Leal a seu senhor escrita por Ágata Arco Íris


Capítulo 2
O amor de um deus


Notas iniciais do capítulo

Mias um capitulo, espero que gostem! ^~^



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Com o nascimento da raça humana, uma nova geração de deuses também nasceu. Esses deuses foram criados a partir de desejos e necessidade dos humanos, tornando assim divindades e mortais cada vez mais próximos.

Lendas contam que muitos andavam, choravam e riam junto com nosso povo. Isso sempre foi algo saudável para qualquer deus, seja ele um deus antigo ou nascido a partir de desejos, pois essa relação alimentava a fé de ambos e um deus sem fé não tem propósito de existir, sem isso ele basicamente morre.

Mas tudo mudou quando Izanagi descobriu que Kazu estava na Terra, sua ira aumentou ainda mais quando ele descobriu que vivia como um humano.

"Desgraçado, maldita seja sua alma e sua chama. Eu, deus Izanagi amaldiçoou sua existência e reencarnação como humano, deus do fogo. Você nunca poderá entrar no céu, eu te proíbo! ".

Como parte de sua vingança, Izanagi também proibiu também o contato direto de humanos com os deuses. Forçando as divindades a se esconderem sob máscaras para andarem sobre a Terra. Isso pareceu imprudente demais para qualquer um, mas foi necessário de se fazer. O oráculo de Izanagi havia previsto há muito tempo que um ser humano com afinidade ao fogo seria um dia coroado deus. Izanagi não podia pensar em outro humano a não ser kazu para essa profecia, por esse motivo teve que banir o contato direto dos deuses com os humanos. Ele sabia que para um humano ter tal ascensão, era preciso a ajuda de um outro deus. Por isso também a proibição.

Os deuses obedeceram essa regra por séculos, se escondendo em múltiplas formas, todas diferentes do habitual deles. Até que um dia um deus se apaixonou por uma humana, desafiando assim a lei de Izanagi e pondo em risco sua própria existência.

1792 - Província de Kumamoto

 

Hioshi, o senhor feudal responsável por uma pequena vila ao norte da província de Kumamoto, nunca foi um homem religioso. Sua mãe sempre brigou com ele por isso, ela dizia que “—se não tratarmos os deuses com respeito eles poderiam se esquecer de tratar bem você também” Hioshi nunca se quer ouviu isso. Para ele, deuses e milagres não existiam, era um homem muito fechado para coisas como essas. Mas tudo acabou mudando na noite em que seu primogênito estava para nascer; se não fosse a ajuda de um deus, nem ele, nem sua família e nem ninguém naquela vila estaria vivo pela manhã.

Um pouco antes do pôr do sol no dia anterior a bolsa de Nana, sua esposa, se rompeu. Quase que ao mesmo tempo Hioshi foi tirado de sua casa por uma emergência. Um de seus guardas que estava de sentinela na estrada que leva a cidade havia sido atacado, ele foi o único que sobrou do grupo que o acompanhava e estava morrendo, por esse motivo Hioshi teve de sair ás pressas para vê-lo na tenda do curandeiro.

—O que houve rapaz? —Perguntou Hioshi pegando na mão do soltado deitado na cama.

—Meu senhor, é uma honra conhecê-lo—Disse o guarda forçando um sorriso, mas não tinha forças nem para isso —Meu senhor, eu admito a culpa pelo ocorrido, mas se não tivesse acontecido talvez não os teria visto.

—Veria quem? —Perguntou Hioshi.

—O clã das aranhas.

—O que?! Não é possível?!

O Clã das aranhas (Kumo) juntamente com o das raposas (Kitsune), eram dois clãs de assassinos que semeavam a morte e a desgraça por onde passavam. O clã Kitsune era rival do Kumo, mas ambos mantinham suas famílias saqueando e eliminando seus rivais. O clã das aranhas tinha esse nome pela forma brutal que matavam as pessoas, eles penduravam suas vítimas de cabeça para baixo e cortavam suas gargantas para que morressem lentamente, suas vítimas viam sua vida escorrer diante de seus olhos. O das raposas era ainda pior, eram canibais e celebravam suas conquistas com um banquete de carne humana, mas comiam com a pessoa ainda respirando.

Os dois eram terríveis, por onde passavam a morte os seguia. Por esse motivo, Hioshi sabia que se chegassem na cidade ele não veria seu filho nascer.

