Três Desejos escrita por Kayra Callidora


Capítulo 27
Capítulo Vinte e Cinco




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/684972/chapter/27

Capítulo Vinte e Cinco

Atena só se permitiu respirar direito quando, por fim, ela e Poseidon chegaram aos jardins externos, longe de Zeus e de todas as possíveis batalhas. Ela soltou o ar, aliviada, e Poseidon passou o braço por sobre seus ombros.

— Não foi tão ruim assim, não é, amor? – ele perguntou, tentando soar inocente, mas Atena enxergou nas entrelinhas de sua pergunta.

Ela lhe estendeu um olhar acusador.

— Você provocou ele – disse a deusa.

Poseidon abriu um sorriso culpado, mas não negou.

— Desculpe, eu não consegui evitar.

— Humpf – Atena bufou. – Sorte a de vocês que eu tenha conseguido evitar a batalha que estava prestes a acontecer ali. Toda santa vez é a mesma coisa. Vocês parecem duas crianças.

Mas Poseidon, longe de se sentir afetado, apenas gargalhou, como se aquele fosse exatamente seu objetivo.

— Ah, ele faz por merecer.

Atena somente revirou os olhos, sem oferecer a dignidade de uma resposta àquela disputa infantil por poder.

— Imagine só – Poseidon continuou, enquanto procuravam um local isolado para transcrever a missão. – A cara que ele vai fazer quando chegarmos juntos à festa. Já planejei toda uma entrada para que ele queira explodir esse lugar inteiro.

Atena já não tinha mais olhos para revirar ao fim dessa constatação, ao que ela apenas continuou caminhando na direção de um banco de pedra mais à frente.

— Falando assim, parece que você me conquistou só para irritar meu pai – ela disse.

— Claro que não – negou Poseidon, depositando um beijo em seu ombro assim que Atena parou. – Você sabe que eu te amo. Poder irritar seu pai é só um bônus muito gratificante que vem junto.

— Sei – resmungou Atena.

A deusa se sentou no banco, convenientemente localizado ao lado de um lago e bem escondido dentro dos jardins, já conjurando um grande bloco de papel e uma caneta.

— Por que você escolheu esse lugar tão escondido no bosque? – Poseidon perguntou, um sorriso malicioso em seus lábios. – Por acaso está pensando em fazer alguma coisa... indecorosa aqui?

Aquela era a gota d'água para Atena, e ela por fim ergueu o rosto para Poseidon, seus olhos flamejantes.

— Eu preciso que você pare de pensar em sexo só um pouquinho — ela pediu. – Só para transcrevermos essa missão. E depois você pode colocar a sua mente na sarjeta de novo.

Poseidon sorriu e concordou.

— Tudo bem, vou fazer isso por você.

— Obrigada. E por sinal, não estamos nada sozinhos aqui. Há pelo menos vinte ninfas nos assistindo, então comporte-se.

Poseidon se aproximou, mas, ao invés de se sentar ao seu lado, ele deitou no banco, apoiando a cabeça nas pernas da deusa. Atena achou o ato fofo demais para repreendê-lo, então simplesmente fez o bloco e a caneta flutuarem e se colocou a acariciar os cabelos de Poseidon. Seus dedos já percorriam o local com tanta familiaridade que era como respirar, e ela abriu um pequeno sorriso.

— Tudo bem, precisamos ditar os acontecimentos para que a caneta vá anotando – ela explicou. – Então muito cuidado com o que você vai dizer, ou vou ter que mandá-la riscar a frase, e Zeus vai desconfiar. Entendido?

— Entendido – confirmou Poseidon.

Mas minutos depois, Atena estava convencida de que ele não havia entendido nada. Ele mandava a caneta escrever coisas que não deveriam estar no relatório pelo simples prazer de imaginar Zeus tentando enxergar debaixo dos riscos, e por vezes demais Atena precisou riscar melhor alguma besteira que ele disse. E só por causa da implicância do deus dos mares, os dois passaram quase três horas naquela posição, descrevendo seus procedimentos. Mas Atena não se importou. Pelo menos não muito. Estava com Poseidon, e isso poderia fazer um século parecer um minuto.

Por fim, terminaram a transcrição, e Atena pediu que uma ninfa próxima muito curiosa levasse o papel até Zeus. A menina pareceu prestes a derreter quando ouviu que apareceria na frente de Zeus, ao que Poseidon reagiu com um rolar de olhos. Era raro que ele reagisse assim à alguma mulher, mas ele categoricamente desgostava de mulheres que gostavam do seu irmão.

Atena se levantou do banco, se espreguiçando, e, sem um relógio para se orientar, pôde apenas deduzir que horas eram pela coloração do céu.

— Acho que vou para o meu palácio me arrumar – ela anunciou, ao que Poseidon se levantou também. – Não sei que horas a festa começa, mas como todas começam às sete, é melhor eu já começar os preparativos.

— Eu vou com você – declarou Poseidon. – Não quero voltar para Atlântida agora, tão em cima da hora.

— Tudo bem – Atena deu de ombros. Não queria mesmo ficar sozinha se arrumando.

Os deuses rumaram em direção ao palácio branco de Atena, muito próximo dali. A deusa suspirou ao abrir a porta e contemplar o interior de sua casa. Tudo estava exatamente do jeito que ela havia deixado, mesmo os papéis jogados em cima da mesa de centro da sala de estar. O único sinal de que alguém havia estado ali era que o palácio estava impecavelmente limpo, de um modo que não poderia estar depois de um mês abandonado.

— Eu não me lembrava do seu palácio – comentou Poseidon. – É realmente bonito.

