À Espada Pelo Sangue escrita por LahChase


Capítulo 51
Capítulo 41 – A Música Que Eu Não Toquei


Notas iniciais do capítulo

Hey, minna!!
Eis o capítulo prometido ^^ Eu sei que prometi postar durante a semana, mas né... Mal aí
Agradecimentos a Minoran e Ary pelos comentários maravilhosos que deixaram no último capítulo ♥
Bom, sem mais delongas... Vejo vocês no final ^^



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Pisar naquele lugar era suficiente para trazer um sorriso involuntário ao meu rosto.

A mansão fazia jus ao nome em tamanho. De fato, por ser o antigo prédio da escola de música da minha avó, era um lugar muito grande apenas três pessoas (meu tio e seus filhos) morarem, e por isso grande parte da casa não era utilizada. Por vezes eu me perguntei o motivo de meu tio não a vender e se mudar para algum lugar menor, mas agora era grata por isso. Era graças ao espaço de sobra que o evento anual de talentos musicais era realizado lá, o que significava muito para mim. Além disso, muitas memórias boas me invadiam estando ali.

Minha infância foi bem feliz, em contraste com a maioria dos semideuses. Tivera uma família feliz, abastada e recheada de amor. Minha avó havia morrido quando eu tinha cinco anos, então eu não me lembrava muito dela, mas seu legado era incrível. A escola de música era, de fato, um lugar muito alegre. E aquele prédio ainda conservava parte dessa alegria, como se ela houvesse sido gravada em suas paredes.

Ou eu simplesmente estava dando muito mais valor a tudo agora que meu pai havia partido.

No entanto, uma coisa me incomodava a ponto de fazer meu sorriso se transformar em uma expressão exasperada: Ian não parava de se curvar a cada pessoa que cumprimentávamos.

— Pare com isso. – murmurei depois da terceira vez – Quem em plena América fica se curvando ao ser apresentado a alguém? Não estamos no Japão. Aqui apertamos as mãos.

— E no Brasil nós nos abraçamos. Ou fazemos um “toca aqui”. – ele reclamou, com uma expressão cansada – Não sei você, mas eu não tenho um botão para mudar de programação toda vez que mudo de país. São três culturas diferentes, então vê se não reclama.

— Rum. – resmunguei, com jeito de “tô nem aí”, apesar de estar pensando que Ian evidentemente nunca havia participado de um evento daquele tipo no Brasil. Eu tinha quase certeza de quem ninguém no mundo fazia um “toca aqui” em meio a uma festa de gala – Você tá passando tempo de mais com Hiro para falar de programação.

— Urusai, baka.

— Não diz “urusai” pra mim.

— Você nem sabe o que significa.

— Como se você fosse falar coisa boa, ainda mais em japonês.

— Em inglês, então: “cala a boca”.

— Cala você, idiota.

— May! – uma voz nos interrompeu.

Nós dois rapidamente disfarçamos os olhares fuziladores que mandávamos um ao outro, e nos viramos para a direção de onde a voz viera. Um sorriso se abriu em meu rosto no momento em que identifiquei quem era.

— Liam! Lizzy! – exclamei, abrindo os braços.

Meus primos me agarraram em um abraço em grupo, apertando-me com força.

— May! Como é bom te ver! – Lizzy disse ao nos separarmos.

Elizabeth, ou Lizzy, tinha seu volumoso cabelo loiro caindo graciosamente pelos ombros à mostra e estendendo-se até a cintura, apenas alguns centímetros maior que o meu, olhos azuis brilhantes e feições delicadas. O vestido branco realçava seu caráter e aparência inocente e fofo. Ela era o tipo de menina que a gente precisa sempre tomar cuidado ao acompanhar na rua: chamava a atenção de todos os meninos como imãs. Eu me lembro de uma vez ter passado uma semana em San Francisco, quando nós passeamos juntos pela cidade. Perdi a conta de quantos olhares fuziladores eu e Liam lançamos aos garotos que a devoravam com os olhos.

— Papai falou que vocês não viriam esse ano. – Liam acrescentou – Ficamos desapontados.

