Quando abriu os olhos visualizou a enfermaria. Tentou sentar-se, mas o corpo todo doía. Olhou ao seu redor e viu os dois amigos, deitados também em camas, dormindo. Pareciam muito machucados também. Principalmente a garota. Olhou de novo e viu o albino sentado na porta. Tinha caído no sono também. Estava com o braço direito enfaixado e com alguns curativos no rosto.

– Ah, Yuu-kun. Você finalmente acordou!

– Che, não diga.

– Ora, não seja tão rude! Estávamos muito preocupados com vocês! – Froi Tiedoll se aproximou da cama do aprendiz ainda com um sorriso de alívio no rosto.

– Não duvido nada que o Supervisor Komui não estivesse quase morrendo pela irmã dele. – Um risinho de deboche formou-se no canto da boca do moreno.

– Ah, você nem tem ideia de como o Komui ficou desesperado quando soube que vocês estavam com problemas em Madrid.

– Hm, imagino. – Ele se sentou na cama com um pouco de dificuldade. – Por quanto tempo ficamos desacordados?

– Só uns dois dias talvez, nada de mais.

– Hm.

– Mandamos Walker e Lotto para o campo de vocês quando recebemos o pedido de socorro. – Sua expressão tornou-se um pouco séria. – Eu fui com eles e levei Chaoji comigo. Quando chegamos, vocês já estavam desacordados e haviam bastantes Akumas cercando vocês três. Miranda parou o tempo e nós os destruímos.

– E os Noés?

– Noés? Não estava nenhum deles lá.

Kanda arqueou as sobrancelhas e arregalou bem os olhos, não conseguindo esconder sua surpresa ao ouvir aquela informação.

– Hum.... – O albino espreguiçava-se da cadeira onde estava sentado.

– Bem, eu já vou indo, Yuu-kun. Melhore rápido. Mas não tente fugir daqui dessa vez. – Ele completou saindo com um sorriso doce na face de novo.

– Che.

– Ah, Kanda, você acordou!

– É, pois é...

– Sabe, – O garoto senta na cama do mais velho – eu fiquei muito preocupado com você. Todos ficaram. Com vocês três, claro.

– Não se preocupe da próxima vez. – Ele pousou uma das mãos na cabeça do menor acariciando-a – Você sabe que eu não morro tão fácil. Preocupe-se com quem realmente merece. – Ao fim da frase olhou com o canto do olho para as duas camas ao seu lado.

– É-é, eu sei. A enfermeira disse que não foi nada tão grave assim. Mas acho que ela só disse aquilo para tranquilizar o Supervisor. – O britânico deu uma risadinha abafada com seu último comentário. Vendo que o outro não dissera nada, ele pigarreou e continuou a falar, agora com um tom de voz mais baixo – Kanda, – Allen sentiu o próprio rosto ficando avermelhado – eu te amo.

– Tsc, Moyashi. – Ele corou um pouco, mas ainda assim deixou que um risinho malicioso se formasse em seus lábios. – Aishiteru mo.

As faces foram se aproximando até um conseguir sentir a respiração do outro. O beijo foi intenso. As línguas entrelaçadas aumentavam o desejo dos dois. Ouviram a porta bater com um estrondo grande. O susto foi suficiente para cortar o beijo. Assustados, e bastante corados, ficaram olhando alguns instantes para a porta, atônitos. Não viram ninguém passar nem nada. “Deve ter sido só o vento”, pensaram. A janela estava aberta e a cortina balançava um pouco com uma leve brisa. Talvez tivesse mesmo sido apenas o vento. Talvez.

Allen saiu logo, já que era hora do “lanche da tarde”. Kanda se levantou depois e vestiu o casaco da Ordem. Deu uma última olhada na enfermaria. Foi quando a ficha caiu: A cama ao lado da sua estava vazia. Os lençóis amassados eram a prova: não tinha sido o vento que havia batido a porta. Saiu do lugar em passadas rápidas. Percorreu os corredores da Ordem até chegar ao dos quartos. De longe ouviu a porta ser fechada com força. Parou em frente a ela.

