Odds - INTERNATO SALVATORE escrita por Jenniffer


Capítulo 4
Tempo - Parte 2.




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Tempo

Parte 2

 

~ Diário Gemini - entrada #174 ~

"Josie estava envolvida numa espécie de bolha energética criada por Bonnie e Valerie. Estava completamente nua, mas tinha um nevoeiro dentro da bolha, então apenas conseguia ver o contorno do seu corpo suave e pequeno, tão inocente, desprotegida e entregue. Quando me aproximei, pude notar que a cada ínfimo pedacinho do corpo dela, estava ligada uma espécie de corrente elétrica que florescia e se unia à bolha numa ramificação bonita e impressionante. As linhas que pareciam segurar o corpo dela iam mudando de cor lentamente enquanto o ritual decorria, e foram percorrendo todos os tons do arco-íris, de forma ordenada e gradual. 

Vermelho quando as linhas ampliavam a percepção da sua pele. Laranja quando chegavam aos músculos. Amarelo mostrando os ossos dela como numa radiografia hospitalar. Verde assumindo a forma de todas as ramificações normais que formam o nosso sistema nervoso. Azul quando pode acompanhar a sua corrente sanguínea. Índigo onde apenas o seu coração estava em fluorescência e, finalmente, o violeta. Quando percebi que parte do seu corpo aquela cor mostrava, entendi que o ritual já estava chegando ao final. Logo, o violeta evaporou rapidamente do seu corpo se espalhando pela bolha e esfumando lentamente, enquanto Josie adquiria uma posição tão velha como o mundo, a posição fetal. Ao contrário do que acontecia nos bebês, ela não ficou ligada por um cordão umbilical mas sim por um cordão medular, que se espalhava ao longo da sua coluna, formando um círculo fino e colorido que pulsava. Era como se ela estivesse sendo alimentada pelos “fios”. Assim que o ultimo fio se rompesse do corpo de Josie, o encantamento estaria completo, ela estaria de volta para os meus braços e eu a seguraria assim como Caroline segurava Lizzie nesse momento, que por sua vez aguardava a sua vez desacordada. Faltava pouco pra que respirasse pela primeira vez, novamente.

A primeira respiração é um momento crucial e decisivo num ritual, porque respirar é ficar em sintonia com a criação. De uma forma bem mais simples, é absorver oxigênio e expelir resíduos. Mas, nessa simples troca, dois mundos se encontram, se aproximam um do outro, tentam se misturar, se tocar: o mundo interior e o mundo exterior. Dois mundos, agora separados, tentam se reencontrar, se unir. E é no nascimento que a criança, ao respirar pela primeira vez, através de seus próprios pulmões , assume a si mesma, tomando o caminho da autonomia e da independência . Ali não seria diferente. E tudo dependia disso: respirar, a mais inconsciente de nossas ações.

Bonnie e Valerie estavam ficando cansadas quando pediram que Kol entrasse no ritual, pois ficaram com medo de perder suas forças tão perto do fim. Ele se aproximou, o que me permitiu continuar observando todo o processo. Ele entrou em contato com a bolha que protegia o corpo de Josie e perdeu o equilíbrio quando tentou se apoiar numa parede inexistente. Olhou para o seu braço e percebeu que não conseguia mais definir os limites do próprio corpo. Não conseguia definir onde começava e onde terminava o seu organismo, pois os átomos e as moléculas do seu braço se misturaram com os átomos e as moléculas do meio ao seu redor. Tudo o que ele conseguia sentir era essa energia. Apenas energia pura. 

