À Espada Pelo Sangue escrita por LahChase


Capítulo 14
Capítulo 13 - "Dê-me seu sangue"


Notas iniciais do capítulo

Oiee ^^
Aqui está o próximo capítulo ♥
Agradeço a Cassie, Minoran, Leta Le Fay e Alhene Malfoy pelos comentários que me fazem ficar sempre ansiosa pra postar ^^
Esse capítulo vai fazer uma raivinha e trazer umas perguntas, então preparem-se ~carinha maliciosa~ e divirtam-se!
Bom, vejo vocês no final ^^



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Depois que Link me escolheu, nosso treinamento juntos se intensivou. Jake disse que o ideal para ele seria ser transformado em um rastreador, então nós o fazíamos praticar bastante. Meus voos com Pandora agora também tinham mais um acompanhante, o que me fazia ainda mais feliz. Ele também era capaz de ficar alerta durante o dia, e estava ficando cada vez mais veloz. Sempre que eu o treinava, ficava tão orgulhosa e feliz que parecia que dava vontade de gritar.

Minhas habilidades com a espada estavam ficando melhores. Drake vinha me fazendo praticar minha força e precisão pela repetição de certos golpes. De início, questionei seu método, mas ele então explicou:

— Você é ágil devido à prática da ginástica e das artes marciais, e isso é bom. – disse – Mas seu corpo ainda não se acostumou com a espada, por isso você ainda não tem muita firmeza e qualidade de golpe. A repetição desses movimentos vai te ajudar a se familiarizar com a empunhadura, o peso e o balanço de Prostátida. E mais: é melhor ter um golpe forte que dois fracos.

Desde então, passei a fortalecer a série específica, apesar de treinar mais do que só aquilo.

Em um dos treinos, eu estava repetindo um movimento diagonal, que poderia cortar uma cadeira de madeira ao meio quando uma espada entrou em meu caminho, chocando-se contra Prostátida. Encarei o portador da arma. Sean tinha um sorrisinho na cara.

Ergui uma sobrancelha.

— Sério?

Ele deu de ombros.

— Drake mandou.

Sorri.

— Tudo bem então.

Nossas espadas se cruzaram.

O garoto jogou seu peso contra mim, e tive que recuar para o lado. Desequilibrado pela minha retirada rápida, ele cambaleou para frente e eu dei uma rasteira para que caísse. Ele amorteceu a queda com uma cambalhota e ficou de pé num instante, virando-se para mim.

Ele avançou, sua espada fazendo uma sequência veloz de estocadas diretas difíceis de defender. Desviei das três primeiras e aparei a quarta com Prostátida, mas a quinta acertou o meu lado de raspão, rasgando minha blusa e minha pele.

Levei a mão ao ferimento.

— Sean! – reclamei.

Ele ergueu as mãos.

— Desculpa! Mas você que não se defendeu, Mayara-senpai.

— Isso é treinamento. – lembrei – Controle essa sua força.

— Certo, mas... Esse corte de nada nem vai estar mais aí amanhã, mesmo.

— Mas dói do mesmo jeito, idiota. – rebati, erguendo a espada novamente.

Avancei com um arco diagonal, pegando-o desprevenido. Sean aparou o golpe sem jeito e a espada caiu de sua mão. Ele reagiu rápido, ficando em posição de combate. Eu sabia que era a partir dali que a luta ficaria difícil: Sean podia ser novo na esgrima, mas seu Karate era quase tão bom quanto o meu.

Apertei o cabo de Prostátida e me adiantei, brandindo-a na horizontal, mas o chute poderoso de Sean atingiu minha mão em cheio e minha espada também foi ao chão, exatamente como eu esperava. Posicionei minhas mãos em guarda, apenas para ter que ter que defender um soco no rosto. Contra-ataquei com um chute lateral, mas ele ofereceu o cotovelo como escudo, machucando meu pé. Ao invés de recuar, avancei, batendo meu corpo contra o dele. Ele se desequilibrou, mas não caiu.

Sean fintou um chute e eu fiz um movimento para defender, mas ele mudou de direção e atingiu justamente onde havia ferido anteriormente.

Eu me dobrei ligeiramente para frente.

— Sean! – gritei.

Ele tinha um sorriso culpado na cara.

— Drake! – reclamei – Pelos deuses, mandou esse garoto não se controlar?

— Eu? – meu irmão fez cara de inocente – Você não é a “senpai” dele? Aliás, não tire os olhos do seu adversário.