– Lavi...

Nada.

– Lavi, eu sei que está aí, abra a porta. – Continuou sem obter resposta algunma. – Abra logo, Baka Usagi!

– O que você quer agora, Kanda? – O ruivo abrira a porta e olhava para o outro exorcista com desprezo.

–... Você não estava dormindo, estava?

– Até o Tiedoll-sensei ir embora, sim.

Kanda nada respondeu; apenas direcionou seu olhar para o chão.

– Se veio aqui para me forçar a ficar olhando essa sua cara de morto, eu acho que...

–... Por que me salvou?

– Quê? – Ele arqueou uma das sobrancelhas, um pouco desconcertado.

– É. Por quê? – Seu olhar sério penetrava o olho verde do colega.

–... Porque a Lena pediu.

– Porque a Lena pediu?

– É. Ela não gosta que as pessoas morram. Ela sente-se culpada. Só fiz um favor a ela. – O olhar dele não podia ser mais gelado. Até o espadachim estava começando a ver que algo muito errado estava acontecendo ali.

– Hm.

– O que foi? Não parece satisfeito. Esperava uma declaração? – O olhar transformou-se em cínico, mas ainda continha um pouco de desprezo. – Outra declaração, para você jogar na minha cara que você e o Allen estão mais apaixonados do que nunca? Que a relação de vocês vai de bem a melhor?!

– Cala a boca, Baka Usagi! – Os dentes semi-serrados e o rosto levemente vermelho demonstravam a raiva do japonês.

– Vê se te enxerga, Kanda. Você não é mais nada pra mim. Por que não vai ficar um pouco com seu namoradinho e me deixa em paz, hein?! – Ele já ia bater a porta na cara do outro, mas este foi mais rápido e segurou seu braço.

– Qual o seu problema, Lavi? O que está havendo com você?!

– Ah, Yuu, como se você não soubesse. – Ele riu debochadamente. – Não sabia que também era bom ator.

– Você está mudado. Mais seco, frio, sério. Esse não é o Baka Usagi que eu conheci.

– É, Yuu, você tem razão. Eu mudei sim. Não sou mais aquele idiota que você conhecia. Se vou me tornar um Bookman algum dia mesmo, qual o problema de começar a cortar os laços a partir de agora?

– Não seja idiota, Lavi. Você não está cortando os laços porque vai ser um Bookman. – Na expressão séria dele podia-se ver um pouco de inquietação. – Também não mudou só porque eu disse que não gostava de você.

– Tem razão. Mesmo porque não foi só isso que você me disse. Você jogou na minha cara que não gostava de mim de uma forma brutal. Você podia ter sido mais gentil e dito somente “Baka Usagi, eu não sou gay. Portanto, não me encha mais a paciência!”, que eu não ia ficar chateado. Não muito, pelo menos. Mas você ainda fez questão de esfregar na minha cara que estava com o Allen! Você nem ao menos teve coragem suficiente de falar isso olhando pra mim!

Kanda recuou um pouco tamanho a explosão de certa forma inesperada do outro. Imediatamente censurou-se mentalmente por isso.

– Agora, se me dá licença, eu tenho coisas mais importantes para fazer.

O Bookman Junior passou rente ao espadachim, que não disse mais nada. Ele rumou para a biblioteca – ia continuar seus deveres de aprendiz de Bookman. O outro ficou parado por alguns instantes ainda, até que se lembrou de que seu corpo ainda doía um pouco da batalha. Resolveu ir para seu quarto meditar. Agora sabia que a mudança do amigo tinha sido sua culpa. “Tsc, e daí? Se ele se ofende por qualquer coisa, o problema não é meu. Eu só falei a verdade”. Mas então, por que isso não era o suficiente para convencê-lo de que o ruivo era o errado da situação?

“I’ll keep you my Dirty Little Secret

(Dirty Little Secret)

Don’t tell anyone or you’ll be just another regret

(Just another regret, hope that you can keep it)

My Dirty Little Secret

Who has to know”

Dirty Little Secret – The All American Rejects