Eyes On Fire escrita por Brê Milk


Capítulo 36
Chapter 32: Um em um milhão


Notas iniciais do capítulo

''When you lose your way and the fight is gone
Your heart starts to break
And you need someone around now
Just close your eyes while I'll put my arms above you
And make you unbreakable''

- Jamie Scott (Unbreakable)



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JANE VOLTURI

 

Pouquíssimas eram as vezes em que a preciosa Volturi não compreendia suas próprias ações. Por estar no mundo há quase um milênio, era de se esperar que seu lado racional governasse tudo, e não o lado impulsivo e contraditório de sua personalidade difícil. Afinal, mesmo que Alec fosse o "gêmeo certinho", ações como a que estava tomando não era nenhum pouco de seu estilo.

Vaguear à procura de um vampiro nerd recém-criado de outra espécie e transtornado, com problemas de autocontrole e questionamentos existenciais, certamente não era nenhum pouco a sua cara. 
Ainda assim, lá estava ela: Jane Volturi, a angelical e malvada vampira, percorrendo as ruas de Forks, em busca de Gaz Julions, o estranho e patético amigo de Brooke Evern, que por sinal, tinha atacado a mesma à uma hora atrás. Então, após todo o choque e drama do ocorrido e do Julions ter fugido arrependido (provavelmente), a caça à ele começou. 
Os Cullen também estavam o procurando, porém o fato mais irritante era que ela, Jane, fora a primeira a sair na procura do estranho recém-criado. E enquanto fazia o trajeto até o endereço que encontrara em algo chamado Facebook, proveniente da boa é útil internet, tentava ignorar aquele fato e a natureza duvidosa dele.

A loira avistou a casa alguns metros adiante, contornando um poste de luz cujo a lâmpada acendia e apagava, quase queimando. Ela caminhou lentamente até lá, atravessando a rua escura e deserta da vizinhança de construções com gramados de cercas brancas, onde provavelmente famílias humanas felizes e ridículas viviam. 

Jane bufou com o pensamento e puxou as golas do sobretudo para cima, alcançando a cerca branca do endereço certo. Após olhar para os lados e constatar que não havia ninguém observando, ela pulou por cima da cerca, pousando graciosamente no gramado bem cuidado e esmagando as flores do jardim que antes não havia percebido, fazendo algumas pétalas grudarem no solado de seus sapatos.

Grunhindo, a Volturi virou as costas e seguiu caminho até a porta da entrada, desviando de estátuas de anões sorridentes. A porta estava entreaberta, e sem cerimônias, a loira a empurrou, abrindo-a totalmente, e adentrou a casa logo em seguida. 
Era relativamente pequena e relativamente aconchegante para uma família normal. O hall de entrada estava escuro, assim como o resto da residência. Jane se deslocou, caminhando silenciosamente pelo cômodo, os ouvidos atentos. O silêncio era absoluto, menos por um ruído frenético vindo do andar de cima. Com um sorriso de vitória, a vampira avistou a escada em caracol nos fundos da sala de estar e andou calmamente até lá, rumando na direção dos ruídos. 

Segundos depois, já estava no segundo andar, que assim como o primeiro, também estava imerso nas sombras. Contudo, com sua visão de vampira, Jane encontrou três portas ao longo do cumprido corredor, uma ao lado da outra. O barulho vinha da última. E foi para ela que a Volturi caminhou.

A placa pendurada na porta, com o símbolo do Batman desenhado, lhe deu a certeza de que o Julions estava do lado de dentro antes mesmo de rodar a maçaneta e entrar no quarto. E quando fez isso, foi exatamente o que aconteceu. Em meio às formas dos móveis, ela encontrou uma silhueta encolhida chão, que se movimentava para frente e para trás. 

Suspirando alto, Jane procurou um interruptor na parede e o achou, apertando o botão. A lâmpada se ascendeu, irradiando luz pelo quarto repleto de bugigangas, e um rosnado soou. O rosto de Gaz Julions apareceu em seu campo de visão; os olhos vermelhos mais vívidos que nunca, assim como mais irritados que nunca, e a boca completamente manchada do líquido escarlate que faria qualquer vampiro recém-criado surtar.

