhos para apreciar com mais detalhes o movimento leve que fazia sobre os pelos, as reações lupinas se manifestaram automaticamente, o rabo abanando e a baba escorrendo por entre os dentes caninos, devido a satisfação do ato. 

 Me afastei do seu toque, não permitindo que ela tivesse acesso, olhando bem firme em seus olhos, querendo saber os motivos que a levavam a estar parada a frente do lobo, permitindo essa tal exposição do seu corpo frágil, naturalmente mais frágil por conta da sua idade. 

 

— Nós precisamos vê-la. — comunicou com seriedade, recolhendo sua mão para o abrigo de suas roupas. Não foi difícil saber a quem se referia. Olhei ao nosso redor, me certificando de que as árvores que nos cercavam estavam próximas o suficiente para que a chuva não a atingisse diretamente, eu não estava tão confiante de deixá-la tão perto do meu corpo dessa maneira. Retrocedi alguns centímetros para trás — Eu sei que você não gosta de quando eu apareço tão perto de algum lobo, e eu respeito isso, mas há momentos que é indispensável que eu esteja assim. — aproximou-se ainda mais, e roçou ambas as mãos sobre os pelos ao redor da face lupina, dessa vez com mais tato do que o toque anterior, pude até sentir a tração do material gelado dos anéis que evolviam seus dedos — Filho, preciso fazer esse ato de intercessão com a sua forma mais sensível aos Espíritos da Tribo. Você precisará de forças para os próximos períodos da sua vida. — sua voz soou carinhosa ante ao pedido por meu aval — Eu te amo, meu filho; você precisa confiar de coração aberto no que eu sinto, para te ajudar. — suplicou da sua maneira única de ser. Como mãe, com amor. 

 

Fechei meus olhos devagar, deixando que ela percebesse minha aprovação de intercessão. Um vento significativo soprou por entre os troncos esguios das árvores ao nosso redor, agitando as folhas das árvores, respingando água em nosso corpo, arrastei minhas patas dianteiras mais para frente, a fim de que minha mãe tivesse abrigo contra a tempestade que se aproximava daqui a alguns minutos. O lobo emitiu um som baixo, concedendo espaço e adotando uma postura submissa, para que minha mãe tivesse autoridade sobre nós, sobre o que era necessário ela fazer. Analisei o comportamento dela com curiosidade, me perguntando o quanto eu perdi longe dos meus irmãos lobos para que eu não soubesse da sua maneira ativa entre eles; minha mãe sempre se fez necessária entre a gente, mas agora ela era realmente requisitada. 

 Minha mãe começou uma oração simples, não havia nada de misterioso nas suas palavras apesar de ela continuar a falar em nossa língua, ela não estava invocando os setes espíritos da natureza, causando a ordem do caos ou coisa parecida e sim convidando a presença dos nossos ancestrais a me presentearem com a perseverança, sabedoria e paciência. Seu último pedido me fez lembrar dos conselhos da vovó Emily. Os olhos do lobo continuaram atentos à sua mão, que gesticulava pelo ar, parecia uma coreografia leve contra o vento que soprava a garoa sobre nós, seus olhos não continham nada de especial, mas olhavam para o ambiente ao meu redor com propriedade, como se de fato houvesse alguma presença corpórea da qual eu não tinha a capacidade de desvendar. Aos poucos o ar se tornou mais palpável, condensado; como se as melhores qualidades naturais do lobo se ampliassem ainda mais, novamente percebendo que eu podia separar os timbres que compunham sua voz. Olhei para a minha mãe, pensando que a veria de alguma forma mais esquisita, só que ela ainda estava aqui, parada no mesmo lugar, como se não tivesse acontecido nada anormal. 

 Suas mãos dançantes giravam ao meu redor, e quando tocou sobre os pelos lupinos, eu pude sentir sua temperatura mais abrangente do que o normal, seus olhos escuros estavam reluzentes pela leve lagrimação, contrastando com a seriedade que seu rosto transmitia. O seu toque quente causou-me um susto devido à uma espécie de descarga elétrica sobre meu corpo, ocasionando uma contração involuntária em toda a estrutura lupina. Mesmo depois que ela se afastou, eu ainda sentia leve choquinhos nos músculos. 

 

— Deve ter acontecido o estímulo do vínculo transcendental entre seu Lobo e o auxílio dos espíritos; nada muito esquisito, mas mágico e renovador. — tagarelou agitada — Você não será dominado por nenhuma força maior que te controlará, ainda será o mesmo, mas terá a sensibilidade restaurada. Seus anos de distanciamento à força fez com que isso acontecesse. — fez questão de explicar e sorriu, seus olhos quase se fechavam, meus ombros caíram ante suas palavras, eu ainda sentia a culpa — Mas não se preocupe, eles não guardam rancor. — abanou a mão como se isso não fosse nada demais, o gesto deixou suas palavras engraçadas. 

 

 Um silêncio leve nos cercou gradualmente, interiormente da mesma forma gradativa, os estímulos da conexão com os meus irmãos foram retornando até que eu pudesse me comunicar com eles com clareza, ignorei-os. Minha mãe ergueu seu punho esquerdo para verificar a hora no relógio, pela pouca claridade noturna que tínhamos no local, e sua visão humanamente limitada, ela teve que aproximar o objeto bem perto do rosto para que pudesse enxergar o horário, quando obteve o esperado, ela olhou ao redor, como se procurasse por alguma aproximação; com meus olhos atentos sobre ela, eu procurei algum manifestar pelo perímetro. Não havia nada além dos animais convencionais em seu habitat. 

 

— Filho, — seus olhos fixaram-se nos meus — Eu irei dirigir até a mansão Cullen. — anunciou. Os ombros do lobo se elevaram, atento ao que ela dizia — Você tem que ficar aqui. Mas só por mais algum período, eu preciso já estar lá quando você chegar. — deixou claro — Por isso pedi que para que Jacob te encontrasse e oferecesse suporte, se fosse necessário. — suas pálpebras se apertaram contra os olhos, suas sobrancelhas penderam, formando linhas expressivas em sua testa — Eu sei que os outros não são capazes de te deter, eu conheço o lobinho que eu tenho.  

 

Minha pata direita moeu o solo abaixo de si, criando um som opaco, chamando sua atenção, eu quis saber seus motivos, que pelo jeito ainda eram desconhecidos para mim. 

 

 — Você saberá quando chegar lá. A Nessie provavelmente já deve estar com a família. — ela sabia muito bem o que estava falando — Espere aqui, vou pegar suas roupas, irei amarrá-las no seu tornozelo. — girou sob seus calcanhares caminhando diretamente para onde eu havia deixado minha muda de roupas, no canteiro abandonado. Suas mãos habilidosas puxaram um fio de barbante de dentro de suas próprias vestes para interligar entre minhas roupas, logo ela estava passando pela lateral do meu corpo, se abaixando ante a minha pata direita, e amarrou meus pertences ali. Apoiando suas mãos nos joelhos, ela se levantou — Lembre-se de que a fé vence o medo. Já te falei antes, volto a repetir: não permita que seu medo venha estagnar sua vida. Parece que ainda tem receio de entender a benção quileute que corre em seu sangue. 

 

O lobo balançou a cabeça, contrariando sua especulação. Só nós sabíamos o que sentimos quando Amberli surgiu para nós; o sublime apogeu penetrante dentro de cada corpúsculo do nosso corpo. A vivacidade adquirida, o vigor restituído alcançou o nível mais extremo e etéreo de plenitude entre nossos seres desde aquele dia. Tudo bem que talvez eu não seja tão ativo com o meu vínculo além do dever de proteger a tribo e todos os humanos ao nosso alcance, mas não era como se eu continuasse indiferente, muito pelo contrário, todas as horas do meu dia eu sentia o instinto de proteção e reivindicação e quando havia a oportunidade de estar limitado ao mesmo ambiente da minha imprinting eu me policiava para não exceder o limite lógico da sua realidade. Eu não podia negar que meus olhos a contemplava com cada manifestar da sua presença. Não era natural, parecia que o ar se tornava mais limpo, um sublime esplendor ligado diretamente aos componentes enigmáticos contidos no meu sangue que se entrelaçava ao designo de ela ser a escolhida. 