— Obrigada – Atena sorriu. – Fui eu quem desenhei tudo. A planta, os móveis, as colunas...

— Pelo bom gosto dá para perceber – disse Poseidon.

E Atena conseguiu a proeza de enrubescer depois desse elogio. Não importava quantas vezes e de quantas formas Poseidon a elogiasse, ela sempre se sentiria um pouco constrangida em receber tanto afeto vindo de alguém.

— Meu quarto é lá em cima – ela indicou, convidando o deus a subir.

Ele a acompanhou silenciosamente pelas escadarias até o segundo andar. Parecia estar imerso em pensamentos, de um modo que Atena raramente o via, e a deusa não quis atrapalhar aquele momento tão precioso. Ela simplesmente seguiu seu caminho até o quarto, com Poseidon em seu encalço, e assim que entrou, já conjurou sua mala de viagem que estava em Atlântida.

— Pode tomar banho primeiro – ela ofereceu. – Preciso procurar meu vestido para terminá-lo.

Poseidon sorriu.

— Por que você não vai comigo, e depois resolvemos esse problema do vestido?

Atena riu de seu convite, mas não pôde deixar de pensar sobre ele.

— Vai demorar um pouquinho para eu terminá-lo – ela avisou. – Espero que quando eu terminar aqui, você já tenha terminado seu banho.

Ao contrário do esperado, o semblante de Poseidon não murchou nem um pouquinho. Ele parecia ter aquela situação inteiramente sob controle.

— Eu vou deixar a porta aberta, caso você mude de ideia – ele alertou.

Atena rolou os olhos.

— Eu não vou.

Poseidon entrou no banheiro, e Atena começou a costurar. Mas afinal de contas, suas habilidades como deusa da costura superavam até suas próprias expectativas, e, quando ela terminou o vestido, Poseidon ainda estava no banho (embora ela tivesse fortes suspeitas de que ele estivesse demorando de propósito). Para não dar o braço a torcer, Atena esperou um pouco depois de concluir o vestido; ela procurou e separou suas jóias, escolheu sapatos que combinassem com o vestido e até selecionou as cores de maquiagem que usaria, mas ainda depois disso, Poseidon estava no banho. A demora chegou ao ponto em que Atena se atrasaria se continuasse esperando, então a deusa não teve outra opção senão entrar no banheiro como um furacão, carregando uma carranca. Contudo, ela não foi capaz de sustentar a carranca por mais do que dois segundos perante a cena que encontrou:

Poseidon estava deitado na banheira, os braços apoiados nas laterais, absolutamente parado e relaxado. Atena se perdeu por um instante no físico dele que nunca falhava em prender sua atenção; os braços fortes e torneados, o peitoral maciço. Havia uma sensação diferente agora que Atena já havia tocado tudo aquilo de todos os jeitos possíveis, mas o friozinho gostoso no pé da barriga que a deusa sentira na primeira vez em que o viu sem camisa era o mesmo. Depois de sair de seus devaneios, a deusa bufou.

— Você não está nem tomando banho! - ela protestou indignada. - Está só fazendo hora aí.

Poseidon sorriu maleficamente.

— Quem disse? - ele perguntou. - Ao meu ver, estou tomando banho.

Atena rolou os olhos.

— Se eu não entrar no banho agora mesmo, vou me atrasar para a festa, Poseidon.

O deus apenas deu de ombros, como quem pede desculpas.

— Que pena que eu ainda estou tomando banho, não é mesmo?

Atena suspirou, mas por fim se deu por vencida. Poseidon era muito bom em conseguir o que queria, e Atena não era muito boa em dizer "não" quando se tratava dele.

— Tudo bem, você venceu - ela se rendeu.

Então, lentamente, a deusa se aproximou da banheira e começou a remover suas roupas, uma por uma. Poseidon observava quietamente à cena, tão boquiaberto que até se esqueceu de exibir um sorriso vitorioso. Os olhos do deus dos mares acompanhavam cada movimento de Atena com assiduidade, parecendo brilhar mais a cada peça de roupa que ia embora.

Por fim, Atena estava apenas com suas roupas íntimas, e nessa etapa, a deusa hesitou. Já havia ficado nua na frente de Poseidon mais de uma vez, mas não daquele jeito. Nas duas vezes anteriores, o próprio Poseidon havia tirado sua roupa, em meio a beijos e mordidas que mal permitiam que Atena se sentisse ser despida. Naquele caso, era como se a cena se passasse em câmera lenta, com o deus acompanhando cada frame de movimento seu, e um instinto muito primordial, não de autopreservação, mas de completa timidez, tomou conta de Atena. Poseidon percebeu sua hesitação e se levantou da banheira, ficando bem de frente com a deusa. Os músculos dela se enrijeceram automaticamente com a proximidade e a virilidade daquele momento; Poseidon estava muito perto de si, completamente nu, e ela estava prestes a fazer o mesmo. Não havia como não se sentir nervosa com aquilo. No entanto, Poseidon, que sempre sabia o que fazer para deixar Atena entregue, passou os braços ao redor dela e aproximou o rosto para beijar sua bochecha.

— Não se preocupe, meu amor - ele a tranquilizou, a voz baixa e grossa. - Sou só eu.

Aquilo era justamente o que a deixava nervosa, mas seu toque familiar fez com que o corpo rígido de Atena começasse a relaxar. Ela sentia a tensão se esvaindo de seus músculos conforme as mãos de Poseidon subiam de seu quadril para suas costas, buscando pelo fecho de seu sutiã. Ele o encontrou facilmente demais, e logo a peça era removida e atirada ao chão.

