Entrelinhas Ron e Hemione - Intuições escrita por Morgana Lisbeth


Capítulo 8
Presente (in)esperado


Notas iniciais do capítulo

“Queria ter coragem
Para falar deste segredo
Queria poder declarar ao mundo
Este amor
Não me falta vontade
Não me falta desejo
Você é minha vontade
Meu maior desejo”

(Carlos Drummond de Andrade)



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Como já acontecera em tantas manhãs, Hermione desperta pensando em Ron. Tinha ido dormir chateada com o aparente marasmo do rapaz que, mesmo demonstrando ciúmes de Krum, jamais admitia esse sentimento e parecia indiferente a ela. "Vou deixar Ron sem graça, mas ele terá que me responder por que se irrita tanto quando falo o nome de Vítor", pensou.

Ao começar a se arrumar, a menina estranhou o fato da cama de Gina estar vazia. Ela costumava levantar antes da ruiva. Na noite anterior, assim como já fizera muitas vezes, havia colocado o feitiço abafador ao redor de sua cama. Assim dormia melhor, sem ouvir os ruídos do quarto, especialmente os risinhos de Lilá e Pavarti que pareciam ter sempre muitos assuntos a colocar em dia.

Quando desce as escadas do dormitório, Hermione se surpreende ao encontrar com a professora McGonagall. "Bom dia, senhorita Granger. Poderia vir à minha sala? Precisamos conversar em particular", convidou a diretora da Grifinória. A menina responde ao cumprimento e logo segue Minerva, que anda apressada. O coração da jovam bruxa bate acelerado. Será que alguma coisa tinha acontecido com um dos dois amigos?

No momento que entram na sala, antes da professora sentar, a menina tem finalmente a oportunidade de perguntar num fôlego só: "O que houve? Foi algo com Ron ou foi com Harry? Algum deles está ferido"?

— Calma, Hermione Granger. Seus amigos estão bem. Aliás, ninguém mais corre perigo de vida - respondeu com a voz tranquila.

— Como assim? Alguém corria perigo de vida? - Hermione perguntou com os olhos arregalados e o rosto pálido.

— Arthur Weasley sofreu um acidente ontem à noite no Ministério e Dumbledore achou melhor que Harry e todos os irmãos Weasley fossem imediatamente para Grimmauld Place. Arthur está no Hospital St. Mungus, mas seu quadro já se encontra estável - explicou a professora.

Hermione faz várias perguntas sucessivas. Quer saber tudo sobre o acidente com o pai de Ron. A professora se limita a dizer que ele foi atacado por uma cobra no Ministério. "Não insista. Ronald e Harry podem lhe contar melhor os detalhes depois", Minerva falou com seu jeito lacônico.

— Por que não me avisaram? Eu queria ter ido com eles! - a menina tinha a voz estridente, denunciando todo o seu nervosismo.

— Senhorita Granger, o recesso começa amanhã. Ainda há atividades hoje e, como monitora, você tem responsabilidades a cumprir. Os irmãos Weasley precisaram ir porque o acidente foi como pai deles. Harry que... digamos... previu esse acontecimento, foi autorizado por Dumbledore a acompanhá-los - argumentou em tom severo.

— Mas eu gostaria de estar com eles... Será que não posso ir para lá amanhã? - o pedido veio num tom de voz mais baixo.

A professora ponderou que agora dependia dos pais da menina, que deveriam autorizar. "Mande uma coruja para eles", sugeriu, despedindo-se de Hermione e dizendo para ela ir tomar café.

Hermione sente-se angustiada. Não vai conseguir ficar bem com a sua família, esquiando na França, depois de saber que o pai de Ron sofreu tão grave acidente. Ao mesmo tempo, como vai desmarcar o lazer de inverno há tantos meses aguardada pelo casal Granger? Quer estar ao lado do ruivo e também de Harry, que previu o ataque.