Sorri. Eu sabia que Sean iria tentar se aproveitar da minha distração para acabar com a luta. Mas eu não estava distraída. Ergui a perna e girei em um arco alto, atingindo o rosto do garoto, que avançava descuidado, e derrubando-o no chão. Eu rapidamente apoiei meu joelho em seu peito e simulei um soco em seu rosto, mostrando que poderia facilmente continuar se ele insistisse na luta.

Sean levou a mão à face, onde meu pé o havia atingido. O local estava inchando.

— Doeu. – declarou.

Eu ri e saí de cima dele, estendendo a mão para ajudá-lo a levantar.

— Sean, sua base está muito curta. – falei – Se ajustá-la, não vai estar tão vulnerável àquele encontrão que te dei.

Ele assentiu com a cabeça, aceitando o conselho.

— Como esperado de você, Mayara-senpai, seu tempo de reação é incrível! – ele exclamou, e então sorriu para mim – Mas me pergunto se faz parte da estratégia deixar a guarda tão baixa.

Esbocei um sorriso malicioso.

— Obrigada. – respondi, sem responder à pergunta.

Nós nos curvamos, encerrando o momento. A postura serena de Sean caiu e ele começou a saltitar ao redor da arena, hiperativo, exclamando com os outros campistas sobre como eu era incrível. Revirando os olhos, peguei minha pulseira e fui até Drake.

— Droga, esse garoto é forte. – resmunguei, olhando minha mão molhada de sangue, que vertia do corte em meu lado.

Drake sorriu.

— Mas parece que você sempre é capaz de responder à altura.

— É o mínimo que posso fazer como aluna mais graduada. – respondi – Não é difícil de vencê-lo agora. No entanto, ele com certeza tem potencial, e logo eu teria que me esforçar mais. Seria um desperdício se ele tiver que parar de treinar Karate.

— Você poderia treiná-lo. – ele observou – Afinal, você não é faixa marrom?

Eu lhe lancei um olhar divertido.

— Eu não já fiz isso? – falei – Nosso Sensei jogou o aprendizado dele praticamente nas minhas costas. Mas agora eu não posso mais continuar a ensiná-lo, já que estou saindo. Quem sabe depois que eu voltar... – Suspirei e desencostei das barras – Bom, acho melhor eu ir logo à enfermaria cuidar disso. Deseje-me boa sorte.

— Desde quando você precisa de sorte para ir à enfermaria?

— Desde que Michael se tornou um completo idiota.

Drake revirou os olhos, mas não rebateu.

— Sean! – chamei, e ele veio correndo até mim – Vamos, você precisa se tratar disso antes que fique mais sério.

Nós então caminhamos para a enfermaria.

 

 

Michael me fez sentar na cara e então me encarou com um olhar insatisfeito.

 Depois de deixar Sean na enfermaria, eu fui à Casa Grande, onde Quíron designara um quarto que usávamos sempre que eu precisava de cuidados médicos. Isso por que, apesar dos rumores que corriam no Acampamento, eu fora capaz de manter o segredo sobre minha cura acelerada restrito apenas aos meus amigos, e, com Michael fazendo as pesquisas para entendê-la, era mais seguro que não usássemos a enfermaria.

Embora a explicação do meu pai sobre por que minha regeneração era tão boa fosse o suficiente para mim, não o era para Michael, e, apesar de não nos falarmos mais em nenhum outro momento, ele não abriu mão de ser aquele a me tratar todas as vezes que me feria, e nós tentávamos agir como se nada estivesse acontecendo entre nós. Ele vinha fazendo avanços. Percebeu que meu processo acelerava quando eu dormia, e que minha tolerância à ambrósia e ao néctar era um pouco maior que a maioria dos semideuses, mas não parecia que havia algo que fosse realmente explicar como meu organismo fazia para me curar tão rápido.

Encarando-o de volta, não abri a boca, sabendo que isso só pioraria o sermão que viria a seguir.

— Mas que tipo de treinamento foi esse? – começou – May, já perdi as contas de quantas vezes te falei para ter cuidado! Só porque você se regenera rápido não quer dizer que pode ficar se dando o luxo de ficar se ferindo! Agora a gente sabe que não é uma maldição nem nada, mas não abuse da sorte.

— Tá, eu já sei... – resmunguei – Mas a culpa é de Sean.

Ele cruzou os braços, cético.

