Megavi - Outras Vidas escrita por Joana Guerra


Capítulo 1
1985 - A popstar e o jornalista


Notas iniciais do capítulo

A música-tema que acompanha o capítulo é Crazy For You", da Madonna. Mais popstar dos anos 80 não há.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/638387/chapter/1

“Swaying room as the music starts

Strangers making the most of the dark

Two by two their bodies become one

I see you through the smokey air

Can't you feel the weight of my stare

You're so close but still a world away

What I'm dying to say, is that

I'm crazy for you

Touch me once and you'll know it's true

I never wanted anyone like this

It's all brand new, you'll feel it in my kiss

I'm crazy for you, crazy for you

Trying hard to control my heart

I walk over to where you are

Eye to eye we need no words at all

Slowly now we begin to move

Every breath I'm deeper into you

Soon we two are standing still in time

If you read my mind, you'll see

It's all brand new, I'm crazy for you

And you know it's true

I'm crazy, crazy for you”

(Madonna, "Crazy for You")

Los Angeles, 1985

Apertando o robe de cetim, Megan desceu pelas escadas do backstage enquanto o seu agente Danilo, um dos maiores prodígios da indústria, fazia o ponto da situação no que se referia aos compromissos em falta para aquela noite.

Oh, c´mon! Você só pode estar brincando comigo, right? – resmungava ela, pegando uma flute de champanhe – Eu acabei de dar um concerto para vinte mil pessoas e você me vem com trabalho. I wanna party, you fool!

Mas, Megan, essa entrevista pode ser muito importante para você. Essa revista tem muito prestígio e pode dar muita visibilidade para a sua música. – disse ele, tentando acalmar a sua irritação.

Ela balançou o seu cabelo loiro preso com um enorme laço preto de veludo e, ao dar um jeito no seu brinco em forma de crucifixo que ameaçava cair, as suas pulseiras néon espreitaram pela manga do robe.

Darling, as minhas músicas estão no top da Billboard , ninguém vende mais records do que eu e a minha cara já está em todas as capas de revista desse país. What else do you want? – questionou ela.

– Vai, Megan, só mais essa. Por favor. – pediu ele, sentindo-a aquiescer.

– Ok. – assentiu ela, revirando os olhos – Mas later vou numa party e não quero ouvir reclamações, Mr.

– Tudo bem. – consentiu Danilo, feliz com a troca – Mas, Megan, sem drogas dessa vez, por favor. Amanhã a gente começa a gravar o novo videoclipe e preciso de você sóbria e pronta para trabalhar.

“ Claro, você precisa da sua cash cow” - pensava ela – “ Too bad que você não consiga ter essa preocupação comigo.”

Engolindo de uma vez a sua segunda flute de champanhe, ela se deixou conduzir para o seu camarim, onde o jornalista já a aguardava.

Com apenas vinte anos, Megan Lily já se tinha tornado no maior fenômeno pop dos Estados Unidos.

Descoberta casualmente por Danilo enquanto ela trabalhava como garçonete e cantora num pequeno bar em Nova Iorque, Megan Lily tinha visto na carreira que ele lhe ofereceu a possibilidade de fugir a uma família desestruturada que nunca lhe tinha sabido dar amor e de uma vida em que não via futuro.

O que Megan Lily tinha aprendido da pior maneira é que nada vem de graça. Após o deslumbramento inicial com o mundo dos ricos e famosos ela tinha caído numa espiral que ia inevitavelmente acabar em decadência.

O principal problema dela era a cocaína. Afinal, se tratavam dos anos 80 e se adquiria cocaína com a mesma facilidade com que se comprava um doce. Forçada a trabalhar dezasseis horas por dia, mantendo sempre um sorriso nos lábios para os fãs, ela tinha usado inicialmente a droga para ter energia, mas rapidamente o vício tinha tomado conta dela.

Depois disso vieram o álcool, os comprimidos e a vida dissoluta, sendo cada noite passada numa cama diferente. Megan Lily sempre procurando amor no sítio errado.

Claro que o público não podia saber de nada disso. A imagem de menina rebelde vendia, mas dentro de um certo limite. Tivessem os fãs conhecimento do que ela fazia em privado, Ronald Reagan nunca a teria recebido na Casa Branca e os executivos de uma conhecida marca de refrigerante não a teriam escolhido para estrelar a sua nova campanha publicitária.

Megan entrou de rompante no seu próprio camarim, de cabeça altiva como a diva que ela era. Se ela pensava que iria encontrar um bobo starstruck na figura do jornalista, então ela apanhou uma desilusão.

Ajeitando os óculos sobre um nariz proeminente, o sujeito se limitou a dar um lacônico “oi, tudo bem?”, antes de a convidar a se sentar na cadeira diante dele.

Mas quem era aquela criatura que não se tinha deixado derreter pela nova queridinha da América?