Os pais teriam dificuldade para compreender o real motivo de não querer passar o Natal com eles. Por isso decidiu escrever dizendo que está preocupada com a proximidade dos exames dos Níveis Ordinários de Magia e precisa estudar nos dias do recesso. Mesmo se os Granger não gostam muito de receber e mandar correspondência por intermédio de corujas, pede que a respondam assim diante da urgência da situação. Mesmo contrariado, o casal faz como a filha solicitou.

No final da tarde, assim que recebe a resposta dos pais autorizando-a a ficar, Hermione escreve aos amigos. O coração bate acelerado e ela não entende muito bem o porquê. Precisa comunicar que vai para a sede da Ordem da Fênix que, por ser mais próxima ao St. Mungus, abriga Potter e a família Weasley. Resolve fazer uma carta apenas, endereçada a Molly e família, extensiva a Harry.

Quem recebe a correspondência é Gina, que logo comunica a Ron e aos gêmeos, que estavam na sala: "Chegou uma carta da Mione!"

— Deixa eu ver a carta - pediu Ron, sem esconder a ansiedade. - Deve ser para mim.

— Nada disso! - retrucou Gina, desvencilhando-se de Ron, que havia se levantado e esticava o braço em direção ao envelope que a irmã segurava. - A carta está endereçada a mamãe e vou entregar para ela.

— Eu entrego, então! - falou Ron e, como a menina não responde, se limitando a olhar para ele com indiferença, ele a segue até a cozinha, onde estava a mãe.

— Mãe, Hermione escreveu para você - Gina anunciou rapidamente assim que avistou Molly.

Ron fica parado à porta, com cara de poucos amigos. Atrás dele surgem mais duas cabeças ruivas que acompanharam com muitas risadas a discussão dos irmãos.

— Muito bem - disse a mãe olhando de um filho para o outro. - Pelo visto todos querem saber o que diz a carta. Podem deixar que lerei em voz alta.

Abrindo com tranquilidade o envelope, Molly tira a carta escrita com letra bem desenhada e começa a ler:

Queridos Molly, Gina, Ron, Fred, Jorge e Harry,

Soube hoje pela manhã do acidente com o sr. Weasley e fiquei muito preocupada. Agora à tarde a professora Minerva me informou que o quadro dele é estável e senti-me aliviada. Ainda assim, gostaria de estar com vocês e ajudar no que precisarem. Meus pais concordaram que eu não viajasse com eles no Natal e planejo chegar ao Largo Grimmauld amanhã, por volta das 18h. Caso por algum motivo não possam me receber, não tem problema. Peço apenas que me comuniquem.

Um abraço a cada um, afetuosamente,

Hermione

— Viu, Ron? A carta não tem qualquer menção especial a você! Seu nome só aparece na saudação inicial e, mesmo assim, depois do nome da mamãe e do meu - provocou Gina.

— Você, definitivamente, está cada dia mais parecida com Fred e Jorge. Com certeza é irmã deles, e não minha - Ron elevou a voz.

— Crianças, parem com essa discussão! Vocês sabem que não admito briga entre irmãos - protestou Molly.

— Ron tem razão, maninha. Você é uma verdadeira Weasley - começou Jorge.

— Gina, você é brilhante. Falou exatamente o que queríamos dizer a ele - concluiu Fred.

— Saiam todos daqui. Vou responder a carta de Hermione dizendo que ela pode vir - afirmou Molly no momento que Ron deixava a cozinha.

Muito chateado, Ron sai à procura de um local tranquilo, onde não precisasse ouvir as zombarias dos irmãos. Resolve caminhar nos sinistros jardins da casa e, depois de mais de meia hora andando em círculos, senta-se num dos bancos do lugar.

Não conseguia entender por que tivera aquela reação, quase tomando a carta das mãos de Gina. Queria ver a letra de Hermione, ler ele mesmo a mensagem da amiga, mas, para não ser ainda mais caçoado pelos irmãos, decidiu sair da casa.

Ele havia ido deitar, na noite anterior, pensando em Hermione. "Por que ela ainda se corresponde com aquele idiota. Mione podia ajudar eu e Harry a fazer os deveres em vez de gastar tanto tempo com Krum", pensava, quando começou a ouvir os gritos do amigo na cama ao lado.