A Volturi empurrou as mãos para dentro dos bolsos do sobretudo, erguendo as sobrancelhas claras.

 

— Não rosne para mim. Seu rosnado é péssimo e patético como você.

— Jane? — O Julions perguntou, antes mesmo de erguer os olhos e a fitar confuso, parando de se balançar. O cenho dele se franziu enquanto pestanejava. — O que você está fazendo aqui?

— O que você acha? Vim atrás de você, é claro! Quer dizer, assim como os outros. Todos estão procurando por você, seu vampiro patético. Quem o disse que podia fugir daquele jeito? E dar todo o trabalho que está dando? — gritou Jane, o observando se levantar em um pulo. — Não ouse se mexer!

 

Gaz ficou imóvel.

 

— Bem, eu só ia pegar a poltrona para você se sentar.

 

A loira olhou pelo canto dos olhos a poltrona em forma de nave espacial do Star Wars, no canto do quarto.

 

— Eu não quero sentar na sua nave espacial — retrucou, rolando os olhos. — Eu quero que você vista uma camisa e que me siga de volta para a mansão Cullen. Agora.

 

— Eu não vou voltar para lá — Gaz respondeu, livre de qualquer confusão. Seu tom era sério e seu rosto, triste. E a certeza se sobressaía à ambos.

 

Jane bufou, o encarando impaciente.

 

— Eu não perguntei ou te dei uma escolha, Julions. Você vem comigo, querendo ou não — Determinou, erguendo o queixo. — Se dependesse de mim, eu não o levaria de volta, mas não depende. Então, pode me seguir por bem ou por mal. Posso fritar seu cérebro se for a segunda opção.

 

A Volturi o deu as costas, prestes a sair do quarto e convicta que o recém-criado estaria em seu encalço. Porém, quando alcançou a porta do cômodo, a voz dele soou, contrariando todas as suas firmezas e planos:

 

— Eu sou um monstro. Descobri isso esta noite — O sussurro de Gaz foi cheio de dor, raiva e arrependimento. Um pacote de emoções enviado diretamente para a única garota que não tolerava bagagens sentimentais.

— Bem, todos nós somos. Supere isso, Julions — replicou Jane, virando-se para trás com os braços cruzados, sentindo que a tarefa que fora fazer ali estava tomando um rumo diferente, perigoso para as suas barreiras.

 

Ela viu o loiro balançar a cabeça, desolado, parado no meio do quarto apenas de calça jeans escura, que agora que olhava atentamente, estava salpicada de sangue. Assim como as mãos.

 

— Eu não quero ser. No começo, pensei que ter me tornado vampiro tinha sido a melhor e mais irada coisa que havia acontecido comigo, o garoto nerd atrapalhado e tímido. Imortalidade, beleza, músculos, super poderes... Era como estar dentro de um HQ e saber que eu era o herói. E tudo bem desistir da minha antiga vida, do colégio, até dos meus pais se era o melhor para eles. E enfrentar os vilões... Tudo bem ser um erro de espécie e participar de testes e experiências inofensivas. Tudo bem não ter mais minha liberdade. Mas, eu matei duas garotas hoje. E ataquei Brooke, minha melhor amiga, a garota que eu amo. Eu a mordi! Eu tenho sangue manchando minhas mãos, minhas roupas, e agora quando me olho no espelho, tudo que vejo é a imagem de um assassino! Não sei como virei essa pessoa.

— Não que eu esteja tentando reconfortar você, mas já parou para pensar que isso é normal? Você é um vampiro novato, o que achou que aconteceria depois de um tempo? Que as bolsas de sangue do estoque do Carlisle saciariam a sua sede para sempre? — Questionou Jane, incomodada com a explosão de confissões do Julions. — Porque não, elas não iriam. E agora que entendeu da maneira mais difícil, é melhor que aceite sua real natureza, porque esse é quem você é agora.