Atena baixou a cabeça, envergonhada por sua nudez, embora Poseidon fizesse de tudo para deixá-la confortável. O deus dos mares pousou uma mão sobre seu queixo e ergueu seu rosto, de forma que seus olhos estavam totalmente ligados.

— Atena - ele começou, beijando a ponta de seu nariz, - você é a mulher mais linda que eu já vi - ele prosseguiu, beijando sua mandíbula. - E eu vou repetir isso quantas vezes for necessário - seu nariz roçou lentamente as bochechas da deusa, - até que você se acostume - suas mãos desciam lentamente pelo tronco de Atena, seguindo em direção ao seu quadril, - e entenda que eu adoro você. No sentido literal da palavra.

As mãos de Poseidon por fim chegaram à sua calcinha, mas a essa altura, Atena já se sentia bem mais confortável com sua posição. Só não estava cem por cento segura de como funcionaria o próximo passo. Poseidon não conseguiria tirar sua calcinha sem se abaixar completamente e depois subir, diante de seu corpo inteiramente nu. O coração de Atena acelerava só de pensar, mas enquanto ela pensava, Poseidon já estava em ação. Com as duas mãos, ele segurou os dois lados da calcinha e começou a descê-la. Atena sentia vontade de se enterrar em um buraco como nunca antes, mas a essa altura, não havia mais para onde correr.

Ao chegar aos seus pés, o deus puxou a calcinha e a lançou em qualquer direção. E então, ao voltar, subiu beijando cada pedaço do corpo de Atena que conseguia encontrar, marcando seu calcanhar, sua panturrilha, suas coxas, sua bacia, cintura, costelas, seios, e por fim sua clavícula até que chegasse aos seus lábios, aos quais devorou com tanta voracidade quanto havia feito com o resto do corpo. Nesse momento, Atena já havia esquecido qualquer embaraço que sentia antes. A sensação de tocar o corpo todo de Poseidon daquela forma, sem lençóis ou roupas os separando, era capaz de levá-la à loucura, e ela já sequer sabia o que a inquietava antes. Ela passou os braços ao redor do pescoço dele e ficou na ponta dos pés, de forma que seus corpos se juntavam completamente, o contraste do molhado de Poseidon e o calor de Atena. Suas bocas dançavam aquela dança que era só deles, enquanto os corpos pareciam se reconhecer, reagindo um ao outro de formas loucas. Poseidon se afastou de seu rosto e sorriu.

— Podemos?

Só então Atena se lembrou de que estava ali para tomar banho, e assentiu, ao que o deus se sentou na banheira e puxou sua mão para que ela viesse junto. Antes que pudesse reagir, Atena já estava sentada sobre ele, as pernas abertas ladeando seu quadril e o rosto de frente para o dele. Poseidon não deixou espaço para que ela se envergonhasse de sua posição, e puxou o corpo da deusa para junto do seu. E Atena podia jurar que havia muito mais em um selar de lábios dos dois do que deveria haver.

— Viu só? - perguntou Poseidon. - Não é um sacrifício tão ruim.

— Não, não é - respondeu Atena.

Sem perder tempo, o deus se inclinou e alcançou o lóbulo de sua orelha, dando ali mordidinhas leves capazes de fazê-la delirar.

— Mas Poseidon - Atena protestou quase sem forças. - Vamos nos atrasar para a festa.

— Vamos? - ele perguntou, trilhando um caminho de beijos por seu tronco.

— Uhum - concordou Atena, já quase sem controle da própria consciência.

— Ninguém vai reparar - argumentou Poseidon, os beijos chegando perigosamente perto dos seios de Atena.

— Mas a festa é para nós - contrapôs Atena, e mesmo ela podia sentir o quanto ele se irritava com sua racionalidade naquele momento.

— Você quer sair agora? - Poseidon perguntou como último recurso, mas sua boca já estava estrategicamente sobre os seios de Atena, e ele começou a sugá-los antes que ela pudesse responder.

Claro que, depois do que ele começou a fazer, Atena não poderia dar outra resposta senão a que deu:

— Não - e seu não era quase uma súplica para não sair dali.

— Que bom - agradeceu Poseidon, e voltou a trabalhar em seus seios.

Atena já nem se lembrava mais de porquê não deveria estar ali; Poseidon fazia com que ela se esquecesse de absolutamente tudo, e conseguisse pensar apenas nele. Seus toques, suas palavras e todos os seus atos eram como um estimulante, de forma que Atena estava inegavelmente sujeita a qualquer coisa que ele quisesse. Ela já nem lembrava mais por quê deveria sair dali. Havia uma festa? Mas o que era uma festa quando Poseidon estava fazendo a maravilha que fazia agora?

Atena não se lembrava, e honestamente, não se importava.

¶¶¶

Quando os dois saíram do banho, já passava das sete, o que significava que a festa já havia começado e os deuses sequer estavam trocados.

Bem, valeu a pena, Atena pensou, com as pernas ainda meio bambas, enquanto sofria para fechar o vestido que havia costurado.

— Pode me ajudar com isso? - ela pediu para Poseidon, que também enfrentava problemas com sua gravata.

— Claro - respondeu o deus, abandonando a gravata em seu pescoço de um modo que o pano praticamente o enforcava.

Em segundos, o zíper do vestido de baile de Atena estava fechado. A deusa tinha um orgulho particular daquela costura, que era inspirada em uma roupa que ela havia visto em uma loja da Quinta Avenida. O tecido fazia um dégradé de azul quase negro em cima para um azul quase branco em baixo, pontilhado de brilhos que se assemelhavam à estrelas. Era a roupa mais linda que Atena já havia visto, e certamente a mais linda que já havia costurado também.