— Ah, claro. A culpa é do novato filho de Hermes, que nem é tão bom quanto você.

— Não o menospreze. – rebati – Sean é muito bom, pode perguntar a Drake. Tive que me esforçar para vencê-lo.

Michael suspirou.

— Se está dizendo. – ele pegou agulha e linha numa gaveta e as colocou na mesa ao lado da cama – Eu vou lavar as mãos. Tire a blusa e se apronte. Vou ter que costurar isso aí.

Ele saiu.

Tirei a blusa com cuidado e observei o corte. Michael tinha razão quando dissera, há algum tempo, que depois de um tempo a gente se acostuma a ver sangue. Ultimamente eu vinha me cortando com tanta frequência que já não me incomodava mais. Para ser sincera, poderia até costurar eu mesma aquilo ali, de tanto que já havia visto Michael fazer.

Peguei a agulha e comecei a tentar passar a linha pela ponta. Depois de algumas tentativas, finalmente consegui e comecei a me costurar, convencida de que era capaz. A sensação era agonizante, o que me fez perguntar como Michael conseguia fazer aquilo sem me deixar sentir praticamente nada. Seria alguma magia de Apolo? Pensando nisso, lembrei que ele sempre falava comigo enquanto dava os pontos. Talvez eu sentisse a agonia, mas estava distraída conversando.

Depois do terceiro ponto, ouvi vozes à porta e congelei. Percebi logo de cara que Kate abordara Michael.

— ...ocupado agora? – ela perguntava.

— Estou no meio do meu turno – ele respondeu.

— Mas eu aposto que seus irmãos podem dar conta de tudo sem você. Vamos, por favor!

Eu o ouvi suspirar.

— Eu não vou cair nessa de novo. Você sabe que da última vez Will ficou furioso comigo. E com razão.

Ela bufou.

— Você não tem o menor senso de aventura. Will é mais novo que você e você ainda o deixa ficar com seu cargo de Conselheiro-chefe. E fica aceitando qualquer coisa que aquele pirralho diz.

— Não diga isso, Kate. – a voz de Michael soou ou pouco irritada – Will está em sua posição de direito. Ele é um ótimo líder e um curandeiro incrível. Além disso, você sabe que ele me ofereceu a posição de volta e que eu recusei.

— Bom, tanto faz. Só estou dizendo que você poderia dar uma escapadinha comigo agora. Prometo que vai ser rápido. – ela então acrescentou com um tom sedutor – Só quero te mostrar uma coisa.

Michael não caiu.

— E eu estou dizendo que não dá. Estou com um paciente agora.

— Ah, sério? Achei que estaria livre já que está aqui na Casa Grande... – sua voz soou frustrada, mas então pareceu desconfiada – Não é aquela maldita filha de Atena, é?

Michael ficou na defensiva.

— Eu não disse isso.

— É ela! Droga, Michael, já falei que essa garota fica se atirando em você!

Senti meu rosto esquentar de raiva, mas segurei-me para não me mover.

— Nós somos amigos, Kate. Ou pelo menos éramos. – ele rebateu, cansado – E não há nada que eu possa fazer se ela precisa de cuidados médicos. Quíron me encarregou de cuidar dela.

— Claro, cuidar da garota amaldiçoada. E você aceitou de muito bom grado. Por que você simplesmente não passa isso pro “curandeiro incrível” do Will?

Michael deu um suspiro irritado.

— Escuta, que tal se deixássemos para discutir sobre esse assunto mais tarde? Se me der licença, meu paciente está esperando.

Ouvi o salto alto de Kate andar para longe a passos duros, e Michael respirar fundo antes de girar a maçaneta e abrir a porta.

Seu olhar pousou em mim, congelada com a agulha na mão, costurando meu próprio corte.

— Mas o que diabos você pensa que está fazendo?! – ele praticamente gritou.

Assustada, soltei a agulha, e ela pendeu junto ao meu corpo.

— Ah, e-eu...

Ele bateu a palma da mão na testa, e eu me perguntei se ele estava pensando no que estava fazendo, visto que havia acabado de lavar as mãos.

— Será que não posso te deixar sozinha por um instante que você faz besteira?

Dei um sorriso amarelo.

— Eu pensei que talvez pudesse te poupar o trabalho...

Ele enfiou luvas nas mãos. De alguma forma, ele conseguiu fazer com que aquilo parecesse um movimento bem violento.