Liam compartilhava com sua irmã os fios loiros, os olhos azuis e as feições bonitas. Bom, eles eram gêmeos, afinal. No entanto, seu olhar não era tão inocente quanto o de Lizzy. Sua beleza era um tanto mais... sedutora, se acrescentado ao brilho quase travesso que ele tinha no olhar. Eu me lembro de ter mostrado uma foto dele para Shayla e de ter que aturá-la falando dele por dias até que ela o esquecesse. E olha que ela não costuma fazer esse tipo de coisa.

No entanto, a personalidade deles não fazia muito jus à aparência de anjinhos. Ambos eram meus parceiros de travessuras quando éramos crianças. Formávamos uma espécie de gang dos Jacobs, ou era o que pensávamos. Embora Lizzy sempre fora aquela metida no meio por não querer desgrudar de nós, eu e Liam éramos verdadeiros aventureiros. Nós dois nos dávamos tão bem que costumávamos dizer que nos casaríamos quando fossemos grandes.

Claro, quando crescemos colocamos essa conversa de lado (apesar de que as piadas quanto a isso nunca morriam. Ele ainda me chamava de “futura esposa” de vez em quando), mas o hábito de fazer besteira juntos foi algo que não perdemos. Liam e eu sempre protegemos Lizzy, e nos metemos até mesmo em brigas juntos.

Mas eu gostava de fantasiar que era aquela a protege-los. Não deixava eles se machucarem, principalmente quando se tratava de suas mãos, que usavam para tocar piano e violino. Aqueles dois eram gênios da música, o que significava que eram as pérolas da escola, ainda mais sendo filhos do Diretor. Sempre que eles se machucavam por minha causa, eu me sentia culpada. E principalmente Liam reclamava de meu hábito de querer poupá-lo. Mas eu não podia evitar. Quando éramos crianças eu era mais forte que ele, enquanto os dois significavam tanto para mim: os únicos entre as duas escolas (a normal e a de música) que não me recriminavam por ser estranha e hiperativa.

As mães não queriam que seus filhos sofressem a influência de uma pestinha como eu, mas a esposa de tio Henry sempre me perdoava depois da bronca. Os professores não sabiam mais o que fazer quando eu não conseguia ler os textos ou partituras, mas Liam e Lizzy simplesmente me diziam que teclas pressionar ou que cordas tocar. Eu sentava sozinha no almoço da escola, mas nas noites em que íamos para a casa de tio Henry, jantávamos todos juntos como uma família feliz e unida. Eu acho que, na minha cabeça, ser protetora quanto aos meus primos era minha forma de garantir que aquilo nunca acabasse.

Olhei para Liam, notando que agora precisava erguer o pescoço para encará-lo. Pensar em tudo aquilo, revê-los após tudo o que havia passado... Senti lágrimas se acumularem em meus olhos.

Os olhares dos dois caíram sobre mim, de repente preocupados.

“Não posso chorar agora!” gritei mentalmente e disse a mim mesma: “Foco! Depois você sente a nostalgia, agora trate de disfarçar isso”.

Abracei Liam novamente, pegando-o de surpresa, mas ganhando um tempo para minhas lágrimas secarem, antes mesmo de caírem, ao enterrar meu rosto em seu peito.

— Ah, vocês não sabem o quanto senti saudades de vocês! – exclamei, então largando-o e segurando as mãos de Lizzy – Quando papai disse que não viríamos quase chorei.

Os dois abriram sorrisos gentis.

— A propósito, onde está tio Jack? – Liam perguntou.

Desviei o olhar, soltando as mãos de Lizzy.

— Ele... Não pôde vir esse ano. – respondi, e disfarcei novamente, puxando Ian pelo braço – Por isso eu trouxe meu amigo comigo. Ian, esses são meus primos, Liam e Elizabeth.

— Pode me chamar de Lizzy. – ela disse ao apertar sua mão.

— É um prazer conhece-la.

Liam me cutucou e, aproximando a boca do meu ouvido, sussurrou:

— Seu namorado?

— Hah! – ri, também falando em seu ouvido – Nem sob tortura!

Ele me lançou um olhar malicioso.

— Sei.

— Urusai. – respondi, automaticamente.

— Que?

— Você não é daqui, é? – Lizzy perguntava – Tem um sotaque diferente.

— Ele é brasileiro. – falei, querendo me desvencilhar de Liam – Mas mora no Japão.

— Japão. – Liam sussurrou novamente – Você não acabou de me mandar calar a boca em japonês?

— Como diabos você sabe disso? – eu murmurei de volta.

— Sou otaku.