 

— Hum... — analisou minha reação — Talvez eu esteja equivocada. 

 

Tive vontade de lhe dizer um sim, bem alto e claro, mas no corpo que eu estava, não seria possível. Dei um jeito de fazê-la entender que ela estava certa nesse ponto, só que a menção sensitiva sobre a Lee me causou uma inquietação dilacerante, o instinto se aguçou instantaneamente; a vontade que tive no momento foi de deixar minha mãe ali, e sair a sua procura, mesmo que eu estivesse bem consciente de onde ela estava. 

 

— Ainda não está na hora, filho. — afastou-se de mim com cuidado — Você tem que aprender a calcular os momentos certos para agir, e não falo apenas sobre Amberli saber o lugar que ela tem por designo na sua vida. 

 

Gani baixo em desagrado de mais um fato inconveniente que eu tinha comigo a cada momento. Isso me infernizava sem intervalos, eu já sei que ainda não era a bendita hora dela saber sobre a verdade do sangue quileute e muito menos sobre ser meu imprinting, eu já sabia dessa porra toda, só que era mais irritante quando as pessoas me relembravam disso; me irritava sim, mesmo que dessa vez não fosse Renesmee a me dizer e sim, minha mãe, me chateia da mesma maneira. Ela revirou seus olhos perante a reação refletida no comportamento instintivo do Lobo, eu não podia fazer nada, ele concordava comigo, ansiamos por esse momento, doía em nossas entranhas essa verdade. 

 

— Eu posso imaginar como se sente... — soltou um riso leve, envolvendo a si mesma num abraço — Eu vou para lá, — se referiu à mansão dos vampiros — mas quero que espere os minutos necessários para que possa ir também; pode fazer isso por mim, filho? 

 

Chacoalhei a cabeça um pouco, para que ela pudesse compreender que cumpriria seu pedido, minha mãe me observou com atenção por mais algum tempo, até se afastar passo a passo com cuidado, ainda de frente para mim, nossos olhos só se apartaram um do outro no momento em que ela se virou para atravessar a lateral de casa e partir para a residência dos Cullen. Sentei-me sobre o pouco rastro visível de grama e o vasto amontoado manto gelado de serapilheira que cobre o chão húmido da floresta para aguardar os minutos do trajeto da minha mãe, pelo horário atual, não seria muito difícil identificar seu carro em movimento entre os poucos que circulavam pela reserva, eu ouvia o manifestar de Jacob a me observar, mas não estava tão intenso como costuma ser, a insensibilidade em forma de torpor em me comunicar nitidamente com meus irmãos pareciam as ondas calmas do mar, indo e voltando de modo discreto, até mesmo nos momentos em que estava convicto de que não voltaria a acontecer. Era uma sensação esquisita. Durante esses minutos de espera meus pensamentos foram agraciados pela constância da Lee, sempre era muito bom tê-la em meus pensamentos, mesmo que na maioria das vezes a preocupação aguda com seu estado de saúde prevaleça; lembrei-me dos momentos em que sentia a pele macia do seu rosto contra o tato da palma de minhas mãos, desejando que aquele cano inserido em seu nariz que dava agonia de ver, eu mal podia lhe contemplar e isso agitava meus ossos, energizava meu corpo num anseio ferrenho de reivindicá-la, deixar que soubessem que ela é tudo para mim. No mesmo ímpeto desse desejo, a realidade batia sobre mim, antes de qualquer pessoa, ela, mais do que ninguém também precisava saber. 

 Levantei-me com agilidade, tendo apenas uma certeza para a direção que eu movimentava minhas pernas. Eu estava decidido a pôr as cartas na mesa, eu tenho que fazer isso mais cedo ou mais tarde, não dá para camuflar essa verdade, é exaustivo e tem se tornado cada vez mais nítido em tudo que eu faço quando se trata da Amberli; não que isso seja ruim, apenas seria um peso à menos dos pensamentos silenciosos que ela possa ter a meu respeito. 

 

Fui bem recebido pelo odor repelente que impregnava o território, deixando bem claro a quem pertencia, a cada passo voraz que eu avançava, meu instinto tinha o desejo de seguir pelo lado contrário, inquieto por sempre estarmos no ambiente de um inimigo natural. Adentrei mais entre os espaços estreitos para o corpo do lobo, fornecido pelos troncos dos pinheiros, serpenteando pelo relevo húmido, descendo cada vez mais para perto da mansão que abrigava a mulher da minha vida. No íntimo de mim eu pude sentir que ela me esperava, e eu corria ao seu encontro. 

 

 

 

↣ ↢ 

 

 

 

— Eu já estou cansado de esperar pelo momento certo Nessie, quando que ele chegará? Ela precisa saber sobre o imprinting. — deixei que percebesse frustração. 

 

— Vo-você já quer falar? Não pode! — seus olhos esbugalharam, evidenciando o castanho-chocolate num contraste harmônico com os fios de cabelo acobreados — Não agora! — se colocou na minha frente. 

 

— Você não pode simplesmente me barrar desse... Momento! Nessie! 

 

— Eu sei! — exclamou na defensiva — Eu, sei. Só que veja bem: não é a ideia mais inteligente. 

 

— Oh! Oh! Oh! — não pude evitar de soltar uma gargalhada pausada e irônica — Agora você é a portadora de toda a inteligência?! Fique com esse título, eu prefiro estar com a Amberli. — passei por ela, ajustando a braguilha da calça. 

 

— Cole, não seja um idiota cabeça dura justo agora! — ela grunhiu ofensiva e passou a me seguir — Ela está bem no momento de parir, você deveria esperar tudo isso passar — olhei para trás vendo-a fazer um redemoinho com o dedo, englobando a situação como um todo. Parei minha caminhada, mudando a rota dos meus passos para bem perto dela. A maneira brusca de como me aproximei de seu corpo fez com que ela se refreasse de supetão para não colidir contra mim. Seu dedo ainda girava quando isso aconteceu. 

 

— E se fosse algo acontecendo com o Jake? Você iria me obedecer, ou seguir os impulsos que estivesse sentindo?! — seu silêncio instantâneo e a saliva engolida em seco foram a resposta perfeita — Se for entrar no meu caminho, que seja para me acompanhar até a casa de Carlisle e Esme, se não, pode ficar por aqui. — eu não poderia simplesmente dizer que a arrastaria à força para o outro lado do terreno se ela pensasse em me atrasar mais ainda para a direção da mansão. 

 

— Sua mãe. — sua voz soou como um aviso — Ela está aqui. 

 

— Eu sei. Ela disse que viria. — retomei meu caminho amontoando o barbante para dentro do bolso dianteiro da calça. 

 

Foram necessários cinco passos meus para que Renesmee começasse a andar. Entramos na mansão pelo acesso dos fundos e antes mesmo que meus pés pisassem nos primeiros degraus, eu pude sentir que minha mãe estava lá, não apenas por ouvi-la e sentir seu cheiro, mas por identificar através da densidade do ar que ela não estava ali sozinha. A presença dos Espíritos Quileutes era palpável ao redor dela.  

Minha mãe conversava com Esme, estavam acordando na possibilidade de minha mãe agir como uma doula. Ouvi a palavra estranha não fazendo ideia do que significava, apenas permaneci em silêncio ao redor delas, mal vendo a hora de poder tocar a Lee. 