Tudo aconteceu muito rápido depois que Harry afirmou que tinha visto Arthur ser atacado. Ron logo estava na casa número 12 do Largo Grimmauld, mas Mione não lhe saía da cabeça. Imaginava o que a menina iria sentir quando soubesse do acidente, como ficaria chateada por não ter sido avisada na mesma hora. Lembrando da amiga, porém, um pensamento o pegou mais uma vez distraído. "Hermione está cada dia mais bonita", falava para si mesmo, reprimindo-se em seguida.

Perdido nesses pensamentos, Ron nem percebe que alguém se aproxima. Gui, que chegara no fim da manhã assim que soube do acidente do pai, senta-se ao lado dele.

— Tudo bem? Em que você está pensando? - foi a pergunta direta do irmão mais velho, por quem Ron tem uma amizade e admiração especiais.

— Nada de mais. Aconteceram tantas coisas de ontem para hoje que ainda não assimilei tudo muito bem - ele economizou palavras.

Os dois começam a conversar sobre o acidente com o pai. Pouco depois, Ron toma coragem para fazer uma pergunta ao irmão.

— Gui, é possível que o sentimento que a gente tem por uma garota mude com tempo? - a fisionomia de Ron mostrava o quanto ele estava assustado.

— Está perguntando se podemos deixar de gostar de uma menina pela qual nos apaixonamos ou passar a amar alguém que antes nos era indiferente? - o irmão o olhava com atenção.

— Não é bem assim - tentou explicar o rapaz, que ainda não entendia bem o seu sentimento por Hermione. - O que estou perguntando é se a gente pode passar a olhar de uma forma diferente uma menina que sempre foi nossa amiga.

Ele sabia exatamente de quem o irmão mais novo falava. Tinha observado Ron e Hermione desde o ano anterior e notava a forte ligação, marcada também por brigas, que existia entre os dois. Sabia que, cedo ou tarde, os dois entenderiam que se amavam de verdade.

— Bem, as meninas, por volta dos 15 anos, ficam realmente muito bonitas. É difícil não se deixar atingir pelo encanto delas. Parece até que lançaram um feitiço na gente - disse divertido.

Ron deu uma gargalhada. Como o irmão conseguia explicar tão bem o que ele estava sentindo, pensou. "Você tem razão, Gui. É exatamente assim. Mas isso  fica chato e até constrangedor quando a menina é nossa amiga", confidenciou.

— Sei exatamente como é isso. Mas precisa ficar atento. Pode ser uma simples atração, que aos poucos se normaliza, quando nos acostumamos a ter amiga tão bonita, mas, ainda assim, apenas amiga. Por vezes, no entanto, essa atração não se equilibra. Pelo contrário, aumenta a cada dia. Hora de estar alerta porque a amizade pode ter se transformado em amor - Gui falou com simplicidade.

O rapaz, que entendera perfeitamente a explicação de Gui, sentia-se aliviado, imaginando que aqueles sentimentos conturbados iriam se acalmar, e ao mesmo tempo apavorado. Afinal, Hermione estava cada dia mais linda aos seus olhos.

Diante do silêncio do irmão mais novo, Gui resolveu estimular a confidência. "Ron, se você não quiser falar sobre isso, tudo bem. Mas se sentir necessidade de desabafar, pode ter certeza que o que conversamos aqui vai ficar só entre nós dois".

Ron encontrou-se diante de um impasse. Nunca tinha falado sobre aquele assunto com ninguém. Nem mesmo refletira o suficiente sobre os sentimentos confusos que experimentava por Hermione desde o ano anterior. Por muitos motivos, o melhor seria permanecer calado. Ao mesmo tempo intuía que se alguém pudesse olhar de fora e explicar para ele o que estava acontecendo, acalmaria o seu coração. Foi com essa inspiração que finalmente tomou coragem para se abrir com o irmão.

— Nem sei muito bem o que dizer. Na verdade, acho que estou apenas confuso. É que... eu nunca tinha reparado muito na Hermione... quer dizer, nunca a tinha achado bonita, entende? Para mim era uma menina normal. Ou melhor, nem tão normal assim porque ela sempre se destacou por ser muito inteligente - ele começou a falar um tanto vacilante.