— Tá, tanto faz. – disse, pegando a agulha e recomeçando os pontos. Estava escrito na cara dele seu mal humor.

Ele não conversou comigo, o que confirmou minha teoria de que era a sua fala que deixava o processo menos doloroso. Eu queria que ele conversasse. Caramba, aquele era um dos poucos momentos em que nos encontrávamos em dias, e, apesar de ultimamente nossas falas serem sempre meio ácidas (de minha parte) e magoadas (da parte dele), era o que chegava mais perto do que tínhamos no começo. No entanto, parecia que eu era a única que sentia falta daquilo. “E não há nada que eu possa fazer” foi o que ele disse. Eu era apenas algo sobre o qual não havia nada que ele pudesse fazer.

Bom, se era assim, eu lhe daria a opção de fazer algo. Ele não precisava ficar comigo se não quisesse. “Tanto faz ele estar aqui ou não” pensei.

— Michael. – chamei baixo e ele grunhiu – Se quiser passar os cuidados sobre “a garota amaldiçoada” para outra pessoa, fique à vontade.

Ele não ergueu o olhar, nem parou o trabalho.

— Will me disse um dia desses que seria interessante trabalhar na minha cura, então eu pensei que... talvez...

Michael limpou o sangue ao redor dos pontos e os cobriu com um curativo. Fiquei esperando que ele recusasse a proposta, fitasse meu rosto com aqueles olhos que me faziam querer sair correndo e me chamasse de idiota por dizer uma coisa dessas. Queria que ele bufasse e dissesse algo como “é obvio que não vou fazer isso”, ou que simplesmente me encarasse com uma expressão que mostrasse que sabia que eu não queria aquilo de verdade. Mas ele apenas continuou o procedimento, até que tudo estivesse acabado. Ele então ficou de pé, deu as costas e finalmente quebrou o silêncio:

— Se é o que quer, então esta foi a última vez. Boa sorte com Will. Ele com certeza fará um ótimo trabalho com você.

E saiu.

Fiquei ali, de olhos arregalados, fitando o chão, e o coração batendo devagar.

Ele havia aceitado? “Se é o que quer”, ele dissera. Idiota! Como ele não pode perceber que era exatamente o oposto? Logo ele, que sempre sabia como lidar comigo. Que sempre sabia o que se passava na minha cabeça. Não. Ele sabia. Sabia que eu queria que ficasse. O problema, então... Era que ele não queria ficar.

Senti meus olhos arderem. Aquele então era o fim da nossa curta amizade.

 

 

 

Levei vários minutos antes de ser capaz de afastar meus pensamentos rancorosos e meus lamentos o suficiente para me mover. Limpei a face, onde uma única lágrima furiosa escorrera, deixando um caminho solitário. Recomposta, olhei minha imagem no pequeno espelho do quarto.

— Chega. – disse a mim mesma – A partir de agora, você não vai mais lamentar por isso, não vai mais se importar com isso, e nem falar sobre isso. Logo, logo, você vai sair para aquela Reunião, e, até que volte, não vai se permitir pensar em mais nada relacionado a esse idiota.

Fechei os olhos e respirei fundo. Quando me encarei novamente, tinha um sorriso determinado no rosto. Pronto. Tudo certo.

Caminhei para fora do quarto e cheguei à sala. Planejava sair o mais rápido possível, mas meus olhos foram atraídos como imãs até a estante de livros ligeiramente encoberta pela sombra num cantinho da parede, de onde eu sabia que Quíron tirava os livros que usava para falar sobre os Greno. Parei por meio segundo antes de me dirigir a ela, de repente tendo uma ideia.

Eu sabia que o centauro estava dando aula naquele momento, e o Sr D havia – para o alívio de todos – sido chamado ao Olimpo há vários dias, e parecia que não voltaria tão cedo.

— Onde está, onde está... – murmurei comigo mesma, enquanto minhas mãos se moviam apressadamente, procurando pelo título, mas nenhum deles era o que eu queria.

Fiquei nas pontas dos pés para olhar nas prateleiras mais altas, mas ainda não fui capaz de enxergá-lo. Foi apenas na última delas, quando precisei de um banquinho para alcançar, que meus dedos tocaram uma caixa dura. Com certo esforço, trouxe-a para mim.

Era uma caixa de madeira do tamanho de um livro grande. Tinha entalhos prateados enfeitando-a e a pequena tranca emitia o brilho cálido da Prata Olimpiana. Só de olhar eu já sabia que era o que eu estava procurando: o Livro dos Greno.

