Interlúdio escrita por Lab Girl


Capítulo 10
A Noite


Notas iniciais do capítulo

Que bom receber as reações de vocês que estão lendo a história e saber que continuam gostando, mesmo com a reviravolta e a montanha russa de emoções dos capítulos anteriores. A esta altura a fanfic parece ter tomado vida própria! Sim, porque Megan e Davi estão me levando pela mão aonde eles querem ir nesse universo.

Espero estar conseguindo passar o lado dos dois na história. E não fiquem deprês com o rumo que a coisa está tomando: a autora que vos escreve é super a favor dos finais felizes.

Música que inspirou o capítulo, caso queiram escutar: A Noite, Tiê: https://www.youtube.com/watch?v=8PCwLqyyyXE

Boa leitura!



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Megan acordou com a cabeça doendo. Olhou em volta e viu a mãe sentada ao lado da cama onde estava deitada, e ela sorriu e apertou sua mão.

Hey, Sweetheart.

Mom” a voz de Megan saiu num sussurro arranhando.

“Não precisa falar, Sweetie. Está tudo bem. Você está bem e o baby também.”

Automaticamente, a mão de Megan pousou sobre o ventre. Ela sentiu uma onda de alívio no peito. Mas, de repente, lembrou-se…

“E Davi?”

“Ele foi tomar um café. E, baby girl… ele já sabe sobre o bebê.”

Megan havia imaginado. Ele estava ao seu lado no momento do atropelamento - embora tudo tivesse ficado escuro rápido demais depois do baque, lembrava-se de ter ouvido a voz dele dentro da ambulância, mesmo que sua cabeça estivesse confusa demais para registrar o que ele dizia, porém conseguia recordar a mão dele na sua, em seu rosto, certamente enquanto dizia palavras de conforto. E, depois, bem, ela havia oscilado entre a consciência de luzes e vozes em seu entorno e um apagão logo depois. Só havia recobrado a consciência de forma completa quando a levaram para fazer uma transfusão de sangue e o médico lhe explicou que, embora ela estivesse bem, era de extrema importância para o bebê. Agora, acordando depois de um sono pesado, ela se sentia dolorida e a lembrança de Davi voltava com força. Ele tinha sido o responsável por autorizar a transfusão pelo que o médico havia dito, então ele tinha ficado sabendo sobre a gravidez assim. Como ela jamais teria previsto.

Fechando os olhos por uma fração de segundos, Megan suspirou antes de tornar a abri-los. O que tinha passado as últimas semanas adiando, tinha finalmente chegado. A verdade veio à tona da pior maneira. Agora Davi já sabia que ela esperava um bebê. E não soube por sua boca, mas por causa do acidente inesperado. Megan suspirou mais uma vez, olhando para a mãe. E a preocupação misturada à curiosidade a venceu.

“Como ele reagiu, mom?”

“Na verdade, quando eu cheguei ele já estava sabendo. O médico contou. Nós não tivemos muito tempo para conversar. Mas eu posso dizer que ele estava aparentemente calmo. Surpreso, claro.”

Just? Só?”

Pamela apertou os lábios antes de responder sinceramente. “Ele me pareceu chateado quando viu que eu já sabia.”

“Oh, mom” Megan choramingou sem poder evitar.

“Você já esperava por isso, Sweetie. Agora não se preocupe com esse assunto, preocupe-se com a sua recuperação.”

Era difícil para Megan não pensar no que viria pela frente. Mesmo com o corpo dolorido e a cabeça doendo, seus pensamentos e preocupação não paravam de aumentar. Até sentir a mão de sua mãe correr por seu cabelo, afagando como fazia quando era apenas uma menina. E foi o que bastou para que se sentisse segura. Logo o sono a venceu.

Quando tornou a despertar, sem saber quanto tempo havia se passado, Megan o viu. De pé, parado a uma pequena distância da cama, a observá-la em silêncio. A princípio, ela pensou tratar-se de um sonho. Porém, quando ele deu o primeiro passo e se aproximou, ela soube que era real. Tentou colocar-se sentada, apoiando os cotovelos sobre a cama e impulsionando o corpo para cima, mas Davi ergueu a mão ao vê-la se mover.

“Não precisa. Não se esforce.”

Megan suspirou, internamente agradecida. Seu corpo doía muito e ela se dava conta de onde vinha a expressão ‘como se tivesse sido atropelado’.

“Davi, eu…” ela tentou começar a falar algo - qualquer coisa, a fim de se explicar agora que ele já sabia sobre a gravidez.

Ele, porém, mais uma vez interrompeu seus planos falando por cima.

“Só vim pra ver como você estava. A pancada não deixou nenhuma sequela, mas tiveram que fazer uma transfusão. Por causa do bebê.”

