— A Imperatriz ainda não está em condições de fazer muitos esforços, então peço por favor, Sasuke-sama, que tenha cuidado para não estressá-la.

Tsunade falou assim que o Príncipe chegou à varanda do prédio dos enfermos guiado por Tetsuo. Um simples olhar bastou para que o sobrinho soubesse que estava dispensado, curvando-se antes de sair devagar para os campos de plantação. Os olhos caramelos desprenderam-se dos fios rosas para se perderem na intempestividade negra, nunca iria admitir, mas o Uchiha tinha uma postura intimidante que a fazia hesitar, ainda que negasse mostrar qualquer tipo de receio para qualquer pessoa.

— Me acompanhe, irei levá-lo para aonde ela repousa.

A madeira macia mal rangia com o som dos passos, os olhos cor de mel vagavam por todos os quartos, embora a maioria das portas abertas indicasse a falta de pacientes. Uma revolução tinha estourado pelo Império, e claramente traria tempos tenebrosos dali para a frente, mas por hora seu clã ainda podia aproveitar a calma, antes dos conflitos estourarem e vierem a sofrer novos ataques. Assim que atingiu o fim do corredor, pôde ver as duas figuras negras paradas ladeando a porta, os pares de olhos moveram-se na sua direção, para logo encararem aquele vinha a seguindo silenciosamente, curvaram-se rapidamente de modo sucinto antes de voltarem a posição de guarda. Acabou que por sorrir, admirando mais uma vez a disciplina que sua sobrinha sabia ensinar.

Deu duas leves batidas na porta antes de abri-la. O cheiro das frutas selecionadas especialmente para o desjejum da Imperatriz dava um agradável aroma para o lugar e uma brisa fresca entrava devagar pela janela aberta. Tinha escolhido aquele quarto para a estadia da mulher não somente por ser mais seguro, mas também pelo conforto que oferecia. Bastou dar dois passos para de longe verificar o estado da mulher deitada no futon, sendo alimentada por Shizune, aparentava estar bem, mesmo que ainda continuasse excessivamente pálida. Uchiha Mikoto era uma mulher delicada e polida, porém mostrava em seus olhos uma perseverança não natural depois de tudo que lhe ocorrera.

—Imperatriz, trouxe Sasuke-sama para vê-la. - ela olhou para trás, dando a permissão que o outro esperava silenciosamente para entrar. - Shizune.

— Hai, Tsunade-sama. - a jovem levantou do chão, onde estivera sentada ao lado de Mikoto, pousou a pequena vasilha na mesa posta no quarto, reverênciando ambas figuras reais antes de sair seguindo sua mestra.

Sasuke esperou até a porta tornar a ser fechada para se mover. Um tanto acanhado, foi até o lado de sua mãe, sentando sobre suas pernas para tornar o momento mais confortável. Porém, só foi encontrar os olhos negros, iguais aos seus, que a coragem se esvaiu de seu corpo. Abaixou a cabeça, olhando firme para suas mãos apoiadas em suas coxas, firmemente fechadas como se alí pudesse extravasar todas suas frustrações. O silêncio que se perpetuou pelos minutos seguintes só parecia sacramentar as dores colocadas tão repentinamente em seus corações.

— Sasuke… - a voz delicada estava seca, como se sua garganta não sentisse o gosto da água há dias, mesmo que tivesse acabado de fazer um refeição. Porém, aquele era o resultado da dor, e Sasuke, conhecendo sua mãe tão bem, sentiu em cada letra os sentimentos que corroíam seu peito.

— Como está o seu ferimento?

Os olhos negros de Mikoto se levantaram para os do Príncipe, as marcas profundas manchando a pele branca davam um severidade nunca vista em seu filho, o jeito que a mandíbula se tensionava ou as mãos que tremiam eram quase imperceptíveis para quem pouco o conhecia, porém ela sempre o observara, mesmo de longe quando este cresceu, se tornando um homem em um tempo tão precoce para ingressar no exército e assumir as responsabilidades impostas por Fugaku. Conhecia o filho como conhecia as linhas do próprio rosto, sabia as manias de Sasuke com a mesma intensidade que ignorava as suas, e vira por diversas vezes o rosto do caçula tomado por angústias causadas pela pressão da relação com o posto que um dia deveria assumir, mas nunca sequer cogitou que um dia aquele olhar afetuoso que sempre ganhava, independente do humor em que ele se encontrava, iria dar lugar a duas bolas negras vazias.

Virou o rosto, encarando o céu límpido pela janela, um aperto tomou seu estômago outra vez, era uma sensação que a tomava em prazos curtos desde que acordara e custava profundas respirações até cessar. Deixou as pálpebras caírem, tendo a mente invadida pelas cenas da noite de dias atrás, algumas se confundindo com outras ainda mais antigas, misturando-se em uma aleatoriedade de acontecimentos, fazendo-a se perguntar até onde aquilo era real.

