Amandil - Sombras da Guerra escrita por Elvish Song


Capítulo 23
A maldição


Notas iniciais do capítulo

Certo, gurias! Agora é hora da verdade: o destino de Thorin Escudo de Carvalho. Espero que o capítulo tenha ficado a contento.



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– Fili! Thorin! – havia horror e preocupação na voz da elfa, quando alcançou os amigos gravemente feridos. Fili encontrava-se preso ao chão por uma espada em forma de gancho que lhe atravessava o peito e seguia através do corpo, cravando-se no gelo; Thorin, por sua vez, fora atravessado de lado a lado pela espada de Azog – ela chegara no exato momento em que isso acontecera - antes que houvesse ele próprio atravessado o corpo do inimigo com sua arma de dois gumes. O orc pálido tombara, morto, e agora jazia inerte no chão, ao lado dos dois anões agonizantes. Sem saber qual socorrer primeiro, a moça indicou a Legolas que cuidasse de Fili, enquanto ela ia até Thorin.

Não foi sem medo que ela se aproximou do rei anão: seus últimos encontros estavam vívidos na mente da jovem, especialmente a “visita” que ele lhe fizera... Assim, também se lembrava muito bem de como respondera à afronta sofrida: com uma maldição. Uma maldição que, agora, cobrava seu preço! Se o guerreiro se encontrava semimorto, agora, era apenas porque ela o amaldiçoara, condenando-o a se ver sozinho e desamparado na batalha, sem amigo, sem ninguém para vir em seu socorro. Por sua maldição, e nada mais, é que ela e Legolas haviam sido atrasados pelos orcs, impedidos de chegar a tempo! Por causa dela, os anões estavam prestes a perder seu rei.

– Thorin – chamou ela, vendo os olhos azuis do guerreiro se abrirem. Vencendo o medo de tocá-lo, cobriu o ferimento com uma tira da própria camisa, mas aquele que um dia fora seu amigo (ao menos ela o considerara assim) pediu:

– Por favor, não. Cuide de Fili, Amandil. Você não tem forças para salvar a nós dois... E eu não mereço ser salvo.

– Não diga isso, Thorin! Legolas está cuidando de seu sobrinho. Eu posso curá-lo!

– Não, não pode – ofegou o anão, referindo-se à maldição da jovem – e você sabe. Estou morto, princesa, e é merecido que assim seja. – os olhos dele tinham uma lucidez que ela não via há meses – mas eu preciso dizer...

– Não fale. – pediu a moça, tentando evocar o encanto de cura, que simplesmente se recusava a obedecê-la. O mesmo feitiço que usara com Kili, e que tão prontamente salvara a vida do anão mais jovem, agora se recusava a fazer efeito, e ela sabia muito bem o motivo. – Não... Não! – Nunca na vida a princesa desejara tanto poder voltar no tempo, e desfazer um erro. Thorin não podia morrer por sua causa! Nunca se perdoaria, se isso acontecesse! O rei, porém, parecia conformado, e até mesmo feliz com isso, quando sorriu com dificuldades para ela:

– Obrigado pela tentativa, menina... Mas nós dois sabemos que não vai adiantar. – a mão do guerreiro pousou no ombro dela – Mas não posso partir, sem lhe dizer... – ele ofegou, engasgando-se com o próprio sangue, que encharcava seus pulmões – Preciso de seu perdão. Por todo o mal... Que lhe fiz. Você pode me perdoar?

– Não tenho nada a perdoar, Thorin. – ela tentou evocar o encanto, outra vez sem sucesso – mas não desista, por favor! Você não pode morrer!

– Não sou digno de continuar a viver. – gemeu o anão, sua voz cada vez mais fraca - Falhei para com meu povo... Falhei para com meus amigos. – Ele a fitou com olhos esperançosos – salve Fili. Garanta que meu povo... Não ficará sem um rei.