— Hermione realmente é muito inteligente - reforçou Gui, tentando motivar o irmão a continuar a se abrir.

— Então eu... Bem, no ano passado teve o Baile de Inverno, a gente devia chamar alguma garota para dançar... Não passava pela minha cabeça convidar Hermione. Eu tinha uma lista de meninas que considerava bonitas e ela, definitivamente, não estava incluída. Sei que ela não é feia, mas, na verdade, eu a olhava só como amiga... - aos poucos ele conseguia verbalizar, pela primeira vez, aqueles sentimentos confusos.

— Mas quando isso começou a mudar? - Gui sabia fazer as perguntas certas.

— Voltando ao baile... Eu estava com dificuldade de encontrar um par e, quando Neville contou que havia convidado Hermione, mas ela não aceitou, foi que me dei conta que poderia chamá-la para me acompanhar. Quer dizer, eu falei que ela podia ir ao baile comigo ou com o Harry. Mione é legal na maior parte do tempo, seria uma boa companhia. Mas ela respondeu que não podia, que estava indo com outra pessoa - Ron continuou, ficando cada vez mais à vontade para contar aquele episódio para o irmão.

— Certo, então ela não foi ao baile com você? - ele já sabia a resposta, mas queria motivar o irmão a continuar a se abrir.

— Não, ela foi com o Vítor Krum... Você sabe quem é. O jogador de quadribol búlgaro que estava participando do Torneio Tribuxo. Eu fiquei surpreso porque Hermione... Bem, ela nunca fez muito sucesso com os garotos, pelo menos com os de Hogwarts. Mas a verdade é que ela estava simplesmente linda no baile. Eu nem acreditei que era Hermione quando a vi entrar... - Ron ficou nervoso apenas ao lembrar da menina naquela noite fatídica.

— Então, depois que passou o baile, ela voltou a ser a menina de sempre - Gui ponderou.

— Claro, sim, mas... eu passei a reparar mais nela depois desse dia. Tem horas que a vejo simplesmente como a amiga de tantos anos, inclusive com todos os seus defeitos. Mas de vez em quando me surpreendo admirando a beleza dela. Claro que não gosto de Mione... quer dizer, gosto apenas com amiga. Nem podia ser de outro jeito por que a gente briga demais. Só estava confuso, mas como você esclareceu que isso é normal... - ele agora tentava justificar os sentimentos conflitantes que experimentava.

— Isso mesmo, Ron, não se preocupe. Continue tratando Hermione com amizade. Se tiver que acontecer algo entre vocês, vai ser tão natural que não vale a pena sofrer por antecipação - concluiu Gui, abrindo um sorriso para o irmão.

Ron também sorri. Sentia-se tranquilo depois da conversa com o irmão mais velho. Lembrou que ainda não tinha comprado presentes de Natal para os amigos e não fazia ideia do que poderia dar para Hermione. Comentou com Gui e ele sugeriu um perfume.

— Toda menina gosta, mas é preciso escolher com cuidado, ver uma fragrância que realmente combine com ela - explicou, omitindo do irmão o fato que, segundo a tradição bruxa, acertar o perfume era confirmar a existência do amor.

Como Gui disse que não poderia ir com ele ao Beco Diagonol e Harry continuava recluso no quarto, se recusando a descer até mesmo para participar das refeições, Ron tomou coragem e convidou Gina para acompanhá-lo. Achou que precisaria da ajuda dela para escolher um presente tão diferente assim, mas temia que a irmã continuasse a provocá-lo. "Se zombar de mim, largo você por lá sozinha e volto para o Largo Grimmauld", ameaçou.

Na manhã seguinte, Ron e Gina vão ao Beco Diagonal na companhia de Tonks. Por decisão da Ordem da Fênix, nenhum dos Weasley poderia andar sozinho. A ruiva estava se divertindo com a oportunidade de acompanhar Ron naquele momento. Há muito tempo ela intuía que o irmão era apaixonado pela amiga. Mas sabia que se insinuasse qualquer coisa o rapaz ficaria brigado com ela pelo resto da vida.

