Go Home, Dominique escrita por Miss Jackson


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Hey, gente! Eu quero agradecer, do fundo do meu coração, pelos comentários no capítulo passado e todos os acompanhamentos que eu já tenho. Muito obrigada! ♥ Boa leitura.



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Quando entro em casa o Gato pula nas minhas pernas, avançando e tentando rasgar minhas calças. Suspiro e pacientemente pego ele no colo, deixando-o no sofá. Temos um gato angorá de um ano chamado Gato (o que mostra que minha família é claramente criativa), e nunca vi um bicho me odiar tanto. Sério, eu me dou bem com animais, mas Gato me odeia e demonstra isso de uma forma tão clara que chego a imaginar que Tracey o controla.

Minha mãe senta no sofá e começa a brincar com ele. A mesma criatura selvagem que me atacou há um minuto atrás agora está ronronando e brincando com minha mãe como um anjinho.

Chega a ser ridículo.

Me dirijo até meu quarto e me tranco lá. Abro as cortinas, deixando a luz do sol entrar — o dia está lindo, e seria mais lindo ainda se não estivesse sendo um porre. Ligo o rádio e deixo tocando numa estação qualquer.

— Seu estilo musical é muito chato — comenta Tracey, aparecendo deitada na minha cama. — Já não basta ser perturbada desse jeito?

— É uma estação de rádio, não minha playlist — resmungo. — E sai da minha cama. — Tracey ri e desaparece.

Estou com sono e tudo que eu gostaria no momento é dormir, mas não posso. Os pesadelos que me atormentam normalmente são bem terríveis, e eu procuro ao máximo evitá-los. 

Aumento o volume da música até parar de ouvir a minha mãe chorando na sala. Ela sempre age como se fosse a pessoa mais forte do mundo e um exemplo de mãe, mas eu sempre a ouço chorando por aí quando tenho uma crise ou por motivos mais simples. Com o passar do tempo, ela tem ficado cada vez mais emotiva.

Depois de algum tempo ouvindo música, decido que é melhor tomar um banho e tentar relaxar. Pego uma muda de roupas e vou até o banheiro, deixando as roupas em cima da pia e colo a banheira para encher enquanto tiro as roupas e me encaro na frente do espelho, suspirando profundamente. Entro na banheira e logo relaxo com a água morna, fechando os olhos. Mergulho, molhando meus cabelos, e quando volto Tracey está junto comigo na banheira. Arregalo os olhos e grito, assustada. Tracey começa a gargalhar, e confesso que a gargalhada dela me dá muito medo, é maligna.

— Quando ficou tão ousada? — pergunto, ainda me recuperando do susto.

— Eu sou apenas como você, irmãzinha.

— Eu não sou ousada — retruco e começo a passar o sabonete pelo meu corpo. Tracey, sorrindo daquele jeito maligno, pega outro sabonete e faz o mesmo. — Pare de me imitar.

— Eu faço o que você faz, Nique — Não. Ela não me chamou de Nique!

Meu corpo todo estremece e o sabonete escorrega das minhas mãos. Aperto os olhos, tentando com todas as forças não voltar àquele dia. Meu pai foi a única pessoa que me chamou frequentemente por um apelido até hoje, e ele sempre me chamava de Nique. Ele me acalmava quando eu tinha crises, me deixava feliz.

Sou sugada para o flashback daquele fatídico dia antes que eu consiga pedir para Tracey ir embora.

Estou conversando com meus pais sobre a ideia de ir para uma escola particular. Eu tinha muitos sonhos até o dia da morte do meu pai, estudar em uma escola particular era um deles, mas a maioria das coisas boas em mim desapareceram naquele dia, quando a depressão e Tracey ficaram ainda mais fortes.

— Se você quiser tentar, Nique, podemos tentar algo na cidade. Dizem que têm ótimas escolas particulares por lá! — Diz meu pai, com um sorriso. Minha mãe faz uma careta, claramente incomodada com a ideia, e acaricia as orelhas do Gato, que descansa em seu colo. — Oh, Marie, não faça essa cara. É um sonho da nossa filha que pode ser realizado, e a Nique precisa do apoio da mãe também.