—Senhor, estou dizendo toda a verdade—O rapaz começou a chorar—Eu sou novo nesse trabalho e estava cansado de andar, minhas pernas doíam, então pedi para pararmos um pouco. Meu comandante ficou com dó de mim e nos deu uma hora de descanso, mas estava tudo tão calmo, eu nunca poderia adivinhar que...Estávamos perto do rio, então fomos nos lavar no rio. Eu lavei meus pés e limpei meus calos, depois peguei uma garrafa de saquê e subi numa arvore para ver o pôr do sol, mas acabei dormindo assim que bebi o primeiro gole. Quando acordei eles já estavam nos atacando, eram cerca de 20 ou 30 homens, eu consegui fugir sem que me vissem. Mas um deles me viu e me seguiu, por sorte consegui matá-lo. Me perdoe senhor, foi tudo minha culpa!

Hioshi olhou para o curandeiro e ele não o olhou com uma cara boa, ao ver aquilo Hioshi soube que o garoto não duraria muito.

—Eu o perdoo, quando se recuperar irá lutar ao meu lado—Disse Hioshi lhe dando um tapa em seu ombro.

Ao dizer isso o guarda abriu um sorriso e começou a rir por entre lágrimas.

—Eu nunca havia visto o senhor de tão perto, é tão jovem, mas parece tão sábio... O senhor jura isso?

—Claro! Eu lhe dou minha palavra.

Depois disso o jovem caiu na cama, Hioshi pensou que ele havia morrido, mas havia apenas desmaiado.

—Cuide bem dele—Disse Hioshi ao curandeiro.

—Farei tudo possível, mas para esse homem somente um milagre pode salvá-lo.

Hioshi saiu da tenda e seu conselheiro já o esperava, haviam algumas guardinhas ao lado dele, três ou quatro. Todos estavam distraídos, então Hioshi falou firmemente:

—Homens! —Gritou Hioshi para os soldados que estavam do lado de fora tenda, todos levantaram na hora — Chamem todos os soldados possíveis, iremos expulsar os malditos Kumo daqui.

—Meu senhor— Disse seu conselheiro abaixando o rosto—Eu já fiz isso, esses são todos os homens treinados e disponíveis. O resto, são só recrutas, crianças sem experiência em um campo de batalha, como o que está ferido na tenda.

“Vamos todos morrer” Pensou Hioshi. Mas então como um lampejo, uma luz caiu sobre sua cabeça e ele se lembrou do que o curandeiro havia acabado de dizer “Um milagre...” e essas palavras ecoaram na sua cabeça. Isso realmente era algo que ele não acreditava, mas então Hioshi fechou os olhos e pode ver o rosto de cada habitante daquela vila, ele temia por todos.

—Peguem minha armadura em minha casa e me encontrem na entrada da cidade. Volto em uma hora.

—Sim senhor— Disseram todos ao mesmo tempo.

Hioshi correu o mais depressa possível para o templo do guardião do vilarejo, no topo da colina. Ele nunca tinha rezado, muito menos feito um pedido aos deuses em toda sua vida, mas naquele momento sua esperança era a única coisa que ele tinha. O templo era dedicado a Tamonten ou mais conhecido como Bishamon, o deus guardião dos ensinamentos de Buda, o grande ouvinte.

Por mais que ele achasse uma palhaçada todo aquele ritual, ele acendeu calmamente dois incensos, ajoelhou-se perante a enorme estátua de Bishsmon, juntou suas mãos e depois fechou os olhos. Ele não sabia o que falar, então lembrou de um dia ver sua esposa rezar e meio a uma conversa ela disse: É fácil rezar, se você falar com o coração, sendo sincero como Ebisu, qualquer deus irá te ouvir. Então ele respirou fundo e então falou com voz calma.

—Tamonten, eu vou ser sincero contigo. Eu nunca acreditei em você, ainda acho isso meio que uma perda de tempo, mas...Mas eu não faço isso por mim, eu rezo pelas almas de cada pessoa do meu vilarejo, pois eles são minha responsabilidade. E eu rezo principalmente por minha esposa, que neste momento está dando à luz ao meu filho. Se eu não fizer nada, o maldito clã das aranhas vai matar a todos e eu não sei o que fazer, não tenho homens para lutar e não tenho nem como passar confiança para eles, estou com medo. BISHAMON, POR FAVOR, ME AJUDE! Eu não quero que ninguém sofra, não quero que ninguém morra, quero poder ver o sol nascer e ouvir os pássaros cantarem, como pressagio que está tudo bem—Hioshi respirou e meio contrariado consigo mesmo continuou a falar—Juro que se sobreviver, tornarei meu primogênito um grande samurai, e ele irá lutar pelos seus ensinamentos.