 Eu poderia tocá-la, será? 

Meu corpo se espasmou em fúria e angústia pela vontade. 

Esme olhava para a minha mãe com os olhos bem abertos, parecia extremamente espantada em tê-la dentro de sua casa pela primeira vez, sua atenção voltada atenciosamente só para ela, nuns segundos ou outro eu percebi que a mulher olhava ao entorno do corpo da minha mãe, como se algo estivesse as rodeando, talvez ela pudesse sentir a carga mística circulando seu corpo imutável de alguma forma. 

 

— ... Pode parecer que não é o dia certo, mas eu tive que aparecer aqui, mesmo que a Nessie não tenha ligado. — olhamos brevemente para ela assim que seu nome foi mencionado. Pelo jeito Renesmee havia deixado subentendido que avisaria ela sobre o trabalho de parto da Lee. 

 

Esme redirecionou a conversa, nos informando sobre o estado de Amberli desde as últimas horas, ouvi tudo com uma fome de informações avassaladora, prendendo meus pés sobre o assoalho da sala para que eu não subisse escadas acima para vê-la. Eu sei onde ela está, sinto o cheiro dos medicamentos ao redor dela e em contato com o seu sangue pela leve alteração da essência, posso ouvi-la suspirar e seu corpo mexer-se sobre o colchão. Havia um homem ao lado dela, o cheiro característico de um macho era altamente notável de onde eu estava, eu só não me alarmei, por saber que há outros vampiros que cuidam dela aqui, além de Carlisle. Inalei o ar para coletar mais um pouco do cheiro dele, e procurei tanto na minha, quanto na memória dos meus irmãos, a quem esse odor representava. Mesmo que meus olhos estivessem fixos nas expressões e gestos de Esme, meus demais sentidos estavam atentos sobre Amberli, acompanhei cegamente os momentos em que ela se remexia e suspirava, ou quando alguns resmungos ininteligíveis saiam pela abertura de seus lábios, por último e completamente tensionado, pude ouvir quando teve ajuda de Jasper para sair de cima daquela cama hospitalar. Minhas mãos pinicaram apenas por sentir a sua presença, eu não podia mais esperar. 

Sem querer, interrompi as palavras de Esme com um chiado incontido pela minha boca, o silêncio dominou o local entre nós quatro. 

 

— Apenas peça. — minha mãe sugeriu baixo em nossa língua — Estarei logo atrás de você. 

 

Tomei um fôlego profundo reunindo toda a minha boa educação e cordialidade para pedir a concessão de subir até ao cômodo onde ela está. As palavras saíram de mim com tanto rogo e alívio, que Esme nem relutou, apenas instruiu o caminho que eu já saberia ir. 

Abandonei a matriarca Cullen na primeira oportunidade que ela concedeu, sentindo labaredas inflamáveis arderem dentro do meu corpo, o anseio de estar a cada passo mais perto dela me impulsionava a pular degraus e mais degraus até estar diante da porta do cômodo que a separava de mim. Antes que minha mão tocasse no trinco, Carlisle a abriu concedendo minha passagem, ele já havia a avisado sobre minha presença na sua casa, a resposta dela ante a minha presença fez com que seu coração bombeasse mais rápido, fazendo seu sangue correr mais acelerado pelo seu corpo, e assim seu cheiro ficasse ainda mais evidente, seu perfume exalando pelo ambiente de maneira irresistível, como um bom presente de boas-vindas, apesar dos medicamentos que circulavam entre ele. Talvez ela ainda não percebesse, mas me chamava. A atração era mais intensa do que qualquer tipo de imã existente. 

Dei passos longos em sua direção analisando seu corpo se perder fora de forma dentro do roupão de algodão estampado que a cobria, seus pés estavam cobertos pelos fios trançados da sua bota sem nenhuma conexão com a roupa que usava, os cabelos escuros e curtos estavam precariamente prendidos num coque esquisito, talvez ela só tenha torcido os fios de qualquer jeito e os juntado no topo da cabeça, pode não ser esteticamente bonito, mas completava a beleza caótica dela no momento. 

A toquei com propriedade, um fogo se alastrou por cada partícula minha no mesmo instante, houve um prazer genuíno imprescindível, um alívio e amor. Ah!... Era bem mais que devoção, era sim amor. Envolvi seu corpo de encontro ao meu a cercando com meus braços, tocando minhas mãos nas laterais tensas dos seus quadris, toquei meu nariz nos seus cabelos desalinhados aspirando seu cheiro por completo, memorizando cada aspecto do seu perfume e idealizando as próximas oportunidades de sentir seu suor impregnar no couro cabeludo. Senti o suave cheiro de suas lágrimas, o que me fez reparar em seu rosto. Seus olhos fechados selavam a passagem de novas lágrimas, havia um rastro fresco desenhado sobre a sua pele, seus lábios entreabertos expulsavam o ar que ela tragava pelo nariz. Atentei-me imediatamente ao seu nariz, percebendo que pela primeira vez, eu estava a vendo sem aquela sonda colada em sua pele. Traguei o ar encarando-a bem, minha boca se abriu em deleite e disse palavras verdadeiras para ela. Não me contive em passar minhas mãos pela textura delicada do seu rosto, sentindo-a contra minha pele, querendo analisá-la minuciosamente bem. Como se tivesse ouvido meu pedido silencioso, ela ergueu o rosto me prestigiando com os mínimos detalhes da sua face, acariciei os poros de sua pele me sentindo embevecido pelos seus detalhes, e quando pensei que não tinha meios de melhorar, suas pálpebras tremeram e se abriram, assim pude ser privilegiado a ver nitidamente seus olhos castanhos. Senti um frio na barriga ao contemplar a sublime junção de fios em variados tons de castanhos dentro de suas írises, pois eles claramente me transmitiam seu cansaço. Olhei para cada parte do seu rosto mais uma vez, deixando incontido em palavras o quanto eu estava enlevado pelos mais densos sentimentos dentro de mim em verdadeiramente vê-la. Eu estava aliviado de que aquela coisa estava longe de sua pele. Amberli abriu um sorriso tímido e agradável ao fechar seus olhos e soltar um riso em resposta às minhas palavras, logo ela deixou-me olhar para os teus olhos mais uma vez e dessa vez havia satisfação ali. 

Através da sua entonação de agradecimento, percebi que ela estava cansada e entristecida, seu corpo inclinava-se para dentro de mim procurando por refúgio, tornando-me uma fortaleza para ela. Acariciei seu rosto com carinho, suas mãos mornas tocaram-me dos braços até as mãos e ela sorriu mais uma vez e um suspiro leve saiu por entre seus lábios. Não me opus a vontade que tive em tocá-la com meus lábios e abraçá-la contra mim, declarando o que antes era uma promessa silenciosa. 

Cobrindo-a com meu corpo, lembrei da minha mãe, de modo automático procurei pela sua presença, identificando-a atrás de mim. Alinhei minhas ações, agindo de maneira contrária aos sentimentos melancólicos de Amberli, deixando-a um pouco mais animada para que eu pudesse apresentá-las. 

Lee olhou minha mãe com curiosidade, seus olhos passando com atenção nas vestes dela, seu olhar foi demorado sobre a bota, seus olhos se moveram para os seus próprios pés de modo imediato, possivelmente comparando a exatidão dos calçados que vestiam. Vi sua sobrancelha se curvar e logo sua pele avermelhou sobre as maçãs do rosto quando se direcionou a mim. 

Minha mãe se apresentou com cuidado, acolheu ela com todo o amor e empatia, houve entre elas uma grande afeição; tanto que não houve receio algum da parte da Lee em deixar minha mãe tocar sua barriga enquanto conversava abertamente com ela de um modo um tanto quileute. Pelos seus batimentos acelerados eu sabia que minha mãe estava exultando, saltando de alegria. 