— Sasuke, conte-me, o que aconteceu?

A voz de Mikoto era desagradável os ouvidos de Sasuke, faltava a leveza e doçura que tanto o acalentava, nem a firmeza da mulher que parecia para tantos uma divindade que só o Imperador fora capaz de alcançar, era fraca e passava rudemente por seus ouvidos. Reprimiu a expressão desgostosa que a pergunta causou-lhe. Quando criança tinha o costume de andar pelo palácio sozinho, explorando lugares como se buscasse alguma aventura por entre os corredores, todas essa perambulação resultou na mania de ouvir conversas proibidas entre os adultos, e por acidente escutaras algumas sobre como a atual Imperatriz se afundara em uma tristeza moribunda nos primeiros após o ataque que o Imperador viera a falecer, mas era a primeira vez que via aquilo tão de perto e aquilo o assustou.

— Estamos no Clã Haruno, desde que chegamos na madrugada de duas noites dois atrás eles têm nos abrigado, inclusive foi a onee-san da tsuma de Haruno Kizashi foi quem cuidou de seu ferimento. - a cabeça se virou para a janela, respondendo da forma mais imparcial que conseguia.

— Alguma notícia de seu otou-san? - o questionamento inocente fez um arrepio subir por sua coluna, enrigecendo seu corpo - Sasuke, precisamos saber o que houve depois de nossa fuga, sinto-me extremamente preocupada com Fugaku e Itachi, nosso povo deve estar caindo no desespero.

Foi então que percebeu a cegueira que sua mãe estava em relação a verdadeira situação que se encontravam, na mente da mulher ela ainda era Imperatriz e seu marido não havia sido traído e assassinado a sangue frio pelo filho primogênito e o irmão traidor, estavam claramente em uma situação preocupante, porém ainda tinha sua família viva e completa. O gosto ruim retornou a sua garganta, não esperava por aquilo e não tinha uma forma de lidar com a situação, o estado tão decrépito da Imperatriz iria piorar, talvez chegar a um nível que de tão grave não reconhecesse a sua progenitora. Entretanto contaria, esconder a verdade não ajudaria por mais breve que fosse, mudanças grandes estavam acontecendo em vários lugares naquele mesmo momento, e sua decisão de contra-atacar só deixava o futuro de suas vidas ainda mais incerto, não tinha tempo para se condoer com algo que não tinha volta.

— Haha, o que se lembra da nossa fuga?

As sobrancelhas negras se uniram encarando as próprias mãos relaxadas no colo, o esforço que ela fazia para organizar o ataque dentro da mente era claro, e os longos minutos de silêncio que sucederam fizeram Mikoto finalmente clarear seus olhos para os detalhes da situação que se encontrava. Uma tremedeira tomou seu corpo conforme os gritos tomavam a sua cabeça, e uma sensação ruim apoderava-se do seu peito, parou para pensar em como estavam escondidos, nenhum dos samurais vinheram entrar em contato, e Sasuke estava muito abatido para ser a reação de um ataque, ele era jovem, mas experiente, além de extremamente centrado, não seria afetado por algo assim com facilidade.

— S-Sasuke, - um longo suspiro foi necessário para continuar - o que aconteceu?

— Chichi, ele foi morto no meio do ataque.

A nova informação tomou forma, se cravando mais fundo do que a adaga que estava antes em seu corpo. A frase foi dita com agilidade, nada mais que um sussurro jogado no ar, obviamente para acabar o mais depressa aquele momento. Passou longos segundos encarando os fios negros do seu filho que caíam, encobrindo-lhe o rosto. Um arrepio percorreu sua pele como se de repente o ar tivesse ficado mais frio, e antes de que percebece, uma ardência tomou seus olhos conforme seu coração se apertava, com o peito comprimido. Só percebeu os som guturais que saíam da sua boca quando a mão pesada do filho tocou-lhe os ombros, fazendo-a despertar para o olhar assustado de Sasuke.

— Haha, por favor, respire!

— Por Kami, Fugaku não... Sasuke, seu otou-san. C-como, ele era invencível... - seu corpo convulsionava durante o choro, os dedos trêmulos apertando os olhos com força, como se assim fosse possível parar as lágrimas que escorriam.

— Foi no meio da confusão, ele se distraiu por um momento e acabou sendo atingido por um ataque duplo... - apertou os lábios com força quando a lembraça veio em sua cabeça, jogando o corpo para a frente até que sua testa estivesse tocando as costas das mãos apoiadas no chão de madeira – Gomenasai haha, gomenasai, eu deveria ter o protegido, morrer para defender a sua vida, porém fui fraco. Gomenasai, foi minha culpa.