Eu sorrio, concordando.

— Dominique deveria continuar estudando por perto, Harry, você sabe — resmunga minha mãe. — Com todos os problemas psicológicos dela, ir até uma escola na cidade demoraria caso ela precisasse de ajuda.

— Minha escola fica quase na cidade — digo, mordendo o lábio e ficando desanimada. — Tudo bem, eu já entendi.

Meu pai revira os olhos, balançando a cabeça.

— Desculpe, Nique. Para compensar essa decepção, vou pegar o carro e ir até o mercado da cidade, adivinhe o que irei comprar.

Meu rosto se ilumina novamente e eu abro um sorriso de orelha a orelha. Mesmo com todos os problemas, a Dominique daquela época ficava feliz com mais facilidade. Sinto falta disso.

— Cookies! — exclamo alegremente.

— Com certeza, florzinha — diz meu pai, levantando e bagunçando meus cabelos. Ele se inclina e dá um selinho suave na minha mãe, que sorri. Ela amou muito meu pai, e era feliz de verdade antes dele morrer. — Volto logo, minhas garotas!

Foi a última vez que ouvi a voz do meu pai. Horas depois, bateram na nossa porta contando que um caminhão se atravessara na frente do carro do meu pai e ele saiu da pista. Morreu na hora. Minha mãe chorou e gritou, e eu também chorei. Tracey apareceu e eu tive, por um momento, a esperança de que ela fosse ser gentil, mas ela apenas sorriu e disse:

— Nique, Nique, Nique... Acho que finalmente vou conhecer o nosso pai e, parabéns, graças à você!

Abro os olhos, de volta à realidade. Tracey continua ali, me encarando.

— Foi culpa sua — observa minha gêmea.

— Você é uma idiota. Vai embora daqui!

Tracey gargalha novamente e eu me desespero, começando a me debater e, inutilmente, jogar água nela enquanto ela gargalha mais e mais alto. Minha mãe entra no banheiro, com os olhos vermelhos e já toda descabelada, deve ter arrancado uns bons tufos de cabelo. Ela me agarra pelos ombros, me sacudindo enquanto eu continuo no mesmo estado.

— PARA COM ISSO, DOMINIQUE! — grita, e então ela me dá um tapa com força. Arde, e eu paro de me debater na hora, encarando minha mãe com os olhos arregalados. Ela retribui o olhar, aparentemente tão assustada quanto eu. Minha mãe nunca perdeu o controle desse jeito.

Tracey solta uma última risada e desaparece, nos deixando sozinhas.  Toda vez que ela aparece eu desejo com todas as forças que isso seja apenas um pesadelo e que acabe logo, mas não é um pesadelo, eu estou perfeitamente acordada — e isso só deixa as coisas mais horríveis.

— Mãe... — sussurro, afônica. Minha mãe cai de joelhos no chão, sem forças para parecer forte na minha frente. — Me desculpa, mãe...

— Sai da banheira — ordena ela, apertando os olhos. — Termine de se lavar e vai pro seu quarto.

Obedeço sem hesitar. Tento abraçá-la, mas ela recua, me deixando mais magoada ainda. Me arrasto até meu quarto e entro, fechando a porta. Quase não dá para acreditar que ainda tem o resto do dia pela frente. 

Estou considerando a ideia de ir dormir antes de anoitecer e aturar os pesadelos.

— Você mereceu — Tracey aparece, me assustando. — Deus, foi a melhor cena de toda a minha v... — Ela franze a testa e se interrompe. — Hum, deixa pra lá. Mas foi muito divertido!

— Me deixa em paz, Tracey — murmuro. Pela segunda vez no dia Tracey me obedece, o que me faz pensar que é um milagre acontecendo. Ou talvez ela só esteja cansada de rir da minha cara de otária sofrida.

Deito na cama e abro um sorriso de leve, apreciando o silêncio que preenche o quarto.


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