Mantive minha posição ao lado de ambas e cercado pelas maquinas que emitiam chiados e ruídos, Carlisle e Jasper estavam ao nosso derredor, dando o espaço necessário que precisávamos no momento, minha mãe e a Lee minavam assuntos diversos para conversar, eu não esperava que elas tivessem tantos assuntos tão rápido, falavam e falavam sem parar, elas ficaram tão entretida uma com a outra que as pernas de Amberli pesaram sobre seus pés, deixando-os com um aspecto mais esparramado, devido ao inchaço ocasionado. Fiz questão de levá-la para a cama, pondo-me ao seu lado, mantendo minhas mãos em contato com sua pele, sentindo-a, absorvendo resquícios de suas emoções interligadas a mim. Nuns minutos ou outros, Amberli respirava fundo e ficava em silêncio, passando a mão pela circunferência de sua barriga e após um tempo assim, um sorriso miúdo curvava seus lábios e mesmo com indícios de fadiga, ela continuava a conversar. 

 Seguia seus gestos de olhos atentos, imaginando se em algum tempo do futuro seria possível vivenciarmos essa etapa de modo natural, consensual e felizes com a expectativa de trazermos um filho para o mundo. Amberli sorriu, após passar a ponta da língua sobre seus lábios e concordar com algo que minha mãe comentava, Carlisle vendo seu cansaço, nos aconselhou a deixá-la aos cuidados de Jasper. De maneira discreta ele me avisou que Jasper estava monitorando os meios de comunicação sentimentais dela durante aquelas horas. 

Eu e minha mãe esperamos algum manifesto da parte dela ante a nossa saída, aguardamos o seu silêncio concentrado, observando-a acariciar sua barriga e suspirar mais forte quando relaxou o corpo sobre o colchão; com o consentimento de Amberli, saímos daquele lugar e por minha mãe eu descobri que seus momentos de pausas eram indícios das contrações. 

 

Quando retornamos para a sala mais uma vez, havia mais dois serezinhos fazendo companhia à Esme. Renesmee tinha Hilary em seu colo, a cópia de Amberli tinha um dos dedinhos minúsculos dentro da boca, movimentando-o de um lado ao outro, seus olhos acompanharam a nova movimentação pelo local, facilmente localizando e reconhecendo meu corpo grande no seu campo de visão, o sorriso largo e de poucos dentes de leite me aqueceu de uma maneira diferente. Os olhinhos castanhos daquela menina miúda brilharam e seus braços se esticaram para mim, mesmo que eu ainda estivesse distante. Minha mãe não chegou a se aproximar dela, Esme havia a interceptado antes que pudesse se aproximar. 

Renesmee não deixou que eu ficasse com a criança em meus braços por muito tempo, de acordo com suas próprias convicções, esse era o momento dela de aproveitar a Hilary bem-humorada. A princípio eu não entendi muito bem o que ela queria dizer com isso, mas quando questionei a respeito, ela apenas me respondeu que Jasper já estava cuidando dessa parte e priorizou sua atenção apenas em ensinar novas sílabas e palavras curtas para que a bebê pudesse repetir. 

 

— Vamos lá, bebê, se você conseguir falar “Renesmee”, conseguirá falar qualquer nome! — ficamos em silêncio para ver se ela falaria alguma coisa. Não houve progresso — Tente o nome do Cole! — repetiu meu nome mais devagar e bem mais articulado — Ou então Ness, consegue falar Ness? — ouvimos um sibilar como de uma serpente ao vê-la tentar reproduzir o nome Ness — A-há! Ela quase conseguiu! — triunfou. 

 

— Foi mais um chiado do que o nome mesmo. — averiguei — Diga meu nome, Hilary: Cole. 

 

...Col! — entre um emaranhado de sons entusiasmados que ela reproduziu, ela conseguiu soar o meu nome de maneira convincente. 

 

— O meu foi melhor que isso... — Nessie provocou virando-se, fazendo com que seu cabelo chicoteasse no meu braço. 

 

— Mas ainda não foi seu nome inteiro. — devolvi, olhando-a caminhar para a outra extremidade da sala. 

 

 Minha mãe e Esme continuavam a conversar, discutiam a respeito das horas de avanços e períodos de contração que a Lee estava tendo, Esme sugeriu que minha mãe fosse para casa descansar, ela não queria sobrecarregar as energias da minha mãe antes do momento e firmou a promessa de que qualquer um dos Cullen ligariam para nós no momento em que Amberli precisasse de uma equipe de amparo, no momento ela também precisava descansar, Esme estava confiante de que ela conseguiria dormir por mais algumas horas. Confiei em sua hipótese e apresentei a filha da Lee de maneira devida à minha mãe. Renesmee deixou que a menina decidisse por si só se iria para os braços da minha mãe; ela não foi, entretanto, suas mãozinhas curiosas tocaram o rosto dela e segurou-lhe as mãos. 

 Na despedida momentânea, pedi que Renesmee levasse-a para outro lugar, assim evitaríamos de fazê-la chorar, Esme nos acompanhou até a varanda da sua casa e nos observou caminhar até o carro de minha mãe. Ela pediu para que eu conduzisse seu veículo, seus pés sobre o assoalho interno se batiam sem parar enquanto ela olhava compenetrada para além da janela do carro, acompanhando a vista do trajeto, ela não ficou muito satisfeita com a situação, já que havia passado apenas dez minutos com a Lee e poucos segundos com sua filha, mas não podíamos fazer muitas interferências, já havia sido de bom tamanho eles a deixarem como doula, tendo acesso livre para estar com a Amberli durante aquelas horas cruciais. Ela não me responde em palavras, apenas emitiu um bom baixo de concordância. Sua postura serena me fez perguntar onde exatamente ela queria ficar, não fiquei surpreso quando ela mencionou minha casa novamente, de acordo com ela, eu morava mais perto da rodovia. Ante a sua decisão, não vi problemas em levá-la de volta para a minha casa. 

Quando o silêncio mortificou o interior do carro, eu me vi inquieto e sensível, como se a angústia de estar longe da Lee mais uma vez se manifestasse de forma corpórea e opressora, espremendo-me de fora para dentro, gerando em mim um medo do desconhecido. Apertei minhas mãos contra o material do volante e engoli seco me sentindo preso contra a lataria do carro. Foi um tremendo alívio quando estacionei próximo ao meio-fio e me livrei do cinto de segurança mesmo que minhas mãos já tremessem ante o estresse. Os olhos da atentos de minha mãe mediram-me de cima abaixo e ela pediu pela chave do seu carro. 

   

— Deveria se abrigar na floresta, — tombou sua cabeça contra o encosto do banco — seus olhos foram além do vidro do painel — você conseguirá extravasar melhor. Não se esqueça por nem um minuto o que te disse dias atrás. Consegue se lembrar? O coração dela vai se manter batendo do mesmo jeito que está... Há muita vida dentro dela. 

 

Estendi minha mão, pedindo pela sua. Seus olhos se abaixaram estendendo seus dedos da mão livre contra os meus, juntei minhas mãos contra a sua e a trouxe para perto dos meus lábios, beijando os nós de seus dedos. Minha mãe murmurou baixo e em nossa língua, o quanto me ama e que eu tomasse cuidado. A correspondi, tocando meus lábios em sua mão mais uma vez e escapuli para fora do veículo procurando sensorialmente uma rota de fácil acesso adentrando no primeiro bosque que incidia ao redor das casas e deixando que minhas roupas fossem destruídas no processo. 