— Não! Este monstro de agora é quem você e seu irmão sádico querem quem eu seja para concluírem a missão estúpida de vocês. Porque a missão é tudo o que importa para os Volturi, não é? — Rebateu Gaz, apontando o indicador na direção da loira, transtornado. O sangue em seu rosto e o brilho em seus olhos vermelhos contrastando com os cabelos louros o faziam parecer diabólico. Uma risada azeda lhe escapou pelos lábios, algo que ele não costumava fazer. — É, andei pesquisando um pouco sobre a realeza dos vampiros e descobri que há gente mais hipócrita e maquiavélica que os Sith!

 

Jane pestanejou, enfurecida.

 

— Ora, você está mesmo tentando ofender meu clã e eu com comparações de nerd? Seu...

— Idiota, patético, fracassado, etc. Eu já sei que você não gosta de mim, você já deixou isso bem claro. E também sei que vai me torturar ou fritar meu cérebro, mas me pergunto o porquê você está aqui agora, tentando me levar de volta?

— Porque você precisa de ajuda! — A vampira rosnou, estreitando os olhos, sendo a sua vez de apontar o indicador para ele com hostilidade. — E mesmo eu não querendo ajudar você, por alguma razão eu estou aqui! Porque toda vez que estamos perto de completar a missão e voltar para casa, algo acontece e atrapalha tudo! Porque você é um idiota ingênuo e eu odeio pessoas ingênuas, mas estou tão cansada de tentar demonstrar isso e causar terror nas pessoas apenas para manter a imagem de poder! Ou, então, porque... porque eu sei como é se sentir perdido e não saber mais quem você é ou como achar o caminho de volta. Como é não ter mais nada ou para quem voltar da sua antiga vida. Eu apenas... Vim atrás de você, mas não sei por qual motivo, Julions.

 

Jane calou-se, deixando o silêncio sufocar suas palavras descabidas e impulsivas. Ela confrontou o olhar arregalado de Gaz, que se mantinha mudo enquanto a observava sem reação, com o dedo ainda estirado em sua direção.
Sentindo-se mais constrangida do que em quase mil anos, a loira bufou e caminhou até a poltrona da nave espacial, onde se sentou atrás do painel de controle de espuma e cruzou as pernas, virando o rosto para o lado, para a coleção de bonecos e HQ's da prateleira à frente.

Estava louca. Louca e desequilibrada por se alterar daquela forma e abrir uma brecha em suas barreiras. Era aquela cidade a deixando insana, certamente. A convivência com o melodramático clã Cullen a estava infectando com toda sua sensibilidade e a pressão do cumprimento da missão. E por isso agora estava naquela situação vergonhosa: berrando seus pensamentos frustrados para o patético Gaz Julions. 
De toda maneira, aparentemente Alec não era o único que tinha mudado de certa forma, pois, Jane não estava se reconhecendo mais. E aquilo a estava dando nos nervos.

O pigarro desconfortável do Julions a chamou atenção, e com um olhar de esguelha, ela o viu se aproximar lentamente e sentar-se na poltrona ao lado da sua, outra em formato de nave espacial, a fazendo grunhir.
O silêncio se estendeu por mais alguns minutos até ele quebrá-lo.

 

— Como... você sabia que eu estava aqui? Quero dizer, seu namorado é o rastreador, e não vi nem sinal dele — Inquiriu Gaz, o tom baixo e livre de qualquer divertimento, escárnio ou indiferença. Somente curiosidade.

 

Jane encolheu os ombros, tentando achar algo interessante na prateleira para fixar os olhos.

 

— Demetri não é o meu namorado, pelo menos não oficialmente — Corrigiu-o, soando irritada. — E se quer mesmo saber, é bem óbvio. Depois do que você fez e como estava se sentindo, pensei que provavelmente você iria para um lugar onde se sentisse seguro e que não tivesse nenhuma relação com quem você é atualmente; o lugar onde você sempre poderia voltar, independente do tempo ou das circunstâncias.

— Meu lar.

— É, algo do tipo. Demetri e os outros não consideraram a hipótese e estão procurando você pelas ruas ou lugares mais próximos, então resolvi verificar se eu estava certa e eles errados. Como sempre, eu tinha razão.