— Por que você quer dar um perfume de presente para Mione? Essa é uma escolha muito pessoal. Você não tem medo de errar? - questionou Gina.

— Não. É só escolher uma fragrância legal que ela vai gostar - argumentou com surprendente convicção.

No momento em que entram na perfumaria bruxa, Ron sente-se perdido ao ver tantos frascos de cores, formatos e tamanhos diferentes. A balconista, uma simpática e jovem bruxa loura de baixa estatura, pergunta que tipo de perfume eles queriam. "Temos os adocicados, os amadeirados, os exóticos... exatamente qual tipo de fragrância vocês procuram?", os interrogou.

— Quero uma fragrância suave e forte ao mesmo tempo. Feminina e poderosa. Tem algo assim? - pediu o ruivo.

Gina ficou boquiaberta. Como Ron tinha tanta certeza sobre o tipo de perfume que queria? Ele, que era tão inseguro em vários momentos, agora se mostrava decidido assim. A vendedora sussurra perguntando se ele tem intenções românticas com o perfume. "Isso não interessa", respondeu com firmeza. Um pouco sem graça, a moça se afasta e vai até uma prateleira onde alcança um vidrinho azul.

Ron e Gina cheiram o primeiro perfume. A menina gosta, mas o irmão diz que é "delicado e doce demais". A vendedora volta com um frasco vermelho e a fragrância, intensa e inebriante, também não agrada ao ruivo. Por fim a moça traz um vidro perolado com a tampa dourada em formato de flor. Ron aprova na mesma hora. "É exatamente esse que eu quero", justificou, se recusando a experimentar outros.

— Acho que vim aqui só a passeio. Você não precisou de minha ajuda - disse Gina, ainda admirada com o fato do nome do perfume ser "Eternity".

— Pensei que você também tinha aprovado o perfume que escolhi... - ele ergueu as sobrancelhas.

— Gostei muito, mas não tive participação alguma na escolha - Gina sorriu com perspicácia.

 

 

* * * * * * * * * * * * *

 

 

O coração de Hermione estava aos saltos e não era apenas pela emoção de viajar pela primeira vez de Nôitibus Andante. Ela temia a própria reação quando se encontrasse mais uma vez frente a frente com Ron. Ao mesmo tempo, nada mais desejava do que estar com o amigo, saber como vivera os momentos de apreensão ao receber a notícia do acidente do pai.

Hermione foi acompanhada por Tonks do ponto do Nôitibus ao Largo Grimmauld. Conversaram sobre diferentes assuntos e a auror deixou escapar que havia ido naquela manhã com Gina e Ron ao Beco Diagonal. "O que eles foram fazer lá?", a inteligente bruxa perguntou espontaneamente. 

"Comprar os presentes de Natal. Molly achou bom, já que assim podiam se distrair um pouco", comentou Tonks com um sorriso enigmático que deixou Hermione constrangida. "Será que Ron comprou meu presente",  a garota pensou, lembrando do álbum e das fotos que havia recebido no aniversário.

Tonks entrou na sala da antiga residência dos Black acompanhada por Hermione e logo algumas cabeças vermelhas se levantaram, a primeira delas correndo ao encontro da garota. Era Gina, que deu um abraço bem apertado na amiga. "Que bom que você veio passar o Natal com a gente", comemorou a ruiva.

Os gêmeos se aproximaram e cumprimentaram a menina com dois beijinhos no rosto, o que normalmente não faziam. "Mionizinha, seja bem-vinda", falou Jorge. "Pensamos que ia passar o Natal na Bulgária", completou Fred. Afastaram-se de Hermione dando risadas maliciosas e olhando para o irmão mais novo.