A moça olhou para a direita, onde seu noivo retirara a espada do peito de Fili, e agora comprimia com força o peito do anão, esforçando-se num encanto de cura que não seria o bastante para estancar tão grave hemorragia. Legolas não era um curandeiro, e não tinha qualquer das ferramentas necessárias para tratar alguém, além da própria magia que, verdade seja dita, não era das mais potentes, quando se tratava de curar. Podia ser o jovem senhor da floresta, ao qual plantas e animais se curvavam e obedeciam, mas não tinha habilidade mágica na arte de fechar ferimentos ou sanar doenças. Só ela podia salvar Fili... Mas isso implicaria em deixar Thorin à própria sorte. E como poderia fazer isso, se fora ela a culpada por aquilo? Por outro lado, também Fili não estaria à beira da morte, se não fosse por sua maldição. Não era ele o amaldiçoado, mas, ainda assim, sofrera os efeitos das palavras da elfa, que condenara o herdeiro de Dúrin a se ver sozinho na batalha. Também a vida do mais jovem jazia em suas mãos, e a este ela poderia curar.

– Eu vou salvar Fili. É uma promessa – disse, afinal, e ia se levantar quando a mão de Thorin a segurou:

– Amandil... Mesmo com toda a... Loucura... – já quase não restavam mais forças ao rei – Não foi o ouro, nem a Pedra Arken: eu amei você. Com toda a loucura que me possuiu... Eu te amei, e esta foi minha maior fraqueza. Perdoe-me pelas coisas que lhe fiz... Nunca quis machuca-la... – mesmo alguns metros distante, Legolas ouviu tais palavras, e ergueu os olhos para sua noiva, confuso e sentindo-se traído.

– Não há o que perdoar, Thorin. Eu é que lhe peço perdão, pelo que lhe fiz. Nada disso teria acontecido, se não fosse por mim. – havia lágrimas não derramadas nos olhos da elfa, que não se conformava com a própria impotência ante os resultados da própria magia, e não percebia que era observada por seu noivo, com olhos cheios de mágoa – Perdoe-me, meu amigo. Perdoe-me por meu erro.

– Salve Fili... E não haverá nada a perdoar.

Anuindo, Amandil se levantou; no mesmo instante, um apressado Bilbo correu até Thorin, e ela soube que o rei não morreria desamparado, enquanto o halfling se abaixava ao lado do amigo. Eis o coração mais bravo e honrado de todos os envolvidos naquela guerra: o pequeno hobbit, verdadeiro herói desde que haviam deixado o Condado.

A fim de cumprir sua promessa, ela se ajoelhou ao lado de Legolas, que ainda lutava contra a ferida grave demais para seus conhecimentos - evitando o olhar da elfa - e pediu:

– Continue a pressionar a ferida. Eu termino isso.

– você está sem forças, Amandil! – protestou o príncipe, sem conseguir fitar sua noiva, sabendo que seus ciúmes ficariam evidentes, se o fizesse – isso vai exauri-la!

– Que seja. – respondeu a moça. Mesmo se o preço fosse a morte (o que realmente não era), ela tinha de fazer aquilo: não que salvar o moço a redimisse de seu terrível ato, pelo qual se sentiria culpada até o fim dos dias, mas não falharia com sua promessa.

Pousando as mãos no peito de Fili, ela pronunciou outra vez as palavras antigas. Sua pele se cobriu de luz, e finas raízes luminosas pareciam emanar de seus dedos, penetrando a carne do anão inconsciente; um fluxo de energia lento e morno corria da elfa para o guerreiro caído, reparando a carne e fechando veias rompidas, consertando o tecido onde este se rasgara, deixando o corpo outra vez em condições de se manter vivo. Exigia cada gota de concentração da jovem – era um ferimento ainda pior que o de Kili! – e drenava suas forças até o limite, mas, enfim, ela soube que o moço estava fora de perigo. Com sua luz se desvanecendo, sentiu uma forte vertigem e seus olhos escureceram. Foi só com dificuldade que se obrigou a ficar acordada, e sorriu para seu futuro esposo:

– Ele vai viver.

– Não posso dizer o mesmo de você – respondeu o elfo, tomando-a nos braços ao ver que sua noiva estava prestes a desfalecer de exaustão, momentaneamente esquecido de Thorin e do próprio ciúme, ante a preocupação com a moça – louca inconsequente.

– Eu também te amo, Leg. – respondeu a jovem, antes de olhar para o lugar onde deixara o rei anão: estava morto, e aquela percepção fez o chão fugir aos pés da garota. Thorin estava morto, e a culpa fora dela. Era tão culpada quanto se houvesse ela mesma empunhado a espada que o golpeara! Esquivando-se aos braços do príncipe de Mirkwood, sentiu as lágrimas se derramando de seus olhos, incontidas, e curvou-se na neve fresca, perguntando mais para si do que para o homem ao seu lado – meus Ainur, o que foi que eu fiz?! – sem conseguir se conter, exausta e sentindo-se esmagada pelo peso da culpa, desfez-se num pranto convulsivo, até escorregar lentamente para a suave escuridão da inconsciência.