 

A respiração quente do Julions bateu na parte de trás do pescoço da Volturi, a fazendo pensar como estaria a expressão dele no momento. Assim, movida pela curiosidade, ela virou a cabeça e olhou por cima do ombro, o encontrando com o semblante suavizado, a fitando como se ela fosse alguém interessante falando sobre coisas interessantes, embora ele ainda parecesse triste. 

 

— Você é uma garota esperta — comentou Gaz. — Mas não deve ter considerado que eu não estaria aqui se meus pais estivessem, pois não iria querer coloca-los em risco.

— Na verdade, eu considerei. Mas meu objetivo não era seus pais, e sim você. Como eles estariam, dependeria de você. Por sorte, ainda não os vi — Jane encolheu os ombros.

— Abençoada seja a terapia de casal de sexta-feira.

 

A vampira balançou a cabeça, começando a se questionar porque não levantava daquela poltrona estranha e arrastava o recém-criado de volta para a mansão, à base da tortura se fosse necessário. Mas, não. Ao invés disso, permanecia ali, sentada ao lado dele, tentando disfarçar seu constrangimento de minutos antes, mantendo um diálogo relativamente civilizado, enquanto estava frustrada e ele deprimido. 
Tudo aquilo era algum tipo de fenômeno ridículo.

 

— Jane, posso te fazer uma pergunta?

 

Ela suspirou.

 

— Você já está fazendo, Julions. Mas vá em frente, pergunte.

— Como você sabe como eu me senti depois... do que fiz? — Ele perguntou, olhando para os vestígios de sangue seco nas mãos. O sangue da garota que ele matara.

 

A Volturi não respondeu de imediato. Ponderou, questionando-se se deveria responder ou não. Porque, uma pergunta como aquela, era o tipo de questão que sempre evitara falar sobre.
Contudo, havia algo na forma como aquele recém-criado atrapalhado lhe perguntara. Uma mescla de dor, angústia, cólera e desespero contidas, mas palpáveis em seu olhar e tom de voz. 

Era a forma como ele a fitava. Ou melhor, como ele sentia-se. E Jane Volturi, a preciosa joia do clã real, temida pelos vampiros do mundo, se reconheceu o olhar e sentimento do Julions; ela se viu espelhada nele durante alguns segundos. Foi por isso que, diferente do que deveria e fora ensinada a fazer naquelas situações, ela virou o corpo completamente na direção do loiro, o encarando de frente, as costas retas, rígida, acessando as lembranças sombrias e vagas em sua cabeça do começo de tudo.

 

— Porque eu me senti da mesma forma como você, quando matei pela primeira vez após ser transformada — disse Jane, o encarando com os olhos vermelhos brilhantes, distantes. — A maior parte dos vampiros espalhados pelo mundo sabe da minha história e a de Alec, mas são poucos os que sabem da versão real.

 

Gaz ergueu uma sobrancelha salpicada de sangue seco.

 

— Eu estou fora das duas categorias.

— E nem será um dos poucos que estará na segunda — Rebateu Jane, o rosto pétreo. — Mas, resumindo, não é como todos pensam que é. Não nasci cruel como parece; a crueldade foi moldada em mim um pouco antes de me transformar. E a primeira vez que matei, não foi um simples assassinato, foi um massacre. Homens, mulheres, idosos, crianças... todos que moravam no meu antigo vilarejo. Os matei por vingança. E quando terminei, percebi que foi ali o início da maldade moldada em mim.

 

A Volturi encarou o Julions, esperando que a melancolia dele se transformasse em indignação ou horror. Porém, a expressão dele não mudou; ao contrário. Gaz somente absorveu a informação e ficou a fitando, parecendo ponderar sobre algo. No fim, ele apenas   lançou um breve olhar para as mãos tingidas de vermelho e voltou a encara-la:

 

— Você se arrepende de ter matado todos eles?

— As crianças, sim. Os outros, eu não poderia. Mata-los foi pouco comparado ao que me fizeram — Jane contestou, sentindo o cenho se franzir, pois não sabia de onde toda aquela sinceridade estava vindo. — Nos seus HQ'S, essa não seria a parte em que você, como mocinho, repudiaria minha resposta de antagonista?