— Você está linda, amor - disse Poseidon, atrás dela, enquanto ela se olhava no espelho.

A deusa sorriu para ele pelo reflexo.

— Obrigada, amor.

O sorriso de Poseidon se alargou. Só então Atena percebeu que, apesar de estar acostumada ao apelido, antes irritante e agora carinhoso com o qual o deus a chamava, ela nunca o havia chamado do mesmo modo. Aquela era a primeira vez, e definitivamente era uma sensação boa oferecer uma pequena palavra de carinho.

— Pode me ajudar com isso aqui? - pediu Poseidon em retorno, apontando para a gravata.

— Claro - respondeu Atena, se dirigindo até ele.

A deusa passou os braços ao redor de seu pescoço, ajustando a gravata, e rapidamente fez o nó com o tecido. Poseidon soltou um suspiro de derrota.

— Acho que eu nunca vou me acostumar com essas forquilhas - ele confessou. - Como você sabe dar um nó de gravata, afinal?

Atena deu de ombros.

— Eu sei de tudo.

E disso Poseidon não tinha como discordar. Uma vez prontos, os deuses deram as mãos e se teleportaram outra vez para a frente do palácio principal. Dessa vez, a construção nem parecia a mesma de quando eles estiveram ali horas atrás. Os arredores e o próprio palácio estavam cobertos de luzes, flores e enfeites primaveris. Tecnicamente era inverno, mas como o clima era controlado pelos deuses e no Olimpo não nevava, todos podiam fingir que era a estação que quisessem.

As luzes foram enroladas ao redor das árvores e colunas, e dispostas em forma de cascata na entrada do palácio, acompanhadas pelas flores, e só de bater o olho, Atena tinha certeza que aquela decoração era fruto da imaginação de Afrodite. Nenhum outro deus teria a ideia de colocar cupidos pendurados em todos os pisca-piscas. Uma música alta vinha do lado de dentro, acompanhada pelo som estridente de muitas vozes falando ao mesmo tempo, e embora tudo isso devesse tranquilizar Atena, ela estava um pouco receosa. Uma hora ou outra sua família descobriria sobre ela e Poseidon - talvez fosse naquela noite, talvez não. De toda forma, a deusa temia o modo como alguns deles reagiriam, especialmente seu pai. Assim como Poseidon, Zeus não era nenhum mestre em controlar a própria raiva.

— Pronto para enfrentar nossa família? - perguntou Atena.

— Não - respondeu Poseidon, com um sorriso.

O deus segurou uma mão de Atena e depositou ali um beijo antes de soltá-la.

— Provavelmente seria melhor não entrarmos de mãos dadas - ele deduziu.

Atena assentiu, aliviada porque ele não quis seguir em frente com sua ideia de "uma entrada triunfal para fazer Zeus explodir o Olimpo".

— Pelo menos não agora - ela completou. – Vamos deixar o choque geral para o fim da festa.

Então os deuses se adiantaram para dentro da festa. Embora tecnicamente houvessem se passado apenas trinta minutos do início oficial da celebração, já havia deuses bêbados o suficiente como se estivessem bebendo o dia inteiro. Bem, no caso de Dionísio, Atena sabia que era o que havia acontecido. A gritaria e as risadas faziam parecer que a festa já estava acontecendo a horas. O olhar de Poseidon voou para algo do outro lado do salão, e ele se inclinou para falar com Atena:

— Eu já volto - ele avisou. - Pode deixar que eu te acho depois.

— Tudo bem - disse ela.

Tão logo o deus de afastou, Atena sequer teve tempo de pensar no que faria a seguir, porque seus pés de repente não estavam mais tocando o chão, e seu corpo estava sendo jogado de um lado para o outro.

— Atena! - ela reconheceu a voz de Apolo, gritando seu nome cheio de empolgação. - Você voltou!

O deus do sol havia erguido seu corpo, e chacoalhava Atena no ar enquanto gargalhava.

— Oi, Apolo - ela respondeu.

— Eu senti sua falta, baixinha – disse ele. – Fiquei sabendo que você e o tio Poseidon sumiram por um bom tempo.

Atena, que não era burra nem nada, entendeu imediatamente a insinuação escondida na fala de Apolo. O deus do sol era o fiel escudeiro de Afrodite quando se tratava de fofocas olimpianas, e não havia nada sobre a vida dos outros deuses que os dois não acabassem sabendo. Atena tinha certeza de que, assim que Apolo voltou de sua própria missão, Afrodite contou para ele sobre seu suposto "encontro" com Poseidon. Ah, se eles soubessem do resto...

Atena abriu um sorriso misterioso para o irmão.

— É, tivemos algumas complicações na nossa missão – ela se esquivou.

— E essas complicações envolviam sair para dançar, eu imagino?

Atena deu um tapa leve no braço de Apolo, que começou a gargalhar.

— Você e Afrodite são dois fofoqueiros – ela o acusou. – E não, as complicações não foram só essas. Imagino que Afrodite ainda não saiba que a casa dela foi destruída pelos titãs?

— Aparentemente não – replicou Apolo. – Mas não acho que ela vá se importar. Em todo caso... – o deus abaixou a voz, de forma que só Atena pudesse ouvir. – Você e o tio Poseidon, hein?

Atena rolou os olhos.

— Pode admitir que era aí que você queria chegar desde o começo.

— Ah, não vou mentir para você – Apolo confessou. – Fiquei curioso depois que Afrodite comentou. Não achei que fosse possível. Até onde eu sabia, vocês se odiavam.

Atena inclinou a cabeça em consideração.