Coloquei o banquinho de volta no lugar e certifiquei-me de que a estante estava organizada, então voltei para o quarto, fechando a porta atrás de mim e ficando de joelhos no chão, com a caixa diante de mim. Eu sabia que não podia levar o Livro comigo para o Chalé de Atena, onde muitos o veriam, mas ali era seguro. Poderia dar uma espiadinha no Livro e ainda devolvê-lo ao seu lugar rapidamente sem que ninguém visse ou desconfiasse.

— Agora... Como eu abro isso? – resmunguei.

O mistério se desfez assim que toquei a tranca com a ponta dos dedos. Ela fez um “click” surdo e eu abri a tampa. Dentro, em envolto em seda vermelha como sangue, havia uma única página, tão fina que poderia cortar apenas de encostar. Com os olhos arregalados, eu me dei conta de que também era feita de Prata Olimpiana.

Eu olhei mais de perto e li o que havia escrito no primeiro parágrafo:

— “Você, que primeiro profanou a terra de meus antepassados e que deles foi feito escravo por justa disputa, responda a quem vos chama. Com a autoridade concedida pelo sangue em minhas veias, eu... (seu nome e descendência), vos invoco e ordeno: responda à minha pergunta”.

Ergui uma sobrancelha.

— Mas o que diabos isso deveria signi...

Minha voz morreu no momento em que algo como uma névoa branca começou a sair da página, e chão foi preenchido pelo que parecia gelo seco. Da página, projetou-se uma estaca de quase um metro de altura. Perfeitamente equilibrada em pé sobre ela, havia um garoto.

Ele aparentava ter doze anos, tinha a pele tão branca que poderia estar morto, marcada por uma cicatriz na bochecha, e os cabelos negros como a noite quase chegavam aos ombros. Seus olhos eram vermelhos, e emitiam um brilho insano e feroz. Vestia um trapo marrom, com uma abertura no peito que deveria ser fechada pelo cordão que pendia, folgado, e estava descalço. Apertado em seu pescoço, havia algo que parecia uma coleira de prata, e de suas costas, saíam duas curtas asas de demônio.

Reconheço o chamado. – sua voz gelada e tão insana quanto seus olhos fez um arrepio percorrer meus braços. Ele me fitou e esboçou um sorriso sombrio – Mas não reconheço quem me chama. Isso quer dizer carne nova?

Ele se inclinou para frente de sua posição na estaca, aproximando seu rosto do meu. Tive a sensação de que precisava ficar firme onde estava, ou alguma coisa séria poderia acontecer. Quase engoli em seco, mas segurei uma expressão neutra em meu rosto, enquanto os olhos selvagens me analisavam.

Você não falou seu nome e descendência... Deve ser nova nisso. Mas atendi o chamado mesmo assim. – seu sorriso se alargou – Ah, há quanto tempo não me chamam! Eu com certeza tinha que ver quem finalmente havia aberto a caixa.

Sustentei seu olhar, mas não respondi.

— Você está sozinha? Bom, então deve ser uma Greno. — ele pôs a mão atrás das costas e tirou de lá uma faca pequena – Muito bem, milady. Dê-me do seu sangue.

Franzi a testa, sem entender. O garoto soltou uma risada.

Então você realmente não sabe! Não acredito que me invocou sem saber de nada. Você é tão divertida, milady! A primeira pessoa que me invoca em anos e ainda não faz ideia do que fazer!

Ergui o queixo.

— Então explique-me.

— Ah-ah! – ele balançou o dedo indicador de um lado para o outro – Não é como funciona.

Desviei os olhos para a página, vendo se poderia ler alguma coisa nela escrita, esperando ter uma pista do que fazer, mas toda aquela névoa não me permitia enxergar. Coloquei minha mente para trabalhar. “Que primeiro profanou esta terra... feito escravo por justa disputa...”, ele me chamando de “milady”, aquelas asas e o aspecto morto... Meus pensamentos voaram numa rapidez incrível, como sempre acontecia quando eu ficava imersa neles. Cinco segundos e eu havia entendido o que se passava ali.

— Você... – comecei, olhando para o garoto – Você é o primeiro. O primeiro espírito de vingança. Deve ter sido preso ao livro por algum motivo, ao invés de enviado ao Tártaro, e mantido pela família Greno como um escravo. – fiz uma pausa – Não, isso não está completamente correto... Você não foi preso a ele, você é o Livro.