 

 Collin parecia me esperar, seus pensamentos estavam focados em mim quando surgi entre eles, sua primeira reação foi se interromper e ababalhar sobre suas patas. 

 

 — E aí? — ele me perguntou. Tencionou a ponta das unhas numa das grandes pedras da ribanceira em que estava, seus pensamentos me perguntavam sobre Amberli, o rosto dela e a barriga pouco aparente de dias atrás estavam nítidas em seus pensamentos. Preferi apenas compartilhar o momento em que ela estava sentada na maca com as mãos sobre a barriga que atualmente estava três vezes maior, ou mais — O bebê nascerá hoje? — quis saber. 

 

A expectativa é para que nasça, mas dizem que essas coisas são imprevisíveis... Agora preciso ter paciência. — ele apenas emitiu uma concordância e ficamos em silêncio. 

 

Vaguei pelos terrenos ao derredor da floresta, minhas patas firmes contra os minérios, pedaços de madeira, moitas de musgo e terra, me impulsionavam mais e mais, o tempo em que corri me pareceu sem sentido, tornando todo o trajeto num feito sem propósito e turvo, arrastando as horas em apenas segundos, deixando todo o ambiente a minha volta sobrecarregado, oprimindo minhas vértebras. 

 Pensei na Amberli mais de um milhão de vezes. Minhas patas continuavam exercendo pressão contra o solo, me conduzindo sempre adiante, numa corrida interminável, minhas orelhas captavam o som ao redor tensionando meu corpo num alerta desconhecido. Interrompi abruptamente minha corrida, arranhando minhas unhas contra as pedras, como um grito de horror o som do risco ruidoso estrondou contra meus ouvidos sensíveis. Olhei ao redor procurando pela ameaça, minha visão trilhou minuciosamente por entre as fibras das árvores ao redor e não detectei nenhuma presença além de mim e os bichos noturnos e insetos de todas as espécies, Collin já estava longe o suficiente, seus pensamentos me analisavam com curiosidade e estranheza, parecia sincero sua falta de compreensão. 

 Desamparo... Era isso que ele sentia emanar de mim; seu aspecto analítico naturalmente silencioso não me ajudava em muitas coisas. 

 Me vi perdido em minhas próprias reações e desejos, me parecia um torpor mental que me dava indícios de que me deixaria no limite, ocupando minha mente a um estado extremamente exaustivo. 

 

Você deveria ir ver como a Amberli está. — sugeriu quando minha perturbação passou a afetá-lo — Tente ficar mais próximo dela. 

 

Não tenho certeza de que me deixarão entrar. — o rosto mal-humorado da loira surgiu em minha mente — Talvez ela me impeça pelo medo de eu quebrar alguma decoração que valha milhões. — soei pilhéria. 

 

 — Isso é motivo suficiente para te fazer arregar? — me perguntou, sondando minhas reações, um pouco surpreso pela minha resposta medrosa igual a de um bunda-mole. 

 

Tem razão; não é. — sacodi meu corpo, os pelos dançando de um lado ao outro, a cauda se abanava em reflexo à minha decisão — Talvez não vejam problema se eu ficar à uma distância segura. 

 

 — Não perca mais seu tempo aqui. — incentivou quando percebeu que eu me preparava para partir — Mulheres precisam do apoio do marido nessa hora. Mesmo que a sua ainda não saiba. 

 

Avise Embry por mim. Não tenho previsão de retorno. — me preparei para partir. Eu não fazia ideia do peso das minhas próprias palavras. 

 

Em instantes eu estava farejando o berço dourado dos vampiros, eu ainda não estava perto o suficiente, então afundei minhas patas contra a terra para que minhas pernas me levassem mais rápido para lá, desci em direção ao local, mantendo-me ciente de que eu estava descendo a floresta do outro lado da estrada de acesso à mansão, mas isso não me impediu de procurar pelo perfume mais importante entre os deles.  

Avancei com violência por entre as árvores imensas que abrigava o terreno na escuridão de mais uma noite, me embrenhando cada vez mais, percorrendo rente à jusante estreita daquela parte do rio.  

Resolvi estancar a corrida por ali mesmo, minhas patas traseiras se prepararam para o salto, calculando de modo automático a força necessária para passar ao outro lado, saltei recebendo o último vestígio de um vento forte que havia soprado ali. Quando a brisa gelada foi inalada pelas minhas narinas, me trouxe um odor fresco e próximo de um vampiro macho. Dessa vez eu pude reconhecer, era o mesmo de horas atrás, era de Jasper. 

 

 O jovem vampiro loiro me aguardava muito tranquilamente, agachado em suas próprias pernas com seus dedos finos e pálidos imersos sobre as águas que se chocavam com as grandes pedras que havia ali, seus olhos amarelos tinham um peso de conhecimento e melancolia quando deixaram de encarar a água para olhar nos meus olhos, a um metro atrás de si, havia uma muda de roupas bem dobradas; não foi muito difícil de saber a quem pertenciam. 

 

— Pensei que não chegaria nunca. — declarou pondo-se em pé, a água escorria, pingando das pontas dos seus dedos para o chão — Como eu não sou o Edward, prefiro que esteja como humano para que possamos conversar. — deu um sorrisinho de lado, virou de costas para mim e segurou a muda de roupas, a humidade de suas mãos foram absorvidas pelo micro entrelaço do tecido — Sua mãe pediu para que eu trouxesse para você. Espero que não se importe do meu cheiro no tecido. 

 

Ele deixou as peças sobre um ajuntamento de pedras, e retornou para a orla das águas turbulentas, imergindo sua mão na água. Equilibrei meu vínculo corpóreo para estar sobre pernas humanas mais uma vez, agarrei os panos e os chacoalhei contra o musgo que predominava a superfície das pedras, a fim de que seu fedor se mesclasse contra o perfume do musgo, pus as roupas no meu corpo e me aproximei do vampiro, disposto a saber o que ele tinha a me falar. 

 

— Senti que precisava falar com você no momento em que a Amberli te chamou. — Jasper ergueu seus olhos para me olhar, não pude identificar nada através do nosso contato visual. Observei em silêncio ele pôr-se em pé e secar as mãos na roupa — Você deve ter sentido ela te chamar até aqui, não foi? — era mais uma pergunta retórica, do que para mim diretamente — Percebo que ela clama por você quase sempre, você deve sentir..., enfim. Eu estive colhendo o núcleo de emoções dela, apesar de eu evitar intervir nas suas decisões movidas por elas por saber que isso também a liga diretamente a você. Eu me preocupo com o momento em que as emoções dela entrem em colapso pela circunstância psicológica que ela vive diariamente, principalmente hoje. Então resolvi estudar parte do seu vínculo com ela pelo lado emocional, pois assim eu posso gerar estímulos mais definitivos que ajudará ela a superar o trauma que seu cérebro encarcerou. Ela pode não se lembrar do abuso, mas a consequência do ato foi gerado e depende exclusivamente dela, ela terá que encarar isso em breve; sem contar com o que ela já tem vivido no cotidiano... — ele calou-se por alguns segundos, dando uma pausa para que eu absorvesse o que ele estava falando — Aprimorei uma maneira de blindar o vínculo afetivo entre ela e a Hilary também, não quero que o elo natural de mãe e filha se estraçalhe, os danos podem ser irreversíveis a longo prazo para ambas. 

 

— Ela corre o risco de isso acontecer? — perguntei com receio da resposta, porém dentro de mim eu já tinha ideia do que ele me responderia, era dolorosamente muito óbvio. 

 

— A qualquer instante. — confirmou meus temores — É como um castelo de areia, — deu um exemplo simples para que eu pudesse compreender — podemos apalpar, apertar a estrutura quando a areia húmida começa a craquelar, mas uma hora se reparte e desmorona. Com ela será do mesmo jeito, só ainda não sei se será por inteiro ou partes específicas. — tragou o ar — A parte boa é que já venho tentando manter a estrutura dela o mais estável possível... 