Davi não sabia como lidar com aquela situação, a palavra pareceu queimar-lhe a língua assim que foi proferida. Tentou disfarçar o desconforto, mas estava quase certo de que estava falhando nisso.

Yes” Megan respondeu, quase num sussurro. “Mas agora está tudo bem. Tirando a dor no corpo.”

“É normal. Depois do que você passou.”

I know.

“O motorista que te atropelou foi preso. Estava bêbado e perdeu o controle da direção. Um colega da Gambiarra me ligou há pouco avisando que ele está detido na delegacia.”

“Menos mal. Tomara que não passe em branco e ele seja punido para não colocar outras vidas em perigo.”

“A polícia vai precisar ouvir o seu depoimento” Davi explicou, “Assim que você estiver em condições, claro.”

“Claro” ela meneou a cabeça.

Davi sentiu o estômago se apertar em um nó ao reparar as marcas que os ferimentos haviam deixado na pele branca e delicada de Megan. Um arranhão na testa. Uma mancha que já começava a ficar roxa no lado esquerdo do rosto. Escoriações no dorso das mãos e nos braços expostos pela camisola de hospital. Ele sabia que existiam outras marcas que não estavam à mostra, encobertas pela vestimenta e pelo lençol que a cobria da cintura para baixo. Sentiu uma mistura quente de dor e raiva subir pela garganta e torceu mentalmente para não encontrar com o sujeito que havia causado tudo aquilo quando fosse à delegacia prestar depoimento como testemunha.

“Você está sentindo muita dor?” ele se ouviu perguntar, a preocupação com o bem estar dela falando mais alto.

“Agora não muita. Me deram algo analgésico leve que me ajudou a dormir um pouco. Até queria tomar algo mais forte, mas tenho restrições a medicação mais pesada por causa…” ela começou a dizer e interrompeu-se, percebendo que não conseguia falar ‘da gravidez’ ou ‘do bebê’; o brilho que tremeluziu nos olhos de Davi minou sua voz e sua coragem.

Os dois entreolharam-se em silêncio, o clima de desconforto quase palpável no ar. Megan sabia que Davi ainda estava remoendo a novidade de sua gravidez, e ela, por sua vez, não sabia como agir diante dele agora que sabia que ele já sabia. Por fim, foi ele quem fez a escolha: ignorar completamente o enorme elefante no quarto.

“Bem, eu vou indo. Só voltei pra ver como você estava. Já é bem tarde e eu preciso estar de pé cedinho pra receber dois possíveis interessados em investir na Brazuca.”

Oh, sim, nosso projeto já começou a despertar o interesse de gente nova” Megan sorriu de leve, feliz por ter um assunto seguro para tocar.

“Graças a ideia da sua campanha.”

No, graças ao trabalho em equipe. Você, Ernesto e eu.”

“Tem razão” Davi murmurou, enfiando as mãos nos bolsos da calça. “Formamos um bom time.”

“O melhor” ela tentou sorrir de novo.

Davi queria corresponder à tentativa de sorriso dela, mas falhou. Em vez disso, conseguiu apenas menear a cabeça. “Vou indo, então. Melhoras.”

Megan sentiu a pequena centelha de ânimo desfazer-se quando ele virou as costas e caminhou rumo à porta do quarto. Mas algo a impeliu a chamá-lo de volta.

“Davi!”

Ele se virou para vê-la. E Megan tornou a perder a coragem. Ela apenas conseguiu dizer timidamente, “Obrigada. Por ter me socorrido e ficado do meu lado até me trazerem para o hospital. E por ter se responsabilizado pela transfusão de sangue.”

Davi balançou a cabeça. “Não tem por que me agradecer. Teria feito por qualquer pessoa que precisasse.”

A resposta a pegou direto no coração, gelando seu corpo inteiro.

Of course” Megan murmurou, sem graça. “Mesmo assim, thank you.”

Não tinha sido a intenção de Davi soar frio ou descortês. Porém, quando ouviu a própria voz, aquela resposta já tinha saído. Sua cabeça no momento não era a melhor das conselheiras. Estava física e mentalmente exausto, e ainda confuso e chateado por descobrir de uma maneira tão chocante um segredo tão forte. Segredo esse que Megan e Pamela haviam conspirado juntas para esconderem dele. Não sabia o que pensar nem como agir. Sabia apenas que precisava sair dali o quanto antes para evitar dizer ou fazer algo de que se arrependesse depois. Então, tornou a menear a cabeça à guisa de despedida e virou-se, abrindo a porta e saindo do quarto.

Quando se viu sozinha, Megan sentiu os olhos arderem, as lágrimas acumuladas implorando saída. Mas respirou fundo e, com as mãos, esfregou os olhos. Não queria chorar.

O barulho da porta se abrindo a fez encarar a entrada na esperança de vê-lo retornar. Foi a figura de sua mãe, porém, que viu adentrar o quarto.