Depois disso abriu os olhos e respirou novamente, tentou ganhar ao menos um pouco de confiança com a brisa que tocava seu rosto, por fim se levantou e foi embora. Só que, quando estava saindo do templo, na porta do santuário havia um homem com uma bela armadura encostado no portal, ele mascava uma folha qualquer. Hioshi ficou perplexo e com um pouco de luz que ainda restava ele pode ver que seus cabelos eram brancos como a neve, devia ter por volta dos quarenta ou cinquenta anos. Ele pensou por um momento que fosse um homem do clã das aranhas, então pegou rapidamente sua adaga em seu Kimono.

—Ei idiota, vai ir encontrar seus homens ou vai ficar aí me olhando? —Disse o homem.

—Hã?! Com sabe que...

Era Bishamon disfarçado, ele estava descansando em seu próprio templo quando viu Hioshi adentrar. Aquele vilarejo estava sobre a proteção de Bishamon, todos ali oravam com constância para ele pedindo sabedoria e calma para saber lidar com as dificuldades da vida, mas Hioshi... Hioshi se quer visitava o templo no dia de ano novo, Bishamon não o questionava, mas nunca esperava ter nada de Hioshi, muito menos aquele pedido. Cada palavra de Hioshi havia comovido o deus, por esse motivo o deus resolveu ajudá-lo.

—Eu costumo vir aqui a noite, te ouvi rezando. Você é péssimo nisso sabia? Se eu fosse Bishamon vinha aqui só para te ensinar a orar direito.

—Onde você quer chegar, o que você quer? —Disse Hioshi sério.

—Meu nome é Nagai Tadashi e sou o que você pode chamar de um mercenário.

—Hum, já sei onde quer chegar, não precisamos de seus serviços mercenário.

—Cara, você sempre é tão sem educação assim? Credo, não deixa nem eu terminar de falar.

—Continue então.

—Sou um humilde servo de Bishamon, amo esse lugar, não posso nem pensar nele destruído. Então, pelo bem do templo e da cidade, peço que me deixe lutar ao seu lado.

—Sabe usar uma katana?

—Melhor que você se brincar—Tadashi sorriu sarcasticamente.

Mesmo Hioshi não tendo gostado daquele sujeito, ele não estava em momento de recusar ajuda de ninguém. Então foram os dois até a entrada da cidade.

—Já sabem a localização dos Kumo? —Disse Tadashi montando em um cavalo negro, que surgiu basicamente do nada.

—Há um ou dois quilômetros daqui—Disse um soldado meio receoso com o velho—Desculpe, mas quem é o senhor?

—Esse é Tadashi, um conhecido— Disse Hioshi terminando de vestir sua armadura.

Então assim foram oito homens, contra cerca de 30 assassinos, a caminho da morte...

Bem, mais ou menos. Eles tinham ao seu lado um deus e ele honrava o nome de deus guerreiro, lutava com maestria e graça. Bishamon abençoou enquanto cavalgava, todas as laminas carregadas pelos soldados, dando assim vantagem sobre os assassinos. O clã Kumo os esperava em uma emboscada que deu errado, os forçando a duelar espada com espada contra o clã protegido pelo deus. A batalha levou quase a noite toda para acabar, mesmo com a benção de um deus, o clã Kumo ainda era muito forte, então foi difícil acabar com todos.

Ao final, nenhum dos oito soldados morreu, alguns se feriram, mas nada que pudesse lhes tirar a vida. Hioshi havia levado uma facada em seu ombro por entre as brechas da armadura, mas não sentia dor, sua determinação em expulsar os Kumo era maior que qualquer dor.

—Foi um corte feio—Disse Tadashi— Deixe me ver.

—Não, está tudo dentro do normal…. Ainda bem que acabou—Hioshi suspirou—Eu nem acredito que conseguimos vencer todos aqueles homens.