— Brasileiro? – Lizzy disse – Então fala português? Você não começou a aprender essa língua, May?

— Hmmm... – ouvi Liam resmungar ao meu lado e internamente dei um suspiro exasperado.

— Ah, foram apenas algumas semanas, não lembro de mais nada. – apressei-me para mudar de assunto – Gente, preciso da ajuda de vocês para algo.

Os dois grudaram o olhar em mim.

— Está aprontando de novo, prima? – Liam perguntou com um sorriso.

Eu pisquei um olho.

— Tipo isso.

— Ei... – ouvi Ian começar, provavelmente preocupado que eu revelaria a missão a eles, mas ergui a mão para detê-lo, ao mesmo tempo lançando um olhar que o mandava ficar calado. “Confia em mim nessa” pedi mentalmente.

Eu o vi ficar quieto, e cruzei os braços, sorrindo para meus primos.

— Vocês sabem que papai não me deixa viajar sozinha, certo? – comecei – Então, acontece que, como ele não poderia vir esse ano, eu tive que convencer esse idiota aqui a vir comigo. – apontei para Ian – Ele só aceitou com uma condição. Ele é louco por aquelas coisas velhas, aquelas armas antigas e tudo o mais, por isso usei a coleção de tio Henry para convencê-lo. Prometi que o deixaria ver tudo. Só que nós temos que ir daqui direto para o aeroporto, ainda essa noite. Não tenho outra opção a não ser sair no meio das apresentações.

— E quer que a gente te dê cobertura. – Liam adivinhou.

— Entendo. – Lizzy disse – Se papai souber que você o está levando para ver a coleção dele...

— É, vocês sabem como ele é ciumento. E, depois da última vez... – deixei a frase no ar.

Os dois seguraram as risadas.

— Jura que não vai fazer aquilo de novo, não é? – Lizzy perguntou.

— Faço até promessa do dedinho. – respondi – Nunca mais faço aquilo. Gosto de viver.

Liam abriu um sorriso de canto.

— Nesse caso, a gente ajuda.

— Lizzy, Liam! – uma voz chamou, e vimos meu tio se aproximando – Está na hora de se prepararem!

Os dois se viraram para mim e piscaram um olho.

— Vamos dar um jeito para você quando precisar. – Liam disse.

— Agora precisamos ir. Até já. – Lizzy completou, e ambos se apressaram para subir as escadas que davam para os quartos onde os musicistas que se apresentariam se preparavam. Perguntei-me o motivo de eles estarem indo para lá.

— May! – tio Henry continuava a vir até mim, já abrindo seus braços para me receber.

Eu sorri, e me aconcheguei em seu abraço.

Tio Henry tinha uma composição robusta. Não gordo, mas grande. Os olhos eram azuis como os dos filhos, mas os cabelos eram mais escuros, algo entre o loiro e o castanho. Uma barba bem-feita lhe dava uma aparência madura, além de um quê de galã ao ser combinada com o terno elegante. Seu sorriso me lembrava o de meu pai. Não pela fisionomia, mas pela forma como te fazia acreditar que ele verdadeiramente estava alegre.

— Tio Henry! – exclamei, apertando-o.

— Ai, ai, minha querida! – ele riu, fazendo de conta que estava sem ar – Assim eu não respiro.

Sorri, afastando-me.

— Como você está linda. – ele disse, segurando minha mão e me fazendo dar uma voltinha – E maior também. Como você está, meu bem?

— Melhor agora. – respondi, sinceramente.

— E quem é o rapaz? – perguntou, fitando Ian.

Apresentei-os um ao outro, e deixei tio Henry conversar um pouco com ele enquanto o observava. Nenhuma pergunta sobre o meu pai, para o meu alívio, e nada de diferente desde a última vez que eu o vira, há vários meses. Não importava o quanto eu tentasse, de fato não podia ver um traço sequer em meu tio que pudesse me fazer desconfiar que ele estava do lado do inimigo. Rezei silenciosamente para que Matthew também não encontrasse nenhum motivo para acusá-lo.

— May. – a voz de tio Henry me tirou de meus pensamentos – Vamos, já vai começar. Sente-se comigo, pelo menos nessa primeira parte.

— O senhor não vai tocar a abertura esse ano? – perguntei, ao sentar ao seu lado, entre ele e Ian.