*

A jovem elfa não se lembrava de já ter acordado com uma dor de cabeça tão forte; nem mesmo quando se embebedara com Legolas e Tauriel nas adegas de Thranduil, quando menina, havia acordado com tanta dor! Mas o que acontecera, afinal?!

Abrindo os olhos com dificuldade, não reconheceu o lugar onde estava: um quarto escavado na pedra, onde a luz penetrava através de uma janela entreaberta, filtrada por grossas cortinas vermelhas. A cama onde estava deitada era macia e confortável, e já não vestia armadura, mas um vestido sem mangas, branco. Havia sido banhada, e seus ferimentos, tratados. Mas onde estava, afinal?!

Como se em resposta à sua pergunta, Legolas entrou no quarto, abrindo um largo sorriso ao vê-la desperta:

– Que bom que acordou, meu amor! Já estava preocupado com você. Está dormindo há dois dias inteiros! – ela tentou se levantar, no que foi impedida pelo elfo – devagar. Não sei se seus ossos já se consolidaram. Quebrou alguns deles, na briga com Bolg.

– onde estamos, meu amor? – perguntou a moça, relaxando sobre os travesseiros, a mão sobre os olhos para bloquear a luz.

– Em Erebor. – respondeu ele, acariciando os cabelos da jovem. – Dale não tinha como abrigar tanta gente, especialmente após quase ter sido demolida. Os feridos graves, de todos os exércitos, estão sendo tratados aqui.

– Feridos gravemente? E como eu me encaixo nisso?

– Não se encaixa – riu-se o elfo – mas Fili e Kili não consentiram em outra coisa.

– Fili e Kili?! – esquecendo-se da dor de cabeça e das costelas quebradas, a moça se levantou de súbito, sentando-se na cama – como eles estão?! Ah, por Erú, e Bilbo?!

– calma! – censurou Legolas – os três estão bem. Kili está preso ao leito, pois sua perna foi praticamente amputada, mas está vivo. Fili já deixou o quarto, graças ao seu encantamento. E Bilbo não se feriu na batalha.

– E Tauriel? – ela se lembrava do quão machucada a amiga estava.

– Levou uma boa surra de Bolg, e está bem machucada... Costelas quebradas, ombro esmagado, fraturou os dois ossos da perna direita. Mas você a conhece: ninguém prende Tauriel na cama, por mais de um dia. Ela veio aqui e, agora, está com seu anão. Ada vai acabar matando os dois, quando souber.

– Thranduil? – perguntou a elfa, surpresa – ele está aqui?

– Parece que sua iniciativa de desaparecer com a Pedra Arken colocou as ideias de meu pai de volta no lugar. – respondeu o moço, tirando de dentro da manga a grande joia brilhante, e entregando-a a Amandil – não sei o que vai fazer com ela, mas sei que é a melhor pessoa para guarda-la. Só tome cuidado... É bastante perigosa.

– Sim. – concordou a moça – é mesmo. Mas não corro perigo.

– Não? – ele provocou, embora soubesse que era verdade.

– Não. – respondeu, sorrindo – a Pedra Arken se alimenta da ambição e do desejo furioso em possuir algo que não se pode ter. E eu, bom... Tenho tudo o que poderia desejar. – entrelaçando os dedos aos cabelos de Legolas, Amandil o beijou – Eu tenho você. O que mais poderia desejar? – com cuidado, ela escorregou para a beira da cama, levantando-se devagar – Nossa, que dor de cabeça! Nem quando nos embebedamos juntos tive uma ressaca assim!

– Foi a poção que a curandeira lhe deu; você estava muito fraca, e Carnil temeu que morresse, sem ajuda. Mas a poção tem efeitos colaterais. Tem certeza de que não quer ficar na cama?

– Preciso falar com Thranduil. E... Quem está no comando de Erebor?

– Dain, até Fili se recobrar totalmente. – mas havia uma pergunta na mente de Legolas, uma questão que ele realmente precisava exprimir – Amandil... O que houve entre você e Thorin? – os ciúmes lhe roíam o peito, por mais que ele lutasse contra aquele sentimento irracional. Ciúmes das lágrimas que ela derramara ao ver o anão ferido, e principalmente da confissão final de Escudo de Carvalho.