— Talvez. Mas muitas coisas mudaram durante essa missão. Mas escute – ela completou antes que Apolo pudesse tirar qualquer conclusão. – Não temos nada definido. É só algo que aconteceu.

— Eu entendo, irmãzinha – Apolo garantiu. – E o papai já sabe?

O semblante de Atena nublou.

— Não, e espero que não descubra tão cedo – Atena suspirou, frustrada. – Ele está... terrivelmente territorial desde que voltamos. Não consigo nem imaginar o que ele vai fazer quando souber.

Apolo assentiu.

— No que depender de mim, ele vai continuar sem saber de nada.

— Muito obrigada – o agradecimento de Atena era sincero.

— Sem problemas – Apolo garantiu. – Vamos pegar uma bebida?

Atena olhou ao redor do salão automaticamente, procurando por Poseidon, mas, não o encontrando, deu de ombros.

— Por que não?

Apolo liderou o caminho e Atena seguiu em seu encalço em direção à uma mesa onde copos de vinho se enchiam sozinhos. O deus do sol pegou um copo para Atena e um para si mesmo, e ambos começaram a beber em um silêncio confortável. A presença de Apolo era sempre reconfortante para Atena; ele era uma das poucas pessoas em quem ela tinha confiança para conversar sobre qualquer coisa, embora ela frequentemente questionasse sua escolha, visto que Apolo não era muito conhecido por saber guardar segredos – ele apenas, incrivelmente, nunca havia revelado um segredo seu.

— E como foi a sua missão, afinal? – indagou Atena.

Apolo encolheu os ombros.

— Já havíamos matado Píton uma vez, então tínhamos certa experiência em fazê-lo de novo – ele explicou. – Além disso, eu estava com Ártemis. Você sabe que ela é barra pesada.

Atena sorriu com orgulho.

— Sim, ela é. E por falar nisso, onde está ela?

— Boa pergunta – Apolo esticou o pescoço para ver por sobre as pessoas. – Deve estar por aí ameaçando alguém. Mas posso encontrá-la num segundo. É só encontrar uma caçadora e...

— APOLO! – o grito veio do outro lado do salão, mas foi perfeitamente audível, vindo da voz inconfundível de Ártemis.

— Eu disse – Apolo sorriu triunfante. – ESTOU AQUI! – ele gritou em retorno.

Algum tempo depois, uma mulher ruiva surgiu em sua frente, abrindo caminho pela multidão que ocupava o salão. Atena levou um instante para perceber que aquela era Ártemis. A deusa da lua, que geralmente aparentava ter no máximo doze anos, escolhera naquele dia o corpo de uma mulher adulta que, a não ser pelo cabelo, nada tinha a ver com sua pessoa original. Atena só a havia visto com aquela aparência uma vez em sua eternidade, quando Ártemis queria enganar Oto e Efialtes.

— Uau – Atena soltou, antes que percebesse o que dizia. – Você está diferente, Artie.

— Ela está linda, não está? – Apolo perguntou, com um sorriso, se aproximando da irmã. – Venho tentando convencer ela disso a tempos.

— Está sim – Atena concordou.

Ártemis enrubesceu, mas permaneceu firme.

— Obrigada, Atena – disse ela. – Senti sua falta. Fico feliz que tenha corrido tudo bem na sua missão.

— Igualmente – Atena retribuiu.

— Quer beber alguma coisa? – Apolo perguntou, tomando a mão da irmã entre as suas com naturalidade.

Atena franziu o cenho para o gesto. Ficou esperando que Ártemis gritasse e mirasse um golpe mortal no irmão por ousar tocá-la, mas a deusa da lua sequer parecia reparar no que ele fazia. Os olhos de Atena se estreitaram. Aparentemente, não era só em sua missão que muitas coisas haviam mudado.

— Na verdade, eu precisava falar com você – Ártemis disse, e sua entonação deu a parecer que seria uma conversa particular.

— Bem, eu já estava indo pegar algo para comer – Atena se prontificou, afastando-se dali imediatamente. – Até logo.

Os gêmeos acenaram para ela, ao que Atena se retirou de sua presença. Não foi nada fácil encontrar a mesa das comidas em meio à multidão que estava na festa, mas por fim, depois de muito procurar, Atena apareceu ao lado dela quase que por acidente. A deusa havia acabado de estender a mão para alcançar um petisco quando uma mão circundou sua cintura e um corpo forte se colou às suas costas.

— Olá, princesa – a boca de Poseidon estava colada ao seu ouvido. – Você vem sempre aqui?

Atena enrijeceu com a pergunta. Mais uma vez, Poseidon estava repetindo algo que havia dito a mais de três mil anos, na época da qual ele já não tinha mais memória. Em um evento como aquele, em uma festa, na mesma posição, com as mesmas palavras. Atena não o culpava, é claro – ele não tinha como saber o que estava fazendo. No entanto, não podia deixar de achar aquele ato um tanto estranho.

— Na verdade, não – ela respondeu. – Hoje é uma ocasião rara e única.

— Hum – Poseidon inalou o perfume em seu pescoço antes de responder. – O cavalheiro que está te acompanhando deve ser um homem de sorte.

E outra vez, ele respondeu a mesma coisa de três milênios atrás. Como era possível? Ignorando a dor em seu coração, Atena por fim se virou de frente para ele com um sorriso forçado nos lábios.

— Na verdade, não estou acompanhada.

— Impossível – Poseidon continuou o jogo. – Como uma mulher como você pode estar desacompanhada?

— Estava esperando meu príncipe encantado – respondeu Atena.

Poseidon se afastou um pouco, apenas o suficiente para que pudesse segurar a mão de Atena e se curvar diante dela.

— Sendo assim... me concederia a honra de uma dança?