As cadeiras não eram muitas, cerca de sessenta, e estavam organizadas e enfileiradas em uma meia-lua, viradas para uma estrutura não muito alta, uma espécie de palco onde os musicistas se apresentariam.

— Não. – meu tio negou com a cabeça, sorrindo – Esse ano Liam e Lizzy vão tocar ambas as músicas.

Ele me lançou um olhar ladeado.

— Estive insistindo com seu pai desde o ano passado para que você apresentasse Love’s Sorrow para nós esse ano, assim como os meninos estão tomando o meu lugar em Love’s Joy. É uma pena que ele não tenha concordado.

Dei um sorriso triste, tendo certa ideia do motivo pelo qual meu pai não havia permitido, mas sem poder dizer a verdade, falei:

— O senhor sabe que as minhas habilidades musicais não chegam ao nível deste evento, tio.

Ele riu.

— Não se menospreze. Você tem o sangue de Jack, afinal. Com treino adequado, estou certo de que faria uma apresentação maravilhosa. Eu estava esperando poder fazer desta cerimônia uma representação: o primeiro passo para passar a Escola para a geração mais jovem.

— Neste caso, não entendo como o fato de eu não participar impede que isso aconteça.

Tio Henry sorriu.

— Você é herdeira também, May. – respondeu – Bom, mas eu tenho certeza de que há outras prioridades no momento. No entanto, quando chegar a hora, venha para cá novamente, e conversaremos sobre isso mais uma vez.

Estreitei os olhos, perguntando-me o que ele queria dizer com aquela fala vaga, mas ele logo disse:

— Veja, eles estão vindo.

Meus primos desceram as escadas, de braços dados, e caminharam até o palco ao som dos aplausos do público. Após cumprimentarem a plateia, Lizzy pegou o violino e Liam se sentou ao piano. E as primeiras notas de Love’s Joy suavemente nos alcançaram, em uma melodia que me colocou no ápice de minha nostalgia. Meus olhos ficaram grudados àquela cena, enquanto meu coração era preenchido por uma sensação boa.

Antes mesmo que eu me desse conta, Love’s Sorrow também já havia acabado, com Liam no violino e Lizzy no piano. Aquela música, ao contrário da primeira, trazia algumas memórias tristes em meio às felizes, pois fora a trilha sonora da morte do meu pai. Os dois se retiraram e meu tio subiu ao palco, anunciando o início das apresentações das escolas e agradecendo a presença dos convidados. Segui meus primos com o olhar, e vi Liam apontar para o quarto e dizer “você, sozinha, agora”.

Lancei um olhar a Ian, certa de que ele não gostaria que eu saísse...

— Idiota. – murmurei, assim que o vi. Ele estava cochilando.

Levantei e discretamente segui os dois até o quarto onde haviam entrado.

— Ei, vocês dois foram simplesmente incríveis. – falei, enquanto entrava, fechando a porta atrás de mim.

— Obrigada. – Lizzy sorriu, pegando um vestido em cima da cama e seguindo para o banheiro – Vou trocar de roupa.

Liam esperou que ela fechasse a porta e então se virou para mim, com os braços cruzados.

— May, o que está acontecendo? – perguntou, com um olhar preocupado.

Fiz cara de quem não entendeu.

— Do que está falando? Eu já expliquei, não foi...?

— Acontece que não estou acreditando. – ele interrompeu – Olha, eu sei que não nos vemos há muito tempo, mas eu te conheço, okay? E você definitivamente está preocupada com alguma coisa séria. Você e seu amigo estrangeiro.

Sustentei seu olhar por alguns segundos, procurando um jeito de o fazer deixar isso de lado. Se ele tentasse descobrir a verdade, podia acabar em perigo, e isso era algo que eu simplesmente não podia permitir. No entanto, eu tinha que admitir que Liam não era bobo, nem fácil de enganar. Se ele desconfiava de que eu não estava contando a verdade, convencê-lo do contrário não seria fácil.

— Ei... – ele recomeçou, hesitante – Diga-me, May, você... Você vê também, não vê?

Franzi a testa.

— O que quer dizer?

Liam suspirou e sentou na ponta da cama.

— Coisas estranhas. – falou – Como se seu cérebro lhe pregasse peças, te fazendo enxergar coisas que não deviam existir. Cavalos voadores, por exemplo... Eu às vezes tenho a sensação... – ele soltou uma rizada incrédula – Loucura, não é? Talvez eu apenas assista animes de mais.