Ron, que estava um pouco atrás, parecia paralisado. Hermione ficou tão feliz em ver o amigo que não esperou por ele e tomou a iniciativa. "Oi, Ron! Como você vai?", perguntou ao se aproximar dele, dando um beijo no rosto do menino. Um pouco sem graça, com as orelhas vermelhas, ele se inclinou e  beijou rapidamente a testa da amiga. "Estou bem e você? Fez boa viagem até aqui?", ele tentou disfarçar o próprio constrangimento.

A pergunta deu a Hermione a oportunidade de contar a sua aventura no Nôitibus Andante. Fred e Jorge falaram também das divertidas viagens que já haviam feito naquele estranho veículo. Tonks ilustrava suas narrativas com mudanças nas cores do cabelo e no formato do nariz e logo todos davam gostosas gargalhadas.

Usando o seu já conhecido talento para persuadir os amigos, Hermione conseguiu convencer Harry a descer do quarto. A alegria da véspera de Natal contagiou a todos, fazendo-os esquecer dos momentos de dor e angústia experimentados com o acidente do patriarca dos Weasley.

Enquanto todos cantavam velhas canções de Natal, acompanhados por Tonks no desafinado piano dos Black, Hermione sentou-se ao lado de Ron, que estava um pouco mais afastado do grupo. "Você ainda está preocupado com o seu pai?", perguntou. "Meu pai está se recuperando bem, mas estou intrigado para descobrir por quem e por que ele foi atacado. Se não tivermos essas respostas, ele vai continuar correndo risco", analisou.

— Dumbledore vai descobrir como tudo aconteceu, Ron. Seu pai não vai sofrer um novo ataque. Não se preocupe - ela lançou um olhar carinhoso para o amigo.

O ruivo deu um aperto forte na mão da menina, como forma de agradecer, e abriu um suave sorriso. Hermione sorriu de volta, mas foi inevitável ficar com o rosto vermelho. Como o rapaz se sentia feliz e reconfortado ao lado da menina. Ela, por sua vez, também se sentia muito bem próxima ao amigo. "Obrigado pela força", disse ele.

Aquele momento terno foi quebrado por Sirius que, animado como nunca, gritou: "Venham, Ronald e Hermione, quero cantar uma música especialmente para vocês". Mesmo se o padrinho de Harry desafinava muito, os dois conseguiram entender perfeitamente a letra, que contava como a amizade entre um rapaz e uma menina havia se transformado em amor. Constrangidos, evitaram todos os olhares naqueles longos três minutos que durou a canção.

Molly recebeu os presente comprados por todos. Seguindo a tradição dos Weasley, ela os distribuiria quando os hóspedes da casa fossem dormir, colocando-os próximos às cabeceiras das camas.

No momento em que finalmente conseguiu se deitar, depois daquela noite repleta de emoções, Hermione lembrou-se do reencontro com Ron. O beijo na testa, as palavras, mas, especialmente, o olhar carinhoso do amigo ainda eram muito vivos em sua memória. Recordou ainda do ruivo pegando a sua mão e sorrindo. Logo essas lembranças se transformaram em sonhos e, em sono profundo, a menina nem percebeu Molly entrar no quarto carregada de embrulhos.

Quando Hermione acordou estranhou o quarto, mas não demorou a se dar conta que voltara ao Largo Grimmauld. Ainda se acostumava à claridade quando ouviu a voz de Gina. "Feliz Natal, Mione! Tem vários presentes ao redor da sua cama", falou a ruiva. Em cima da pequena cabeceira e a sua volta, a menina viu os embrulhos e, sorridente, se dirigiu à amiga.

— Feliz Natal, Gina! Você já abriu os seus presentes? Vamos abrir juntas - convidou.

Do primeiro embrulho tirou o presente do pai, um livro de literatura trouxa. Da mãe, ganhou um bonito vestido, de Gina, um moderno prendedor de cabelo, de Molly, um casaco de lã fechado por delicados botõezinhos, de Sirius, um conjunto de penas, de Tonks, uma bolsa mágica que tinha o poder de reduzir todos os objetos que eram colocados nela, de Lupin, um livro de Defesa contra as Artes das Trevas, de Harry, a nova edição da Teoria da Numerologia...