Bufando, Megan se sentou displicentemente na cadeira com os braços cruzados. Espreitando da porta, Danilo lhe piscou o olho e saiu silenciosamente.

Sozinha com o jornalista naquele cômodo, Megan se permitiu analisar aquele estranho. Habituada à excentricidade dos jornalistas associados às revistas da área da música, ela estranhou a roupa certinha que ele envergava. Aliás, todo ele parecia certinho. Demasiado bom moço para aquilo que ela estava habituada. Mas não era de todo de se jogar fora.

Ele a olhava, a encarando de uma forma interrogativa, mas ela preferiu gastar um pouco de tempo analisando meticulosamente aquele jovem.

A pele morena dele espreitava debaixo de uma camisa azul que deixava adivinhar um corpo nada demasiado musculoso, mas ainda sim bastante apetecível.

Não compreendendo o que ela fazia, ele contorceu levemente a boca, o que ela achou adorável, deixando antever uma dentição perfeita ao tentar um pequeno sorriso.

Ele correu as mãos pela barba meio encabulado quando percebeu que ela olhava para ele como uma leoa que se prepara para desfazer um antílope.

Hmmmm…. eu ainda não me apresentei. Eu sou o Davi Reis. – disse ele, suando frio com a forma com que ela o encarava.

So, Davi, como é que você quer começar?- perguntou ela sorrindo, ao mesmo que se levantava e voltava para a penteadeira tirando as pesadas bijutarias.

– Oi???? – perguntou ele aflito, abrindo os seus olhos apertados em tom de surpresa.

The interview, quero eu dizer. – disse ela rindo e servindo duas flutes de champanhe.

Se sentando novamente diante dele, ela lhe entregou uma das flutes e cruzou sensualmente as pernas, comentando casualmente:

– Você não se parece nada com um jornalista do business, darling.

Ele suspirou, mas ficou feliz por ter sido apanhado. Davi não gostava de mentir e estar ali, num meio que ele não compreendia, se fazendo passar por quem não era, estava sendo custoso para ele.

– É que eu não sou jornalista. – confessou ele – Quem vinha te entrevistar era o meu amigo Ernesto, mas ele apanhou um porre e eu vim fazer a entrevista por ele, para ele não perder o emprego na revista.

Vendo como a cara que ele fez se assemelhava à de uma pequena criança apanhada em falta, ela se permitiu um sorriso franco e soltou o seu cabelo, que caiu numa cascata loira pelos seus ombros.

Habituada a um meio onde imperava a mentira e a hipocrisia, era muito refrescante para ela ver alguém que revelava uma inocência tão profunda. Já havia muito tempo que ela não sabia o que era ingenuidade e bateu uma vontade dentro dela, pela primeira vez em muito tempo, de baixar a guarda.

Oh, dear. E agora o que é que eu faço com você? – perguntou ela, batendo sugestivamente com o dedo indicador no lábio inferior.

– Eu…. uhmmm….ahmmm… eu tenho as perguntas que o Ernesto te ia fazer. – respondeu ele, engolindo o champanhe de um trago para tratar da sua garganta seca.

Megan quase se enterneceu com o constrangimento dele. Ele era tão adorável, de um jeito quase geek. As coisas que ela podia fazer com ele.

Ok, shoot away. – consentiu ela.

Davi tirou do bolso do casaco os cartões com as perguntas e começou a entrevista sem saber muito bem o que fazia, como quem dirige um carro pela primeira vez.

– Como é que você descreve o seu novo álbum?

Lá vinham as mesmas perguntas, que ela já tinha respondido quatrocentas vezes a quatrocentos outros jornalistas.

Boring. Next, please. – pediu ela, revirando os olhos.

Davi bem tentou, mas todas as outras perguntas eram dentro dos mesmos moldes. Algumas eram um pouco mais atrevidas, é certo, porque tentavam tocar na vida pessoal de Megan Lily, mas nada que fosse original.

Bocejando, ela se foi trocar atrás de um biombo, ao mesmo tempo que respondia mecanicamente às perguntas que Davi lhe atirava. De súbito as perguntas cessaram e, voltando a vestir o robe, ela espreitou para confirmar se Davi não teria adormecido de tédio.

O caso tinha sido mesmo o contrário. Enquanto Davi se tinha concentrado em escrevinhar nos cartões à sua frente tudo tinha corrido bem, mas quando ele levantou os olhos, começou a experimentar sensações que raramente tinha.

Constatando a translucidez do biombo contra um foco de luz, ele via diante de si o contorno do corpo de uma deusa que, vagarosamente, se movia sobre si mesma numa dança muito própria.

Engolindo em seco, ele tinha a consciência de estar de boca aberta, olhos arregalados e com um constrangimento noutra parte da sua anatomia. O caso piorou quando ela saiu de trás do biombo e imediatamente percebeu o estado dele.