Dessa vez, a deusa sorriu verdadeiramente para ele.

— Seria um prazer.

Poseidon tomou sua mão e a guiou até a pista de dança próxima dali, onde dezenas de pares se balançavam lentamente ao som de uma melodia calma. Chegando em meio a bagunça de pessoas dançando, ele abraçou a cintura de Atena, ao que ela passou os braços em torno de seu pescoço. A mente da deusa estava apenas vagamente consciente de alguns olhos chocados os observando; apesar de seu anseio pelas reações gerais, a presença de Poseidon não permitia que nenhuma emoção além da mais pura alegria dominasse seu corpo.

— Você demorou – Atena o acusou.

— Estava conversando com Hades – explicou Poseidon. – Ele tinha muitas perguntas a me fazer. Honestamente, não posso imaginar como ele tenha descoberto tanta coisa. E eu recebi algumas ameaças sérias ali.

Atena enrubesceu, entendendo que ele sabia exatamente como Hades havia descoberto tanta coisa.

— Não foi de propósito – Atena explicou. – Ele meio que já sabia de tudo. Por causa da época...

— Da qual eu não me lembro – Poseidon completou.

— Isso - confirmou Atena.

Ela recostou a cabeça em seu peito enquanto dançavam, e podia jurar que ouvira a voz chocada de algum deus dizendo seus nomes. Ela só esperava que não fosse Zeus.

— Engraçado - Poseidon começou. - Você sabia que, entre os cavalos marinhos, quem engravidam são os machos?

E ali estava, outra vez, uma frase que Poseidon havia dito a mais de três milênios sendo repetida. Na mesma ocasião, no mesmo contexto. E aquele era oficialmente o limite da desconfiança de Atena. Quais eram as chances de ele dizer algo tão estúpido duas vezes na vida? Ainda mais ele, que era o deus dos mares desde sempre? Atena ergueu a cabeça e olhou diretamente nos olhos de Poseidon.

— Poseidon, você tem alguma coisa para me contar? - ela perguntou, por fim.

O deus sorriu como se Atena tivesse demorado a entender algo. Embora a deusa previsse o que ele diria a seguir, tentava conter a euforia que começava a crescer dentro de si. Mal podia acreditar que...

— Na verdade, sim - ele confessou. - Eu me lembrei de tudo. Absolutamente tudo.

Atena soltou um suspiro de alívio, apertando os braços ainda mais ao redor dele. Só ela sabia o peso da culpa que ela carregava todos os dias por ter tirado memórias importantes de Poseidon com ela, e embora ela não soubesse dizer como o efeito do feitiço foi revertido, era infinitamente grata.

— Mas como? - ela perguntou. - Desde quando?

— Não sei como - respondeu Poseidon. - Mas eu me lembro desde o dia em que eu... Morri, para todos os efeitos. Quando eu acordei, percebi que haviam coisas na minha mente que simplesmente não estavam lá antes. Coisas que coincidiam com algumas coisas que você me contou.

— Ah, Poseidon - Atena o abraçou, inteiramente aliviada. - Eu não sei nem o que dizer. Era tudo o que eu precisava nessa vida.

Poseidon a abraçou de volta, beijando o topo de sua cabeça.

— Agora é sua vez, senhorita - ele estreitou os olhos. - Você não tem nada para me contar?

Atena baixou os ombros, se dando por vencida.

— Feliz aniversário, Poseidon.

O sorriso do deus se alargou de uma forma inacreditável, e ele apertou ainda mais a cintura de Atena.

— Eu sabia que tinha algo de estranho naquele almoço de hoje - ele disse. - Mas não imaginei que você fosse lembrar.

A deusa deu de ombros.

— Não foi tão difícil assim. Afinal...

— É seu aniversário também - Poseidon completou, ao que Atena reagiu com um semblante surpreso. - Não pensou que eu esqueceria, não é?

— Confesso que esperei - disse Atena. - Nós provavelmente somos os únicos deuses que ainda contam aniversários.

— Eu lembrei dos seus todos os anos - atestou Poseidon. - E nesse ano não seria diferente - ele se abaixou para tocar seus lábios com delicadeza. - Feliz aniversário, meu amor.

Atena sorriu contra seus lábios, ao mesmo tempo em que um trovão ribombou tão fortemente pelo céu que fez estremecer todas as estruturas do Olimpo. E dessa vez foi Poseidon quem sorriu.

— Ops - ele fez, mas sua expressão não enganava a absolutamente ninguém.

Atena rolou os olhos.

— É melhor sairmos daqui agora - ela apontou. - Pela vida de todos aqui.

— Tudo bem - Poseidon deu de ombros e os teleportou para os jardins, um pouco distante do palácio.

Estava tudo absolutamente silencioso ali; nada além dos sons da natureza e do nome de Poseidon sendo gritado por Zeus dentro do palácio principal.

— Acho que ele viu - disse Poseidon, tentando soar inocente.

Atena o encarou sem paciência.

— Nós dois sabemos que ele viu, Poseidon - ela retrucou. - Ele estava olhando para nós bem na hora, e não aja como se você não soubesse disso.

O deus dos mares ergueu os braços no ar, como quem se rende.

— Tudo bem. Não direi uma palavra - ele suspirou. - Mas já que estamos aqui... Eu queria conversar com você antes que Zeus chegue me desafiando para um duelo até a morte.

Atena se sentou em um banco próximo, olhando para ele com curiosidade. Poseidon preferiu se sentar na grama à sua frente, encarando seus olhos fixamente.

— Eu sei que já disse isso - ele começou. - Mas eu só queria deixar claro antes que você faça qualquer escolha.