— Nos meus HQ'S, o mocinho não mata uma pessoa e vira outro antagonista no meio da história — Gaz encolheu os ombros. — Mas, e você? Sendo a vampira antagonista da realeza, não deveria ser mais difícil abaixar sua guarda e revelar sua história que aparentemente é um enigma para a maioria dos vampiros espalhados pelo mundo?

Jane estreitou os olhos na direção dele.

— Eu nunca abaixo minha guarda, ainda não revelei minha história para você e você é um péssimo antagonista, só para deixar claro.

— Se você, que possui uma vasta experiência na área diz, então eu acredito. Acho que deve ser porque eu não gosto de espaguete, ou porquê não sou italiano.

 

Jane não conseguiu controlar a risada que lhe subiu pela garganta. Quando percebeu, o som de seu riso já estava repercutindo pelo quarto, mas foi breve. A vampira comprimiu os lábios, cessando o som, e olhou feio para Gaz, que tinha indícios de um meio sorriso na face.

 

— Você é um cara estranho, Julions. Mas acabo de perceber que isso talvez não seja necessariamente ruim.

— Um cara tipo, "um em um milhão"?

— Forçar a barra não se configura em um motivo plausível para tortura, mas pode passar a ser.

O vampiro deu um sorriso completo.

— Sem barra forçada, então, Jane Volturi.

 

Jane semicerrou os olhos, mas não fez nenhum comentário. Dessa forma, o silêncio recaiu novamente, mas dessa vez os dois estavam trocando olhares que ela não conseguiu decifrar. O tipo de olhar que aprisionava dúvidas, descobertas e hesitação.

 

— Eu não sei sua história, Jane. Mas, por baixo de todo esse mecanismo de defesa que você tem, e deixando de lado a tortura e seus comentários maldosos, você é uma garota legal — Gaz apontou para ela.

 

A Volturi piscou.

 

— Não gosto que tirem sarro de mim, Julions.

— Eu não estou fazendo isso. Apenas estou confessando que estava enganado à seu respeito. Você não é a pessoa que eu desenhei. Não é completamente má e não se importa apenas consigo mesma.

— Não preciso que me diga quem eu sou — Jane o lançou um olhar enviesado, mas havia uma ponta de nervosismo nele.

— Não estou tentando fazer isso — suspirou Gaz. — Estou apenas agradecendo. Pela conversa, por estar aqui, por ter vindo...

— E agora já está na hora de voltar! — A Volturi o interrompeu, levantando bruscamente da poltrona e se distanciando alguns passos.

 

A capa preta se moveu junto com ela, farfalhando em seus calcanhares, enfatizando o quão apressada ela estava para fugir do assunto. Porque era sempre assim com Jane: ela não gostava de falar sobre ela mesma. Ou sobre sentimentos, principalmente sobre os seus enterrados não tão no fundo. Porque, para ela, era bem mais fácil se tudo se resumisse à frieza, ao monocromático, à prática. Porque, acima de tudo, ela não conseguia lidar com as diversas sensações que algumas pessoas a despertavam.
A vampira alinhou a postura e virou -se de frente para o Julions, começando a levantar as barreiras e seus mecanismos de defesa.

 

— É melhor que você venha comigo sem reclamar, pois eu...

 

Gaz, que até então a observava em silencio, ouvindo as batidas lentas de seu coração despedaçado se misturarem com a voz harmoniosa da loira, esperou que ela se virasse para se levantar e ir até ela e envolve-la com os braços, desesperado por um último gesto de afeto, de qualquer pessoa que fosse.

Aquela pessoa era Jane.

Num primeiro momento, ele sentiu o corpo dela ficar rígido, como se estivesse sendo atacada e logo em seguida, sentiu os empurrões e ouviu os gritos dela, mas ele não se afastou. Contudo, alguns segundos depois, a Volturi pareceu perceber que aquilo não era um ataque, e sim um abraço. E ficou sem reação. Suas mãos caíram ao lado do corpo, e ela deixou que Gaz encaixasse o rosto na curva de seu pescoço.