Kol ficou fascinado pelo esplendor à sua volta, olhando vidrado para o que estava acontecendo. Eu pude ver isso... Não só nos olhos dele, mas confirmar depois, com suas próprias palavras quando me contou a sua experiência em primeira mão. Por não conseguir identificar os limites do seu corpo, ele se sentia enorme e expansivo. Se via conectado com toda a energia que havia ali e era tudo lindo. Bonnie e Valerie tinham formado um elo entre ele e Josie sem querer, e agora era como se ele partilhasse de um espaço na mente dela, sentindo o que ela sentia. Era como se Josie já não estivesse sozinha com sua inconsciência. Kol foi ligado ao corpo dela pelo ritual, e ao tocá-la era como se vivenciasse simultaneamente o que estava acontecendo dentro da mente dela, era como se estivesse dentro de seus sonhos e pesadelos. Quando ele ajudou Josie a se levantar e ela abriu os olhos pela primeira vez, ambos estavam prateados. E assim permaneceram. Mais uma coisa a distinguia de Lizzie agora.  Os olhos, espelhos da alma. Nada poderia estar tão certo.”

 - Alaric Saltzman.

Termino de transcrever a entrada #174 do diário Gemini pro meu diário-tarefa completando a minha linha do tempo principal. Usar as entradas do meu pai sobre o que aconteceu comigo e Josie me faz sentir como se estivesse colando. Principalmente quando envolve feitiços, encantamentos e rituais. Algumas vezes, ele reescreve as entradas, adicionando descrições de como as outras pessoas envolvidas se sentiram. São comentários bem pessoais. O próprio Kol contou que meu pai o interrogou para escrever aquela entrada, pois ele queria comentar da perspectiva do vampiro original. Ao mesmo tempo, não queria que ele escrevesse, pois também queria que nós pudéssemos ler a cena de fora, como um espectador, como ele mesmo. Ele é muito minucioso nas suas anotações, nunca esquece nenhuma e jura que um dia nós vamos agradecer por ter todos os passos do nosso crescimento documentado com rigor. No meu caso, esse dia já chegou. 

Registrando tudo isso direitinho no meu diário, vou garantir que Ekko não precise acessar minhas memórias na fonte. Hoje estou me sentindo uma traidora, pois descobri algo novo e quero contar primeiro para o Kol, talvez até só pra ele. Continuo me sentindo nervosa de esconder algo assim dos meus pais, mas mal posso esperar para compartilhar com Kol. Ele sempre faz tudo parecer normal e nada perigoso, me acalma e me ajuda - sem fazer uma lista de prós e contras como minha mãe ou sem catalogar cada reação e emoção que eu sinto, como meu pai. Eu não vejo Kol muitas vezes, mas cresci me sentindo ligada a ele. 

Elijah diz que foi por causa do ritual. Nós éramos mais novas e partilhamos energia com ele. Ele fez parte do ritual de nós duas, embora o meu tenha resultado em algo diferente, no tipo de bruxa que eu sou agora. Completamente diferente da minha irmã, em tudo que importa. Meus poderes vem do meu sangue, da minha linhagem, da genética da minha mãe, Josette Parker, que nunca conheci e só soube da existência algum tempo depois do ritual, quando os efeitos começaram a se apresentar de forma totalmente diferente dos de Josie. Mais uma vez, Kol foi quem descobriu o que estava acontecendo. 

Josie conseguia canalizar energia da natureza ao seu redor. E eu apenas conseguia canalizar a energia mágica contida no sangue que corre em minhas veias, o sangue dos meus ancestrais, do coven Gemini, do qual Valerie foi um dia expulsa. Nós pensamos que as diferenças tinham parado por aí, mas estávamos enganados. 

Rasuro no meu texto as partes do meu raciocínio que não preciso mostrar para Ekko e fecho o diário. Faço isso frequentemente. Transcrevo meus pensamentos em tempo real e depois corto a maior parte, deixando só os momentos que acho que ele quer realmente saber. Mas escrever tudo como se estivesse contando para alguém, me ajuda a organizar as coisas na minha cabeça e não esquecer de nada. 

— Terminou Lizzie? - Elijah pergunta quando me vê fechando o diário finalmente. 

— Por agora sim. - Respondo sorrindo e vendo os edifícios do centro da cidade pela janela. Estamos chegando. 

 

Revisão e Edição:

Caroline Azevedo

Drika Landim

Guilherme Rodrigues

Katti Vianna


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