Eu me esforcei para manter minha surpresa sob controle, mas minha mente estava trabalhando freneticamente. Cavalos voadores?! Ele era capaz de enxergar as criaturas mágicas e os monstros? Como...? Liam e Lizzy eram ambos humanos comuns. Pelo menos eu sabia que sua mãe não era uma deusa, pois eu mesma a havia conhecido antes de ela morrer. Haviam fotos de sua gravidez, e também do parto. Provas de mais para suspeitar do contrário. Tio Henry também... Ele não era um Greno, e provavelmente nem era semideus. E qualquer um que olhasse para ele saberia imediatamente que era pai daqueles dois, então não havia a menor chance de sua esposa o ter traído com algum deus...

Isso significava... Que Liam era um mortal com a capacidade de ver através da Névoa? Mas isso era...

— Perigoso. – deixei escapar, o que o fez olhar para mim.

Sim, perigoso. Por isso eu tinha que convencê-lo de que ele não podia ficar pensando sobre isso.

— Liam, você confia em mim? – perguntei, séria.

Ele franziu a testa, mas assentiu.

— Então escute bem o que vou dizer: esqueça isso de ver coisas estranhas. Não comente com mais ninguém, e simplesmente ignore. Quanto menos atenção prestar nisso, melhor para você.

— May, você não simplesmente ignora algo como cavalos voadores. – ele respondeu – Se sabe alguma coisa sobre isso, eu prefiro que me explique.

— Não! – rebati, um pouco mais forte do que pretendia.

Ele arregalou os olhos, surpreso. Foi quando notei a lágrima correndo por minha face.

— May...?

Senti mais lágrimas vindo, e meus ombros começaram a tremer. Ele ficou de pé e me abraçou.

— Ei, calma...

— Não pode, Liam... – falei – Você, Lizzy e tio Henry... Vocês são preciosos para mim, entende? Não posso deixar que vocês também...

Eu me afastei e o encarei, com o olhar determinado.

— Por favor, confie em mim. – pedi – Pelo menos por enquanto... Faça o que eu falei.

Eu vi a hesitação em seu olhar.

— Um dia – prometi – Um dia eu te explicarei tudo. Mas agora, eu preciso que me ajude com o que pedi e então esqueça esse assunto. Quando eu resolver o que preciso...

— Entendi. – ele interrompeu, revirando os olhos e abrindo um sorriso – Eu não sei no que está metida, sua desmiolada, mas acho melhor que saia logo dessa, entendeu? Não vou te perdoar se não voltar e me explicar tudo.

Sorri, aliviada.

— Hm? – Lizzy saiu do banheiro e nos lançou um olhar malicioso – Interrompo algo entre os dois pombinhos?

Nós dois sorrimos. Liam colocou a mão em minha cintura e me puxou para si, enquanto eu fazia cena de donzela.

— Ora, ora, será que não posso ter um tempo a sós com minha futura esposa? – ele brincou.

— Ah, querido, teremos tempo. – respondi, abanando o rosto com a mão do jeito que as moças faziam naqueles filmes antigos.

— Pfffff! – ele explodiu, largando-me e gargalhando, Lizzy e eu o acompanhando – Ah, eu senti falta disso, prima.

Enxuguei as lágrimas de rizo.

— Vocês dois... – falei – Não importa quanto tempo passe, eu sempre me divirto quando estão por perto. – fiquei mais séria – É uma pena que eu não possa ficar por muito mais tempo. Nesse momento, preciso que vocês desviem a atenção de tio Henry para que eu e Ian possamos ir à sala da coleção.

— Não precisamos de nada complicado. – Lizzy falou, caminhando para a porta – Ele já está distraído o suficiente com a festa. Mas, se ele preguntar por você, daremos um jeito.

— É. – Liam disse, seguindo-a – Dizemos a ele que você está se pegando em algum canto com o seu namorado que trouxe com você. Isso vai convencê-lo.

— Ei! – reclamei, também saindo do quarto – Eu já falei, aquele idiota não é meu namorado. É uma inconveniência, isso sim.

— Quem é uma inconveniência, baka? – a voz de Ian surgiu do nada, fazendo-me dar um pulo – Não fui eu quem sumiu do nada e deixou o parceiro para trás.

— Mas que diabos...?!