 

— O que diabos acha que está fazendo, Julions? — Questionou, próxima ao ouvido dele, imóvel.

— Não quero ser um antagonista, Jane. Mas também não posso ser mais o mocinho — sussurrou Gaz, a voz abafada e embargada enquanto a apertava forte de encontro ao seu peito. — E é por isso que eu não posso voltar.

 

Ele deixou os braços ao redor da Volturi, caírem, e se afastou o suficiente para erguer o rosto. 
Jane abriu a boca, fitando as lágrimas rolarem pelo rosto do loiro, limpando o sangue grudado na pele, mostrando o quão diferente ele era de todos os outros vampiros que ela conhecia. Gaz Julions tinha a proeza de chorar e possuía um coração que batia dentro do peito, além de ser o imortal mais humano de todos os tempos. E por mais que fosse estranho, Jane o admirou naquele momento.

 

— Do que você está falando, Julions?

 

Gaz apenas balançou a cabeça e se inclinou para frente, alcançando o ouvido dela.

 

— Por favor, diga à Brooke que eu sinto muito. E diga aos outros que eu os agradeço por todo esse tempo e que eu ficarei bem — disse ele, e em seguida a fitou fixamente, os olhos vermelhos brilhantes, mais próximo que nunca. — Quanto à você... Você é estranhamente especial. E eu gostaria de tê-la conhecido antes, em outras circunstâncias. Espero que um dia eu só não ouça a verdadeira versão da sua história, como também conheça a verdadeira versão de você mesma, Jane Volturi.

 

Jane não compreendeu. Mas também não teve tempo. Antes que abrisse a boca, Gaz abaixou a cabeça e depositou um beijo cálido na testa dela, fazendo uma vibração percorrer entre os dois e uma luz branca irradiar pelo quarto, paralisando tudo ao redor. 
A vampira perdeu a noção do tempo, mas tudo pareceu acontecer em um segundo. Quando sua visão voltou ao normal e ela recuperou os movimentos, se deu conta que Gaz não estava mais presente. Estava sozinha no quarto com decoração nerd, e a cortina aberta junto com a janela, revelava o motivo.

Foi aí que a Volturi entendeu. O Julions havia usado seu dom para parar o tempo o suficiente para fugir e ganhar vantagem para despista-la. Ele havia ido embora. E não queria ser encontrado. 

 

— Idiota. — sussurrou Jane, olhando para as duas poltronas de nave espacial que outrora estiveram ocupadas pelos dois, enquanto sentia um incômodo em sua garganta e uma pressão em seus olhos. 

 

Ela fechou os olhos e respirou fundo, contando até dez. Não fez as estranhas sensações desaparecerem, mas a fez se lembrar que agora não tinha nada a mais a fazer ali. Então, recobrando a compostura, Jane arrumou a capa presa ao seu pescoço e caminhou até a porta do quarto, sentindo que as emoções há muito tempo trancafiadas dentro de si estavam prestes a eclodir. 

Estava enraivecida por agora não poder levar o Julions de volta para a mansão e provar sua genialidade, incrédula por ter sido passada para trás por um recém-criado e, acima de tudo, estava... arrependida.

Arrependida por ter deixado Gaz ir. 

 

 

 

 


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Notas finais do capítulo

SURPRESA!!!

Olá, amores. Como vocês estão?
Eu disse que voltava rápido, então cá estou eu, com esse capítulo que foi uma delícia de escrever. Até porque tem tristeza no meio e combinação de casal impossível (?)

Estamos na reta final, queridas. Tudo pode acontecer.

Como estou tentando diminuir as notas finais o máximo que posso para não entregar o fim da história, então tenho uma consideração sobre este capítulo: achei mais interessante colocar no ponto de vista da Jane, mesmo sabendo que a dúvida sobre a ''transformação'' do Gaz e os motivos por trás dela, ficaram. Mas, estou guardando essas explicações para serem dadas mais na frente, junto com o plot do Gaz.

Espero que tenham gostado.

É isso.

Até o próximo capítulo...

Bjs!



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