– Eu… eu… desculpa. – disse ele, pousando os cartões no colo.

What for?- perguntou ela, demasiado divertida.

Davi agradeceu mentalmente o à vontade dela. Ela se preparava para encher mais uma vez a flute, mas algo no olhar dele a fez desistir da ideia.

Ele parecia ter ficado fascinado com a boca vermelha da loira, ainda que também fizesse correr os olhos pela pele alva que ela tinha a descoberto.

O falso jornalista se pegou pensando se aquela pele teria mesmo o toque aveludado que ele supunha ter. Pior, ele se pegou pensando qual o sabor daquela cútis que, a poucos centímetros de distância, já emanava um leve odor a morango.

Não eram apenas pensamentos libidinosos de um jovem que sabia reconhecer uma mulher bonita.

Era qualquer coisa de inexplicável que o atraía, como polos diferentes de um ímã se atraem e não o conseguem evitar.

– Você tem mais alguma pergunta, or are we done?- perguntou a loira.

– Só mais uma… afinal, quem é Megan Lily? – perguntou ele, olhando diretamente para ela.

Surpresa, ela deixou cair a máscara blasé que costumava acompanhá-la. Nunca ninguém se preocupava em saber quem ela realmente era. As pessoas queriam ver Megan Lily, a popstar, o ícone, a figura pública, nunca vendo que dentro dela só existia uma menina carente pedindo para ser amada.

Cerrando o maxilar para evitar uma onda que a percorreu e que ela temia resultar em lágrimas, Megan permaneceu estática nunca quebrando o contato visual com Davi.

Ele ficou se sentindo culpado pela reação emotiva dela. Era óbvio que ele tinha achado Megan linda, mas ao vê-la daquele jeito ele tinha vontade de tomar conta dela e embalá-la nos seus braços. Uma mulher como aquela merecia ser amada por quem era, não por aquilo que os outros queriam que ela fosse.

Olhos nos olhos, eles liam a alma um do outro. Sem perceber como, eles se reconheciam, mesmo tendo acabado de se conhecer.

Como se o corpo já não fosse o dela, Megan avançou e se sentou sobre Davi, com uma perna de cada lado.

O geek constatou que a cantora indecente tinha tido pelo menos a decência de ter colocado roupa íntima antes de ter voltado a vestir aquele robe escorregadio. Mas tinha sido tudo aquilo que ela tinha vestido.

Enterrando as mãos nos cabelos fartos daquele homem depois de lhe retirar os óculos, Megan deixou roçar os seus lábios pelos lábios macios dele, num jogo de beija ou não beija.

Se, minutos antes, ela tinha tido vontade de fazer sexo desenfreado com ele só por um imperativo biológico; agora ela queria descobrir o que era fazer amor com um homem que a conseguia realmente ver por quem ela era.

Era qualquer coisa de vertiginosa, a sensação que ela teve quando, recuperado do susto, Davi começou a afagar com uma mão a face dela, quase com reverência, deixando a outra mão percorrer o caminho entre a coxa e a cintura da loira.

Como uma peregrina num deserto, ela se deixou afogar no oásis que era a boca dele. Em sincronia, ele se deixou levar pelo beijo e enlaçou a cintura dela, o que a colocou colada ao corpo moreno dele.

Davi se lembrou de algo que tinha lido de Nietzsche. Se a memória não lhe falhava era qualquer coisa como: “Há sempre alguma loucura no amor. Mas há sempre um pouco de razão na loucura.”

Não podia ser apenas por estar fisicamente atraído por aquela mulher que o corpo dele reagia daquela forma. A sua própria pergunta ecoava dentro da sua cabeça. Afinal, quem era mesmo a verdadeira Megan Lily?

Não era a femme fatal quem naquele momento lhe desabotoava lentamente a camisa, roçando as unhas com força no peito dele.

Era a mulher doce que estremeceu levemente quando ele lhe retirou o robe e a deixou semi nua em cima dele.

Os corpos deles falavam num idioma muito próprio quando Davi apertou com carinho as coxas dela e Megan lhe desaboou as calças, nunca deixando de o beijar.

As restantes peças de roupa rapidamente conheceram o chão do cômodo enquanto os corpos dos seus proprietários se acabavam de conhecer um ao outro.

O ambiente aqueceu, ameaçando fazer rivalidade a um vulcão que entra em erupção, e Megan e Davi ficaram com a certeza que iam deixar mais do que apenas marcas físicas um no outro.

Morriam jovens aqueles que eram favorecidos pelos deuses. Megan Lily não tinha dúvida que esse seria esse o seu destino, mas por uma noite, talvez por apenas uma noite, ela saberia o que era ser realmente feliz.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Quanto mais escrevo, menos nível tenho. Temo pelo futuro.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Megavi - Outras Vidas" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.