 

— O quão estável? — minha voz soou apertada entre o espaço educado entre nossos corpos, falhei em tentar não parecer nervoso nessa situação. Jasper sabia muito bem o que eu estava sentindo, devia perceber o desespero instalado, seus olhos amarelos me olhavam de modo analítico, vi ele esconder sua mão esquerda no bolso dianteiro da sua calça. 

 

— Já parou para perceber que a vida dela é mais frágil que uma flor? — fez mais uma comparação sobre a Lee — Pois quando uma flor é retirada do lugar que mantém sua vida, ela ainda permanece por algumas horas ou até mesmo dias; dependeria da espécie... Já ela, como humana, assim que perde a vitalidade, morre imediatamente, e em alguns casos a vitalidade se perde aos poucos. — calou-se não vendo mais necessidade de explicar aonde ele queria chegar — Eu estou alimentando a maior quantidade de ligamentos emocionais que me é possível. 

 

— É possível fazer com que ela pare de sentir todas essas emoções ruins? — hesitante não deixei de perguntar. 

 

— Não posso inibir todas as emoções dela, seria desumano e isso a mataria. — negou. 

 

— E o que você quer que eu faça? — tive o anseio que me rasgava de dentro para fora, disposto a fazer tudo o que ele me apresentasse, mesmo que não estivesse ao meu alcance, eu estava disposto a dar um jeito. 

 

— Por agora quero que esteja com ela. Seu apoio como amigo e parceiro eleva os níveis de ocitocina de maneira rápida e eficaz, o que é extremamente bem-vindo para ela nesse momento. 

 

— Isso eu posso fazer. — me admiti. 

 

— Sim, eu sei e você nem precisa se esforçar muito para que isso aconteça, só de ela perceber sua presença no mesmo ambiente, já faz com que o nível estressante do cortisol diminua. — deu passos à minha frente, afastando-se, adentrando para a mata fechada. — Vamos. — chamou-me — Ela está clamando por você. 

 

 

 

 

↣ ↢ 

 

 

 

 

Ela quase choramingou ao me ver, as pupilas de seus olhos dilataram e contraíram devido a mudança de iluminação causada pelo seu movimento e aproximação do meu corpo, cobrindo-a com meus braços, sentindo a textura de sua pele, nosso contato pele com pele apaziguou meus neurônios. 

O cheiro de suas lágrimas se misturou ao tecido que me cobria. Eu ainda podia sentir a maciez de sua pele e a sedosidade dos fios de seu cabelo contra as palmas de minhas mãos, podia sentir o contato de seu corpo contra o meu, sentir sua barriga dura se ondular e endurecer contra meu abdômen e até mesmo meu toque com a ponta dos meus dedos na sua nuca, rente aos primeiros fios de seus cabelos. Havia uma mancha ali, uma parte escurecida da sua pele, era pequeno, mas claramente pude identificar como um hematoma que estava escondido ali há dias, um ódio descomunal imergiu em minhas entranhas apenas de imaginar a hipótese dos motivos hediondos da violência contra ela. Não permiti que meu corpo externasse o sentimento, priorizei a oportunidade de ser seu refúgio e apoio, tocando-a com carinho.  

Sentir sua energia fluir na minha direção a cada mínima reação que ela tivesse foi transcendental. Eu pude facilmente senti-la durante todas aquelas longas horas, bem mais do que em qualquer outro dia. Eu nunca havia estado tão próximo a uma mulher em trabalho de parto, nem nas menores hipóteses eu me imaginei viver nessa situação, de chegar a sentir seu corpo enérgico trabalhando em prol de uma vida. Nada define melhor a descrição além de senti-la. Foi inesperado e atormentador também, principalmente a partir do momento em que eu já não pude mais ficar com ela naquele lugar e quando a percepção apurada do lobo começou a deturpar as esperanças que eu tinha de um trabalho de parto no limite do normal. Eu cheguei a sentir pressão sobre todo o corpo vertebral canídeo durante aqueles períodos intermináveis, e a partir do momento em que aquilo começou a soar como um alerta específico, vaguei pelas trilhas da família Cullen a procura de Edward, eu não estava em condições de perambular para dentro da mansão para poder avisar Carlisle, eu sabia que não; mas Edward teria autonomia para fazer isso por mim no momento. E ele fez, continuo muito agradecido por isso, a situação da Lee poderia ser pior se eu não tivesse o procurado. O tormento que eu aguentei em cárcere com o lobo é inenarrável, tenho orado todos os dias para nunca mais vivermos algo aflitivo como o acontecido. 

 

 Quando conseguiram cortar a dor de Amberli, eu pude voltar a conduta humana e exigir respostas àquilo que havia lhe acontecido. Não me permiti chegar perto de nenhum acesso ao lugar em que ela ainda estava, mas nem precisava de muito estímulo para me refrear, eu sentia o cheiro do seu sangue fresco rodear toda a mansão. Rosalie não estava mais no cômodo em que a vi pela última vez, mas sabia que velava o sono de Hilary, eu ainda não havia sentido a presença de Emmett ou Alice, muito menos a de Jasper no local; isso me fez rodear o terreno a passos hesitantes a espera torturante de algum deles, Isabella e Carlisle atendiam as necessidades dela, Esme e minha mãe continuaram dentro da mansão em prol da criança recém-nascida, eu já sabia que era uma menina. Mais uma menina no mundo. 

Continuei a rodear a casa e só parei quando eu ouvi um chamado. 

 Edward me direcionou até a choupana onde ele mora, eu sabia que Renesmee estava lá, havia passado a noite longe do ambiente para que não corresse o risco de qualquer desastre contingente que ela pudesse presenciar ou causar. 

O local seguia a predominância das decorações das décadas passadas, tinha ciência disso através das memórias de Jacob e Nessie, até porque, essa foi a primeira vez que eu caminhei sobre esse lado intocado pelos quileutes. A casinha ecoava o crepitar e estalar da madeira na lareira quase apagada, a pouca claridade de um novo dia incerto adentrava pelos acessos de janelas embutidas nas paredes de pedras visíveis, tudo predominava aos relatos de contos de fadas, mas em compensação tínhamos a companhia de uma Renesmee sonolenta encolhida num canto do sofá, que despertava de modo preguiçoso pela nossa chegada. 

 

— O que está acontecendo, hein? — ela perguntou assim que percebeu nossa atenção sobre si, seu dedo indicador coçava a raiz de seus cílios inferiores — Eu acordei, mas ainda não tenho certeza?... — ela suspirou afundando seu corpo contra o estofado; piscando os olhos ela olhou novamente para nós, sua fisionomia jovem tornou-se ativa, logo ela estava genuinamente séria e preocupada. Muito preocupada, até por que, eu estava ali, seus olhos quase gritavam ante essa percepção — Aconteceu alguma coisa com a Amberli? 

 

Ficamos naquele silêncio tenso, cheios de expectativas. Eu me perguntava todos os segundos a mesma coisa, ela não era a única e eu era o que mais sofria. 

Edward me aconselhou a descansar no sofá disposto perto da lareira. Dobrei minhas pernas até que meu corpo fosse acolhido pelo móvel como um abraço confortável, minha cabeça latejava e meus pensamentos eram bombas dentro do meu cérebro, nada do que estrondava dentro deles me pareciam coesivos o suficiente, não prestavam para nada além de me causar um incômodo incomum; essa deveria ser a dor de cabeça física que os humanos sentem. Renesmee se agitou com a nossa chegada e permanência, perguntando, perguntando e perguntando. Mal nos dava tempo para abrir a boca para que de fato alguma de suas perguntas fossem respondidas; eu apenas fiquei aturdido entre ela e Edward, ansiando pelo esclarecimento que apenas ele poderia nos dar, mas o esclarecimento não veio naquele momento, ele apenas silenciou a filha e me pediu um tempo para estabilizarem a situação de saúde da Amberli.  