Ele estava encostado na parede, os braços cruzados e o olhar de desprezo de sempre.

— O que está fazendo aqui? – perguntei, tentando disfarçar meu susto com uma postura desdenhosa – Quando saí de lá, você estava cochilando igual a Bela Adormecida.

— Eu não cochilo.

— Claro que cochila, idiota.

— Urusai.

— “Urusai, urusai” – fiz uma imitação besta – É só o que sabe falar quando não tem argumentos, não é?

— Olha só... Vocês têm até briguinha de casal. – Liam sussurrou para mim e eu o fuzilei com o olhar.

Respirei fundo.

— De qualquer jeito, temos que ir. – falei, colocando um fim naquela ceninha inútil.

Meus primos se despediram e eu suspirei, percebendo então que estivera tensa desde que Liam começara aquela conversa.

— Ele sabe alguma coisa, não sabe? – Ian murmurou e eu o fitei.

— Acho que ele pode ver pela Névoa. – revelei, olhando para a figura dos dois descendo as escadas – Mas não entende nada ainda.

Ian me deu as costas e começou a caminhar corredor adentro, na direção que tínhamos que seguir.

— É melhor que fique assim. – falou – E conserve sua vida mortal pacífica.

Suspirei mais uma vez, fechando os olhos e me preparando mentalmente para a missão a que daríamos início em seguida. Ouvi as notas de Introduction Rondo e Capriccioso soarem pelo prédio, naquela melodia que dava vontade de dançar. Por alguns segundos não pude me mover, arrebatada pela música.

— Ei, novata! – a voz de Ian me arrancou de minha imersão – Vamos, não temos todo o tempo do mundo.

— Droga, eu queria mesmo ficar e ver o show todo. – choraminguei, alcançando-o e caminhando ao seu lado.

— Relaxa, outros anos virão. – ele falou, com um tom desleixado.

Bufei em deboche.

— Seu eu ao menos sobreviver até lá.

Ele me lançou um olhar que não pude decifrar.

— É melhor não estar planejando morrer facilmente, porque eu não vou deixar.

Ergui uma sobrancelha.

— Não? – questionei – Não foi você quem disse que me jogaria pela janela?

Ele ficou quieto por mais alguns segundos, enquanto eu esperava que ele me direcionasse mais algum comentário ácido, mas ele finalmente respondeu, sem tom de provocações:

— Estou falando sério.

Perdi a fala nos instantes seguintes, tentando seriamente entender o que ele pretendia com uma frase daquelas. Diminuí o passo, e ele se virou para mim. Quando nossos olhos se encontraram, eu vi o sorriso convencido em seus lábios e soube que havia sido pega.

Meu rosto ficou quente.

— Idiota! – falei, apressando o passo e deixando-o para trás – Não preciso da sua proteção. Posso muito bem me cuidar sozinha.

— Até parece.

Eu me virei de repente, encarando-o de perto.

— Vamos apostar. – resolvi.

Ele ergueu uma sobrancelha.

— Se você precisar me salvar da morte alguma vez nas próximas três vezes que formos ao campo de batalha, você vence. Caso contrário, eu venço.

Ian cruzou os braços.

— Beleza... E o que o vencedor leva?

Dei de ombros.

— O que quiser. – levei a mão ao queixo – Eu vou querer... Que pare de me chamar de “novata”. – decidi – Desde que nos conhecemos você nunca me chamou pelo meu nome.

Ele revirou os olhos.

— Que pedido besta. Precisa de uma aposta pra isso?

Levantei as sobrancelhas.

— Ah, então quer dizer que você pode me chamar pelo nome agora?

Ele fechou a cara e voltou a andar.

— Urusai, novata. Vamos logo com essa missão.

 


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Notas finais do capítulo

Eu de novo ^^
E então, o que acharam? Esse capítulo acabou sendo bem levinha, mas a treta vem logo em seguida ~risada maligna~ Expectativas, críticas, opiniões, dicas? Deixa um comment aí me contando tudo ♥ Sou apaixonada pelos comentários de vocês ^^
Bom, eu ainda não decidi o nome do próximo capítulo, mas posto no próximo fim de semana.
Até mais ♥
P.S.: Para as ARMYs de plantão, estou postando uma fic de BTS. Se quiserem dar uma olhada, eis o link: https://fanfiction.com.br/historia/714681/21st_Century_Girls/