A jovem parou no lugar onde estava, relembrada de seu crime, de seu erro, e das repercussões que isso tivera. Por que Legolas queria saber aquilo?! Por que tocar naquela ferida em sua alma, que haveria de persegui-la até o fim do mundo?

– Por que pergunta? – devolveu a moça, fechando os olhos. O príncipe se aproximou dela, os ciúmes bem claros em seu olhar, quando insistiu na pergunta:

– O que houve entre você e Thorin? O que pode ter acontecido de tão grave, para que você guarde segredo de mim?

Duas lágrimas brilhantes escorreram pelo rosto da elfa, quando ela abriu os olhos e fitou o teto, angustiada; Legolas ouvira sua conversa com Thorin e, é claro, estava com ciúmes. Mais tarde ela lhe daria um tapa por ousar duvidar de seu amor, mas agora sentia todo o peso da culpa e do medo – medo, sim, pois ainda não sabia quais seriam as repercussões verdadeiras da morte do anão – a apertar-lhe o coração.

– Thorin morreu por minha causa, Legolas. – respondeu, afinal, caindo num pranto convulsivo – Ah, meus Valar! O que foi que eu fiz?! Eu o amaldiçoei a se ver sozinho e sem forças em batalha, sem ninguém para vir em seu socorro... Por que eu fiz isso?! Nunca me perdoarei, Leg!

O príncipe estava atônito: Amandil – a gentil e controlada Amandil! – amaldiçoara alguém? Como isso era possível?! O que o anão havia precisado fazer, para provocar tal reação em sua adorada noiva? Ela, porém, não havia terminado:

– Por isso choro, meu amor: cometi um ato terrível, e causei a morte não apenas de um rei, mas de um homem que, até ser tomado pelo mal do ouro, havia sido bom e honrado! Como posso me redimir de tal crime?! Como poderei fitar Fili e Kili, ou qualquer dos anões, sabendo que foi a minha maldição que me impediu de, no momento final, salvar a vida de Thorin? – o choro sacudia o corpo esguio da jovem, e o príncipe a aconchegou em seus braços, trazendo-lhe a cabeça contra o peito. A última coisa que queria era causar dor em Amandil! Ah, tolo, por que fizera aquela pergunta?! Com gentileza, acariciou o rosto dela e sussurrou:

– Você salvou a vida de Fili e Kili, meu amor. Os anões estão em débito para com você.

– Não, meu querido. Eu estou em débito para com tudo aquilo em que sempre acreditei. Nada no mundo me daria o direito de amaldiçoar alguém, não importa o que a pessoa me tivesse feito. – sentindo o abraço de Legolas, ela se obrigou a silenciar o choro, ou ficaria ali pelo resto do dia – mas não creio que isso importe, agora. Não há como ressuscitar os mortos. – Enxugando as próprias lágrimas, ela se empertigou e vestiu a capa que estava aos pés da cama, trançando os cabelos. Não queria contar a seu noivo o que se passara durante seu cativeiro: incitar a raiva contra os mortos era algo vil, que ela se recusava a fazer. Terminando de prender os cabelos, certificou-se de ter o rosto seco, e perguntou:

– Vamos? Tenho de falar com seu pai, e quero ver se Tauriel está bem.

Sentindo-se culpado pela dor que causara em Amandil, o filho de Thranduil não fez a pergunta que teimava em voltar à sua mente, por saber que seria ainda mais dolorosa à jovem. O que teria Escudo de Carvalho feito à moça, para despertar-lhe tamanho ódio? Em seu íntimo ele pensava saber a resposta, mas apenas considerar a possibilidade lhe fazia ter vontade de ressuscitar o rei anão, apenas para poder mata-lo de uma maneira mais dolorosa! Deste modo, calou-se e obrigou os próprios pensamentos a se ocuparem de outra coisa, acompanhando a princesa até Dale, onde se encontrava o soberano dos elfos.


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Notas finais do capítulo

E aí, o que acharam?
Perdoem-me por isso, mas eu não podia deixar o Thorin viver... Mais forte do que eu, se é que me entendem.
E Legolas com ciúmes da Aman! Quem achou cute, fala!
Sem mais delongas, porque estou caindo de sono, me despeço com um beijo estalado!



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