Corríamos.

O vento batendo em nossos rostos, o toque suave de sua mão contra a minha revelando a alegria que pulsava fortemente no coração daquela garota. Era como voar pela primeira vez.

Evitei olhá-la, apesar da necessidade súbita que sentia. Por algum motivo, não queria encará-la. Ela estava livre, ambos estávamos, graças àquela menina. Era natural que ela se sentisse orgulhosa; que estivesse feliz. Entretanto, eu não estava pronto para ver seu sorriso ao me deixar.

Engoli em seco e olhei-a, finalmente, pelo canto dos olhos, incapaz de conter-me, e, para minha surpresa, havia em seus olhos incontáveis lágrimas contidas, apesar do sorriso largo que lhe rasgava a face. Senti meus lábios curvando-se num sorriso aliviado, e desaceleramos o passo na medida em que nos aproximávamos do rio.

Ela sentiria minha falta, dei-me conta, com um aperto no peito que mesclava imensa alegria e terríveis culpa e sofrimento.

Chihiro era forte. Ela ficaria bem.

Não ficaria?

— Não tem água! – observou Chihiro para minha surpresa.

É claro que não haveria, assim como no dia em que ela chegara.

— Não posso continuar com você— respondi simplesmente, desejando que ela não notasse a ambiguidade em minhas palavras – Volte pelo mesmo caminho que veio – expliquei, fitando-a – mas em nenhum momento olhe para trás até você ter saído do túnel. – apertei sua mão, desejando que aquele turbilhão de sentimentos fizesse sentido de alguma forma, que se tornasse ameno.

— Mas e você? – ela apressou-se em perguntar e pude sentir meus lábios se curvando de novo – e você, Haku?

— Vou falar com Yubaba – disse, o sorriso pregado ao rosto – deixarei de ser aprendiz. Estou bem agora que tenho meu nome de volta. – entrelacei meus dedos com os dela, certificando-me de fazer de uma lembrança cada um dos curtos segundos que nos restavam – Também vou retornar ao meu mundo.

— Haku, a gente vai se ver de novo? – ela perguntou, e precisei de toda a vontade que residia em mim para manter a expressão serena.

— É claro – respondi simplesmente.

— Você promete? – insistiu.

— Prometo – assegurei-lhe, ciente de que nosso tempo estava se esgotando. – Agora vá, e não olhe pra trás. – disse, incapaz de livrar-me do estranho calor em minha voz.

Chihiro desceu um degrau depois o outro, e, por fim, nossas mãos se soltaram.

Ela se fora.

Observei-a correr pela grama e por entre as pedras por um momento, perguntando-me qual fora a última vez que eu fizera uma promessa que não tinha certeza que poderia cumprir. Essa fora, provavelmente, a primeira vez que o fizera.

Senti uma ardência em meus olhos e levei minhas mãos até eles, perguntando-me o que estava acontecendo, e, para minha surpresa, um líquido quente escorreu-me pelas maças do rosto.

Sorri, agradecendo em silêncio que o feitiço requeresse que Chihiro não olhasse para trás, agradecendo pelas tantas coisas que essa garota me devolvera.