                Quando ela estivesse melhor, aí sim poderíamos retornar à mansão e saber de uma vez por todas o que havia acontecido. 

 

 Suspirei em exasperação abrindo meus olhos. 

 Ergui minhas mãos de encontro ao meu rosto, cobrindo-me com a palma de minhas mãos. Me senti exausto pelas lembranças e inevitavelmente mais melancólico, se ainda for possível. Me levantei da poltrona e caminhei com passos calculados para ser o mais quieto possível, às vezes deixava meus passos propositalmente audíveis para que o som pudesse causar algum despertar nela, mas não sabia se isso pode ser eficaz. Posicionei-me em frente da maca mais uma vez, olhando com ternura e esperança para o que ainda era visível da face de Amberli. 

 Apesar dos meus olhos brilharem desses bons sentimentos a cada vez que eu olhava para ela, não podia negar a mim mesmo o quão destruído me sentia a cada dia renovado sem nenhuma melhora da sua saúde. Eu mantinha as palavras de fé da minha mãe como um escudo sobre as circunstâncias, só que nem sempre eu venço o desespero, mesmo com apoios e orações, me vejo sem saídas. 

 Estendi minhas mãos para tocar na extensão de seus dedos da mão direita, bom, naqueles que eu podia tocar. Fiz carinho ali, correndo minha mão para cima e para baixo, olhei para sua mão esquerda, que descansava na lateral de seu corpo, vendo a pulseira atada a si. Meu coração ardeu, estremecido pelas lembranças. Levantei meus olhos, mirando a estante, meus olhos ardiam pelos sentimentos indiscretos que escorriam para fora de mim, parecia inevitável deixar vir à tona tudo o que esteve acontecendo nos últimos momentos, as lembranças se reprisavam como um véu sobre meus olhos. 

 

 Foi um tormento ficar encarcerado dentro da choupana confortável junto com Renesmee e Edward. 

Ele manteve contato com sua família durante as quatro horas que me impediu de sair do lugar, ele nem precisou fazer muito esforço, todas as horas anteriores foram extenuantes o bastante para que eu apenas aceitasse sua decisão e torcesse para que a palpitação excruciante que energizava meu corpo se acalmasse. 

 Quando a claridade diurna já tinha tonalizado o céu de cinza, nós três fomos autorizados à partimos para a mansão do clã. Tudo parecia estável e limpo; o cheiro de produtos de limpeza predominava sobre a maioria dos cômodos de habitação. Amberli estava no quarto montado no escritório, Carlisle e Isabella junto dela; daquela sala eu só ouvia com exatidão as máquinas a trabalhar. Minha mãe ainda estava de sentinela junto com Esme, um chiado de sucção e resmungos chorosos soava próximo delas. 

 Fomos adentrando o espaço, a cada movimento que eu fazia com as minhas pernas para me aproximar mais e mais do que estava por vir, um receio crescia dentro do meu peito; ao mesmo tempo que eu me preparava para o que estava para chegar, eu tinha vontade de dar às costas, tapar os ouvidos e inventar qualquer inverdade contrária ao que eu teria de lidar. Respirei fundo, reservando o ar para dentro do peito, numa falsa sensação de alívio contra o aperto ferrenho que sentia me abraçando de dentro para fora. 

Dei mais um passo. 

 Me vi atônito em presenciar minha mãe sentada na banqueta com a recém-nascida hibrida em seus braços, segurando a base de uma mamadeira de metal, auxiliando a amamentação, seus movimentos eram ritmados e suaves, seus lábios sussurravam palavras doces à menina; ela sequer olhou para ver quem chegava. Esme em pé, nos encarava. Seus lábios inquietos não se decidiam entre deixá-la parecer serena ou ansiosa, denunciando seu estado emocional conturbado, quando me aproximei o suficiente, ela deu espaço para que eu invadisse a privacidade de minha mãe e interrompesse seu zelo com a criança envolvida em roupinhas brancas, um contraste gritante entre a pele e estampas que minha mãe usava. 

A bebê era pequena, o que me contradisse pelo tamanho gigante da barriga da Amberli antes da concepção, seu corpinho se encolhia dentro dos braços da minha mãe enquanto resmungava e sugava o líquido viscoso para dentro de sua boca com avidez. Ela não tinha nada da Amberli. Foi a primeira constatação que surgiu na minha mente assim que eu analisei a menina, ela e a roupa era um conjunto só. Ela era branca. Muito branca. De tal modo, que dava para eu ver perfeitamente os pequenos vasos sanguíneos traçados por baixo de sua pele com uma facilidade absurda; Hilary chegava a ter a pele clarinha, tons bem mais claros que o da sua mãe, apesar de ser a cópia fiel dela, mas esta menina recém-nascida que está a minha frente, nem de longe poderia remeter à Amberli. Outro ponto era seus cabelos; ao contrário da mãe que possui os fios castanhos, os curtos fios uniformes com leves ondas sobre o entorno da cabeça são completamente negros, tão escuros que eu poderia achar que já fossem tingidos, nada disso dava indícios de que ela pertencia à Lee. 

 Sua característica incomum à sua mãe, despertou o desejo de analisá-la ainda mais de perto, não me contive em quase colar-me à minha mãe para poder vê-la melhor. Minha mãe levantou o rosto para me olhar, pela primeira vez quebrando o olhar terno que tinha sobre a bebê. Deixei que ela percebesse minha intensão, não olhando para ela diretamente, permanecendo meus olhos atentos sobre a menina, vendo os minúsculos estímulos dos músculos de sua face espasmarem, pelos movimentos da sucção, por baixo de sua pele absurdamente alva. 

 Engoli minha saliva a seco. 

Os braços da minha mãe se moveram, ajeitando-a para que eu tivesse acesso ao seu rostinho com facilidade, os cabelos seguiam seu desenho natural, escorrendo escuros por cima da orelha e da testa miúda, quase em contato com suas sobrancelhas, emoldurando o rosto redondo com bochechas gordinhas, o nariz era amontoadinho e redondo, ornando muito bem com o segmento que interligava ao desenho de suas pálpebras inchadas e os cílios curtos e negros que escondiam os olhos. 

 O rostinho se contorceu, as sobrancelhas se franziram e ela desprendeu os lábios do bico metálico da mamadeira, ocasionando um chiado pela interrupção da distribuição do sangue, os lábios entreabertos se tingiram de carmim de modo imediato, tornando a cena bizarra aos meus olhos. A recém-nascida tossiu, terminando de engolir o líquido que estava retido em sua boca, e pôs-se a chorar. A posição murcha e ombros caídos de desapontamento que minha mãe e Esme assumiram quase que no mesmo momento, foi inusitado. Intercalei meus olhos entre elas e a bebê, o chorinho rouco e cansado expressava audivelmente que não era a primeira vez que ela chorava desolada. 

  

— Tem sido assim desde que ela nasceu. — minha mãe soou cansada, entregando a mamadeira prateada nas mãos de Esme — Ela só se rende ao cansaço. — acariciou os cabelinhos dela com a mão livre, agitando seus braços mais uma vez, para mudar a posição da menina, trocando-a de braço com uma destreza admirável. 

 

Dei dois longos passos para trás, afastando-me, deixando que lidassem com isso. Me virei para a direção que Edward e Renesmee estavam, caminhei até eles idealizando meus verdadeiros desejos. Fixei meus olhos firme nos olhos de Edward. 