Gina nesse mesmo tempo abria os seus pacotes e as duas comemoravam juntas cada presente recebido. Instintivamente, Hermione deixou uma pequena caixa azul, fechada com laço branco, por último. "Não vai abrir o presente de Ron"?, a ruiva questionou com um olhar sagaz.

— Esse é o presente de Ron? Ah... vou abrir sim - Hermione tentou parecer indiferente, mas seu coração já havia acelerado.

Com calma desfez o laço e, ao abrir a caixa, ficou admirada com o delicado frasco perolado. Tirou a tampa e cheirou a envolvente fragrância. Um sentimento forte e feliz a invadiu no mesmo instante.

— Gostou? Eu acompanhei o Ron até a loja, mas, na verdade, foi ele que escolheu - contou Gina muito sorridente.

— Maravilhoso! Quer dizer... é realmente muito bom - o olhar maroto da ruiva a deixou envergonhada.

Gina, que também já tinha terminado de abrir os seus presente, convidou Hermione para descer e tomar café da manhã. Com a desculpa de que ainda estava de pijama e precisava se arrumar, Hermione sentiu-se aliviada quando a menina saiu do quarto.

Precisava sentir de novo aquela inebriante fragrância e, enquanto passava o perfume na nuca, pensou em como Ron tinha acertado tão bem no presente. "Nunca gostei tanto de um perfume", dizia para si mesma. Não demorou a ficar perturbada e confusa.

Muitas sensações e lembranças passavam pela cabeça de Hermione. Recordou quando, durante uma ronda de monitores, Ron falou que era muito ligado aos aromas e do elogio que fez ao cheiro do xampu usado por ela. Será que o rapaz só tinha escolhido aquele presente por sugestão de Gina, para fugir dos livros? Ou desejava dizer algo a mais lhe dando um perfume?

Queria falar para Ron o quanto tinha gostado, mas algo a paralisava. Sempre ouvira falar que perfume é algo tão pessoal que, para não correr o risco de errar, o melhor é não dar esse presente. O ruivo, porém, parecia a conhecer a tal ponto que escolhera uma fragrância que realmente a agradara. Era tão envolvente e delicada, ao mesmo tempo, que ela tinha vontade de usá-lo sempre.

Quando encontrou com o ruivo, a única coisa que conseguiu dizer, depois de um simples obrigada, foi que o perfume era "realmente raro". Para alívio de Hermione, o amigo agradeceu pelo organizador de tarefas que ganhara dela e logo mudou de assunto.

"Muito bem, Hermione, não foi tão difícil assim", ela disse para si mesma depois de ter agradecido ao presente. Mas por que continuava completamente confusa? Para tentar fugir de todas essas emoções, decidiu pegar um livro e estudar. Era sempre assim que se acalmava nos momentos mais tensos.

Sentou-se na poltrona perto da lareira, virada para o fogo e de costas para a porta. Já estava envolvida com a leitura quando ouviu um estampido seco. Nem precisou se virar para saber que os gêmeos haviam aparatado na sala. Tentou continuar estudando, mas foi inevitável acompanhar a conversa dos dois, que falavam alto, com certeza querendo ser ouvidos por ela.

— Jorge, você já deu um perfume de presente para alguma menina? - perguntou Fred com certa ironia na voz.

— Fala sério, Fred! Nunca me comprometi com alguém a esse ponto - respondeu Jorge de um jeito mais maroto ainda.

— Você tem razão. Perfume é um presente repleto de significado... - continuou Fred com um tom mais alegre que o normal.

— Dar um presente assim significa dizer: gosto de estar bem pertinho de você e por isso o perfume que usa é importante para mim - completou Jorge elevando ainda mais a voz.

Hermione se mexeu na poltrona impaciente. Pensou em dizer alguma coisa, mas decidiu permanecer quieta. Os gêmeos resolveram se dirigir direto à menina.

— Mionizinha, nem tínhamos reparado que você estava aí - exclamou Jorge em tom bem-humorado.

— Estávamos querendo entregar o nosso presente para você - anunciou Fred esticando um embrulho vermelho.

— Não precisavam se preocupar com isso - Hermione pegou o pacote com certa desconfiança.