Atena inclinou a cabeça, indicando que ele prosseguisse.

— Eu não espero que você prefira abandonar a vida que já tem - Poseidon continuou. - Não espero que deixe de lado suas obrigações abusivas, embora eu ainda esteja muito disposto a falar com meu irmão sobre isso; não espero que você se case comigo; não espero que escolha morar em um lugar sempre cheio de gente ao invés de um palácio silencioso e tranquilo como seu; não espero que aceite o peso de ser a rainha de todo um reino, e que faça tudo isso só por mim. E se você decidir que não, eu vou entender e aceitar completamente.

"Não vou deixar de te amar ou te amar menos em razão da sua escolha. Você é livre para seguir o curso de sua vida como achar melhor, e eu farei o possível para me acostumar com isso. No entanto... - Poseidon suspirou e segurou sua mão. - Se você, para a minha sorte, escolher viver comigo... Eu prometo que não vai haver um único dia em que não vou dar o meu melhor para te fazer feliz, Atena. Prometo que todos os meus segundos vão ser dedicados à você e a qualquer coisa que você precisar para ficar comigo. Prometo reconstruir Atlântida até o último prédio, se for o necessário para que você se sinta em casa. Prometo que você finalmente vai poder descansar... Ou trabalhar em dobro, se preferir. Mas em todo caso... - ele concluiu, entrelaçando seus dedos. - Eu vou fazer o meu melhor para te amar ao máximo, qualquer que seja a sua escolha.

A essa altura, os olhos de Atena já estavam encharcados, e ela não tinha certeza se seria capaz de respondê-lo.

— Estou dizendo isso... - Poseidon prosseguiu. - Porque não quero que você tome uma decisão baseada no que for melhor para mim. Eu me desdobro para me encaixar em qualquer realidade que você achar melhor. Quero que você escolha pensando em você e no que te faria mais feliz.

Atena continuava incapaz de gerar uma resposta, apenas balançando a cabeça de um lado para o outro.

— Você também não precisa me responder agora, é claro - Poseidon se adiantou a dizer, vendo o estado de Atena. - Não tenha pressa nenhuma. Pode fazer tudo no seu...

Mas ele não conseguiu terminar, porque Atena se lançou sobre ele, o abraçando com todas as suas forças. Não sabia o que havia feito para merecer uma pessoa como Poseidon, mas tinha absoluta certeza de que era a mulher mais sortuda do universo.

— Eu já decidi - ela revelou. - Mas não sabia como te contar isso.

Poseidon assentiu, indicando que ela prosseguisse. Seu semblante estava preocupado, e mesmo antes de falar, Atena podia ver que ele esperava por uma resposta negativa. E por isso foi ainda melhor ver seu rosto se iluminar quando ela disse:

— Eu quero ir morar com você. Talvez seja uma mudança drástica na minha rotina, mas eu tenho certeza de que vale a pena. Porque honestamente... A eternidade seria uma tortura para mim se eu a passasse em qualquer lugar que não com você.

Poseidon ficou em silêncio por um instante depois disso, e Atena prosseguiu, nervosa.

— Isso, é claro, se você aceitar. Eu sei que é um grande passo para você também e...

Mas ninguém nunca saberia o que mais Atena tinha a dizer, porque Poseidon puxou seu corpo para perto e a beijou, um beijo que carregava muito mais do que apenas desejo. Carregava tudo o que eles sentiam um pelo outro, e não era pouca coisa. E todos os beijos com ele eram como se fosse o primeiro. Cada toque dele era uma nova descoberta, como se ele nunca tivesse encostado em seu corpo.

— Mas escute - Atena se lembrou, - precisamos urgentemente de um escudo anti-Helena. Ela sempre aparece no meio dos melhores momentos.

Poseidon gargalhou.

— Eu confio nas suas habilidades como deusa da estratégia para resolver esse problema.

Um movimento próximo chamou a atenção dos deuses, que viraram a cabeça imediatamente, temendo que Zeus finalmente os tivesse encontrado, mas para sua surpresa, quem apareceu foi Hermes, vestido seu capacete e os sapatos alados. Ele estava muito ofegante, o que indicava que havia corrido mais do que o normal, e seu rosto estava vermelho e suado.

— O bebê... Agora... Estão chamando... - ele balbuciou.

Atena franziu o cenho para ele.

— Você está bêbado, Hermes? O que está dizendo?

Hermes respirou profundamente antes de responder pausadamente:

— Um pouco. Mas vim trazer uma notícia - ele esclareceu. - Dionísio mandou avisar que Will mandou avisar que Annabeth mandou avisar que...

— Direto ao ponto, Hermes! - Atena pediu, impaciente.

— Deselegante - Hermes murmurou. - Quis dizer que a filha da sua filha e do filho de Poseidon acaba de nascer no Acampamento Meio-Sangue.

Quando enfim o cérebro de Atena processou aquela informação, ela se levantou em uma velocidade impressionante até para uma deusa, puxando a mão de Poseidon junto de si e os transportando imediatamente para o acampamento, sem se demorar para agradecer a Hermes ou dar uma escolha para Poseidon. Apesar de ser de noite, o Acampamento estava uma absoluta algazarra, e um grupo enorme de pessoas se reunia ao redor da enfermaria, que estava acesa. Atena abriu caminho entre as pessoas, com Poseidon logo atrás de si, e o jovem amedrontado na porta não se atreveria a dizer não quando ela disse que queria ver Annabeth. A deusa cruzou o recinto em passos irregulares até chegar na única cama ocupada, do outro lado, onde a cabeleira inconfundível de Annabeth escorria dos lençóis. Ela segurava um pequeno pacotinho no colo, e ao seu lado, Percy olhava para dentro do emaranhado de lençóis nos braços dela. Os jovens se sobressaltaram ao perceber a presença dos deuses ali, mas imediatamente fizeram curtas reverências.