“Ah, é você, mom” não conseguiu disfarçar o desapontamento.

“Como foi com Davi?” Pamela perguntou, puxando a cadeira ao lado da cama e sentando-se.

“Não foi.”

“Como não?”

“Ele não tocou no assunto e eu também não tive coragem. Ele só mencionou a palavra bebê quando falou da transfusão que teve que ser feita. Mas deu pra perceber que ele está diferente. Mal quis conversar, só veio pra saber se eu estava bem e dizer que estava indo embora.”

Pamela recostou-se à cadeira, liberando um longo suspiro. “Ainda é muito recente, Sweetie. Ele precisa de tempo para assimilar tudo.”

“Eu sei, mas foi horrível sentir que ele tava distante de novo. Eu odeio quando ele me trata assim, como se eu fosse uma estranha.”

“Calma, Megan. As coisas vão chegar no lugar.”

“Será, mom?”

“Eu tenho certeza” Pamela buscou a mão da filha apoiada sobre o colchão e a apertou. “Tenha calma agora. E, como eu disse, pense apenas na sua recuperação, okay? Eu só deixei Davi entrar agora porque ele me pediu e achei que não era bom negar, especialmente porque ele já sabe que vai ser papai.”

Megan fechou os olhos diante da palavra, rindo, sem humor. “Ele não se sente assim, com certeza.”

“Mas vai sentir em breve. Afinal, ele é o dad dessa criança.”

“Se é que ele acredita mesmo que o filho é dele” Megan admitiu com pesar, abrindo os olhos.

“Se ele tiver alguma dúvida…” Pamela começou a dizer.

“Eu me sentiria morrer por dentro, mom” Megan lutou conta a vontade terrível de chorar.

Oh, no, Sweetie. Não diga isso” Pamela tornou a apertar com carinho a mão da filha. “Não pense assim. Se por um acaso Davi duvidar, tente entender que ele ainda deve ter cicatrizes causadas pelas mentiras que você contou no passado para mantê-lo ao seu lado. Remember?”

Megan evitou olhar para a mãe, sabia que ela tinha razão, mesmo assim doía sequer pensar que Davi pudesse estar considerando que o filho que esperava era de outro. Fungando para reter as lágrimas, ela meneou a cabeça.

I know. Eu sei, mom. Não me esqueço disso nunca, e foi justamente por esse motivo que não consegui contar a ele a verdade antes. Mas eu ia contar amanhã, a gente tava se entendendo tão bem esta noite, antes de...” ela perdeu a voz ao lembrar-se da montanha russa de emoções das últimas horas.

“Não importa. Nada está perdido ainda. Pense assim, baby girl...” Pamela deu um tapinha de leve na mão de Megan, fazendo-a voltar a encará-la, “...se ele tiver uma dúvida inicial, ela não vai se sustentar por muito tempo. E você tem a verdade a seu favor. Um teste de DNA e tudo ficará esclarecido.”

Megan não queria ter que chegar a esse ponto. Mas, se fosse preciso, faria. De qualquer modo, seu maior medo nem era esse. A voz da mãe continuou a falar, no entanto, na tentativa de fazê-la recobrar a esperança.

“E conhecendo Davi, ele não vai deixar a responsabilidade dele de lado. Sabendo que é o pai, ele vai assumir essa criança.”

Megan ergueu os olhos, encarando a mãe e dando voz a seu temor. “Esse é o meu medo.”

“Por quê, Sweetheart?” Pamela questionou, confusa.

“Porque eu não quero que Davi se relacione com esse filho só por uma questão de responsabilidade.”

Pamela sorriu diante dessa resposta, o que fez Megan franzir a testa, confusa. Tornando a acariciar a mão da filha, a artista emendou, “Estou orgulhosa de você. Se fosse meses antes, você estaria usando essa gravidez para manter um elo de ligação entre vocês dois. Mas em vez disso, está pensando no quanto é importante para esse filho ter o amor do pai de verdade. Como você amadureceu, minha baby girl.”

Pela primeira vez, Megan percebeu que sim. Sua mãe estava certa. Meses atrás teria feito de tudo para prender Davi a seu lado, e aquela gravidez inesperada teria sido a resposta perfeita. Porém, desde que havia descoberto que estava esperando um filho, nunca tinha pensado em tal coisa. Muito ao contrário. Seu medo era justamente que Davi pensasse que ela estava querendo manipulá-lo com um bebê. E estava percebendo, finalmente, que o mais importante para ela era que Davi também quisesse aquela criança - que quisesse e amasse o filho deles tanto quanto ela já sentia que o queria e o amava.

Com um sorriso melancólico, Megan apertou a mão da mãe de volta. Talvez Pamela tivesse razão. Ainda teria tempo para conversar com Davi e colocar tudo em pratos limpos. No momento, sua preocupação devia ser descansar e se recuperar. E assim o faria.

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