Ambos se sentaram um pouco no chão e ficaram contemplando a vista daquele improvisado campo de batalha, onde passaram a noite toda lutando, sob a luz da lua e proteção da escuridão.

—Esse é o poder da fé, ela é capaz de mover montanhas— Disse Tadashi sorrindo—Mas eu acho melhor você ir embora.

—Hã?! Por que diz isso?

—Você não vai ser pai?

—Sim, mas.... Meus homens precisam de mim.

—Não se preocupe, eu cuido de tudo. Aliás, não é todo dia que o primogênito de um homem nasce.

—Como sabe que é meu primeiro filho?

—Palpite, nunca te vi com uma criança pelas ruas do vilarejo.

Hisohi pegou seu cavalo e foi o mais rápido possível para sua casa. O galo já havia cantado, os primeiros raios de sol da manhã já iluminavam o vilarejo, moradores que já haviam levantado estavam saindo para trabalhar. Quem estava na rua se deparou com um samurai montado em seu cavalo, passando por todos em alta velocidade vila a dentro. Não era possível ver o rosto de Hioshi por debaixo de seu elmo, mas ele vestia armadura trincada, havia sangue sobre seu corpo e terra em seu rosto, e era óbvio para quem o visse que vinha de uma batalha. 

—Onde ela está? —Disse Hioshi para a empregada na entrada de sua casa.

— O senhor chegou na hora, acho que a criança está prestes a chegar —Respondeu a senhora sorrindo alegremente.

Ele tirou seu elmo e pôs debaixo do braço, depois desceu com dificuldade de seu cavalo.

—O senhor está bem?  Parece ferido —Disse a empregada preocupada com seu mestre.

—Estou —Ele ajeitou mais confortavelmente a armadura sobre seu peito — Agora leve-me até minha esposa.

Ao adentrar a casa ele escutou um agudo e prolongado grito de dor, era sua mulher.  Logo em seguida veio um silêncio, mas foi rapidamente substituído por um choro de criança que ecoou pelos quatro cantos da casa, era seu filho que acabara de nascer. Hioshi foi tomado de alegria e correu para onde vinha o choro, ele abriu a porta do quarto e viu sua mulher sendo cuidada por suas empregadas, do outro lado da sala estava sua mãe, uma velha senhora segurando em suas mãos o recém-nascido.

Hioshi caiu de joelhos na porta mesmo, depois deu um suspiro de alívio. Esse era sem dúvida um dos dias mais feliz de sua vida, se não o mais feliz.

—Meu filho —Disse Hioshi olhando para sua esposa —Muito obrigado Nana.

—Desculpa querido, eu sei que você queria um garoto. Mas os deuses nos deram uma linda e saudável garota.

—Hã?! É menina?

—Sim querido, por favor não fique chateado... —Hioshi a interrompeu.

—Não estou triste, estou aliviado. Posso segura-la?

—Claro—Nana sorriu.

—Mas não vá derrubar a criança, você é sempre tão desastrado—Disse sua mãe se levantando do chão.

—Não sou tão desajeitado a esse ponto mamãe. Deixa me ver minha filha.

Então Hioshi pegou sua filha pela primeira vez; a criança ainda estava de olhos fechados, como era esperado de um recém-nascido, mas assim que ele tocou na criança ela parou de chorar.

— Acho que ela gosta de você —Disse Nana rindo.

— É o que parece né. Ela é linda, obrigado por uma criança tão bonita assim.  Você já escolheu o nome?

 —Não, eu estava esperando você chegar para pensar nisso, acho que ela também. Estávamos muito preocupadas. Então, qual nome quer dar para ela?

— Bem, eu acho que ela tem cara de Emi.

Emi em japonês significa “Benção, uma graça divina”, era isso que Hioshi sentia naquele momento. Toda sua luta e sua vitória haviam sido uma benção, e o prêmio por isso, ele segurava em suas mãos naquele exato momento.

—Hum, eu acho um bom nome. Gostei de Emi —Disse Nana rindo—É perfeito.

Do lado de fora da casa, assistindo atentamente toda a cena, estava Bishamon. Para ele Emi era apenas uma criança qualquer, sem nada de especial, mas mesmo não sabendo, aquela era a primeira vez que o deus via o tesouro mais valioso que um dia ele teria.

—Bem-vinda ao mundo Emi—Disse Bishamon de forma serena.


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