— Pai, Atena - cumprimentou Percy. - Não imaginei que viessem.

— Viemos assim que Hermes nos deu a notícia - Atena fez questão de dizer, já sentindo aflorar um instinto superprotetor que não imaginaria ter com sua neta. - Meus parabéns para vocês dois.

— Obrigado - o casal agradeceu em conjunto.

— Digo o mesmo - completou Poseidon. - Será que podemos vê-la?

— É claro - Annabeth estendeu o pequeno pacote na direção do sogro, que o segurou com todo o cuidado do mundo.

Atena sentiu um certo calor ao vê-lo segurar a bebê. Sabia que Poseidon não era nenhum inexperiente no assunto de ser pai, e provavelmente já havia tido mais filhos do que podia se lembrar, mas não deixava de ser encantador vê-lo embalar a criança com tanto cuidado. Ele levou a bebê nos braços até onde Atena estava, e a deusa conteve a vontade de torcer o nariz quando finalmente a viu.

Geralmente, dizia-se que bebês são metade a mãe e metade o pai, mas aquela criança era inteiramente Percy. Ele poderia facilmente fingir que fez a filha sozinho, tamanha era a semelhança da recém-nascida com ele - e consequentemente com Poseidon, já que Percy também não passava de uma cópia do pai. A menina tinha os mesmos cabelos cor de petróleo, a mesma pele bronzeada, os mesmos traços e até a mesma boca repuxada para um lado. Será que Annabeth não tivera participação alguma na formação daquela criança?

— Ela é a cara de vocês - Atena disse para Poseidon e Percy antes que pudesse se conter.

Os meninos talvez tivessem percebido o traço de insatisfação em sua voz, porque gargalharam sonoramente.

— Ela é mesmo - Percy admitiu.

— Mas você ainda não a viu de olhos abertos - Annabeth acrescentou. - Ela tem os nossos olhos.

Atena sorriu triunfante ao saber que pelo menos uma herança sua seria carregada pela filha de Annabeth. Os olhos eram, afinal, a parte mais importante do corpo. Eles carregavam toda a verdade. Sem aguentar a própria curiosidade, a deusa pousou um dedo sobre a testa da criança, que imediatamente abriu os olhos. E Annabeth não estava mentindo. A menina tinha os olhos cinzentos e marcantes, herdados de Atena, olhos espertos que pareciam saber de tudo. A deusa da sabedoria sorriu para a bebê antes de fazê-la dormir outra vez.

— É linda - ela confessou. - Como ela vai se chamar?

— Temos uma longa lista de nomes, mas ainda não conseguimos nos decidir - respondeu Annabeth. – Ela nasceu ainda antes do que esperávamos.

— O meu palpite continua de pé - apontou Poseidon.

Atena rolou os olhos.

— Minha neta não vai se chamar Poseidônea - ela disse pela milésima vez no último mês. - Se fosse para homenagear um deus, faria muito mais sentido escolher Atena, que já é um nome feminino.

— Poseidônea é um nome feminino - Poseidon se defendeu.

— É uma modulação do seu nome! Nem parece ser o nome de uma semideusa.

— É um nome diferenciado - disse Poseidon. - E marcante.

— É brega - Atena corrigiu.

Os pobres Percy e Annabeth sequer ousavam tomar parte naquela briga; seria terrível estar contra Atena ou Poseidon, ainda mais em um assunto que parecia tão importante para eles. Por fim, Atena devolveu a criança à Annabeth com um suspiro de frustração.

— Bem, concordarei com o nome que vocês escolherem, seja ele qual for - ela disse. - A menos que vocês escolham Poseidônea. Então eu vou inventar algum nome mais legal e chamá-la assim. A coitada precisa saber que tem alguém do seu lado.

Percy e Annabeth riram, olhando com carinho para a filha. Atena se permitiu devanear naquela cena por um instante. Será que, se tivesse uma filha com Poseidon, ela seria daquele jeito? Ela esperava que não, porque seria um desgosto imenso carregar uma criança por tanto tempo para que saísse uma cópia exata do deus dos mares, sem qualquer traço seu. Ainda assim, a deusa sorriu. Parecia uma ideia louca e quase impossível no momento. Ela sequer deveria estar pensando naquilo.

Os deuses passaram mais algum tempo junto dos filhos, conversando sobre coisas banais, até que Annabeth começasse a manifestar uma necessidade de descansar.

— Já estamos de saída - Atena garantiu, diante dos protestos educados dos semideuses. - Vamos voltar para casa antes que Annabeth desmaie de exaustão, não é, Poseidon?

O deus dos mares sorria ao concordar, e Atena tentava entender por que os três presentes a encaravam com uma feição estranha quando se deu conta de que disse para Poseidon, em alto e bom som, que os dois precisavam ir para casa. Para a mesma casa. A deusa sentiu vontade de bater na própria cara. Nem Percy nem Annabeth tiveram coragem de questioná-la, mas ela sabia que a suspeita já estava implantada em suas cabeças. Bem, eles teriam que descobrir uma hora ou outra.

— Então, estamos indo - declarou Poseidon. - Boa sorte com a garota. Espero que todos vocês fiquem bem.

— Obrigada, pai - Percy agradeceu.

— Tchau, crianças - disse Atena, e então segurou a mão de Poseidon.

Os deuses partiram dali sob olhares surpresos e acenos de despedida.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Três Desejos" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.