Não soube por quanto tempo os soluços da sua mãe perpetuaram, permaneceu de cabeça baixa respirando de maneira profunda para não se deixar abalar. Sasuke era uma muralha, fora construído e moldado por seu pai, sua posição e seus deveres, um homem que devería ser intransponível a qualquer temor, um exímio guerreiro em batalha, um estrategista insuperável, o máximo de perfeição que um General Uchiha poderia chegar. Mas de todos que sempre o cercaram, a única pessoa que o deixava livre de cobranças era Mikoto, sua preciosa mãe que sempre fora tão apegado, seu ponto fraco, agora tão destruído em sua frente que sabia que o fez chegar a conclusão que mais nada poderia o abalar, pois se caísse, sua protetora, sua fonte de segurança cairía junto de si.

— Itachi, ele ficou no palácio. - Sasuke se enrijeceu ao ouvir - precisamos de noticías dele, temos que retornar, seu onii-san precisa de nós para o que está por vir.

— Não iremos voltar, e esqueça a existencia de Itachi. - Sasuke sentou-se com a postura ereta, uma aura de poder e ódio parecia fluir dele, assustando Mikoto pela reação do filho – Logo ele estará morto.

— Sasuke, meu musuko, por que falar assim? Itachi é seu onii, e eles está sozinho depois... - ela respirou fundo tomando coragem de proferir palavras que tanto a machucavam, fechou os olhos não querendo olhar no rosto do filho – Depois da morte de Fugaku.

— Realmente, ele deve estar sozinho no palácio depois de se aliar a Madara para tomar o Império, pisando nos corpos de todos aqueles que condenou a morte. - os olhos dela se abriram, mirando a negritude fria do príncipe em sua frente.

— O que esta dizendo? Enlouqueceu Sasuke?

— Que os deuses tivessem me dado esse previlégio, mas estou são, minha consciêcia é limpa, e sei muito bem o que eu digo. Itachi é um verme traidor que teve coragem de se juntar e armar com aquele homem sujo. Graças a arrogância dele, vários dos meus samurais devem estar mortos, várias famílias foram destruídas e nosso povo caiu na desgraça.

— Não diga essas injúrias, Sasuke. Itachi é um bom homem, ele ama o nosso povo e a nossa família, nunca que faria algo assim! - Mikoto justificou, as palavras de seu filho pareciam mentira aos seus ouvidos.

— Não haha, isso era a imagem que ele nos deu, Itachi é um traidor, levou o Japão a mais uma guerra, sujou a sua tachi com o sangue nobre de meu chichi e agora goza da sua vitória carregando sua cabeça decepada em cima de seu cavalo, anunciando a todos que Madara é o novo imperador. - seus punhos se apertavam mais uma vez, tentando manter o controle sobre a sua voz.

— Não acredito no que diz, está blefando, - as mãos delicadas voltaram aos olhos, derramando mais lágrimas com tudo que ouvia. - está com inveja e o culpando por algo que não fez.

— Um jovem que estava na vila a serviço dos Harunos viu quando Itachi segurava a cabeça do Imperador pelos cabelos, enquanto os moradores sofriam em meio ao tormento que o golpe trouxe, ele ainda conseguiu trazer uma família que estava sendo agredida por homens sobre o comando de seu musuko para cá, a mesume do casal se feriu ajudando sua okaa-san que estava grávida. Eu nunca teria inveja de alguém tão vil. - o olhar gélido parecia queimar em ódio, as expressões duras inflamavam toda armagura sentida.

— Como pode acreditar em pessoas que nunca viu antes em sua vida? Como ignora todos os ensinamentos que lhe dei sobre a importância de manter uma família unida?

— É por não ignorar tudo que me foi ensinado que não duvido do que me foi falado, esse clã lhe curou e corre riscos no mantendo aqui. Esse tipo de julgamento não condiz com a graditão que sempre tanto prezou Imperatriz, nem com o que conheço de minha haha.

— Pare com isso!

Um gritou escapou pela garganta de Mikoto, que cansada pelas revelações levou a mão até a face da Sasuke, o surpreedendo com o forte tapa, incrédulo ele sentiu a ardência em sua bochecha. A dor cruzou o olhar negro, misturando-se ao ódio que antes ali estava, o olhar gélido se tornou vazio, o que fez a Imperatriz tomar consciência de seu ato.

— Sasuke, gomen. - ela elevou a mão ao rosto, mas quando a ponta de seus dedos frios tocaram a marca vermelha, o jovem se afastou, despertando do transe. Cambaleante, se levantou indo em direção a porta do quarto - Musuko…

— Antes da porta do salão se fechar para podermos escapar vi, quando Itachi e Madara atigiram meu chichi ao mesmo tempo. - sem querer ver a face de Mikoto, Sasuke focou seu olhar na porta - Acostume-se, porque eu irei recuperar o trono e matar Itachi.

Deslizando o shoji ele saiu do quarto a procura de Tsunade, não olhou para ver se os guardas da Shapu teriam escutado alguma parte da conversa, nem para ver o desespero de sua mãe.