— Imagina se iríamos esquecer da nossa futura cunhadinha - Jorge deu uma piscadela enquanto a menina sacode a cabeça em desaprovação.

— Você vai achar o presente estranho, mas logo descobrirá que é muito útil - enfatizou Fred.

A bruxa abriu o embrulho e contemplou, um tanto perplexa, a capa preta de um livro que não trazia nada impresso. Os gêmeos explicaram que o presente era perfeito para esconder o verdadeiro título de obras proibidas ou pouco recomendadas. A rígida monitora os olhou com censura.

— Mionizinha, se você fosse tão intransigente como tenta aparentar não iria se apaixonar por um cara tão pouco preso a regras como o desmiolado do nosso irmão - argumentou Jorge.

— Quem nunca precisou pegar emprestado algum livro da sessão proibida da biblioteca de Hogwarts? - prosseguiu Jorge, observando a menina examinar o presente.

— Você deve estar se perguntando como funciona. É muito simples. Basta colocar essa capa falsa sobre a verdadeira e depois bater três vezes sobre ela dizendo: "Segredo escondido guardado está" - explicou Fred.

— A cada batida, a capa vai mudando. E você pode escolher a que achar melhor - concluiu Jorge.

Ainda com um olhar desconfiado, a menina agradeceu pelo presente. Neste momento Ron entrou na sala e os gêmeos não perdem a ocasião de provocar o irmão.

— Roniquinho, quem bom que você chegou - falou Fred.

— Queremos lhe pedir uma dica de como escolher um perfume para uma menina especial - completou Jorge com um sorriso malicioso

Ron fuzilou os irmãos com os olhos. "Saiam daqui e não encham a minha paciência", disse quase gritando.

Os dois, dando risadinhas, desaparataram. Ron e Hermione encontravam-se mais uma vez sozinhos. "Tudo bem? Eles encheram muito a sua paciência?", perguntou. "Tudo bem, Ron. Até parece que não estou acostumada com esses dois", respondeu sorridente. Hermione não reparou, mas o amigo ficou completamente perturbado ao sentir a fragrância do perfume que escolhera para a amiga.

Depois que visitaram Arthur Weasley e viveram alguns momentos tensos no Hospital St. Mungus, inclusive acompanhando o sofrimento de Neville com o estado dos seus pais, Harry e Ron decidiram jogar xadrez.

Hermione gostava de acompanhar as partidas. A princípio não entendeu muito bem por que já que não era fanática assim por xadrez. Aos poucos foi percebendo que, além do fato de poder ficar olhando para o ruivo sem ele percebesse seu especial interesse, ainda o contemplava num momento bom no qual o amigo sentia-se autoconfiante e seguro sobre quais decisões tomar. Se pudesse ser completamente sincera, teria que reconhecer que pouco prestava atenção em Harry. Na verdade, não tirava os olhos daquele irritante sardento de olhos tão azuis. Ela não sabia como, mas o fato é que Ron sempre vencia. Tinha derrotado até mesmo Dumbledore no xadrez.

Naquela noite, em especial, estava concentrada demais acompanhando cada mudança de expressão no rosto do amigo: a fisionomia tensa quando não sabia qual jogada fazer, sorridente ao descobrir a melhor solução, concentrada ou ainda irritada com algum passo errado. A menina estava tão envolvida que demorou a notar que Gina a encarava dando um largo sorriso, se divertindo ao ver que a amiga não tirava os olhos do irmão.

 

* * * * * * * * * * * *

 

Para ouvir antes, durante ou depois de ler o capítulo:

True

http://bit.ly/1RMK6Dl

I won't talk
I won't break
I won't move till you finally see
That you belong with me

You might think
I don't look
But deep inside in the corner of my mind
I'm attatched to you

I'm weak
It's true
Cause I'm afraid to know the answer
Do you want me too?

Cause my heart keeps falling faster
(...)


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Notas finais do capítulo

Revisitar esta história de amor sublimado é apaixonante!
Aguardo comentários de leitores que amam RoMione :)



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