Ele abriu mais um sorriso.

Impressionante, milady. Conseguiu deduzir isso em apenas alguns segundos... Mas ainda assim, não sabe o que deve fazer agora, sabe?

— Qual é o seu nome?

Um brilho divertido veio de seus olhos.

Meus senhores me chamam de Daímonas.

— Demônio. – traduzi, e então fiquei de pé – Daímonas, como sua senhora, ordeno que me explique o que devo fazer agora.

Ele riu.

— Eu já disse que não funciona assim, milady. Você ainda não é minha senhora.

— O que preciso fazer para ser?

Sua expressão ficou mais selvagem, quase como se estivesse de frente para uma presa a ser alcançada. Ele passou a língua nos lábios e mostrou a faca novamente.

Dê-me seu sangue.

Estendi o braço sem hesitar, apesar de cada neurônio meu estar gritando algo tipo “mas o que diabos você está fazendo?!”. Eu não sabia, mas tinha a forte impressão de que não deveria recuar dali. Apesar disso, não estava nervosa. Aquele garoto era insano, e eu não tinha ideia do que acarretaria ao dar meu sangue a ele, mas meus instintos diziam para fazê-lo.

O garoto estendeu a faca e fez um corte em minha mão. Esforcei-me para não demonstrar dor, mas não pude evitar expressar minha surpresa quando Daímonas segurou minha mão entre as suas e a levou à boca, literalmente bebendo meu sangue. Seus olhos vermelhos intensificaram ainda mais seu brilho. Ele soltou minha mão devagar e deu um suspiro saciado.

Então mostrou para mim dois dedos erguidos, e os posicionou sobre o peito esquerdo.

Seu sangue é meu sangue. Você agora é minha senhora.

— Ótimo. Agora você responderá às minhas perguntas?

— Até onde estiver disposta a pagar, milady.

— Pagar?

Seu sorriso era satisfeito, com meu sangue ainda escorrendo por seu queixo.

Um pedido, um preço. — disse – Essa é a regra.

Juntei as sobrancelhas, imaginando de que tipo de preço ele estava falando, mas assim que abri a boca para perguntar, a porta do quarto se abriu de repente, assustando-me. Quíron me encarou com uma expressão séria.

— Dispense-o. – ordenou.

Com os olhos arregalados, não me movi.

— Q-quíron! – gaguejei – Eu só estava...

— Dispense-o logo. – ele repetiu.

— Ah? — Daímonas inclinou a cabeça para o lado – Vai estragar a diversão...

A expressão de Quíron era no mínimo séria de mais para que eu pensasse em desobedecê-lo. Sem tirar os olhos dele, falei para o garoto:

— Volte, Daímonas.

Ele me encarou por um segundo, e então colocou os dedos sobre o coração novamente e se curvou.

Como quiser, milady.

Sua forma foi recolhida pela página, bem como a estaca e toda a névoa. Fiquei de pé com os punhos apertados ao lado do corpo, temendo o que o centauro faria diante da situação, mas ele apenas soltou um suspiro.

— Sinceramente... Você é igual a ele. – murmurou e então levou a mão à nuca – Daímonas bebeu seu sangue?

Assenti, confusa. Para onde fora toda aquela seriedade assustadora?

— Bom, então acho que não tenho escolha. Vamos.

Ele deu meia volta com a cadeira de rodas, conduzindo-a para o corredor.

— Vamos? – repeti, sem me mover – Para onde?

— Vou te ensinar sobre o Livro. – disse – Traga a caixa.

 


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Notas finais do capítulo

Eu de novo!

Apresento-vos Daímonas, aquele que, segundo o que a May deduz, foi o primeiro espírito de vingança. O que acharam dele?

Entããão... A coisa ficou mais tensa pra Mayel, não é? Ainda há esperança? Como as coisas poderiam melhorar entre esse casal que a gente tanto shippa? E quanto ao Daímonas? Alguma teoria sobre como uma criança se tornou o primeiro espírito de vingança a ser caçado e preso pelos Greno? E o que será que Quíron tem a dizer sobre o Livro?

O que acharam o capítulo? Viram algum erro? Alguma coisa que tenho que melhorar? O que mais gostou? Deixa um comentário ˆㅅˆ ~carinha fofinha para convencer vocês~

Bom, vou ficando por aqui! O próximo capítulo sai no sábado, então até lá!
Beijos ♥