 

— Quando vou poder vê-la? — proclamei por ela. Amberli. 

 

Sua cabeça fez um leve, quase imperceptível movimento lateral, indicando para cima; poderia parecer um leve e discreto tique, mas eu sabia que não deveria ser. 

 

— Estamos esperando pela Bella. — uma breve pausa, o choro da menina tornou-se um som de fundo naquele milésimo de espera — Ela prometeu não demorar. — foi o que me respondeu. 

 

Isabella só desceu quando Jasper tomou seu lugar. Eu não sabia de onde ele havia surgido, mas não era como se isso me importasse agora. 

 Nos encontrávamos na sala. Eu, Edward, Isabella e Carlisle; os três estavam dispostos a me esclarecer o que havia acontecido com a Lee. As palavras deles no começo não me fez entender nada, mas quando eles passaram a explicar tópicos que coincidiam aos eventos que senti na floresta, afligido por horas a fio através do vínculo que eu tenho com ela, fiquei desperto e atento; de acordo com eles, seus sinais foram ativados pela sua intensa ansiedade, que causou falta de ar, desmaios e taquicardia. Seu corpo foi entrando pouco a pouco em pane e esgotamento justamente durante o trabalho de parto. Comentei algumas observações, como os tremores violentos das mãos, o que eu também havia percebido; perguntei em outras e eles continuaram a me pôr a par de tudo o que esteve acontecendo com ela. Durante os últimos períodos para trazer a criança ao mundo, a pressão dela subiu, ocasionando uma cegueira momentânea pela pressão ocular e um ataque cardiorrespiratório. O veredito final me desnorteou, de sorte Bella tinha um diagnóstico para tudo o que havia reagido em cadeia. 

 

—...Embolia Amniótica? Eu nunca ouvi falar nisso. — o que não era uma grande novidade. 

 

— O ato de ter forçado um pouco a saída da placenta sem que soubéssemos que isso sairia junto com o córion, que é a camada externa da bolsa amniótica, fazendo com que o endométrio uterino, que é a camada real do útero fosse minimamente movido e rasgado, assim agravou a embolia, gerando hemorragia. A hemorragia agravou a recuperação natural do útero, e a entrada de fluidos imunologicamente ativos na sua corrente sanguínea desestabilizou o funcionamento dos pulmões. — Carlisle explicou e ficamos num silêncio expectante. 

 

Assenti, movendo meus olhos de um para o outro, digerindo tudo aquilo e imaginando que em quase todos os procedimentos para reverter a situação de colapso, ela havia sentido pois estava acordada, sem chance alguma de conseguir se comunicar ou até mesmo gritar. Foi inevitável, meus olhos queimaram quando as lágrimas surgiram ante aquele silêncio a minha volta, tendo outra vez como som de fundo, o chorinho da Helena. Engoli em seco, regulando minha respiração, lutando para manter-me são. Aqui não era o tempo e nem local para reagir dessa maneira. Bella se inquietou. Sua fisionomia não expressava muito, mas acredito que ela se culpava pela situação. 

 

 — Se não tivesse comunicado ao meu marido sobre as interações cerebrais dela, continuaríamos achando que ela estava desacordada sem percepção neural. Um erro gravíssimo, admito, mas naquelas circunstâncias era difícil de saber. — Bella se manifestou — Pudemos colocá-la em coma induzido para interromper as atividades cerebrais, graças a você. 

 

— Foi só por isso que parei de sentir toda aquela dor, medos e confusões. — me senti sem forças com tudo o que ouvi. Era um milagre ela estar viva. 

 

— Sim. — assentiu, refazendo o coque torcido com seus próprios cabelos — Tínhamos que estancar a hemorragia e reverter o estado de coagulação após o choque. 

 

— E manter a reanimação... — Edward acrescentou. “Oh sim, como poderia me esquecer de que ela havia sofrido uma taquicardia?!” remoí com amargor — Agora ela está em observação, o corpo precisa se recuperar e só então ela irá acordar. 

 

— Quando isso vai acontecer? — medi-os de cima abaixo, exigindo um tempo específico para que a torção angustiante que me apertava tivesse um prazo de validade. Edward desviou o olhar, seus lábios torceram-se, transformando-se numa linha dura, Carlisle reagiu da mesma maneira, retraiu e recuou num grunhido. Meu corpo espasmou em alerta — Quando ela vai acordar?! — exigi em saber. 

 

— Daqui dois, três dias? Não sabemos. — Bella se manifestou, sua expressão séria, os lábios tensos mal tinham se movido — Isso dependerá da recuperação do corpo e principalmente da mente dela, Cole. No momento o corpo dela precisa descansar de todo o estresse conjunto que sofreu nas últimas horas e isso não costuma durar menos de dois dias. 

 

Minha respiração travou na garganta, meus lábios se desprenderam ante meu estado atemorizado, as batidas já aceleradas do meu coração se agitaram numa ligeireza surreal, como se a qualquer segundo pudesse rasgar o meu peito, pela maneira violenta que ele batia dentro de mim. Pus minhas mãos sobre a cabeça, sentindo que tudo se tornou drasticamente lento, muito lento..., em desacordo com minha rápida percepção. 

                           Meus dias não seriam os mesmos após estas notícias. 

 

E não foram mesmo, hoje já era terça-feira mais uma vez e não tinham nenhum sinal de que ela acordaria. Ela estava estável, não progredia em melhoras e nem regredia, deveria sim estar acontecendo alguma coisa, mas os doutores responsáveis por ela só me mantinham informado do básico e essencial. Desvencilhei minhas mãos dos seus dedos inertes, traçando um risco invisível sobre o tecido que acoberta o seu corpo alcançando o relevo que cobriam seus pés. Segurei a barra do lençol, descobrindo seus pés, tornando-os visíveis para mim, suas unhas pintadas de vermelho eram um contraste gritante com seu tom de pele e os tons a sua volta. Segurei seu pé esquerdo pelo calcanhar, erguendo-o numa altura apropriada. Fechei a outra, pressionando com cuidado contra a sola, fiz isso duas vezes antes de seguir com movimentos circulares para depois esfregar de cima a baixo. Repeti os mesmos movimentos no pé direito movendo meus dedos contra a sua pele de modo compenetrado, ouvindo a aproximação de uma pessoa conhecida. Não me interrompi, esperei que a pessoa viesse; ela chegaria no tempo exato do término de massagem mesmo. A porta foi aberta sem aviso prévio, permitindo a entrada do ar externo para o ambiente, carregando o cheiro da pessoa recém-chegada até as minhas narinas. Estendi o lençol sobre os pés de Amberli novamente. 

 

— Está na hora. — ela disse andando pelo espaço, deixando que a porta se fechasse sozinha. 

 

— Ainda preciso ir embora? — perguntei, desejando poder ficar. Não me movi, continuei com meus olhos sobre a estampa opaca do lençol. 

 

— Eu ainda prefiro que sim, Cole. — Renesmee me respondeu aproximando-se da maca, parando ao meu lado esquerdo — E ouvi algo sobre Embry esperar uma resposta sua; talvez ele esteja te aguardando no porto. 

 

— Deve estar. — assenti. Meu rosto não externava muita emoção pela informação que ela havia me passado, eu precisava mesmo agilizar algumas coisas no trabalho. Ergui meus olhos para olhá-la, seus olhos castanhos expressivos não disfarçavam a atenção que tinha sobre mim — Me ligue imediatamente se tiver alguma novidade. — arrumei minha postura, me reestruturando para lidar com a realidade fora dessas paredes e prateleiras. 

 

— Prometo que ligarei. — prometeu quando me afastei dali, movi o trinco nas minhas mãos para poder sair. 

 

Não olhei para trás quando fechei a porta. 


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